Gralhas 2  


ONU tem a tónica no u

Às vezes tenho dificuldade em perceber o que dizem políticos e jornalistas na rádio e televisão portuguesas, porque empregam normas de pronúncia diferentes daquelas que aprendi no berço e na escola e também porque reflectem mudanças de sentido de palavras que, para mim, têm outros significados.
Posso apresentar exemplos infelizmente muito actuais, relacionados que estão com os trágicos acontecimentos de Timor.
Quanto à pronúncia: a sigla ONU. Como posso entender o que dizem, quando pronunciam /ó nu/? Esta sigla, tornada palavra, em Português europeu sempre teve a tónica na última sílaba: /o nú/ (com o o aberto, como em obra, e o realce no u).
Para se pronunciar como grave, teria de levar acento gráfico na primeira sílaba ("ÓNU"). Pronuncia se, pois, como peru, caju e termos semelhantes.

Quanto ao sentido: humanitário. Este adjectivo tornou se numa espécie de muleta. Quando os locutores não sabem o que dizer, fazem avançar o humanitário, do mesmo modo que outros dizem efectivamente, pá ou prontos. "Catástrofe humanitária" é um contra senso, porque a catástrofe prejudica o ser humano e o que é humanitário beneficia o. Na verdade, como José Mário Costa já explicou no Ciberdúvidas, humanitário é o que visa o interesse da humanidade. O adjectivo que melhor se aplicaria seria humano, mas "catástrofe humana" é pleonasmo sem estilo: portanto, difícil de aceitar (uma catástrofe verifica se sempre na perspectiva do homem).

Políticos, jornalistas e outras figuras que falam em público dever se iam preocupar mais com a nossa Língua comum.

Afonso Peres Ciberdúvidas


BARBARISMOS DA LINGUAGEM CORRENTE

ABALO SÍSMICO Porquanto, no adjectivo sísmico já se encontra contida a ideia de abalo se empregarmos a expressão abalo sísmico à semelhança do que fazem alguns locutores televisivos de pronúncia arrebicada, cometeremos uma redundância desnecessária. Portanto: ou dizemos tremor de terra, seguindo o exemplo de quase toda a gente, ou então usaremos a locução abalo de terra, como variante. Quem pretender, porém, fazer figura de bem falante poderá recorrer à palavra sismo, de origem grega, a qual, nessa língua, já designa abalo e terremoto. Note se, a propósito, ser esta a forma correcta do vocábulo, e não terramoto, que surgiu por deturpação do latim terrae motu (movimento de terra), cujo ditongo ae se transformou na vogal portuguesa e, como era habitual observar se na passagem dos vocábulos romanos para o nosso idioma. O escritor Alberto de Oliveira incorreu também no erro acima referido, conforme se pode verificar nas páginas 67, 161 e 169, edição de 1984, do seu livro de crónicas "Palavras Loucas".

ACORDO O plural de acôrdo (na escrita oficial sem nenhum acento) não é acórdos como se ouve dizer com bastante frequência, mas sim acôrdos, sempre com o fechado, conforme ensinaram, e muito bem, os professores Xavier Roberto e Luís de Sousa, a páginas 207, 6ª edição do "Prontuário da Língua Portuguesa". A esporádica abertura do primeiro o de acordos deve ter surgido por influência de acordes, termo usado em linguagem musical, mas sem qualquer relação com ele.

ACREDITAR SE Quando reflexo, este verbo é sinónimo de alcança boa reputação junto de alguém. Na vulgar acepção de crer, nunca se deve empregar antecedido, como algumas pessoas fazem, de qualquer pronome pessoal complementar. É por tal motivo que se consideram erradas frases do tipo da seguinte, embora bastante vulgarizadas entre o povo: "Ele não se acredita em mim!" Visto que o verbo acreditar desempenha aqui uma função de natureza transitiva, e não reflexa, para correcção da referida frase basta apenas suprimir se lhe o pronome se, e tudo ficará em português de lei.

ALCORÃO Ensinou Vasco Botelho de Amaral, na página 118, 1.Q volume, do seu "Dicionário de Dificuldades da Língua Portuguesa", edição de 1938, o seguinte: "Nota se muito a prática de dispensar o emprego do artigo árabe al, que se aglutina ao substantivo. Tal uso não parece aconselhável, porque a maior parte das palavras recebidas dos Árabes apresenta aglutinação. Escrever o Corão ou o Koran é castelhanismo ou francesismo, em vez de Alcorão.
A esta doutrina pode se acrescentar o seguinte: se nós suprimirmos, por uma questão de escrúpulos, a primeira silaba de Alcorão porque não queremos ser redundantes na duplicação do artigo (o português + al árabe) qualquer dia ninguém nos poderá censurar, se passarmos a dizer: o finete, a molotolia, a cachofa, o mofariz, o geroz, em lugar de o alfinete, a almotolia, a alcachofa, o almofariz, o almofariz, o algeroz assim por diante. Isto é por demais evidente, não é? Continuemos, pois, a dizer e a escrever, o Alcorão, como sempre foi usual entre nós, e deixemos o estrangeirismo para quem gostar de formas arrebicadas.

ANCARA O nome desta cidade turca não é grave, mas esdrúxulo, como se pode ver na página 84, edição de 1949, do livro "Introduction au Turc", da autoria de Herbert Jansky. Esta informação encontra se confirmada na página 31, edição de 1953, da obra "Teach yourself Turkish", de G.L. Lewis. Diga se, portanto, ancara, esdruxulamente, e não Ancara, como rima de cara, visto que tal topónimo é proferido pelos Turcos sempre com acento sobre a penúltima silaba, aliás como já tivemos ocasião de verificar através dos programas noticiosos da televisão otomana.

AVEIRO O A deste nome geográfico deve ser pronunciado aberto, como o de Ávila, e não surdo, como os de Câmara, porque resultou, conforme provamos com o trecho seguinte, da crase ou fusão dos dois aa, com que, nos séculos XIV e XV, era habitual escrever se tal topónimo. Na "Crónica de D. Fernando" V edição de 1975, página 216, deixou Fernão Lopes a seguinte informação: "... E deu lhe el rei logo Villa Viçosa e Avrantes, e Almadaã e Sintra e Torres Vedras e Alanquer e Aatooguia e Oobidos e Aaveiro (o grifado é nosso)..." Digamos, pois, Aveiro, com a surdo, pois esta pronúncia, além de errada, também denuncia fiagrante preciosismo.

CRÉDITO BARATO Assim como não devemos dizer preço barato, em lugar de módico ou baixo, porque se trata de uma impropriedade habitual de expressão, assim também não será legitimo usarmos o mesmo adjectivo para qualificar o substantivo crédito, pois as mercadorias é que se podem considerar caras ou baratas. Diga se, portanto e unicamente: crédito alto ou baixo (e até acessível), jamais crédito caro ou barato, conforme é já habitual ouvir se na televisão e na rádio.

CRUDE Como petróleo bruto é a expressão portuguesa, que se usa há muitos anos para tradução do anglicismo crude, aliás crude oil (na sua forma completa), pensamos não valer a pena tentarmos dar guarida a mais este inútil barbarismo.
Quem quiser consultar o "Dicionário de Inglês Português", da autoria do professor Armando de Morais, publicado em 1966, lá encontrará, entre outros significados, o seguinte: "Crude (cru, verde, imperfeito, rude, bruto, sem amadurecer)"

Francisco Alves da Costa
Jornal dos OLIVAlS Agosto 1999


Do Ciberdúvidas :

Tema
Imprensa escrita?

Pergunta
Tenho assistido ao uso cada vez mais frequente da expressão "imprensa escrita", seja por jornalistas em jornais de referência (ainda hoje, 6 de Agosto, em "O Público"), seja nas televisões por políticos e afins. A imprensa é, por definição, escrita. Logo, o termo é redundante, como se depreende da consulta do dicionário da Porto Editora, quando diz que imprensa é "arte de imprimir; o conjunto dos jornais". Ou não? A língua também é feita do uso que lhe é dado pelos seus falantes. Estaremos a assistir à socialização de uma expressão incorrecta, que passaria a ser correcta por ser comummente aceite? Nesse caso, estará a escapar me algo?
Uma das explicações para a utilização daquela expressão até por pessoas de reconhecida
formação cultural seria a de que se estaria assim a fazer uma distinção entre órgãos de
comunicação social. Referir se ia a "imprensa escrita" para diferenciar de outros modos de
comunicação, como a televisão ou a rádio. Se é esta a explicação, parece me muito frágil.
Alguém quer comentar?

Valdemar Cruz
Portugal

Resposta
Creio que as bases deste pleonasmo surgiram nos países anglo saxónicos, onde o jornalismo da
rádio e da televisão se desenvolveu mais depressa. O dicionário Oxford define imprensa (ou) Imprensa) como "os jornais, magazines, secções noticiosas da rádio e televisão e os
jornalistas que trabalham para eles": portanto, imprensa radiofónica, imprensa televisiva e imprensa... escrita.
Temos, aqui, uma extensão de sentido capaz de legitimar o pleonasmo justamente apontado por Valdemar Cruz, jornalista com formação universitária na área da linguística. No princípio do século, contudo, quando o significado de imprensa era mais restrito do que hoje, também havia uma extensão de sentido não apenas em relação à época da composição manual com caracteres de madeira (a prensa... o prelo...) mas igualmente em relação, por exemplo, ao ano de 1852 quando, no Dicionário Fonseca, imprensa era só tipografia. Depois, o termo que
inicialmente designava a técnica de imprimir passou a abranger os indivíduos que, mercê desta
tecnologia, podiam fazer notícias destinadas a muitos milhares de leitores.
Não obstante tal fundamentação, estão disponíveis outras expressões: jornalismo impresso,
jornalismo radiofónico, jornalismo televisivo. Há quem diga radiojornalismo e (menos) telejornalismo.
Imprensa escrita é pleonasmo agravado. Redundante pelo motivo que Valdemar Cruz aponta (a imprensa é sempre escrita) e porque, empregando se imprensa em sentido lato (o do dicionário Oxford), devemo nos lembrar de que apenas se não escreve o jornalismo da rádio e televisão da transmissão directa de acontecimentos inesperados. E até o estilo destas transmissões não deixa de ser uma mistura de oralidade e dos clichés da escrita que permitem a elaboração rápida das notícias.
Admitamo lo, contudo: imprensa (em sentido lato) e imprensa escrita apesar de aquele
termo primar hoje pela ambiguidade e este pela redundância soam ambos melhor. São mais
coloquiais. Contra a gramática de ouvido e a lei do menor esforço, em qualquer língua, a
gramática de laboratório pouco pode fazer.

J.C.B.


Do Ciberdúvidas:

Tema
Deve fazer se ou deve se fazer ?

Pergunta:
Qual a forma correcta de utilizar o "se"? Existe uma regra geral ou depende do contexto em causa?

"Vou me lavar" ou "vou lavar me" ?
"Deve se fazer" ou "deve fazer se" ?

Pedro Alves

Resposta:
Ambas as formulações são correctas, embora alguns professores prefiram o pronome reflexo junto do verbo principal: "Vou lavar me", "deve fazer se". A maioria dos especialistas
defende, porém, que não pode haver aqui uma regra fixa, variando sempre a colocação do pronome conforme a eufonia e o ritmo da própria frase. Afinal de contas, segundo o estilo de quem escreve. Como pode ser verificado pela variada utilização de uma e outra fórmulas em consagrados escritores da língua portuguesa.

Vejamos, entretanto, um outro exemplo sugerido pela consulente Cristina Cruz: "Vou deitar me" ou "vou me deitar"?; "quero queixar me" ou "quero me queixar"?
A isto responde assim o dr. José Neves Henriques:
" O verbo reflexo é apenas deitar, e nunca vou. Mas ambas as frases estão correctas. Erra quem ensina que só é correcto "vou deitar me", porque o pronome reflexo (ou reflexivo) me pertence a deitar e não a vou. De facto pertence, mas a forma verbal vou atrai a si o pronome. E se precedermos a frase dum advérbio, como por exemplo não, o pronome me ainda recua mais:"

1.Não me vou deitar
Soa um pouco melhor do que:
2.Não vou deitar me.
Há casos em que a diferença entre as duas frases é ainda maior.
Ora comparemos:
3.Isto deve fazer se assim.
4.Isto deve se fazer assim.
5.Isto não deve fazer se assim.
6.Isto não se deve fazer assim.

É preferível a frase 4) à frase 3) por duas razões:

a) Está mais ritmada.
b)Evita a proximidade das fricativas s ss z desagradável de ouvir.
O mesmo se dá com as frases 5) e 6). Se é correcta a posição do se na frase 4), não se dá o mesmo na frase 7). Ninguém a diz."

J.M.C.


Do Ciberdúvidas :

Tema
"Multimédia" ou multimeios?

Pergunta
Esta questão já foi aqui abordada pelo João Carreira Bom, mas continuo com (ciber)dúvidas.
Não entendo por que razão, em português, devemos escrever "media" (média) referindo nos aos meios de comunicação, mas "multimédia" ao falarmos das tecnologias audiovisuais. Porque não escrever também "média" quando o "multi" não se aplica?
Parece me que seria mais lógico e menos confuso, e não vejo desacordo com a argumentação do João Carreira Bom, segundo a qual devemos guiar nos pelas palavras latinas originais, que são "medium" (singular) e "media" (plural) pois não é correcto escrever se "médium" para referir as pessoas que comunicam com espíritos?

Luís Torres Fontes
editor
Porto

Resposta
O que diz na sua correspondência de 23 de Fevereiro a que só agora, lamentavelmente, posso responder é pertinente. Por exemplo, se a memória me não falha, profissionais de informação como o ex provedor do leitor do "Diário de Notícias", Mário Mesquita, costumam empregar a forma aportuguesada de "media", média, para se referir ao conjunto dos órgãos de informação. Quando se dicionariza multimédia, se queremos ser coerentes (mesmo, possivelmente, com uma asneira), não há motivo evidente para não dicionarizar também média.
Estas formas, apesar de tudo, são preferíveis em Portugal aos americanismos abrasileirados "mídia" e "multimídia".
Repito: apesar de tudo.
É que se nos deparam aqui pequena perversidade e alguma falta de clareza que me levam acontinuar a empregar as formas latinas (entre aspas, como em qualquer palavra estrangeira), assim como o aportuguesamento que me parece melhor: "medium" meio; "media" meios;"multimedia" multimeios.
Repare se no precedente constituído pelo aportuguesamento de "medium" médium (espírita); "curriculum" currículo; e "forum" fórum ou foro (assembleia, etc.). Veja se a diferença: o que se aportuguesou foi um singular. E não, como acontece em "media", um plural. Ninguém diz à latina os "fora" (plural de "forum"), mas os foros ou os fóruns. Manter como singular do aportuguesado média o aportuguesado médium é transportar para a nossa língua uma relação entre singular e plural que é da língua mãe, o latim, e não da língua que falamos. Daí, pois, que se possa legitimar a relação médium/médiuns e, porque não?, multimédiuns. Os "multimedia" não passam de multimédiuns.
Médium e multimédiuns têm, contudo, o senão de se poderem confundir com o outro sentido de médium: espírita, coisa que os profissionais de cada meio de informação, em princípio, não querem. Mas há, felizmente, um aportuguesamento com muitos anos, que já mencionei: "medium" meio; "media" meios; "multimedia" multimeios.
Afigura se me muito mais lógico do que o já dicionarizado "multimédia".

J.C.B.
11/3/98


DoCiberdúvidas:

Tema
Num/em um, dum/de um

Pergunta/Resposta
Há certamente uma regra para a união das preposições com os artigos indefinidos. Qual é? Ou quais são? Tenho uma grande curiosidade a esse respeito e creio que se trate de uma regra muito pouco respeitada...
Muitíssimo obrigada.

Beatriz Borges
Itália

Não me consta que haja regra para empregarmos num e em um. Depende do gosto da pessoa. Mas há regra para empregarmos dum e de um. Devemos empregar de um, e também de o (e não do), quando a preposição de não se ligar ao artigo que se lhe segue, mas a palavra/s que vem/vêm mais à frente:

(1) O facto de uma pessoa trabalhar...
(2) O facto de um aluno ser mal comportado...
A preposição de não se encontra ligada ao artigo, mas às palavras sublinhadas à direita.
O mesmo se dá com de + pronome/determinante:
(3) Apesar de este director estar livre...
(4) A resolução de ele ir ao Porto...
(5) Já é tempo de aquelas pessoas terem juízo.
(6) Depois de isso estar estabelecido...

Etc., etc.

J.N.H.


Do Ciberdúvidas:

Como se fuzila um pacífico haver

Para além do cortejo dos seus 37 dias de bombardeamentos insanos, destruição cega e das mortes a eito de civis apanhados no fogo cruzado de beligerantes sem rosto, a guerra da Jugoslávia deixou também as suas marcas linguísticas. Foi a "limpeza étnica", mais os "danos colaterais", a refrega entre os pró NATO e os pró OTAN e, até, o famigerado "caos 'humanitário'" caído algures em combate. Pois agora nem o verbo haver escapou de uma autêntica emboscada, quando a paz parecia enfim alcançada, ele que já vinha ferido de morte de tantas anteriores campanhas belicistas.

O enviado da RTP à capital do Kosovo foi o inesperado atirador sobre um alvo tão pacífico (é o que se supunha, pelo menos...) para qualquer lusofalante medianamente escolarizado. E (outra suposição errada...) profissionalmente obrigado a distinguir a mais básica das regras da sua especialidade.
Infelizmente, pobre haver, não foi daqueles acidentes fortuitos e isolados que acontecem em situações similares.
Foram três tiros, verdadeiros obuses, e logo em directo à hora mais nobre das 20 horas. Um fuzilamento a frio e sem o (aparente) sobressalto até do apresentador do Telejornal [terça feira, 15/06].
Que "&laqno;haviam» ainda sérvios em Pristina"; que "o comandante britânico comunicou que 'haveriam' duas fases na retirada do Exército de Milosevic"; que algures "'haviam' mais valas comuns"...

José Mário Costa

P.S. "Os senhores 'hadem' vir à razão", arengou para a bancada da oposição o ministro português Jorge Coelho, na discussão parlamentar sobre a recusa do PSD e do PP em fazerem passar a autorização legislativa para um sindicato da PSP [quinta feira, 17.06]. Definitivamente: o verbo haver é uma armadilha a que nem escapa o ministro que zela pela segurança pública em Portugal.


Do Ciberdúvidas:

"Pay TV"?

É difícil entender em jornalistas da televisão portuguesa, que se dirigem a centenas de milhares de indivíduos, o emprego de expressões como "pay TV" e "pay per view", sem que, pelo menos, expliquem o seu significado. Creio que a primeira expressão representa o pagamento para ver um ou mais canais e a segunda o pagamento para ve um ou mais programas ou jogos.
Há dias, foi no principal serviço de notícias da TVI. Mas o fenómeno verifica se em todos os canais e, mesmo, na imprensa.
Os jornalistas que assim procedem não se estão a dirigir ao público indiferenciado que os ouve ou lê (e lhes garante a subsistência). A quem eles se "dirigem", nestes casos, é às fontes da informação: os indivíduos que lhes deram os elementos para a notícia (e empregam, no dia a dia, expressões estrangeiras que não podem ou não querem traduzir).
Admito o: não dá jeito, por exemplo, traduzir "software" por programa. Mas "pay per view"? "Pay TV"?
Quando se fala português, só por pedantismo se empregam expressões semelhantes.

Afonso Peres


E aqui vai a última fatia das "gralhas" coleccionadas pelo Guilherme Nogueira. Pela minha parte, obigado e... manda mais!

Sexto pacote:

Dizem: cadavéres em vez de cadáveres.
Dizem: acórdos em vez de acôrdos.
Dizem: própio em ves de próprio.
Dizem: pérda em vez de pêrda.
Dizem: preposta em vez de proposta.
Dizem: carapinteiro em vez de carpinteiro.
Dizem: padeiraria em vez de padaria.
Dizem: pêlo, pêla em vez de pelo,pela (p'lo, p'la).
Dizem: termostáto em vez de termóstato.
Dizem: os CTTês, os PALOPes, as PMÈs, etc, em vez de os CTT, os PALOP, as PME, etc.


Quinto pacote das gralhas da colecção do Guilherme Nogueira

Dizem: cêsto (6º) em vez de seisto.
Dizem: Gibráltar, hángar em vez de Gibraltár, hangár.
Dizem: ÓNU em vez de ONÚ.
Dizem: Garré, Madri, Davi em vez de Garrette, Madride, Davide.
Dizem: interviu em vez de interveio.
Dizem: pugrama, prugrama em vez de programa.
Dizem: entretimento em vez de entretenimento.
Dizem: constituítivo, diminuítivo distribuítivo em vez de constitutivo, deminutivo, destributivo.
Dizem: hádem, hádes em vez de hão de, hás de.


Quarto pacote das gralhas da colecção do Guilherme Nogueira.

Dizem: regenêrador em vez de regenerador.
Dizem: horreroso, paveroso em vez de horroroso, pavoroso.
Dizem: traçar arma em vez de terçar armas.
Dizem: bataria em vez de bateria.
Dizem: Sarafim em vez de Serafim.
Dizem:
sacrafício em vez de sacrifício.
Dizem: terramoto em vez de terramoto.
Dizem: sarrar em vez de serrar.
Dizem: venérados em vez de venerador.
Dizem: metriológico em ves de meteorológico.
Dizem: cenóra, cóve, lóça, lóro, etc. em vez de cenoura, couve, louça, louro, etc.


Como já vos disse o meu coleccionador de gralhas é o Guilherme Nogueira. Hoje, em vez de vos apresentar a quarta série da sua colecção de gralhas, transcrevo um "e mail" que ele me enviou. As da colecção seguem par a semana:

Na RTP 1 (Jornal das 20h00)
A propósito dos refugiados do Kosovo, dizia a jornalista... "estes kosovares irão em breve ser recebidos nos países acolhedores..."
Comentário maldoso: tão acolhedores, tão acolhedores que, nomeadamente o acolhimento em Portugal está previsto em campos de férias!

Na SIC (Jornal das 13h00)
O repórter, muito excitado, por sinal, relatava a manifestação dos habitantes de Barrancos junto à Assembleia da República, à cause dos touros de morte.
E vai daí, não foi de modas, passo a citar: "...e prometem aqui ficar todo o dia até que os deputados respondam às justas reivindicações dos barraqueiros. Enfim, tratar se ía concerteza de um lapsus linguae devido às características do directo. Mas não. Eis senão quando, o mesmo artista, entrevistando um dos presentes, volta a repetir a piada. Sim, porque só por piada, não acham!?


Um amigo teve a amabilidade de me enviar (e prometer mais) algumas gralhas que ele tem coleccionado, retiradas da rádio e da televisão.

Terceiro "pacote" de gralhas:

Dizem: fáçamos, dígamos, póssamos, tênhamos, etc em vez de façâmos, digâmos, etc.
Dizem: aprégoar em vez de apregoar.
Dizem: centéssimo, vigéssimo em vez de centézimo, vigézimo.
Dizem: cómogo em vez de cumigo.
Dizem córagem em vez de curagem.
Dizem: curía romana em vez de cúria romana.
Dizem: óito em vez de ôito.
Dizem: escórtejar em vez de esquartejar.
Dizem inducação em vez de educação.
Dizem: August'Henriques em vez de Augusta Henriques.
Dizem: córenta, córesma em vez de quarenta, quaresma.
Dizem: curenta, curesma em vez de quaren, quaresma.
Dizem: libras estrelinas em vez de libras esterlinas.
Dizem: hilariedade em vez de hilaridade.
Dizem: sái, váio, táia em vez de sei, veio, teia.
Dizem: papáis, anáis, cordáis em vez de papéis, anéis, cordéis.
Dizem: pregunta, préguntar em vez de pergunta, perguntar.

Segundo "pacote" de gralhas:

Dizem: iquenómico em vez de económico.
Dizem: rúbrica em vez de rubrica.
Dizem: púdica em vez de pudica.
Dizem: tamem em vez de também.
Dizem: tamos em vez de estamos.
Dizem: cambra em vez de câmara.
Dizem: dissestes, estivestes, fizestes em vez de disseste, estiveste, fizeste.
Dizem: óvintes em vez de ouvintes.
Dizem: óbrigado em vez de (ou)obrigado.
Dizem: meter (no sentido de colocar) em vez de pôr.
Dizem: sancristão em vez de sacristão.
Dizem: tesaura, tesoira em vez de tesoura.
Dizem: perjuizo em vez de prejuízo.

Mas há mais, prometeu o Guilherme!

Primeiro "pacote":

Dizem: deti, conti, entreti, obti, reti, susti em vez de detive, contive, entretive, obtive, retive e sustive.
Dizem: intercólite em vez de enterocolite. (intestinos)
Dizem : ouvisto em vez de ouvido.
Dizem: pulmonia em vez de pneumonia.
Dizem: praiamar em vez de preiamar.
Dizem: prestigiditador em vez de prestidigitador.
Dizem: ventrículo em vez de ventriloquo.
Dizem: são cristão em vez de sacristão.
Dizem: terçolho em vez de terçol (pl. terçóis)
Dizem: constou se me em vez de constou, consta.
Dizem: fui eu quem fiz em vez de fui eu que fiz.
Dizem igualar com em vez de igualar a.
Dizem: por causa que em vez de por causa de.
Dizem: talvez que se possa fazer isso em vez de talvez se possa fazer isso.
Dizem: prefundo, aprefundar em vez de profundo, aprofundar.
Dizem: príodo em vez de período.
Dizem: carácteres em vez de caractéres.

(à suivre...)


Do Ciberdúvidas:

Caos "humanitário"?!

Caos "humanitário", desastre 'humanitário' vai se lendo e ouvindo aqui e ali, em Portugal, a propósito destes tempos bélicos nos Balcãs e, em particular, no Kosovo. Se é desastre, ou caos, ou o que quer que se assemelhe a tragédia, como pode ser...humanitário?!

Se é "humanitário" o que estão a passar os refugiados albaneses (e, afinal, toda essa martirizada ex Jugoslávia), como se há de qualificar, entretanto, o auxílio da Cruz Vermelha e demais organizações similares?

Enfim, um verdadeiro míssil Tomahawk sobre um alvo reconhecidamente tão pacífico, como é a distinção, na nossa língua, entre os adjectivos humanitário e humano. Ou seja, entre o que "visa ou interessa o bem estar da humanidade" e o que é "próprio do homem ou relativo a ele". Vem em qualquer dicionário de português.

José Mário Costa


Do Ciberdúvidas:

O capitulacionismo à NATO

Se NATO (North Atlantic Treaty Organization) é a sigla em inglês do que sempre foi em português OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte), porque se há de repetir o que dizem (e escrevem) os anglófonos, recusando, inclusive, a forma tradicional lusófona?! E se se prefere NATO em vez de OTAN, porque não, já agora, UN (United Nations) em vez de ONU (Organização das Nações Unidas), USA (United States of America) em vez de EUA (Estados Unidos da América), ou, até, UK (United Kingdom ) no lugar de RU (Reino Unido)?!

Aqui ao lado, os nossos vizinhos espanhóis dão um bom exemplo da preservação da sua identidade linguística, que começa nestes pequenos pormenores. Nestes dias do bombardeamento da cuja dita à Jugoslávia, oiça se, e leia se, como os espanhóis não admitem senão a sigla correspondente ao nome em castelhano. OTAN (Organización del Atlántico Norte), sempre OTAN e nunca à inglesa, ou à americana.

Agora, então, que têm um representante seu à frente da OTAN, só por manifesto capitulacionismo. Ou pura ignorância. Mas de nenhum desses pecadilhos sofrem eles...

José Mário Costa


Do Ciberdúvidas:

Tema
Nunca e jamais

Pergunta
Desconheço que diferenças existem no uso de "nunca" e "jamais". Poderiam explicar mas? E o que significa "sarabá", ou coisa semelhante, no português do Brasil?

Maria José
estudante
Espanha

Resposta
Não é muito fácil discorrer se acerca de nunca e jamais e dizer tudo. Eis, pois,
alguma coisa:
1. Nunca e jamais empregam se como sinónimos:
(a) Nunca eu diria uma coisa dessas!
(b) Jamais eu diria uma coisa dessas!
2. A junção de nunca jamais usa se em sentido reforçativo:
(c) Nunca jamais isso acontecerá!
Jamais emprega se às vezes com o sentido de alguma vez, o que não se dá com nunca.
F. de Castilho escreveu assim em &laqno;A Primavera», I, 14:
(d) "Se jamais o homem foi homem ditoso, lá nos campos o foi".

Nota. Quanto a "sarabá", não encontrei em nenhum dos dicionários brasileiros consultados.

José Neves Henriques


Do Ciberdúvidas:

Tema
Topónimos estrangeiros
Pergunta

Ao traduzir textos do inglês, encontro me frequentemente perante o problema de optar entre a versão original (mais conhecida e mais corrente) e a forma portuguesa correspondente (menos conhecida e menos corrente). Por exemplo: Leipzig/Lípsia, Aachen/Aix la Chapelle/Aquisgrano, Glasgow/Glásgua, etc. Na minha prática, tendo para a versão portuguesa. Até que ponto estou certo?

M.G.T
Portugal

Resposta
Está certo, sem dúvida. Como diz o Prof. Peixoto da Fonseca em resposta anterior, "sempre que possível devem usar se aportuguesamentos". Mas, cuidado, o "sempre que possível" significa que se devem evitar chauvinismos que nos levem a dizer, por exemplo, "Bons Ares" em lugar de Buenos Aires.

C.M.


Do Ciberdúvidas:

Tema
Macicez/talho de foice

Pergunta
Li há dias, num jornal de Lisboa, alguém a escrever "massividade". Como ele também escrevia "'talhe' de foice", em vez de "talho de foice", fiquei duplamente desconfiado. Querem fazer o favor de me esclarecer.
Obrigado.
António Sousa
Lisboa

Resposta
Tem razão. "Massividade" (de "mmassiv(o)" + idade) não existe. Talvez esse "alguém" quisesse escrever macicez qualidade do que é maciço. A expressão é, como referiu, vir atalho de foice, que significa "vir a propósito".

C.M.


Da rubrica "Pelourinho" do Ciberdúvidas

"Interviu","intervido" & "intrevisto"


O verbo intervir deve ser a armadilha mais vezes tropeçada por quantos, letrados e menos letrados, se apanham a falar em público. Então, quando se trata de conjugar o pretérito perfeito na 1ª pessoa [intervim] ou de empregar o seu particípio passado [intervindo], é, no mínimo, penoso ouvir tanta derrapagem... gramatical.

Foi o que se (ou)viu, uma noite destas, na SIC, no megadebate televisivo "Levante se a Justiça!", pejado de ilustres advogados e magistrados portugueses, lado a lado com o ministro da Justiça, o procurador geral da República e o presidente do Supremo Tribunal.

Um deles, não tão ilustre assim para com a sua própria língua, às tantas, lá interveio com um "intervi" da praxe.
Aqui para nós: que força leva já esta "praxe" para pôr até um meritíssimo juiz desembargador a estatelar se tão estrepitosamente ao lado dos que, na mesma linha, caem por regra na esparrela correlativa do "interviu", "intervido" & "intervisto" ?!!

J.M.C.


Do Ciberdúvidas:

Tema
Traquejo

Pergunta
Palavra da linguagem futebolística. Haverá mesmo compartimentos estanques entre linguagem coloquial e gíria do futebol?

A.G.T.M.
Portugal

Resposta
Não diria "estanque" mas, quase sempre, linguagem estereotipada. Estereotipada de frases feitas e imagens repetitivas, quantas vezes destituídas de sentido.

Algumas ficaram na história do destempero absoluto do chamado "futebolês" mais "cerrado":
"denunciar fome de bola", "faltou objectividade atacante","muita ofensividade", "retenção da posse da bola", etc., etc. Ou a moda mais recente da "prestação", da "postura" ou do "posicionamento" em campo; do "desde" o estádio (ou a cidade) X ao "direccionar" (em vez do comezinho dirigir)...

Mas o contrário também é verdade: que bem fala(va)m o português, e com que inventiva, alguns relatores desportivos, como Artur Agostinho, Amadeu José de Freitas, Carlos Cruz, Fernando Correia ou Ribeiro Cristóvão, tributários de muitas das imagens mais célebres ainda hoje no meio, em Portugal: "bola à flor da relva", "no enfiamento da jogada", "retenção de bola", "tapete verde2...

Quanto ao vocábulo traquejo, por acaso, é correcta a sua utilização; no sentido de "experiência" ou "muita prática", com origem no Brasil: "É um defesa com muito traquejo".

J.M.C.

Do Ciberdúvidas:

Tema
Capitã, outra vez

Pergunta
Embora concorde inteiramente com os pressupostos da resposta de J.N.H., tenho
algumas dúvidas quanto a alguns exemplos apresentados. Os termos gigante, estudante,
comerciante, chefe, oficial, parente, presidente, etc. não deveriam permanecer
invariáveis? É provável que a passagem de "infante" para "infanta" tenha resultado da
influência espanhola. Sem pôr em causa "infanta", pois parece consagrado, haverá necessidade de seguir a mesma lógica noutros casos que me parecem não o exigir?

Miguel R. Magalhães
Bélgica

Resposta
É claro que não há necessidade de, nas palavras terminadas no masculino em nte. seguir a mesma lógica de infante, infanta, mas já se encontram os femininos giganta e presidenta; e outros, como governanta, almiranta. E entre o povo ouve se estudanta, comercianta, parenta, chefa. E bem sabemos que linguagem do povo é, não raro, mais correcta do que a das pessoas cultas. O povo, ao contrário das pessoas cultas, segue aqui a tendência da língua.

Na época actual, esta tendência é muito benéfica: como temos as mulheres com as mesmas profissões dos homens, convém um substantivo feminino para as denominar. A tendência da nossa língua para tal é uma riqueza que não devemos pôr de lado. Os franceses vêem se sem solução para conseguirem o mesmo na língua deles, com a mesma facilidade.

Não empobreçamos a Língua Portuguesa, diminuindo lhe a maleabilidade de facilmente formar palavras femininas. Se vierem a fixar se os vocábulos em questão, a nossa língua torna se mais rica. Reparemos até no seguinte: o &laqno;Índice das Profissões no Masculino e Feminino» do Instituto do Emprego e Formação Profissional, de 1988, menciona femininos como estes: ajudanta, alfaiata, bombeira, barbeira, feiranta, governanta.

A mesma necessidade há de formar palavras masculinas a partir das femininas, no caso de os homens se ocuparem em profissões que antigamente eram desempenhadas apenas por mulheres. Quanto a infanta, nunca vi em nenhuma obra que houvesse influência do espanhol.
Mas, mesmo que tenha havido, está inteiramente formada dentro das regras da nossa gramática.

A formação de novos femininos não é uma questão de exigência, mas de necessidade e de conveniência em seguirmos as tendências da nossa língua.


Um dia destes, num dos estúdios onde fazia uma gravação, discutia se a forma correcta de pronunciar a palavra "Babel". Nem de propósito, um consulente do Ciberdúvidas pos lhes a questão:

Tema
Babel

Pergunta:
A SIC dá me cabo da cabeça anunciando a Torre de "Bábél". É legítimo pronunciar a
palavra dessa forma ?

Mário Silva Alverca

Resposta:
Em Portugal, a pronúncia dominante do "a" que não está na sílaba tónica ( casos de
babel, papel e do primeiro e terceiro "a" de palavra ) é fechada.
A pronúncia brasileira ( origem da telenovela ) tem o "a" aberto.
Só mais uma observação: no Brasil não se pronuncia a letra "ele" final. Esta é
substituída por "u". Assim, se adoptarmos a sua forma de transcrição, os brasileiros vão
dizer "bábéu".

Amílcar Caffé


Do Ciberdúvidas:

Tema
Foi se embora/casou se
Pergunta
Antigamente, dizia se (escrevia se) "foi se embora", "casou se", "alastrou".
Hoje, diz se (escreve se) "foi embora", "casou", "alastrou se".
Este leigo agradece se puder ser esclarecido quanto à forma mais correcta.

R. Prado Portugal

Resposta
Tem razão: vai grande trapalhada no "reino" das conjugações pronominais. Parece me
que a tendência é para eliminar os pronomes, obedecendo à lei do menor esforço. Daí
"casar" em vez de casar se, "ir embora" em vez de ir se embora. Quanto a
"alastrou se", não sei que lhe diga... Talvez se diga assim por analogia e proximidade de
sentido com espalhou se. Talvez.


Do Ciberdúvidas:
Perguntem ao Senhor Euro

Segunda, 4

Os jornalistas da televisão e da rádio insistem em abrir o o quando pronunciam a palavra euro. Esta pronúncia também parece ser a preferida pelos políticos, economistas e outros licenciados que intervêm nos audiovisuais. Porquê? Talvez porque o o de euro , enquanto elemento de composição de palavras, se costuma abrir levemente. Por exemplo: /eu rò cra ta/.

O nome da nova moeda não é, contudo, um elemento de composição, um prefixo... É uma palavra. E, no português da Europa, nas palavras terminadas em o, este o só não é fechado quando tem acento agudo. Por exemplo: /li vru/ (livro), /dê du/ (dedo), /mi lhu/ (milho), /êi tu/ (eito). Portanto: /êu ru/ (euro).

Idêntica pronúncia, aliás, creio predominar no português do Brasil.

Em Portugal, entre os indivíduos menos instruídos, afigura se me existir tendência para pronunciar euro com o o fechado. Numa amostra minúscula de dezanove cidadãos portugueses sem frequência universitária, no distrito de Lisboa, apenas um empregado de café respondeu à minha pergunta ("Qual é a nova moeda da Europa?") pronunciando euro com o aberto.

Mais importante do que inquéritos sem rigor científico, todavia, é a forma como o engenheiro Euro Vaz da Silva pronuncia o seu nome de baptismo. Trata se de cidadão brasileiro, residente em Aveiro. Segundo a jornalista do "Público" Maria João Guimarães, que entrevistou o Senhor Euro, ele nunca hesitou: euro, para ele, é com o fechado.

E não esqueçamos o substantivo euro (vento sueste) /êu ru/ , que chegou ao português antigo pelo latim"euru ".

O /eu rò/ não tem pés para andar. Nem pela via popular nem pela erudita. A menos que queiramos pronunciar a palavra à grega, à francesa ou à inglesa.

J.C.B.


Os "partners" de Vera Jardim

Sexta, 27

O ministro da Justiça, Vera Jardim, nas falas que a televisão lhe recolhe, não costuma empregar mal a Língua Portuguesa. Mas, há dias, saiu se com uns "partners" injustificáveis. Só um presunçoso, que o ministro não é, pode empregar uma palavra estrangeira, quando tem uma palavra portuguesa parceiro com significado equivalente ao do termo inglês.

Conheço gestores que dizem parceiros e se fazem entender muito melhor. O uso de estrangeirismos desnecessários empobrece a nossa língua. Não é este o dever dos membros do Governo.

T. A.

Quanto aos publicitários...digo eu! Então quando se trata de "adaptações" de filmes estrangeiros!... E se o original é em castelhano, meu Deus!!!


Do inesgotável Ciberdúvidas

"Corte" de ténis

em língua de trapos

Ouvi mais uma vez pronunciar a expressão "corte de ténis", referindo se a pessoa a um vulgar campo de ténis. Como naturalmente não se trata de uma incisão ou golpe de ténis, tão pouco de uma fenda no dito campo, será que quem assim fala, pensa num curral de ténis?

Por favor, façam a corte aos adeptos daquele desporto e digam nos, sem desmesuradas honras régias, como se chama o tal recinto onde o ténis se pratica.

Luís Ventura
Lisboa

Cibernota Prezado consulente, eles não sabem, nem querem saber. Pronunciam (ainda por cima, mal) o vocábulo inglês &laqno;court» e desatam a sua ignorância e incompetência boca fora. São os tais "especialistas" comentadores disto e daquilo no caso do ténis, mas também os há da política ao chamado futebolês e ao economês mais cerrado, por exemplo... Uma corte nutrida, por sinal. O problema, se calhar, nem é tanto deles. Afinal, quem é que os põe na TV a falar em língua de trapos?


Texto "picado" doCiberdúvidas da rubrica "Pelourinho"

O barbarismo, até de tanto se ouvir por quantos têm obrigação de o evitar, já se tornou numa inevitabilidade. Mas nem por isso diminui o disparate, nem se absolve a ignorância. Se, no singular, o neologismo líder se pronuncia em Portugal /líder/ por que razão o plural não há de ser /lídères/ (com acentuação esdrúxula, tal como /repórter/,
/repórtères/)?!
Com os telejornais portugueses de novo cheios com a recorrente crise à volta do Iraque, lá se voltou a ouvir a recorrência fatal: "/lídres/" para aqui, "/lídres/" para acolá...

P.S.: No Brasil esta questão não se coloca porque a pronúncia correcta é /líderes/, com os dois ee equivalentes.

José Mário Costa


As diferênças entre o falar de Portugal e do Brasil sempre me interessaram muito. Na esperânça que a si também, aqui vai mais uma transcrição do Ciberdúvidas:

Tema
Falar mais devagar
Pergunta
Porque o brasileiro fala mais devagar que o português? E por que fala sintaticamente tão
mal?
Daniele
estudante
Limeira, São Paulo
Resposta

Sem ser um especialista na área da fonética, vou arriscar me a dar uma opinião. No
português falado em Portugal ocorreu um fenómeno de fechamento das vogais, em que
enuncia se parcialmente ou "come se" algumas delas. É o caso do e na palavra "pedrada",
mais curto no português de Portugal, ou do i no nome próprio "Fátima", que quase não são
pronunciados. Pelo que sei, a menor articulação favorece o falar mais rápido.
Nessa questão específica, o falar do brasileiro está mais próximo do que era utilizado no
século XVI. Os especialistas em literatura podem comprovar que a leitura de Camões só
mantém o ritmo original no português do Brasil. Isso porque, como os portugueses "comem"
sílabas, os versos perdem a sua métrica na pronúncia portuguesa actual. O contrário ocorre
com Fernando Pessoa
Quanto à segunda questão a do falar da rua com erros de sintaxe , não se pode tomar o
falar brasileiro como um todo. Existem variantes regionais: no Maranhão, por exemplo,
considera se que é falada a forma mais correcta do português no Brasil. Para um brasileiro
que chega a Portugal, causa alguma surpresa a correcção utilizada na colocação dos pronomes.
No entanto, o estranhamento surge quando se ouve expressões como "muita bom" ou "a gente
somos".
Em São Paulo, o motivo dos erros é a origem da população. A forte influência italiana, que
vem desde o século passado, deixou suas marcas na língua. No italiano, o plural das palavras
não é feito colocando um " s" ou um " es" no final. Geralmente, a vogal " i" no final da
palavra é a marca desse género. Como exemplo, temos as palavras "brocoli" (brocolos) e"vongoli" (mexilhões). A influência italiana fez com que resultasse numa mistura
incorreta/incorrecta para os dois lados: em São Paulo, fala se, por exemplo, "dois pastel".
Ocorre na língua um fenómeno que é a reprodução das formas utilizadas nos centros em
direcção à periferia. Como São Paulo tornou se o pólo de riqueza do país, a pressão social
criou a necessidade de falar como os paulistanos. Daí que, na área sob a influência da metrópole, se repita esse tipo de erros.

Amílcar Caffé


Soube que, um dia destes, o meu colega Cândido Mota se tinha travado de razões (sem consequências, felizmente) com um cliente, durante uma gravação. Queria o Cândido dizer "ìbero americano" (ì) ou "ibero americano" (é) , já não sei e o cliente o contrário. Sem procurar saber quem tinha razão, aqui vai o que disse o sobre o assunto:

Tema
Ibero(/Ibéro/) americano
Pergunta/Resposta

Escreve se e lê se "íbero americano", com acentuação no "i" ou "ibero americano"
com acentuação no "é"?

Luís Gaspar
Portugal

Escreve se ibero americano (sem acento) e pronuncia se /ibéro/ americano, tal
como Ibéria, /Ibéria/.
Cf. Respostas Anteriores e Pelourinho.

J. M. C.

10/11/98


O Ciberdúvidas continua a ser um lugar onde se pode "pescar" excelente material para esta rubrica. Então aqui vai a discussão, agora sobre os anos "sessenta".

Tema
Anos sessenta, outra vez
Pergunta
Permito me discordar do nobre Professor José Neves Henriques quanto à resposta
suscitada pela expressão acima. A meu ver, "anos sessentas" tem significado diferente de
"sessenta anos". No primeiro caso, há substantivo funcionando como aposto, por isso,
no plural; no segundo caso, trata se, é claro, de numeral.
Os numerais, quando substantivados, como se sabe, formam plural.
Ex.: Escreveu muitos quatros no pedaço de papel.
Quantos noves há em noventa e nove? Há dois noves.
Assim também, 1960 foi um ano sessenta; 1961 foi outro ano sessenta. Aí já temos
dois anos sessentas. Na verdade, de 1960 a 1969, há dez anos sessentas. Portanto, na
minha opinião, a expressão "anos sessentas" (e não "anos sessenta", que o aposto deve
concordar com o fundamental) é legítima.

Fernando Bueno
Brasil

Resposta
Agradeço lhe o ter discordado de mim, porque toda a discordância me leva a pensar
e não raro a estudar. E é assim, estudando e pensando, que aprendo e progrido e me
vou tornando mais capaz de ajudar o próximo. Vamos então ao caso:
Não me parece que seja conveniente, e muito menos necessário, dizermos «os anos
sessentas», pelo seguinte:
a) Sessenta não precisa de plural, porque a noção de pluralidade já está no
substantivo anos, que abarca sessenta.
b) De facto, anos sessentas tem significado diferente de sessenta anos, mas
não o tem diferente de anos sessenta.
c) Ainda há bem poucos anos se dizia apenas anos sessenta, e toda a gente
compreendia. É esta a maneira corrente de, em Portugal, nos referirmos aos anos que
vão de 1960 a 1969 e todos nos entendemos.
d) Conclusão: para quê anos sessentas, se não é necessária esta pluralização de
sessenta?
e) Qualquer alteração de linguagem desnecessária pode causar confusão.
f) Só é digna de louvor uma alteração à linguagem corrente, quando ela consiste na
emenda dum erro.
g) O dizer se anos sessenta explica se do seguinte modo: é o encurtamento da
expressão anos [da década de] sessenta, tal como vapor (= barco) é encurtamento de
[navio de] vapor. E muitos outros há.
h) O prezado consulente apresentou os seguintes exemplos para mostrar a
substantivação dos numerais:
(a) Escrevo muitos quatros no pedaço de papel.
(b) Quantos noves há em noventa e nove? Há dois noves.
Salvo melhor opinião, tanto quatros como noves não são numerais, porque
não se referem a quantidades. São, sim, nomes de algarismos; isto é, são os nomes
daqueles dois desenhos que empregamos na escrita para significar quantidades.
Ora reparemos: tal como a palavra mesa não é uma mesa, mas apenas um
conjunto de quatro letras que significa mesa e pode indicar determinada mesa,
também quatro na frase (a) não é quantidade nem sequer se refere a determinada
quantidade. Refere se, sim, apenas àquela palavra quatro, composta de seis letras.
Na frase (b), é ainda mais evidente que nove não indica número, mas sim aquele
seguimento de quatro letras (nove), que noutras frases pode ser um numeral. Essa
evidência é nos patenteada pelo único numeral existente nesse exemplo: dois. A
palavra nove não é numeral, mas substantivo, como muito bem observou o prezado
Fernando Bueno.
i) Salvo melhor opinião, em anos sessenta, o vocábulo sessenta não é
substantivo, mas numeral, porque provém de anos [da década de] sessenta», em
que o vocábulo sessenta é um numeral que abrange o número de anos que vai de
60 a 69.
j) Certíssimo que os numerais, quando substantivos» têm plural. Sim, mas para
significar outra coisa. Deixam, pois, de significar número.
l) Não é verdade que o aposto deve concordar com o fundamental». Dois exemplos:
(a) Este livro, belíssima obra, foi escrito por Fulano. Aqui, não concorda em
género.
(b) Os Lusíadas, obra fundamental da literatura portuguesa, é um livro do mundo.
Aqui, o aposto não concorda com o fundamental, nem em género nem em número.
Gratíssimo por ter discordado de mim. Nunca eu tinha pensado neste assunto.

J.N.H.


O Ciberdúvidas tratou do "impeachment" desta forma. (obrigado, Ciberdúvidas!)

"Impeachment", mais uma vez

Um leitor do "ciberdúvidas" colocou, numa mensagem, a questão do uso da palavra inglesa
"impeachment" pelos brasileiros, em vez de "impedimento", "interdição", "impugnação", ou
qualquer outra equivalente.
Minha posição é simples: a palavra está consagradíssima pelo uso, e não adianta mais remar
contra a maré. Na Constituição brasileira, aparece o termo "impedimento" (o "site" fala em
"impugnação", mas este não é o termo que consta da nossa Constituição). Contudo, sem consultá la, a mídia logo começou a usar o termo em inglês, "impeachment", por ocasião do "impeachment" do ex presidente Collor. Pegou. Quem faz a língua é povo, os gramáticos apenas dão pitaco e formalizam. A mídia usou e abusou, o povo gostou, e saiu todo mundo por aí falando alegremente em "impeachment".
Na época, bem que os gramáticos e professores tentaram incentivar o abandonado "impedimento".
Mas as palavras são vivas, elas têm carga, têm força. Um professor de português daqui fez a
seguinte observação uma vez: "o mesmo 'impedimento' que substitui tão bem o "offside" do futebol parecia não ser suficiente para substituir o tal do "impeachment". "Não tinha força". Como explicar isso? Como explicar, por exemplo, que, apesar de sinônimas, as palavras beiço e lábio tem cargas completamente diferentes a primeira, pejorativa; a segunda, quase poética (pelo menos no Brasil)?
As palavras são vivas é a única explicação que me ocorre.
Assim, passou se a usar "impeachment," e o termo se consagrou. É um caso igual ao do recente "sem terra". Nossas gramáticas dizem que seu plural é "sem terras". Para nós, soa estranhíssimo.
Todo mundo, mesmo as mais conceituadas revistas e jornais, falam "os sem terra". É errado?
Teoricamente, sim, mas virou exceção. É o uso, não tem jeito: como eu já disse, quem faz a língua é o povo. Agora que todo mundo já se acostumou assim, só resta incluir, nas próximas gramáticas, o termo "sem terra" como exceção.
O mesmo vale para "impeachment". Esta palavra, ao menos para os brasileiros, tem uma força
muito maior do que "impedimento", "impugnação", etc. Por isso, todos falam e escrevem assim. O leitor que se manifestou quanto as assunto disse que o termo era horrível. Para ele, deve ser. Mas nossos ouvidos já se habituaram. O hábito, o costume, consagrou essa palavra. Qualquer outro termo nos parecerá horrível, é isto que tem de ser entendido.
Fica a (velha) lição: se os gramáticos inventarem e o povo recusar, não tem jeito. Os primeiros
terão que colocar em suas obras futuras: "termo consagrado pelo uso".
Diogo
Brasil


O dicionário Larousse traduz em francês "impeachment" por acusação em inglês (GB), e por
acusação dum político eleito perante o congresso, nos EUA. Os comentaristas políticos aqui têm sempre usado o termo destituição falando do caso Clinton por exemplo. Parecendo ser esse o objectivo do "impeachment" dum político eleito nos EUA. Parece me que por vezes nas traduções é melhor traduzir a ideia do que o termo exacto. As traduções palavra por palavra, feitas por computadores por exemplo, é a rebolar de rir como diz o Zé Teles. No caso Clinton eu traduziria por destituição para transmitir a ideia e não impugnação.

Victor Duarte
França


Cibernota No comentário de Diogo há várias questões que podem ser referidas. Em primeiro lugar, a utilização do termo em inglês impeachment» tornou se uma moda. E modas, há as que duram mais e as que duram menos. Sinceramente, espero que esta seja das que dure menos.
Formalmente, a utilização de um termo inglês não é errada. Deve ser devidamente indicada,
entre aspas ou em itálico. Caso contrário, deveria seguir as normas da língua portuguesa. Alguma coisa como impichemento», impichemente», ou algo parecido dói me o ouvido só de pensar.
Isso porque as regras do português não permitem a utilização das letras ch sem uma vogal,
assim como o aportuguesamento da palavra prevê a colocação de uma vogal, para a palavra não terminar em t.
Em segundo lugar, impedimento era uma palavra que não era aceita, mas é distinta do off side» inglês. O jogador encontra se em situação de impedimento de jogar a bola. Esta é a origem do termo usado em futebol.
Por fim, nenhuma gramática que conheço diz os sem terras». Ao que me consta, o correcto
ainda é os sem terra.
Quanto à resposta de Victor Duarte, a tradução de impeachment» por destituição é bastante
boa. No entanto, não significa que impugnação e impedimento não devam ser utilizadas.

Amílcar Caffé