Outras Gralhas 8  
 

Croquis e elite
Pergunta/Resposta

   "Croqui" como sendo um rascunho, uma primeira versão para análise, de algo, existe na língua portuguesa, ou é um estrangeirismo grosseiro?
Rui Almeida
Portugal

   O termo – de origem francesa – é croquis e não "croqui". Em francês pronuncia se /croquí/; daí a deturpação do original, assim registada nos dicionários brasileiros. Nos portugueses é o vocábulo francês que se atesta, confirmando a sua consagração há muito entre nós – croquis –, remetendo, todos eles, para o que já tínhamos na língua portuguesa exactamente com o mesmo significado: "esboço", "borrão", "debuxo", "rascunho", "traça", etc.
   Em matéria de estrangeirismos, sigo os ensinamentos dos grandes mestres como Rodrigues Lapa, que na sua celebrada Estilística da Língua Portuguesa (Seara Nova, Lisboa), escreve: «O estrangeirismo é um fenómeno natural, que revela a existência de uma certa mentalidade comum. Os povos que dependem económica e intelectualmente de outros não podem deixar de adoptar, com os produtos e ideias vindas de fora, certas formas de linguagem que lhe não são próprias. O ponto está em não permitir abusos e limitar essa importação linguística ao razoável e necessário. Contido nestes limites, o estrangeirismo tem vantagens: aumenta o poder expressivo das línguas, esbate a diferença dos idiomas, tornando os mais compreensivos, e facilita, por isso mesmo, a comunicação das ideias gerais. Uma coisa é necessária, quando o estrangeirismo assentou já raízes na língua nacional: vesti lo à portuguesa.».
   
   P.S. – Tal como croquis, passa se o mesmo com um outro galicismo, elite (do francês "élite"), palavra contestada pelo consulente António de Azevedo O'keeff. Havendo já na língua portuguesa sinónimos como "escol", "boa sociedade", "alta roda", "aristocracia", "fina flor", "gema", "nata", "o melhor", etc., a verdade é que elite entrou há muito na linguagem corrente de qualquer lusófono, encontrando se registada em todos o dicionários de Português. E, tal como esclarece Rodrigues Lapa, entrou no vocabulário comum, afeiçoando se ao nosso idioma: sem o acento agudo do original francês, passando a ser palavra paroxítona. Portanto, com acento tónico na penúltima sílaba.
   
   J.M.C.
31/01/2003

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Tema
Zero graus / zero grau

Pergunta/Resposta
   Ouve se e lê se com frequência que "a temperatura atingiu zero graus". Pergunto se não será mais correcto dizer "zero grau".
   Obrigado.

Carlos Pinheiro
Portugal

   Em português europeu é frequente o uso de expressões como: "zero graus", "zero valores», "zero horas". O Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea da Academia das Ciências atesta na entrada para "grau" o seguinte exemplo: "Com a chegada do Inverno os termómetros desceram abaixo dos zero graus de temperatura.".
   No entanto, de acordo com o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa , o português falado no Brasil admite a possibilidade de uso de «zero grau», referindo o seguinte exemplo: "Fez zero grau hoje de madrugada.".
   Pode considerar se, então, que o português europeu adopta a expressão "zero graus", enquanto o português do Brasil adopta a expressão "zero grau".
   Porém, o uso que parece correcto é zero graus , argumento confirmado por João Andrade Peres e Telmo Móia no livro "Áreas críticas da língua portuguesa": "... parece nos ter em conta a prática consagrada de adopção do plural mesmo quando o número inteiro é o '0' – por exemplo, em "zero vírgula um gramas" ou "zero gramas vírgula um" –, independentemente do facto de, na tradução em língua natural, o 'zero' se distinguir do 'um' por impor concordância plural mesmo quando aparece isolado ("zero graus" e não "zero grau" [...]).».
Mafalda Antunes
http://ciberduvidas.sapo.pt

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Tema
Saco azul (I)

Pergunta/Resposta
   Muitos consulentes fizeram nos esta pergunta: qual a origem e significado preciso da expressão saco azul ? Muitos outros quiseram mesmo saber quando e como ela entrou no léxico comum, agora que histórias menos edificantes reveladas ultimamente em Portugal lhe deram um protagonismo especial...
   Não foi fácil nem está fechada esta primeira tentativa de resposta.

Vários
Portugal

   Significado e conotação
   
    O termo saco azul não teve sempre a conotação tão negativa que hoje lhe é atribuída.
   Segundo o Grande Dicionário da Língua Portuguesa de António de Morais Silva, de 1945, "saco azul" era a designação dada ao conjunto de importâncias provenientes de receitas eventuais, sem designação oficial, donde saíam verbas para despesas não previstas, em certos serviços públicos. Como as verbas atribuídas pelo Estado tinham uma grande rigidez de aplicação em rubricas específicas, a existência de um "saco azul" permitia por vezes agilizar o sistema.
   Posteriormente, não só em organismos oficiais como sobretudo na escrita de firmas e empresas particulares, o termo ganhou a conotação de dinheiros ilícitos, ou porque provenientes de corrupção ou porque, mesmo não sendo daí provenientes, não eram registados de forma lícita e apenas um número restrito de pessoas sabia do seu montante ou proveniência, não sendo, pois, declarados para quaisquer fins oficiais, nomeadamente os impostos. O seu registo interno, para quem a ele tinha acesso, também era (é) denominado de "Contabilidade Paralela" ou "Caixa 2", sendo este último termo o utilizado no Brasil.
   
    Origem
   
   Primitivamente, o dinheiro era guardado e transportado em sacos. Daí a associação de saco a dinheiro, desde o tempo dos romanos. Em Roma o sacculus (saco para o dinheiro) desempenhava um importante papel na administração pública e era uma das insígnias dos quaestores , magistrados encarregados dos dinheiros públicos, da cobrança de impostos.
   Com o termo "saco azul" está relacionada a expressão "contas de saco". As "contas de saco", segundo o dicionário acima referido, são despesas de que se não toma nota ou gastos de dinheiro sem contar ou recebimentos e gastos sem cálculo.
   O facto de o termo "saco azul" já estar dicionarizado pelo menos desde a década de 40 do século XX como relativo às tais receitas eventuais em serviços públicos leva me a estabelecer uma relação entre o termo "saco azul"d e o papel selado (que era azul) ou os livros de contabilidade das finanças públicas que inicialmente também eram azuis.
   Talvez a associação seja apenas a da cor (saco azul = que continha dinheiro) ou talvez não.
    O papel selado existiu em Portugal desde o século XVII até ao último quartel do século XX. Consistia numa forma de cobrança do imposto de selo. Era um papel que tinha o selo da lei e servia para documentos oficiais, escrituras, certidões, procurações, requerimentos, etc., constituindo, pois, uma receita eventual, embora de muito grande montante. Esta receita proveniente da venda do papel azul era uma receita legal e objecto de registo, mas era uma receita à parte. No início, para a administração do papel selado havia na capital um tesoureiro geral e nas províncias os tesoureiros das câmaras que lhe prestavam contas individualmente. O papel que sobejasse com selo seria entregue até 15 de Janeiro do ano seguinte em troca de outro do ano corrente.
   Apresento esta resposta provisória, dada a insistência dos consulentes, mas brevemente a completarei.
Maria Regina Rocha
http://ciberduvidas.sapo.pt

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RÍVOLI Assim como dizemos Tívoli (antigo cinema de Lisboa, situado na Avenida da Liberdade), e Trípoli ou Triplos (capital da Líbia), assim também devemos dizer Rívoli, quando nos queremos referir à conhecida casa portuense de espectáculos, à qual foi dado este nome em homenagem à cidade italiana homónima situada próximo de Turim.
Como as pronúncias oxítonas destes vocábulos apresentam ressaibo francês, será melhor prática não as empregarmos no linguajar quotidiano, a fim de que não nos acoimem de presunçosos.
O professor Ivo Xavier Fernandes, a páginas 73, 78, 120 a 123 do seu livro "Topónimos e Gentílicos", na edição de 1941, ensinou ser sempre esdrúxula a pronúncia dos vocábulos seguintes: Tívoli, Rívoli e Trípoli, por isso claudicará todo aquele que lhes atribua acentuação diferente.

Francisco Alves Costa in Jornal Olivais

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Tema
Despoletar / espoletar, de novo

Pergunta/Resposta
   Sei que o Ciberdúvidas já respondeu várias vezes à questão "despoletar"/"espoletar" (de espoleta, no sentido de deflagrar, desencadear, accionar, precipitar, etc), mas a verdade é que oiço e leio toda a gente a dizer «fulano ou a entidade cicrana "despoletou" a crise», etc. Será que temos já um erro aceite pelo uso como certo?...
    Mas, tropa que também eu fui, também eu acho que quem "despoleta" «desarma o mecanismo de accionamento de disparo ou de explosão» (in Dicionário de Língua Portuguesa Contemporânea, da Academia de Ciências de Lisboa). Logo, quem "despoleta", não faz "bum!", mas o seu contrário...Além de também eu achar um vocábulo feiíssimo!...
    Que me dizeis?
    Obrigado.

Júlio Vaz Pereira
Lisboa
Portugal

   De facto uma análise mais cuidada destes dois termos permite perceber que o seu uso nem sempre é feito adequadamente. Como complemento à informação veiculada pelo Dicionário de Língua Portuguesa Contemporânea da Academia de Ciências de Lisboa, a que é feita referência, é de registar, como complemento, a informação disponível no Dicionário da Língua Portuguesa 2003 da Porto Editora, que refere três acepções distintas para o verbo “despoletar”:
    1. tirar a espoleta a; tornar impossível o disparo ou a explosão de [sentido original];
    2. [sentido figurado] anular algo; travar o desencadeamento de;
    3. [sentido figurado] fazer surgir repentinamente; desencadear uma acção [uso generalizado]
    Trata se de um caso em que se generalizou uma má acepção da palavra, no entanto, a sua frequência é já responsável pela inserção da acepção 3 no Dicionário da Porto Editora.
    Quanto ao verbo ?espoletar? apenas é referida a acepção de ?pôr espoleta em?. Tratando se de um termo do vocabulário militar o seu âmbito tornou se mais restrito.
    Relativamente à questão de considerar “um vocábulo feiíssimo”, talvez o uso de alternativas linguísticas, como o uso de sinónimos, possa resolver essa questão.
Mafalda Antunes

Ciberdúvidas http://ciberduvidas.sapo.pt

Saudamos o regresso do Ciberdúvidas!

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RETIRAR Nos parquímetros, dispersos por algumas ruas de Lisboa, encontra se afixado o seguinte pedido, cuja redacção consideramos disparatada: "Retire aqui o seu bilhete". Ora, quando se retira um objecto, é sempre de algum lugar, por isso apelamos para as autoridades competentes, no sentido urgente de se apressarem a corrigir semelhante desconchavo das vias públicas, pospondo àquele verbo a indispensável preposição de, antes que o erro comece a proliferar por outras localidades. Insistimos: a inscrição registada nos corpos dos aludidos parquímetros, cuja rectificação já solicitámos oportunamente, sem quaisquer resultados positivos, à empresa responsável, encontra se mal redigida. O que lá se devia ter colocado era esta indicação: retire daqui o seu bilhete, pois assim é que se considera correcto.

Francisco Alves da Costa
In Jornal Olivais

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RESTAURAÇÃO Sempre ouvimos empregar este vocábulo com os seguintes significados: renovação, conserto, reparação, restabelecimento de uma dinastia real ou de qualquer sistema político (e aqui ocorre nos recordar a data da Revolução de 1640, bem como a posterior Guerra da Restauração, em que Portugal se libertou do jugo castelhano de 60 anos). Agora, porém, alguns jornalistas da Rádio e Televisão começaram a atribuir lhe também, com doentia insistência, o sentido anómalo de alimentação, o que não nos parece nada curial, pois atenta contra a nossa prática de séculos. Corrija se depressa o erro, antes que seja demasiado tarde!

Francisco Alves da Costa
In Jornal Olivais

Obs. O Dicionário da Academia das Ciências de Lisboa já contempla a palavra restauração como indústria de confecção e fornecimento de refeições em estabelecimentos abertos ao público ( do fr. restauration).
Porém, a minha alma está com Francisco Alves da Costa. Não sou capaz de usar esta palavra com este significado. Fiquei na "indúntria hoteleira, ramo dos restaurantes". Comprido, não é? Eu sei. Eu sei que "restaurante" tem a mesma procedência!... Mas chamar a Guerra dos Restaurantes às lutas com Espnha depois de 1640 é um bocado estranho.
lg

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Causas principais dos erros de ortografia

Como facto social que toda a língua é, também as formas consideradas correctas estabelecidas pela ortografia são convenções que, se na sua origem não resultam de qualquer imperativo interno à própria língua, se tornam obrigatórias, desde que aceites oficialmente pela comunidade linguística.

As regras da ortografia valem como leis, que pretendem regulamentar a actividade da escrita e, portanto, terão de ser cumpridas por todo e qualquer membro da comunidade.

No entanto, sabemos que, neste como noutros domínios regulados por leis, há as infracções. Os erros de ortografia têm de ser considerados como infracções a princípios estabelecidos com força de lei.

Quais as causas desses erros? São muitas, desde a insuficiente ou má aprendizagem que o utente da língua fez na escola, ao desleixo no dia a dia, não dando atenção aos textos correctos que lê, à contaminação da escrita pelas características da linguagem oral, a perturbações de carácter patológico (dislexia, por exemplo), até às próprias interferências provenientes da ortografia de línguas estrangeiras (como é o caso de estrutura, que aparece por vezes escrita estructura).

Como causas óbvias, sempre são apontadas em primeiro lugar a insuficiente ou má aprendizagem que o utente da língua faz na escola. Porque, exigindo uma iniciação, a ortografia pressupõe a escola, seja ela a instituição, seja a transmissão a nível mais pessoal, mas sempre numa relação pedagógica.

A pouca motivação ou aplicação do utente, e também a falta de preparação ou a fraca qualidade didáctico pedagógica do "docente" encontram se quase sempre na origem dos erros de ortografia... Já não falamos de quantos escrevem deficientemente por terem sido obrigados a, por motivos económicos, ficar com um grau elementar de instrução, muito próximo do do analfabetismo.

Outros utentes há que verão diminuída a sua competência na ortografia, por opções de carácter profissional. Assim, o técnico ou o operário especializado que se consagra a uma actividade predominantemente manual, perderá o contacto com a leitura e a escrita e terá dúvidas e dificuldades no exercício correcto da grafia. O mesmo se poderá dizer de quantos, mesmo a nível universitário, muito cedo perderam o contacto com a leitura e uma escrita exigentes, e pouca atenção concedem à efectiva correcção das palavras.

(Edite Estrela e J. David Pinto Correia in GUIA ESSENCIAL DA LÍNGUA PORTUGUESA PARA A COMUNICAÇÃO SOCIAL)

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APENAS E SÓ Como estes dois advérbios de exclusão significam a mesma coisa, torna se redundante empregá los simultaneamente. Portanto, quando usarmos o primeiro, dispensaremos o segundo, e ao invés. Assim é que se considera correcto!
Esta anómala expressão foi posta a circular há anos, talvez inadvertidamente, por um político jovem, muito combativo, que logo encontrou quem o seguisse no disparate, pois as frases construídas com apenas e só começaram já a proliferar nos microfones das estações radiofónicas e televisivas, com insistência algo doentia.

Francisco Alves da Costa
In Jornal Olivais

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ÂNCARA O nome desta cidade turca não é grave, mas esdrúxulo, conforme se pode verificar na página 84, edição de 1949, do livro "Introduction au Turc", da autoria de Herbert Jansky. Esta asserção, para esclarecimento definitivo de quem o ignore, encontra se confirmada na página 31 da obra "Teach yourself Turkish", de G. L. Lewis, publicada em 1953. Diga se, portanto, Ancara e não Ancara, como rima de Sara, porquanto é exdruxulamente que os Turcos proferem o nome da sua capital, conforme já tivemos ocasião de verificar em programas da televisão otomana. Esta informação foi nos também confirmada pelo embaixador turco em Lisboa, em resposta a uma consulta que lhe fizemos oportunamente acerca do assunto.
Não imitemos, portanto, o locutor de rosto oculto, que diariamente nos bombardeia os ouvidos, através dos microfones da nossa televisão oficial, com a disparatada pronúncia de Ancara, quando noticia as temperaturas diárias das capitais europeias.
Também claudicou neste ponto D'Silvas Filho, autor do "Prontuário Erros Corrigidos de Português", publicado em 1994, a quem escrevemos oportunamente, a solicitar que fosse rectificado, em edições futuras, o lapso inserto nesta obra, pedido até agora ainda por atender.

Francisco Alves da Costa
In Jornal Olivais

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AMORFO Se qualquer pessoa inculta, em conversa informal, pronunciar defeituosamente uma palavra, ainda poderá ter desculpa, já que nunca foi convenientemente elucidada acerca das regras prosódicas tradicionais, agora que um actor profissional venha proferir erradamente, perante milhares de pessoas, amôrfo, em vez de amórfo, como aconteceu recentemente numa entrevista por ele concedida a uma estação televisiva, é que se não pode nem deve admitir. Ora, como tal vocábulo, em grego, donde proveio, se escreve sempre com a vogal ómicron, cuja prolação é sempre aberta, não existe qualquer razão plausível, a não ser a ignorância, neste caso imperdoável, para que se adultere agora publicamente a pronúncia de tal palavra.
Amorfo, para quem não saiba ou já se tenha esquecido, quer dizer informe, sem forma regular bem definida.
Tanto o lexicógrafo brasileiro Morais da Silva, em 1858, no "Dicionário de língua Portuguesa", como o professor Domingos de Azevedo, a páginas 201 da sua "Gramática Nacional", dada à estampa em 1880, registaram igualmente este adjectivo sob a grafia de amórpho, que era a vigente no século XIX, com acento agudo na vogal da penúltima sílaba, para mostrarem a sua prolação aberta, e não fechada.

Francisco Alves da Costa
In Jornal Olivais

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Tema

A mascote

Pergunta/Resposta
   O termo mascote é definido como um substantivo feminino, portanto, a mascote. Gostaria de saber se é aceitável o uso de: o mascote?
Luiz Roberto V. Boselli
Brasil

   Não me parece, porque é, como diz, um substantivo feminino, tanto no Brasil como em Portugal. Assim, deve se dizer, por exemplo, «aquele cão é a mascote do grupo», e não «aquele cão é o mascote do grupo».

C.M.
ciberduvidas

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Tema

Pronúncia de armazém

Pergunta/Resposta

   Tenho verificado que certas pessoas abrem o primeiro a. Será correcto que possa haver dois acentos tónicos na mesma palavra? O mesmo poderia dizer de soldado (militar), em que nem sequer há qualquer acento gráfico.
AGTM
Portugal

   A pronúncia correcta/correta de armazém, no padrão de Lisboa, é "ârmâzém", com os aa fechados. No Brasil abrirão as vogais.
   Repare, porém, que, numa pronúncia "àrmazém", não se pode dizer que fiquem dois acentos tónicos/tônicos: o acento de maior intensidade é posterior.
   No entanto, se houver um acento afectivo/afetivo na pronúncia, então, até a sílaba tónica/tônica pode ficar com intensidade secundária (ex.: `ele é um miserável "míseràvel"´).
   Cf. Armazéns.
   Ao seu dispor,
D´ Silvas Filho Tema

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Tema

Acento gráfico: às / ás

Pergunta/Resposta

   Gostaria de saber se o acento nos "a" são graves ou agudos. Por exemplo: escreve se "ás 3 horas" ou "às 3 horas"? "Á espera" ou "À espera"?
   Agradeço a atenção!

Inês Pereira
Portugal

   Escreve se: às 3 horas; à espera. Grafa se sempre com acento grave a contracção da preposição a com o artigo definido feminino no singular a ou no plural (as). Ou seja: a + a = à; a + as = às.
   Se escrevermos ás com acento agudo, teremos o substantivo ás = carta de jogar, atleta notável, etc.
   Cf. resposta anterior O "á" com acento agudo.

J.C.B.

Do "Ciberdúvidas"que continua paralizado...

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ZEPELIM Adaptado arbitrariamente do nome do conde alemão Ferdinand von Zeppelin (1838 1917), este germanismo, hoje quase votado ao esquecimento, era sempre designado por dírigível nos tempos recuados da nossa infância. E ainda hoje, a tantos anos de distância, nos recordamos do inovidável prazer que tivemos ao observar, pela primeira vez, a passagem de um deles (desconhecemos se foi o derradeiro), no límpido céu de Lisboa, a caminho do continente americano.
Definido, há tempos, erradamente, por balão redondo, no precipitado linguajar de um novel jornalista radiofónico, este meio de transporte hoje foi posto de parte, por causa de uma pavorosa catástrofe ocorrida nos Estados Unidos, em que perderam a vida, no meio das chamas, algumas dezenas de pessoas, precisamente na altura da sua chegada ao aeroporto americano.
Apesar dos perigos, de que se reveste a sua utilização para viagem de passageiros, parece estarem agora em perspectiva novos estudos sobre o seu emprego, para longas distâncias, no transporte exclusivo de materiais de grande envergadura destinados à construção civil.
Como informação complementar, cumpre nos acrescentar aqui o seguinte: os dirigíveis, nome português por que se devem mencionar tais meios de transporte, eram semelhantes a charutos (não a balões redondos), alguns dos quais chegaram a atingir o comprimento de 245 metros, e dispunham de grandes câmaras de hélio, gás bastante inflamável e de existência rara, que permitiam a sua levitação até grande altura.

In Jornal OLIVAIS Agosto de 2002

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VIGÉSIMO
Como o s intervocálico tem sempre o valor de z, labora num vicioso erro quem disser vigéssímo, em lugar de vigézímo (na escrita oficial:vigésimo). Esta mesma observação deve ser aplicada aos numerais ordinais centésimo e milésimo, cuja pronúncia é também frequentes vezes adulterada.
Apesar do seu cuidado habitual, também Domingos de Azevedo claudicou, ao registar, na sua "Gramática Nacional", publicada em 1880, as prolações erróneas de milécimo, centécimo e vigécímo, justamente como proferem ainda hoje algumas pessoas mal esciarecidas.

Francisco Alves da Costa
In Jornal Olivais

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VIENA D'AUSTRIA Quando pretendemos aludir à capital da Áustria, não precisamos de lhe acrescentar nenhum determinativo, pois dizermos apenas Viena já é suficiente para o nosso interlocutor compreender a que cidade nos queremos referir. Aliás, os próprios Austríacos não lhe chamam senão Wien (Viena). E isso parece já ser bastante elucidativo.
0 argumento aduzido algures por certo jornalista de que se deve apor sempre o nome daquele pais a Viena, a fim de não se estabelecer confusão com os topónimos de Viana do Alentejo e Viana do Castelo, não tem qualquer razão de ser, porquanto o nome geográfico acima referido já se distingue muito bem dos nossos pela diferença de vogais empregadas na sua grafia: Viena escreve se com e, mas Viana grafa se com a.
Ainda nos recordamos muito bem de termos debatido este assunto, em conversa amena com o professor Vasco Botelho de Amaral, à saída de um programa nocturno do extinto "Rádio Hertz", de que éramos assíduos colaboradores, em que ele manifestou a sua concordância com esta nossa modesta opinião.
António Feliciano de Castilho, considerado um dos mais eminentes cinzeladores da nossa língua, também claudicou, ao escrever, como acontece com frequência, Vienna de Áustria, a páginas 16, 1.Q volume, do seu livro "Noções Rudimentares para Uso das Escolas dos Amigos das Letras e Artes de S. Miguel", dado à estampa em 1909. Não se imite o lapso deste escritor, cometido há quase uma centúria, mas que nem por isso deixa de se considerar um lapso.

Francisco Alves da Costa
In Jornal Olivais

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VIAGEM FANTASMA Nos substantivos compostos por dois elementos variáveis, conforme determina a regra, ambos os componentes se pluralizam, por isso erra quem disser ou escrever viagens fantasma, em lugar de viagens fantasmas. Quanto a nós, que estudamos estes e outros problemas linguísticos há mais de meio século, parece nos mais correcto usar se a expressão viagem fictícia, isto é, aquela que alguém menciona, verbalmente ou por escrito, mas que nunca chegou a realizar, porque desviou, abusiva e dolosamente, para outros fins, a importância correspondente ao seu custo.

Francisco Alves da Costa
In Jornal Olivais

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ABREVIATURAS
Convém evitarmos, sempre que possível, o emprego de abreviaturas, em substituição das palavras por extenso, pois, se o não fizermos, corremos o risco de não sermos compreendidos por aqueles a quem nos dirigimos.

0 mal das abreviaturas não é recente: veio de muito longe, e ameaça instalar se definitivamente na linguagem quotidiana, facto que lamentamos profundamente, mas contra o qual pouco ou nada poderemos fazer,

No tempo dos Romanos, por exemplo, já era habitual utilizarem se acrossemias nas lápides funerárias e até nos lábaros militares. Recordemos a inscrição S.P.Q.R (Senatus Populusque Romanus), tão citada nas páginas da História Universal, e que quer dizer em português: 0 Senado e o Povo Romano.

Mas para que servem as abreviaturas? Para economizarmos, naturalmente, espaço e tempo responderiam certos locutores da televisão e rádio, que utilizam, por exemplo, a forma sintética de U.R.S.S (lida Urse) para aludirem à extinta União das Republicas Socialistas Soviéticas. E a razão estaria certamente do lado deles, se não existisse no nosso vocabulário o topónimo Rússia, que, embora se referisse apenas à mais importante das mencionadas repúblicas, podia e devia dispensar muito bem o emprego daquela abreviatura.

Aliás quando pretendemos aludir aos Estados Unidos da América, não é habitual usarmos simplesmente, por economia de tempo, a palavra América, sem nos importarmos com o facto de se poder estabelecer confusão com os países luso espanhóis do sul desse continente?

Já agora, não gostaríamos de terminar estas notas sem nos reportarmos à designação sintética da Organízação das Nações Unidas 0. N. U. (United Nations Organization, como é referida em inglês), que alguns locutores mal informados proferem, até à náusea, ó.N.U, com acentuação tónica sobre a primeira vogal.

Ora, a regra diz explicitamente que todas as palavras oxítonas terminadas em u se pronunciam com acentuação tónica sobre essa vogal, e não sobre a precedente. Vejamos os seguintes exemplos: bambu, peru, zebu, marabu e Belzebu.

Como as acrossemias constituem,formas sintéticas dos vocábulos que representam, é e vidente que têm de se subordinar à prosódia estabelecida para as palavras, a que naturalmente correspondem.

Escrevamos então O.N.U., em abreviatura, se não quisermos usar a designação desse organismo por extenso, mas respeitemos a pronúncia de ONú, a rimar com peru, jamais ÓNU, como é corrente ouvirmos dizer a pessoas envolvidas nos meandros da política e da informação, algumas das quais apetrechadas com diplomas universitários.

Francisco Alves da Costa
In Jornal Olivais

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 POETA: Quando frequentávamos as primeiras letras, os nossos professores, estribados na "Gramática Portuguesa", de Ulisses Machado, ao tempo adoptada na chamada Instrução Primária, ensinavam ser poetisa a designação feminina de poeta. E assim continuaram a proceder todos os mestres e gramáticos posteriores. Mais tarde, porém, alguém se lembrou infaustamente de transformar este substantivo em comum de dois, facto que não apadrinhamos de modo algum. Portanto, e para não trairmos as regras propinadas pelos nossos saudosos professores sobre o assunto, continuemos a designar por vate ou poeta o homem que faz versos, e por poetisa a mulher que se ocupa da mesma função. Assim é que nos parece correcto, embora haja quem prefira navegar em sentido contrário.
Francisco Alves da Costa in Jornal Olivais Junho 2002

Francisco Alves da Costa
In Jornal Olivais

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PESSOA HUMANA: Como não se podem classificar de pessoas quaisquer outros seres diferentes dos humanos, consideramos condenável o péssimo hábito, agora muito na berra, de se acrescentar arbitariamente ao substantivo pes soa o adjectivo humana. Mas então perguntar se á nunca poderemos agregar o qualificativo humano a pessoa? É evidente que sim, desde que atribuamos ao adjectivo humano o significado específico de: bondoso, compassivo, caridoso, altruísta ou filantrópico. Fora disso, não, pois tal prática representa uma disparatada redundância.

Francisco Alves da Costa
In Jornal Olivais

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PALESTINO: Por influência dos noticiários anglo americanos, ouvimos pronunciar, quase diariamente, aos microfones das estações de rádio e televisão, a palavra palestiniano, em lugar de palestino, que é o adjectivo mais apropriado para designação de quem nasceu na Palestina, conforme se pode verificar no "Dicionário de Inglês Português", publicado em 1966 pelo erudito professor Armando Morais, certamente estribado na informação de Aniceto dos Reis Gonçalves Viana, exarada no seu "Vocabulário Ortográfico e Ortoépico da Língua Portuguesa", dado à estampa em 1909.
Também emitiu a mesma opinião a este respeito o escritor José Saramago, numa entrevista oportunamente concedida à RTP, dias após ter sido contemplado com o prémio Nobel da Literatura.
Correndo parelhas com os vocábulos acima referidos, também surge como sinónimo de palestino, aqui e além, nos mais importantes dicionários portugueses e brasileiros, o qualitativo palestinense, que ainda não encontrámos exarado em nenhum texto literário.
Em conclusão: se nós apelidamos de argentinos os habitantes da Argentina, por que não havemos de chamar, por analogia, palestino a quem nasceu na Palestina? Não seria isto mais lógico?

Francisco Alves da Costa
In Jornal Olivais Março 2002

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Frase puzzle: Posto recentemente em circulação por uma tímida apresentadora de concursos televisivos, cuja linguagem, talvez por acanhamento, raras vezes transcende os estereótipos habituais usados em programas congéneres, este semi estrangeirismo espúrio, que nunca fez falta ao nosso vocabulário, deve ser substituído, mais vernaculamente, por qualquer dos seguintes compostos: frase adivinha, frase mistérío ou frase surpresa

Francisco Alves da Costa
In Jornal Olivais Março 2002

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Desde apenas:

Conforme já tivemos ocasião de ensinar relativamente a outras expressões de similar formação, o advérbio de exclusão apenas (bem como os seus sinónimos: só, somente, unicamente, exclusivamente) nunca deve ser colocado a seguir a qualquer preposição, mas sim antes dela, conforme os seguintes exemplos: apenas desde, só com, somente contra, unicamente por, exclusivamente após, e assim por diante. Esta era, na realidade, a prática seguida pelos nossos escritores clássicos.
Como exemplo bastante elucidativo contra a persistência no erro, apesar das nossas objurgatórias, costumamos até formular a seguinte pergunta, "Com quem tencionas ir amanhã ao cinema?" E a resposta correcta, quando a pessoa interrogada não pretende levar mais companhias, nunca poderia ser outra senão uma destas: "Só contigo!" ou "Apenas contigo!", jamais, porque redundaria em disparate, "Com apenas tigo!" ou "Com só tigo.
Estes péssimos díslates, agora adquiridos por contaminação da sintaxe inglesa, podem ler se e ouvir se em notícias e anúncios, transmitidos quotidianamente por intermédio da Imprensa, Rádio e Televisão, e contra os quais pouco ou nada podemos fazer, pois, quando as nossas cartas de chamada de atenção relativamente aos lapsos cometidos chegam às mãos dos destinatários, já aqueles proliferaram pelas quatro partidas do mundo.

Francisco Alves da Costa
In Jornal Olivais Março 2002

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Desastre aparatoso.

Por que razão é que um desastre, sempre que ocorre, terá de ser classificado sistematicamente de aparatoso ou espectacular? Ora, quanto ao primeiro adjectivo, o seu significado é: magnificente, pomposo, esplendoroso, brilhante, faustoso, ostentoso, qualidades que não se coadunam com desastre, acidente ou sinistro. Quanto ao segundo (espectacular), cuja significação é: pomposo, ostentoso, flamante, que dá muito nas vistas, achamos que é também, inadequado jungi lo àqueles substantivos, por isso pensamos que a decisão mais apropriada será a de se empregar simplesmente a palavra desastre ou os seus sinónimos (acidente ou sinistro) sem adjunção de qualquer outro qualificativo.
Em todo o caso, e para enriquecimento do estilo daqueles que se consideram desamparados sem o emprego dos adjectivos, ainda existem nos dicionários mais estes vocábulos, que poderão ser apensos aos substantívos atrás referidos: tremendo, pavoroso, terrível, enorme, grave, horroroso, funesto, horrível, infausto, espantoso e até extraordinário. Espectacular e aparatoso é que não, pois, apesar do seu uso tradicional junto daqueles vocábulos, tais qualificativos não conseguem exprimir com bastante propriedade o pensamento de quem os utiliza.
Note se ainda que também poderemos juntar os apelativos de trágico ou dramático a qualquer dos substantivos desastre, acidente ou sinistro, mediante as seguintes restrições: se não houver mortos, mas feridos ou apenas prejuízos materiais, recorre se ao segundo adjectivo (dramático); se os houver, teremos de adoptar obrigatoriamente o primeiro (trágico), em obediência aos requisitos do milenário teatro grego.

Francisco Alves da Costa
In Jornal Olivais Março 2002

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Derivado a

Muito empregado vulgarmente, com esta regência prepositiva, até por pessoas com diploma universitário, o adjectivo mencionado em epígrafe deve ser acompanhado, não da preposição a, mas sim da sua patrícia de, conforme nos ensinaram os nossos melhores escritores clássicos. Diga se, portanto: derívado de, como expressão sinónima de locução devido a, por cuja causa surgiu, no linguajar descuidado, este infeliz disparate. Em Filologia, costumamos dizer que determinada palavra derivou do latim. Nunca afirmamos, porque seria errado, que ela derivou àquele idioma.
0 escritor António Lobo Antunes, a cuja obra sempre dedicámos um carinho especial, também claudicou, ao usar tal regência prepositiva, nas páginas 23, 33, 38, 69, 75 e 186 do seu romance "Que farei quando tudo arde?", publicado em 2001.

Francisco Alves da Costa
In Jornal Olivais Março 2002

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Com até

Encontrámos este encadeamento anómalo de preposições num impresso de propaganda de venda de relógios por correspondência. Ora não é assim que se deve escrever a nossa língua. Segundo a tradição, a ordem normal de colocação destas preposições no discurso é precisamente ao contrário; até com, e não com até, mau hábito de inspiração forasteira, que se torna conveniente corrigir. Este disparate faz nos lembrar o seu semelhante (com apenas), demasiadas vezes empregado por quase todos os jornalistas da Televisão, em lugar de apenas com, apesar das nossas constantes chamadas de atenção acerca do assunto.
Em conclusão: sempre que tenhamos de usar aquele encadeado de preposições, ou outro similar, convém colocarmos sempre em primeiro lugar (nunca no fim) a palavra até, pois assim é que se considera correcto. Seguem, como exemplos, estas frases elucidativas: "Dizes que não me viste ontem na exposição de pinturas, mas eu até 1à estive com a minha mulher!", "Até às melhores pessoas as desgraças acontecem!", "Se alguém houver cometido actos horríveis, até perante o Diabo se deve sentir envergonhado!", "Dizes que tenho péssima memória, mas eu até das mais insignificantes me recordo!", "Embora eu não te mereça, até para mim costumas ser agressiva . Sempre que desejes, podes saber notícias minhas até por intermédio dos meus filhos..."
Como facilmente se pode observar, empregámos aqui diversos encadeamentos prepositivos para exemplificação da tese expendida no primeiro parágrafo destas singelas notas linguísticas.

Francisco Alves da Costa
In Jornal Olivais Março 2002

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"Bicha" e "fila"

Ultimamente tem se verificado a progressiva substituição no falar quotidiano de "bicha" por "fila", no sentido de "conjunto de pessoas dispostas umas atrás de outras". Várias entidades têm chamado a minha atenção para essa novidade. Entre elas está agora o Senhor Manuel J. Nunes, de Lisboa, que com graça comenta: "muitos são os que fogem das bichas porque preferem as filas".
Quando se procura saber a causa de tal procedimento, a resposta invariavelmente assenta no facto de bicha também ser denominação de homossexual. Parece que só agora se deu por essa sinonímia, donde resultou a tentativa de eliminação do uso corrente de vocábulo bicha já atestável no século XVI no sentido de "animal de corpo comprido", mas só em 1871 no de "alinhamento de pessoas".
Fila, pelo seu lado, atesta se em 1813. Com origem no francês, talvez por isso tenha conseguido impor se em nível de linguagem superior ao de quem preferia usar bicha. Esta era (e continua a ser) corrente, só e em expressões. Todos ouvimos já "eh pá, vai para a bicha!", "iam em bicha", "estavam em bicha", "formar bicha", etc. E não esqueçamos a locução à bicha no sentido de "grande quantidade".
Os velhos como eu ainda se lembram dos tristes e agitados tempos imediatamente posteriores à guerra de 1914 1918 com o calvário da falta de produtos de primeira necessidade, donde as frequentes "bichas do pão", as "bichas do azeite", etc., e é sobretudo este etc. que justificava a denominação cronológica com que durante alguns anos aqueles eram "os tempos das bichas".
Bicha era nome de animal de corpo estreito e comprido (como a lombriga e a sanguessuga), geralmente tido como agressivo e perigoso. Daí também servir de epíteto de mulher de mau génio, mas sem equivalência masculina, ao contrário do que por vezes se admite.
O sentido de "homem efeminado, homossexual" deve ser moderno. Não me lembro de o ouvir com esse significado na minha juventude, como não o encontro no bem documentado artigo sobre bicha da Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira (vol.IV, aparecido cerca de 1938).
Fila, como disse, é vocábulo socialmente mais válido do que bicha, se bem que próximos no sentido. Daí não conseguir variedade de empregos idênticos à que consegui para bicha (=fila). Conheço o "ir em fila" e a "fila indiana".
Fila e bicha, afinal palavras sinónimas, mas que entre nós, pelo menos em Lisboa, a segunda está a impor se à primeira talvez por influência das telenovelas vindas do Brasil onde, na verdade, no uso corrente, fila tem mais uso do que bicha.

José Pedro Machado (Diário de Notícias)

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Cacófatos ou cacofonias:

É habitual designarmos por estes nomes os encontros de sílabas de palavras diferentes, cuja pronuncia ocasiona a formação de sons desagradáveis, de ideias ambíguas ou soezes. Seguem algumas frases exempfificativas:
'Tens me já dado provas do teu amor . Uma minha professora de Português ensinou me bem a dividir as orações, mas mal a compreender os textos . Sabes que tens uma mão muito grande?, Atravessa a ponte a pé, nunca montado em burros ......
"Nas corridas de automóveis, toda a gente sabe que arrancas sempre antes dos outros É costume incluir se também, mas injustamente, entre os cacófatos, o célebre verso camoniano
"Alma minha gentil, que te partiste tão cedo desta vida descontente" Refira se, porém, que, no tempo de Camões (século XVI), não se dava o nome de mamas (desculpem nos a ousadia), mas de tetas, aos peitos das senhoras. Portanto: o que presentemente se reputa de cacófato não era assim considerado naquela recuada época. Pode confirmar se esta afirmação nas páginas 7, 575, 697 e 759 da obra "Diálogos", da autoria doutro escritor quinhentista Frei Amador Arrais, dada a lume em 1974, donde extraímos, respectivamente, os seguintes passos relacionados com a mãe de Jesus Cristo; "lembra me do ventre que me trouxe, das tetas que me criarão"....."com tenros lábios quis chupar vossas tetas avia por bem estar chupando as suas tetas & manter se a seu leito...", "Se a Mãy mostrar a seu filho o peito & as tetas, & o Filho ao Pay o lado & as chagas, não pode ser repulso..."
Para melhor esclarecimento deste assunto, seja nos permitido incluir também aqui os seguintes passos de Luís Vaz de Camões, extraídos respectivamente, das páginas 200 e 237 do seu livro 'Rimas, Autos e Cartas", publicado em 1988: "Como, Virgem Senhora, não corriéis/ a dar as tetas puras ao Cordeiro/ que padecer na Cruz com sede víeis?", "0 peito diamantino/ em cuja branca teta Amor se cria..."
Costuma incluir se igualmente no grupo das cacofonias (sons desagradáveis), embora com o nome de eco, o embate de sílabas idênticas, de que anotamos aqui os seguintes exemplos: "Presentemente, há alunos com maior dificuldade de aprender a Matemática do que nos meus tempos de estudante". Para obviar a este inconveniente basta intercalar se entre as sílabas de som idêntico uma palavra com terminação diferente, ou fazer uma simples transposição de vocábulos. Exemplifiquemos: em lugar de dizermos 'Há necessidade de fazer reformas (frase em que se verifica uma desagradável colisão de sons iguais), construiremos a proposição melhormente desta maneira: "Há necessidade urgente de fazer reformas."

Francisco Alves da Costa
In Jornal Olivais.

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Barragem de Alqueva: Erroneamente designada por barragem do Alqueva, esta construção hidráulica deve chamar se Barragem de Alqueva, já que se refere ao nome sem género, de uma localidade alentejana, situada a cerca de 20 quilómetros da freguesia de Portel.
A qualquer construção, de engenharia civil, destinada a condicionar o curso de um rio, a fim de manter assegurado, não só o fornecimento de água às populações, mas também o equilíbrio das irrigações agrícolas, ou produzir energia eléctrica, deram os Franceses o nome de barrage, que nós subservientemente convertemos em barragem, quando já dispúnhamos para sua substituição dos termos: comporta, açude e represa.
Mas, como a força do uso parece pender para extirpação de tais palavras do nosso linguajar quotidiano, está se mesmo a ver que, embora com bastante desagrado, seremos obrigados a contemporizar com aquele barbarismo.

Francisco Alves da Costa
In Jornal Olivais.

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Tema

"Scanear"

Pergunta/Resposta

   Creio que já existe em Português a tradução de «scanner», digitalizador, pelo que lhe assenta bem o verbo digitalizar, com o senão de ser demasiado vago. Daí, penso, a necessidade de «scanear», «escanear» ou outra forma que nos poupe longas frases. Que me dizem a isto?
Manuel Diogo Pereira
Lisboa


   Está certo digitalizador para traduzir "scanner". De digitalizador, derivaremos digitalizar. Este verbo será de sentido vago ou não vago, conforme o significado que lhe quisermos atribuir. A pessoa ou as pessoas que empregam este verbo dão lhe o sentido que entenderem, com vacuidade ou sem ela. "Escanear" é palavra que devemos pôr de lado. Até por uma questão de bom gosto.
J.N.H.
Ciberdúvidas ( http://www.ciberduvidas.com)

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Texto, na abertura do Ciberdúvidas, subscrito por Maria José Mauperrin, viúva de João Carreira Bom, sobre o futuro (menos negro) deste site.

Na sequência do anúncio da decisão de extinção do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, fomos contactados por três entidades que se declararam interessadas em assegurar a sua continuidade. Contudo, não foi ainda possível assentar nos termos em que esse interesse se poderá concretizar. Assim, nesta data, suspende se a actividade de respostas do Ciberdúvidas, ficando o mesmo em linha apenas para consulta. Logo que as "negociações" em curso terminem, dar se á publicamente notícia do facto e dos seus termos.

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Tema

Ciberdúvidas. Comentário à sua eventual extinção

Pergunta/Resposta

   Sinto me revoltado só com a ideia/idéia de ser possível a extinção de Ciberdúvidas. E, no meu caso, revolta tanto mais legítima quanto nunca recebi dinheiro por nenhuma das minhas 526 respostas como consultor de Ciberdúvidas.
   Reconheço, no entanto, que quanto à posição expressa pela actual/atual dona do portal, ninguém é obrigado a ser economicamente o principal responsável por um bem que é colectivo/coletivo.
   Mas, em comparação, e agora com o conhecimento mais exacto/exato do problema económico/econômico, fico assombrado com o sacrifício monetário, e também de certeza anímico, que fez Carreira Bom para conseguir o extraordinário resultado que é hoje Ciberdúvidas. Os excelsos são tão poucos Que saudade eu tenho de ti, Carreira Bom A vida escolhe os seus eleitos e projecta os/projeta os na herança colectiva/coletiva a séculos de distância. É pena que as grandes almas muitas vezes só sejam reconhecidas em toda a sua enorme dimensão depois de nos deixarem
   Sinto me agradecido em parte com as entidades que nos têm ajudado; mas profundamente revoltado com o insucesso dos esforços que foram feitos para se manter Ciberdúvidas. Proteger a língua é um dever do Estado e das pessoas que têm por missão distribuir os dinheiros públicos. Como referem muitos dos nossos fiéis consulentes, é incrível aquilo a que os valores consumistas nos levaram! Têm se propalado na comunicação social casos de desperdícios inaceitáveis e de peculatos com valores que espantam; e não há dinheiro para contribuir para a defesa da língua, este património/patrimônio por excelência, lembrando Fernando Pessoa?
   Mas já não se trata até só de ligar língua e Pátria (para alguns, nestes tempos, a palavra Pátria tem associações negativas; não para mim, que nunca fui fascista e sempre amei o meu país). Ciberdúvidas é agora mais do que isso: é um património/patrimônio da comum língua, de 176 milhões de falantes; Ciberdúvidas é hoje planetário. Uma realização que já transcende o projecto/projeto inicial dos seus fundadores (entre os quais não posso esquecer José Mário Costa). Foi isto o que nos legou Carreira Bom, com o seu sacrifício, o seu entusiasmo, o seu enorme amor pela língua. Uma obra universal na comunhão de esforços, na difusão por toda a parte onde a língua é falada, na união dos países de língua oficial portuguesa.
   Pessoalmente, ajudei Carreira Bom nesta ideia/idéia («Língua de oito pátrias» era o lema que ultimamente tinha adoptado/adotado), pois desde o início da minha colaboração (em 1997) que as minhas respostas foram sempre feitas considerando as duas normas ortográficas conhecidas, para evitar confusões entre os leitores da comum língua.
   Matar Ciberdúvidas seria agora magoar muita gente, espalhada pelo mundo, que já se habituou a comungar no mesmo anseio. Tenhamos todos fé que isso não vai acontecer. A fé move montanhas, não é?
D´ Silvas Filho

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Pequeno "dicionario" de SMS e internetês.
(No "Diário de Notícias")

aki aqui
akilo aquilo
atan entãõ
axim assim
axo ou axu acho
bgd obrigado
bjs ou bjx beijos
cmg, ctg comigo, contigo
daddy papá
dixeste disseste
dsc desculpa
giru giro,
grd. grande
gxtar gostar
hj hoje
idd idade
jahtah já está
k que
kem quem
kk ou qq qualquer coisa
kido, kiduxo querido, queridinho
lammer otário, totó
mm mesmlo,
mor amor
mto muito
mummy mamã ,
nd nada
nn ou ng ninguém
n ou naum não
perxebs percebes
pk ou pq porque
pls please
qd quando
res responde
tds ou tdx todos
td tudo
vc você
vz vez
xpra ou pera espera
xtas estás
xtupido estúpido

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Tema

`Vipes´, os VIP

Pergunta/Resposta

   Tenho uma dúvida sobre a palavra vip, que é derivada de uma sigla em inglês. Ela vai ao plural? Encontrei a no Houaiss, como substantivo e adjetivo também, mas não no plural. Posse escrever convites vips ou deve ser convites vip (do tipo vip)?
   Obrigada.
Marilda de Oliveira
Brasil

   O novo dicionário português ACL Verbo propõe para o léxico da língua o acrónimo/acrônimo `vipe´, como adaptação da sigla VIP («Very Important Person»). Mas esta `inovação´ não foi considerada no completo «Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa» da Academia Brasileira de Letras, de 1998.
   Como já tenho escrito, os acrónimos/acrônimos podem ter plural (as siglas não).
   Assim, se aceitarmos o acrónimo/acrônimo `
vipe´, podemos formar o plural acrescentando simplesmente um s: `vipes´ (ex.: `foram convidados todos os vipes da comunidade´). Para quem, com todo o direito, não aceitar esta adaptação, então, recomendo que escreva, por exemplo: `lugares de VIP´, `convites a VIP´, `personalidades VIP´, etc. Noto que não é costume escrever as siglas entre aspas, mesmo tratando se de reduções de termos estrangeiros, contrariamente ao que se recomenda para esses termos.
   Ao seu dispor,
D´ Silvas Filho

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Puxar da faca

Pergunta/Resposta

Gostaria de saber se estas expressões são corretas:
Puxar da faca, sacar do revólver, saber do caso, gozar de liberdade, chamar por alguém.
Vânia

Brasil

   São correctas, sim. Os verbos que refere podem construir se com ou sem preposição. Os exemplos que se apresentam de seguida foram retirados da Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira.
   1.
Puxar, no sentido de "tirar e empunhar, desembainhar, sacar", pode empregar se sem preposição e com a preposição "de" ou "por". Exemplos: "A luta continuava encarniçada, ele fora de si puxava pela faca...", Rodrigo Paganino, Contos do Tio Joaquim, p. 120; "...primeiramente, Pirano há de puxar da durindana para a cravar no peito.", Castilho, Noite de S. João, III, 1, p. 82; "Iam à feira e o Duarte, se calhava ter de puxar pela carteira, mostrava o seu pacote de notas..", Aquilino Ribeiro, Volfrâmio, cap. II, p. 349.
   2.
Sacar, no sentido de "tirar, fruir, lucrar, auferir", "tirar com maior ou menor violência, puxar por", tanto pode ser utilizado sem preposição como com a preposição "de": "Feliz quem saca do talento e sabe tão belos frutos", Castilho, Dicionário; "sacou a espada da bainha"; "sacou o rapaz pelo braço"; "sacar do sabre"; "sacou do cacete e deu uma pancada no companheiro"; "D. Zuleima, radioso, sacou do seu escritório portátil, e... entrou a encher de garatujas uma tira de pergaminho", Rebelo da Silva, Ódio Velho não Cansa, II, cap. 16, p. 92; "Sacou de uma faca de ponta e com ela atravessou o peito da moça", Gilberto Freire, Casa Grande e Senzala, p. 298.
   3.
Saber, no sentido de "ter conhecimento, notícia ou informação", "investigar acerca de, perguntar por", constrói se com a preposição "de": "não soube da partida do amigo"; "Se os Portugueses da Idade Média não sabiam de seus avós lusitanos, acaso saberiam de seus avós ítalos, romanos...?", Oliveira Martins, História de Portugal, I, p. 4; "Per modo que se partiram logo antes que el rei mandasse saber deles...", Jorge Ferreira de Vasconcelos, Memorial da Távola Redonda, cap. 39, p. 270; "...apareceu... a saber do doente que não via desde a véspera...", Sanches de Frias, Ersília, cap. 20, p. 374.
   4.
Gozar, no sentido de "aproveitar, fruir, disfrutar, apreciar", usa se sem preposição ou com a preposição "de": "que nos deixem gozar da vossa companhia, é o que queremos"; "circunvago os olhos e deambulo depois à roda, para gozar das perspectivas da massa gótica", Ricardo Jorge, Canhenho dum Vagamundo, p. 53; "lhe deixou boa casa, e muita frescura de anos, e óptima disposição para se gozar de tudo isto.", Camilo, Doze Casamentos Felizes, p. 15.
   5.
Chamar, no sentido de "gritar por alguém ou por alguma coisa", constrói se com a preposição "por": "o pai chamou pelo filho"; "a mulher chamou por socorro".
M.R.M.R.

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Discurso directo/direto – Pontuação

Pergunta/Resposta

   Usa se ponto final no fim de uma frase no discurso directo antes do travessão que a separa do discurso indirecto? Isto é, qual seria a opção correcta:
   – Vou passear. – disse a Joana
   ou
   – Vou passear – disse a Joana
   E, tendo em conta o exemplo, "disse" escreve se sempre com letra minúscula? E no caso:
   Posso ir passear? – perguntou a Joana.
   Deve se escrever "perguntou" com maiúscula ou minúscula?
   Obrigada.
Rita Alves

Portugal

   Repare que a primeira frase que apresenta pode ser escrita: `Vou passear, disse a Joana.´; na qual a vírgula marca a transição do discurso directo/direto para o indirecto/indireto. Tradicionalmente, porém, esta transição é feita com o travessão (que pessoalmente não uso para outros fins, para evitar confusões). Então o travessão substitui a vírgula, e a frase, fica: `Vou passear – disse a Joana.´
   Resumindo, quando o verbo declarativo é imediatamente introduzido para identificar o interlocutor, é costume a separação ser feita só com o travessão e o declarativo ser escrito com inicial minúscula.
   Quanto à segunda frase, o critério é semelhante. Muitos autores, mesmo num só tipo de discurso, continuam com minúscula depois duma interrogação ou duma exclamação quando não há pausa no seguimento das ideias/idéias; e a sua frase, com separação fica: `Posso ir passear? – perguntou a Joana.´.
   Note que as frases acima também se poderiam escrever: `A Joana disse: – Vou passear.´; `A Joana perguntou: – Posso ir passear?´; e, neste caso, já a mudança dos discursos obriga à maiúscula.
   Claro que estas regras se aplicam a quem deseja seguir o processo clássico. Modernamente, muitos autores tentam libertar se de regras rígidas (não usam travessão a separar discursos, evitam declarativos, não respeitam as regras da pontuação, etc.). Eu próprio também já ultimamente abandonei algumas (como, por exemplo, o sistema de mudar sempre de parágrafo quando muda o interlocutor); mas considero indispensável que, respeitando o leitor, no texto se entenda sempre bem quem fala e que se distinga convenientemente o discurso do narrador do das personagens (o que nem sempre se verifica nalgumas obras da nova vaga de escrever mais descontraída...).
   Ao seu dispor,
D´ Silvas Filho

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"Pois é": pronúncia

Pergunta/Resposta

   Sou estudante de Coimbra e apenas gostaria de perguntar como se pronuncia uma palavra terminada em s quando a seguinte se incia por uma vogal. Por exemplo, a expressão: "pois é". Lê se "poijé" ou "poizé"? Obrigada.
Carla Simões

Coimbra
Portugal

   Lê se como se fosse uma só palavra, com o s intervocálico a valer de z que é o seu valor normal nesta posição: pois é = *poisé /poizé/.
   A outra pronúncia, que ainda é infantil ou animada, não é dialectal.
F. V. Peixoto da Fonseca

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Grosso modo

Pergunta/Resposta

   Gostaria de saber se antes da expressão grosso modo se usa a preposição "a", e se ela pode aparecer no início das frases, e como.
Carolina Gaudencio
Estudante de Direito
São Paulo
Brasil

   O Dicionário de Questões Vernáculas de Napoleão Mendes de Almeida diz, na entrada Grosso modo, o seguinte:
   "Locução latina ('de modo grosseiro') que significa 'por alto', 'resumidamente', 'de modo geral': 'Julgando o caso
grosso modo, digo que eu teria agido de igual maneira'.
   
"Devemos ter cuidado de não fazer anteceder a locução da preposição a; seria erro dizer 'julgando o caso a grosso modo', erro idêntico de quem dissesse 'cum data venia' (ou 'cum bona venia'); o ablativo latino encerra por si circunstância de modo ou de meio, sem nenhuma preposição."
   
O
Dicionário de Dificuldades da Língua Portuguesa de Domingos Paschoal Cegalla diz, por outras palavras, a mesma coisa.
C.M.

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Tema

Parece acreditarem / parecem acreditar

Pergunta/Resposta

   António Barreto escreve hoje que "...os subscritores parece acreditarem...". Eu escreveria "... parecem acreditar...".
   Estarei errado?
Paulo Marques
Portugal

   É uma questão de estilo: o verbo parecer, quando no sentido de dar a impressão, seguido de infinitivo admite as duas construções. Napoleão Mendes de Almeida, no seu excelente Dicionário de Questões Vernáculas (ed. Livraria Ciência e Tecnologia Editora, São Paulo, Brasil) explica pormenorizadamente as razões das duas flexões: «(...) Tanto podemos dizer "Eles parecem estar doentes" como "Eles parece estarem doentes". No primeiro caso ("Eles parecem estar doentes") o verbo parecer está empregado como verbo de ligação, sendo seu predicado "estar doentes": Eles (sujeito) parecem (verbo de ligação) estar doentes (predicativo). No segundo caso ("Eles parece estarem doentes") o verbo parecer está empregado intransitivamente, isto é, com sentido completo, e é seu sujeito "estarem doentes", equivalendo a oração a "Parece estarem eles doentes" (suj de parece) ou "Parece que eles estão doentes (suj. de parece). O verbo parecer, pois, quando o sujeito da oração está no plural, faculta estas duas construções: 1. Eles parecem estar doentes. 2. Eles parece estarem doentes. Nada, portanto, deverá estranhar nos a flexão do infinito quando o verbo parecer estiver no singular, nem a não flexão do infinitivo quando o verbo parecer vier no plural: "Escudos que os compridos saios de malha pareciam tornar se inúteis" – "Que pareciam desprezar as tribos berberes" – "Que parece entoarem lhes já o hino da morte" – "Lanças que parecia encaminharem se" – "Os quais lhes pareceu dirigirem se para os lados do célebre mosteiro" – "Tais condições me parecia reunirem se..."». Veja ainda nas Respostas Anteriores/Regência de parecer a explicação do dr. José Neves Henriques.
J.M.C.

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Vírgula depois de e

Pergunta/Resposta

   A minha dúvida é a seguinte: tem me sido dito que não é gramaticalmente correcto colocar vírgulas depois dos "e" (Ex.: "...e, se pretender,...") devido ao sentido de continuação que este já implica e que conjuntamente com a vírgula seria exacerbado. Pode se ou não?

Pedro Dinis Couto
Portugal

Resposta

   Não é incorrecto (é até necessário) o uso da vírgula nos casos que aponta, se à conjunção coordenativa copulativa "e" se seguir, por exemplo, uma oração intercalada. Atente na frase: "a conversa azedou e, disse me ele, não ficou por ali". A vírgula é aqui obrigatória, e a continuidade do sentido não se perde pelo facto de a colocarmos depois da conjunção copulativa.
   Há, no entanto, casos em que a vírgula é facultativa, e então não se deve "descoser" o discurso que tem um ritmo e uma unidade própria. Mas aí já estaremos perante uma questão de estilo, não de gramática.

Ciberdúvidas ( http://www.ciberduvidas.com)

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Marketing relacional

Pergunta

   O que é o marketing relacional?

Ana Piçarra
Portugal

Resposta

   Tradicionalmente, o marketing está orientado para promover a venda de produtos. O marketing relacional adopta uma perspectiva diferente: o seu propósito é criar e consolidar relações com pessoas, na convicção de que um bom entendimento dos seus gostos e preferências conduzirá, quase naturalmente, ao sucesso comercial.
   As estratégias de marketing relacional são particularmente relevantes sempre que o cliente sente a necessidade de apoio seja antes da compra (serviço pré venda), seja ao utilizar o bem ou serviço em causa (serviço pós venda). Por outras palavras, a validade do conceito depende estreitamente da importância da componente de serviço associada à transacção entre produtor e consumidor. Assim, o marketing relacional é hoje muito popular em mercados de bens duradouros (exemplo: automóveis), mas também, mais genericamente, em diversíssimos mercados de serviços (exemplo: bancos e seguros).

João Pinto e Castro

Ciberdúvidas ( http://www.ciberduvidas.com)

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"Homebanking" / "homepage" / "scanner"

Pergunta/Resposta

   Tenho as seguintes perguntas de uma aluna que está a escrever a sua tese de licenciatura:
   1) Como é que em Portugal se lida com os anglicismos? São considerados erros, são incorporados mais ou menos livremente?
   2) Existem expressões portuguesas para as seguintes palavras:
   – homebanking
   – scanner
   – homepage?
   Agradeço a atenção.

Beatriz de Medeiros Silva
Alemanha

   Sugerimos que, quanto ao emprego de estrangeirismos, veja as respostas anteriores.
   O neologismo "
homebanking" é, de certo modo, "o banco em casa": o serviço da Internet que permite aos clientes dos bancos movimentar as suas contas sem sair de casa ou do local de trabalho. Talvez possa traduzir se por ciberbanco, banco electrónico, etc.
   
"
Scanner" tem aportuguesamento controverso no Dicionário da Academia das Ciências: scâner. No Ciberdúvidas, há quem prefira empregar digitalizador ou o termo inglês entre aspas.
   
Homepage significa página inicial ou página principal de um sítio ("site") da Internet.

   Ciberdúvidas ( http://www.ciberduvidas.com)

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0 assassino era o escriba
Meu professor de análise sintática era o tipo do sujeito inexistente. Um pleonasmo, o principal predicado de sua vida, regular como um paradigma da primeira conjugação. Entre uma oração subordinada e um adjunto adverbial, ele não tinha dúvidas: sempre achava um jeito assindético de nos torturar com um aposto.
Casou com uma regência.
Foi infeliz.
Era possessivo como um pronome.
E ela era bitransitiva.
Tentou ir para os EUA.
Não deu.
Acharam um artigo indefinido em sua bagagem.
A interjeição de bigode declinava partículas expletivas, conectivos e agentes da passiva o tempo todo.
Um dia, matei o com um objeto direto na cabeça.
(LEMINSKI, Paulo. Caprichos e relaxos. São Paulo: Brasiliense, 1983)

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Tema

Pleonasmos (viciosos)

Pergunta/Resposta

   Eu classifico frase como: "Entrar para dentro", "Sair para fora", "Subir para cima" ou "Descer para baixo" metáforas viciosas.
   Estou correta?
Marivania

Brasil

   Não se trata de metáforas, mas sim de pleonasmos. Metáforas são figuras de retórica; pleonasmos são figuras de sintaxe, muitas vezes usadas na linguagem familiar para reforçar o sentido das frases e dar lhes expressividade. Não é o caso de alguns que vemos na comunicação social, como "todos foram unânimes", esses sim, pleonasmos viciosos.

Ciberdúvidas ( http://www.ciberduvidas.com)

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Tema

Expressões adverbiais e o uso da vírgula

Pergunta/Resposta

   Tenho algumas dúvidas sobre a utilização da vírgula em algumas expressões adverbiais. Em particular, não sei até que ponto a entoação que se quer conferir à frase pode ser um factor determinante para a introdução ou não da vírgula. Por este motivo, gostaria de pedir a vossa opinião sobre o uso da vírgula nos seguintes exemplos:

   (1) Podemos, efectivamente/com efeito, concluir que...
   (2) Podemos concluir, efectivamente, que...
   (3) Efectivamente, podemos concluir que...
   (4)Podemos, assim, concluir que...
   (5) Podemos, de certo modo, dizer que...
   (6) Ele é, provavelmente, o melhor aluno.
   (7) Os nórdicos são, em geral, altos.

Rui Silva
professor
Portugal

   Relativamente à virgulação dos advérbios, Sá Nogueira é taxativo: «Os advérbios pospõem se em regra aos verbos, mas também podem antepor se, e, quer num caso quer no outro, nunca se separam por vírgulas, a não ser quando haja alguma intercalação».
   Não serei tão peremptória, mas os advérbio de modo terminados em
mente sistematicamente colocados entre vírgulas quebram a sequência da frase e podem prejudicar a sua clareza.
   Tirando dois ou três casos, a obrigatoriedade da vírgula não é regra que não admita excepção. Quem escreve é que sabe onde quer pôr mais expressividade, como pode exprimir mais claramente as suas ideias. Nos exemplos que apresenta, pode sempre prescindir da vírgula (excepto para separar as palavras ou expressões de teor intercalado ou explicativo
com efeito; assim; de certo modo; em geral). Depende do contexto, do ritmo do discurso, do estilo do autor. Cf. Uso da vírgula, outra vez.

Teresa Álvares
Ciberdúvidas ( http://www.ciberduvidas.com)

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Tema

Euro. Maiúscula, plural, subdivisão, símbolo, etc.

Pergunta/Resposta

   Estamos a um ano de trocarmos os velhos escudos pelos novos euros e ainda há muitas coisas que desconhecemos sobre como será o dia a dia com a moeda europeia nos bolsos. Procurei resposta às perguntas que vou colocar, quer no Ciberdúvidas quer noutros 'sites' (incluindo o do próprio Banco Central Europeu), mas a informação que encontrei não era conclusiva ou, acho eu, já deve estar desactualizada.
   As minhas dúvidas são:
   1. Tal como acontece com "escudo", "real" ou "dólar", a palavra "euro" é um substantivo comum e, por isso, pode se escrever em minúsculas? Sim ou não? Porque vejo muitas vezes escrito "o Euro" ou mesmo "o EURO", como se fossem as iniciais de qualquer coisa.
   2. Em português, o euro tem plural? Está correcto dizermos "euros"? Porque vejo muitas vezes, mesmo em textos publicados por bancos portugueses, escrito "conversão de escudos para euro", por exemplo, o que não me parece correcto.
   3. Oficialmente, já há nome aprovado para designar a subdivisão do euro? Tenho visto "cêntimos", "centavos", "centavos do euro" e apenas "cents". "Centavo" parece me a forma mais correcta, mas acho que o "cêntimo" está a ganhar terreno rapidamente!
   4. Qual é o símbolo que separa as unidades do euro das suas subdivisões? É a vírgula ou o ponto? Eu acho que em português deve ser a vírgula mas tem se visto muita gente, nomeadamente no "Jornal de Economia" da RTP, a utilizar sempre o ponto. Trata se de anglicismo?
   5. Por último, em português o símbolo do euro deve ser colocado antes ou depois do valor? É que eu tenho visto das duas maneiras. Nós em Portugal não temos prática nestas questões, porque entre nós o cifrão era tradicionalmente utilizado para separar os escudos dos centavos (quando ainda os havia, é claro), mas não creio que o mesmo se irá passar com o euro.
   Não sei a quem caberá esta responsabilidade em Portugal, mas eu acho que era muito importante que estas questões fossem rapidamente definidas e comunicadas aos portugueses. Já bem basta a confusão que vai ser mudar a nossa estrutura mental de quantificar o valor material das coisas!
   Muito obrigado. Continuem o bom trabalho!

Manuel de Sousa
Profissional de marketing
Porto
Portugal

   1. Maiúscula inicial Substantivo próprio é o nome particular de um determinado ser. Substantivo comum é um nome aplicável a seres da mesma espécie. Portanto, eu digo `o Euro é a moeda da Europa´. Mas digo `um euro´, quando se trata do valor expresso nessa moeda, porque estou a referir me, por exemplo, a uma moeda unitária do Euro, e haverá muitas.
   2.
Plural Duas moedas unitárias do Euro são dois euros. Uma nota que represente o valor de cem moedas unitárias do Euro, são cem euros.
   3.
Subdivisão Em Portugal, como designação habitual nas moedas, a centésima parte de um euro deve dizer se um centavo (avos são fracções/frações da unidade: um centavo = um de cem avos de um euro). Mas é possível que, por uma questão de uniformização na União Europeia/Européia, se passe a generalizar a designação de cêntimo para a centésima parte de um euro, como acontece com a centésima parte das moedas de muitos países (ex.: França, Bélgica, Suíça, etc.). Se a abreviatura adoptada/adotada for cents., também serve para centavos.
   4.
Separação dos decimais Em Portugal está oficializado que as casas decimais são separadas por vírgula. Mas também está oficializado que não se deve usar o ponto para separar milhares. Portanto, se, como está a ser hábito na notação internacional, aparecer um ponto a separar decimais, esse ponto é equivalente/eqüivalente à nossa vírgula. Quando se escreve só para portugueses, recomendo a vírgula.
   5.
Abreviatura e símbolo do Euro O nosso cifrão já está a desaparecer em muitos casos, incluindo as décimas à direita, ou a ser substituído por ponto. Tanto faz escrever: PTE 8 000, como 8 000 PTE (mas é esta representação que se está a generalizar); EUR 40, como 40 EUR (mas é esta que se está a generalizar). Quanto ao símbolo, penso que se deverá escrever ¤ 40.
   Este parecer é a minha opinião pessoal. Mas não tenho a pretensão de que possa fazer lei. Se algum dos nossos correspondentes puder dar outras sugestões úteis, agradecemos que nos escreva.
   Ao seu dispor.
   Cf. Centavos e não cêntimos, Euro e seus centavos, As centenas de centavos e Euro, de novo.

D´ Silvas Filho

Ciberdúvidas ( http://www.ciberduvidas.com