Tio Olavo 4
por Edson Athaíde
 

 

Manhattan Connection

No momento que escrevo esta crónica estou em Nova Iorque (não pergunte o "porquê?" porque é falta de educação) e estar em Nova Iorque é como estar no coração do mundo publicitário e capitalista. Daí ter decidido escrever para este jomal alguns apontamentos que me foram surgindo aqui e ali...

Vejo um cartaz da IBM na traseira de um autocarro a dizer: "Entregador de pizza, bom aluno, surfista e dono da sua própria empresa de software, ou seja: um porco capitalista." Esta afirmação é totalmente verdadeira tudo neste país pode ser uma empresa. E se lembramos que um dia Bill Gates também tinha uma empresa de fundo de quintal, fica fácil compreender a força deste anúncio.

Vejo um anúncio de TV. Um casal encontra se num ambiente às penumbras. Enquanto eles se vão preparando para o romance, ouvimos um locutor a dizer coisas sensuais com voz rouca. Quando a coisa chegou a um ponto de não retorno, a rapariga pergunta: "E agora?" E ele responde, com uma voz cheia de malícia: "Que tal uma lâmpada packshot. Lâmpadas G & E iluminam a sua vida."

A última tendência do marketing a ser discutida aqui é o chamado marketing em tempo real. Em linhas gerais (vou guardar o assunto para uma crónica mais para a frente) trata se de considerar o impacte das novas tecnologias de informação nas atitudes do mercado e dos consumidores. Ou seja, num mundo cada vez mais competitivo, indiferenciado do ponto de vista dos produtos e disperso por natureza, irá ganhar quem for mais rápido e que reveja todos os dias os seus cenários.

Na era do marketing em tempo real não há como ser fiel a estratégias predefinidas. O importante é não perder nenhuma oportunidade de demonstrar e alimentar a relação pessoal com o cliente. Quando tiver mais espaço, vamos discutir isto mais profundamente.

Ou como dizia o meu tio Olavo:
"Pesquisas indicam que 50 % dos americanos traem as mulheres nos Estados Unidos. Os outros 50 % traem as mulheres na Europa".

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A Nostradamus do "marketing"

Tendências. Quem trabalha em publicidade e marketing sabe a importância desta palavra. Passamos a vida a discutir as tendências, a procurar novas tendências, a tentar estar na crista da onda das tendências nacionais e intemacionais.
Somos escravos das tendências, até porque nunca sabemos exactamente para onde vai o mundo, apenas temos a certeza de que tendencialmente ele vai continuar a girar. E nós vamos atrás.
De vez em quando divirto me a reler livros que num passado recente tentavam desvendar o futuro através das tendências sociais. Um belo exemplo disto é o livro Relatório Popcorn, escrito nos princípios dos anos 90 pela americana Faith Popcom. Na época da sua publicação, a revista Fortuna classificou Popcorn como a Nostradamus do marketing. E, de certa maneira, tinha razão.
Popcom previu tudo (ou quase tudo) o que está a acontecer na nossa actual vida de consumidores. Apesar de escrever sobre (e para) os EUA, Popcom não poderia ser mais precisa sobre tendências que iriam ganhar vida em boa parte do planeta.
Popcorn escreveu coisas como: "Pela primeira vez na história da humanidade, a selva é mais segura do que a civilização. Pela primeira vez na história, somos nós a nova espécie em extinção." A partir destas premissas, Popcorn teceu um completo relatório sobre teorias que, passados dez anos, se tomaram práticas. E inventou termos e jargões que se aplicam perfeitamente à nossa era da informação, do hedonismo e entretenimento.
Popcom falou de coisas como a "Aventura da Fantasia" (a era modema aguça o nosso desejo de caminhos desconhecidos); o "Consumidor Vigilante" (o mercado deixa de estar exclusivamente nas mãos dos "marqueteiros" e passa a ser manipulado pelos consumidores através de protestos, pressões e políticas); a "Egonomia" (a impessoalidade numa sociedade dominada pelos computadores gera o desejo pela afirmação do ego de cada um); o "Encasulamento" (cada vez sentimos mais necessidade de nos proteger da realidade dura e imprevisível do mundo externo); as "99 Vidas" (o nosso alucinante ritmo de vida faz nos assumir diferentes papéis, provocando uma espécie de esquizofrenia social).
Faith Popcorn apontou várias tendências de mercado para quem estivesse interessado em desenvolver novos produtos. Falou de "Costura para as Massas", que nada mais é do que fazer produtos de qualidade, falsamente personalizados e distribuídos em grande escala.
Teorizou sobre as "Crianças da Geração Chave de Casa", aquelas que "vêm da escola e chegam numa casa vazia. Elas abrem a porta para elas mesmas, são reponsáveis pelas compras do supermercado e pelas próprias refeições".
Pelo caminho, Popcom intuiu que os anos 90 seriam uma espécie de "Década da Decência", ou seja, um período onde as empresas e os consumdores inverteriam os valores tradicionais de mercado (lucro, impacte, sucesso a qualquer preço) por um comprometimento (nem que seja falso e demagógico) como os três "E": Ecologia, Educação e Etica.
A páginas tantas, Popcom perguntou: "O que acontecerá em seguida? O que acontece quando tudo o que está nas prateleiras das lojas está de acordo com as tendências? Quando a diversidade (e a perversidade) da natureza humana começa a reafirmar se? De onde virão as novas tendências? (...) Moldar o seu produto de acordo com uma tendência é como apanhar um vento de popa. Se o apanhar certo, a sua energia levá lo á para a frente. Rápido. (...) O segredo de moldar tendências é descobrir o que elas têm em comum com as qualidades intrínsecas do seu produto e moldá las de acordo com o seu produto e estratégia."
Popcom até pode ser a Nostradamus do marketing, mas acho que a senhora não advinhou nada. Apenas estudou bastante, pensou o suficiente e escreveu sobre o que sabia. Nem mais. Imagine se todos os "marqueteiros" do mundo fizessem o mesmo.
Ou como diria o meu Tio Olavo: "Atire uma bola de cristal e veja onde caiu. Só pode confiar nela até esse ponto"

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Os novos "hippies"

Este sábado tive a honra de poder participar na sessão de encerramento do 6° Congresso dos Jovens Empresários promovido pela ANJE. Esta minha participação fazia parte de um painel sobre o que será a juventude do futuro. Foi me pedido que criasse três cenários possíveis sobre o que serão os jovens daqui a 30 anos. Estes cenários seriam votados pela plateia assistente e também seria disponibilizado na Internet durante alguns dias para que os intenautas os votassem. Foi o que foi feito.

Um dos cenários que apresentei intitulava se "O Fim da Juventude". E partia da premissa de que com o cada vez mais excessivo volume de informação a que as crianças são submetidas, o mito da "ingenuidade" infantil iria acabar por ruir. As crianças passariam então directamente para a idade adulta, sem terem tempo para a adolescência.

Não é um cenário tão fictício como isso. No fundo, não passa de uma extrapolação do que hoje em dia já acontece com os nossos filhos, sobrinhos e netos. A diferença é que no futuro a sociedade iria tomar consciência disto e iria exigir dos jovens um grau de responsabilização dos seus actos bem mais alargada do que a actual. Além de um maior envolvimento dos jovens em actividades produtivas.

O segundo cenário chamava se "A Geração Y". O que propunha aqui é que a massificação de mitos, símbolos e marcas a nível mundial acabaria por criar uma geração global. Outra vez, a previsão não passa de uma projecção das tendências actuais. Os jovens de hoje já estão próximo de ser uma geração global. Estudos sociológicos comprovam isto. A diferenciação está a deixar de ser um objectivo da juventude e está a dar lugar a uma padronização de hábitos e comportamentos.

O último cenário pregava o aparecimento dos "Novos Hippies". Ou seja, mais cedo ou mais tarde os jovens do planeta depois de uma geração "padronizada" iriam voltar a contestar o sistema. Inspirados pelos ideais hippies, protestariam em massa contra a sociedade estabelecida. Só que em vez de irem em massa para Woodstock para dançarem nus, ficariam nus em casa e fariam megaeventos através da Internet. Todas as ideologias do movimento seriam divulgadas pela web e ganhariam uma força planetária de maneira instantânea.

Para minha surpresa, adivinhe que cenário ganhou, tanto na votação do plenário como na virtual?

O terceiro, justamente o mais utópico, o mais lúdico, o menos baseado na realidade.
A única ilacção que posso tirar desta vitória é a de que há um certo desencantamento geral sobre as tendências apontadas pelo presente e uma esperança de que o futuro não seja nada daquilo que antevemos hoje.
É natural que assim seja. O ser humano lida mal com a sua realidade. Provavelmente muitos dos votantes gostariam de abandonar os seus empregos, a suas empresas, as suas responsabilidades. Se pudessem deixariam de usar os sabonetes, os pentes e as pastas de dentes. Mandariam as gravatas às urtigas e cairiam na farra ao som do Bob Dylan. Eu, pelo menos, não acharia lá má ideia.
E só para encerrar, a título de piada, um dos votantes da Internet mandou a seguinte mensagem: "No futuro, vão deixar de existir os gajos e também as gajas. No futuro vai ser tudo malta".
Acho que devemos pensar um bocadinho sobre isto.
Ou como diria o meu Tio Olavo: "Toda gente é revolucionária aos 20 e reaccionária aos 40."