Tio Olavo 5
por Edson Athaíde
 

 

A idade do armário

A adolescência é um período marcado por fortes dores de espírito e perturbações. Não sou especialista no assunto, não tenho filhos e os meus sobrinhos ainda mal abandonaram as chuchas. Mas, como publicitário, tenho a obrigação de perceber os perfis psicológicos dos consumidores.
Ou não? Para uma boa parte dos criativos publicitários a resposta é negatita. Quem tem que se preocupar com isso é o departamento de pesquisa, ou o de meios, ou, no máximo, os accounts. Criativo tem que ter liberdade de criar. E o conhecimento sobre o outro pode vir perfeitamente através da graça do divino Espírito Santo.
Destaco esta contradição apenas como ponte para o verdadeiro assunto: estamos a passar por um período de adolescência na criatividade publicitária nacional.
Costumo dizer que o início dos anos 90 marcaram o aparecimento de uma nova linguagem verbal e estética na publicidade portuguesa. Nada de mais. Os mercados vivem de ciclos. Ninguém fundou nada. A publicidade portuguesa já existia e era feita correctamente, com outros valores e de outra maneira. Os anos 90 serviram apenas para sublinhar a importância do conteúdo criativo dos anúncios e a sua adaptação ao gosto do consumidor médio dos grandes centros urbanos do País.
Passados quase dez anos, o que resulta é um novo panorama. Alguns publicitários que marcaram o início do processo envelheceram, amadureceram, ocuparam cargos de chefia ou puramente desapareceram na poeira dos dias. Toda uma legião de novos criativos (alguns potencialmente tão bons como muitos dos seus "professores") surgiu e labuta diariamente na dura e difícil missão de fazer anúncios. Mas algo perdeu se (ou vem a se perder) nesta passagem de testemunho.
A culpa não é obviamente dos mais novos. Mas a geração antiga (à qual pertenço) não está a demonstrar capacidade de formar publicitários de corpo inteiro e não apenas uns tipos alegres que entre uma festa e outra são capazes de cometer desarrincanços.
Está a faltar marketing no discurso criativo. Está a faltar a noção de empresa, a noção de mercado como um todo (numa lógica económica, que inclui os mercados onde os clientes actuam e não apenas a bolsa de valores dos profissionais da área criativa). Está a faltar portanto conteúdo, consistência, espírito de missão.
Não estou a dizer que este é um defeito de todos. Não. Há honrosas exepções. Mas o fenómeno existe e sequer é estritamente nacional. Directores criativos do Brasil, Argentina e Espanha reclamam do mesmo.
Todos apontam para as mesmas causas: a ditadura dos anúncios fantasmas, o império dos prémios, o desinvestimento das agências em formação (com que dinheiro, se tudo vai em salários e inscrições em festivais?) e a rapidez com que os jovens profissionais alcançam o estatuto de senores.
Não tenho nada contra os jovens profissionais. Sempre apostei neles. A publicidade vive (sempre viveu) de sangue novo. Apenas acho que é necessária uma certa reflexão da parte de quem tem idade para isto. E que novos rumos sejam apontados para os mais novos. Só assim vamos sair da nossa adolescência de mercado. E atingir uma nova maturidade.

Ou como diria o meu Tio Olavo: "Adolescente é um indivíduo novo de mais para ser responsável e velho de mais para levar umas palmadinhas no rabo."

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Megabarracas

Mega ideias, me gaprojectos, mega investimentos e, surpreendentemente. megafracassos.
Se dizem que dinheiro não é tudo na vida, algumas grandes empresas no mundo têm todos os motivos para confirmar esta máxima.
É o caso da Iridium (consórcio de empresas liderado pela Motorola), que decretou recentemente a sua falência. Seria apenas mais uma companhia em dificuldades, não fosse uma companhia de mais de mil milhões de contos. Em serviço há menos de um ano, a Iridium propunha uma coisa fenomenal: a possibilidade de falar pelo telefone de qualquer parte do planeta, através de uma sofisticada (e cara) rede de 66 satélites. Seria a independência final do ser humano, o poder total da comunicação através de um aparelho que cabe no bolso do fato. Pena que não deu certo. E porquê? O próprio presidente da Iridium, John Richardson, responde: "O nosso marketing foi inepto."
Ora, ora, afinal o marketing serve para alguma coisa mais do que fazer bonecos. É perverso dizer isto, mas só quando uma empresa assume o seu fracasso devido a uma má estratégia de marketing é que descobrimos a real dimensão desta ferramenta no sucesso das outras.
A verdade é que a Iridium esbarrou num pequeno detalhe: não funcionava. Ou melhor, não funcionava como os tipos disseram que iria funcionar. O que em comunicação chamamos de over promisse. Ou, numa tradução pouco literal, "banha da cobra".
Se a Iridium não tivesse ficado tão encantada com o que diziam os seus técnicos, talvez visse a realidade: ninguém está disposto a pagar uma fortuna para falar por um telefone em que a chamada cai, 0 som e péssimo e raras vezes chega sequer a funcionar. Você até pode dizer que os telemóveis eram assim antigamente (aliás, como se tivessem deixado de ser). A diferença é que os telemóveis eram revolucionários por completo, eram uma total novidade e o seu lançamento esteve a cargo de milhares de empresas. Umas acertaram nas suas estratégias de marketing, outras faleceram com o telelé nas mãos. No caso da Iridium, eles pagaram o "pato" de serem os primeiros e únicos. Se desse certo, teriam o monopólio, se desse errado, o fracasso imediato. Venceu a segunda hipótese. Pelo menos até agora.
Outro consórcio de empresas, a americana GlobeStar, está prestes a inaugurar o seu serviço que é a cara chapada da Iridium. Se calhar fazem a coisa direitinha e têem melhor futuro.
Quase em simultaneo, outra empresa global, mais pequena, mas de certeza um ícone do anos
90, também pede concordata Trata se da Planet Hollywood, uma cadeia de 80 restaurantes em todo o mundo, liderada pelos astros Bruce Willis, Arnold Schwarzenegger e Sylvester Stallone. Pelos vistos as coisas não andam a correr muito bem para projectos estrelares e megalómanos. Mas no marketing, como na vida, nada é definitivo, pode ser que a Iridium e a Planet Hollywood, se conseguirem sair do buraco de muitos milhões de dólares em que se meteram, talvez ainda consigam ver a luz no fim do túnel.

Ou como diria o meu Tio Olavo: "Na vida, fora o motorista, tudo é passageiro."

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Como ficar rico sem fazer força

E ainda há quem diga que a Internet é um meio muito interessante mas incapaz de gerar dinheiro. Não é o que pensam os jovens cineastas americanos Eduardo Sanchéz e Daniel Myrick. Graças a um bom e simples esquema de divulgação, o seu filme The Blair Witch Project tomou se na película mais rentável da história do cinema: custou 35 mil dólares e já rendeu 80 milhões.
E sabe quanto é que gastaram em publicidade e promoção para chegarem a este resultado? A resposta é apenas 15 mil dólares. É o que eu chamo de ficar rico sem fazer força. Para ter uma ideia, o Titanic para render proporcionalmente muito menos, teve de investir quase cem milhões de dólares em promoção.
Impressionado? Também eu. The Blair Witch Project não é apenas um caso de sucesso na história do cinema. É de certeza o primeiro grande caso de marketing da Intemet. E não só.
Explico: o filme não seguiu os parametros normais de uma produção de ficção. Os dois jovens realizadores contrataram três actores amadores para fazerem um filme e não explicaram exactamente o que eles iriam fazer. De dia, os três pobres ingénuos interpretavam os seus papéis para a camara. De noite, eram infernizados por todo o tipo de assombrações inventadas clandestinamente pelos realizadores. A câmara, sempre ligada, captava tanto o que era interpretado como os sustos reais. O resultado foi um falso documentário sobre três estudantes que tentavam descobrir a realidade sobre a lenda de uma bruxa e que desapareciam (assassinados?) misteriosamente.
A estratégia de divulgação foi a de criar um site na Internet em homenagem aos três estudantes. Milhões de incautos acreditaram (ou quiseram acreditar) que toda a história era mesmo realidade, que os três jovens haviam mesmo sido vítimas da sua própria curiosidade e que uma bruxa (ou melhor um psicopata) estava à solta pelos EUA a matar estudantes indefesos.
Antes mesmo do filme estrear nas salas de cinema de arte, já era um cult movie. Daí até chegar às salas de cinema comerciais americanas, foi um pulo. E daqui a pouco estará a ser exibido em todo o mundo.
O curioso por detrás de toda esta história é justamente o cruzamento entre a realidade e a fantasia. A Internet anda a baralhar definitivamente as coisas. A web acabou por transformar se numa versão do mundo. Diferentemente da televisão, que quis ser um espelho perfeito da realidade, a web está mais para o espelho mágico da madastra da Branca de Neve, que só diz a verdade quando é obrigado.
Sem a Internet, The Blair Witch Project seria mais um filme amador sem grande interesse a não ser para os amigos e pais dos realizadores. Com a Intemet, tornou se num poderoso instrumento de mistificação e num produto perfeito para o consumo. Pelo menos para quem navega pela web sem conseguir separar a fantasia da verdade. Ou seja, por toda a gente.
Ou como diria o meu Tio Olavo: "A verdade não é só muito mais incrível do que a ficção, como é muito mais difícil de inventar."

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Simpatia é quase amor

Já na faculdade, aprendi que o facto e a notícia não são sinónimos, nem sempre andam juntos e às vezes recusam se até mesmo a jantar na mesma mesa. Às vezes as notícias são muito mais interessantes que os factos. Às vezes as notícias são tão confiáveis como uma freira contrabandista de uísque. E às vezes os factos e as notícias, estes etemos desafectos, fazem as pazes e vão juntos de férias, deixando jornalistas e cronistas com a batata quente de fazer jornais a partir do nada.

Você já deve ter ouvido falar da chamada silly season, período nefasto que acontece regularmente no Verão, onde até atropelamento de papagaio vira manchete. Ao longo dos anos fui coleccionando algumas notícias típicas das silly seasons. São histórias reais que nunca teriam espaço nos jornais não fossem ter ocorrido em épocas de absoluta falta de assunto.

Uma delas aconteceu há mais ou menos um ano. Li a num jornal respeitável (logo não tenho que duvidar da sua veracidade) e vou tentar descrevê la com rigor.

Um casal decidiu passar a sua lua de mel numa longa viagem de transatlântico. Eram jovens e românticos, haviam sonhado com longos beijos ao entardecer, a ouvir o ruídos das ondas e a atirar migalhas de pão aos golfinhos. Estavam tão embevecidos com o projecto e tão, como direi, empenhados em conhecerem se biblicamente no conforto da sua caríssima cabina, que entraram navio adentro sem nem olhar para o lado. Passaram um dia dentro do quarto, provavelmente a jogar cartas ou à trívia, estas coisas singelas que os casalinhos costumam fazer durante as núpcias. O barco já estava em alto mar quando finalmente resolveram dar o ar da sua graça e fazer um passeio pelo deck. Foi então que descobriram um pequeno detalhe.

O navio havia sido alugado pela associação gay Simpatia É quase Amor. E por isto, fora o casal, todos os outros 200 passageiros eram gays. E gays alegres a sério, daqueles que decidiram aproveitar o facto de estarem longe da nossa sociedade repressora para colocar as asas (e não só) de fora.

No bar do navio, em vez de um pianista a tocar o tema de Casablanca, o que havia era um concurso da melhor imitação da Diana Ross. A piscina estava invadida por dezenas de matulões trajados apenas de fio dental a darem gritinhos histéricos cada vez que caíam na água. A quantidade de travestis no deck era tão grande que o recinto havia recebido a simpática alcunha de silycon Valley.

O casal fechou se na cabina.

Meu Deus, parece que estamos num baile de Carnaval na casa do Elton John. Viste aquele bigodudo vestido de oncinha? Foi impressão minha ou ele mandou te um beijo, Frederico?

Não vi nada, Gabriela. Estás a ficar maluca. Já disse para te deixares de coisas e relaxar. Bolas, é a nossa lua de mel.

Relaxar? Como é que eu vou relaxar? Três tipos vieram perguntar me aonde é que fiz o tratamento, pois os meus seios pareciam quase de verdade. Quase de verdade?! E aquele clone da Barbra Streisand que puxou o meu cabelo para ver se era peruca! Frederico, a culpa é tua.

Minha?! Mas a viagem foi presente do teu padrinho. Além do mais eu queria ter ido de avião para Miami. Mas vieste tu com aquela história de que não era romântico, que querias uma viagem inesquecível, pois bem, conseguiste.

Tu deverias ter percebido o que se passava assim que chegámos.

Se não tivesses exigido que eu subisse as escadas do navio contigo ao colo, talvez tivesse reparado nalguma coisa. Gabriela, estou com dor nas costas até agora. Eram mais de 40 degraus e tu não és exactamente um passarinho.

Estás a chamar me gorda?! Só faltava esta. Vou já para a casa da minha mãe.

Gaby, estamos no meio do Atlantico. Como é que vais para a casa da tua mãe? A nado?

O navio deve ter um daqueles barquinhos de salvamento que a gente vê nos filmes. Vou remando e pronto.

Com o teu peso o barquinho ainda afunda.

Cafajeste!

Gorda!

A Gabriela acabou por desistir do plano de remar de volta para casa ("Aindo dou cabo das minhas unhas!") Quando a fome apertou acabaram por ter de sair da cabina e ir ao restaurante.

Frederico, estou com medo. Acho que já repararam que eu sou mulLer. Estás a ver aqueles cinco tipos ali vestidos de cabedal e correntes de metal? Não param de cochichar e olhar para a nossa mesa. Devem estar a planear atirar me ao mar.

Gabriela, cala te e come ou sou eu que ainda te atiro ao mar.

Se continuares a tratar me assim eu vou falar com o capitão do navio e pedir o divórcio.

O que é que o capitão tem a ver com isto.

Ele não é a autoridade máxima do navio? Deve ter o poder de declarar o nosso divórcio.

Acho meio dificil. Além do mais, se reparares bem, o capitão é um dos rapazes vestidos de cabedal e correntes daquela mesa.

Gabriela saiu a correr e a chorar. Trancou o Frederico fora do quarto e o pobre teve de dormir os três dias seguintes debaixo de uma mesa do bar. Nunca mais se viram. Segundo consta, Gabriela processou a agência de viagens pela ruína do seu casamento e graves danos emocionais. Perdeu. O juiz, um senhor respeitável no dia a dia, era nas horas vagas o presidente da Simpatia É quase Amor. Frederico foi viver para Miami. E, segundo consta, a última vez que foi visto estava a passear de mãos dadas com um bigodudo vestido de oncinha.

Acredite, tudo isto é verdade. Ou melhor, quase.

Ou como diria o meu Tio Olavo: "Mais vale uma boa história na mão do que dois factos a voar."

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Nos tempos de outrora

Antigamente, o antigamente era chamado de outrora. Bons tempos aqueles em que o passado tinha um nome tão bonito e sonoro. Quem falava do outrora não falava de uma coisa qualquer. O outrora era sempre acompanhado de um suspiro fundo e uma afirmação de que algo já tinha sido muito melhor do que hoje.
Como uma vez escreveu Milôr Femandes: "Falar do passado é falar do presente pelas costas." Já falar do outrora é pior. Falar do outrora é humilhar o presente, é deixar bem claro que ele não tem futuro nenhum.
Junto com o outrora desapareceram hábitos e costumes tão bonitos como passear com a família depois da missa, ir ao cinema sábado à tarde ver o último filme da Metro ou beijar a namorada no banco da praça, a ouvir uma banda a tocar no coreto. Aliás, também desapareceram a praça, a banda, o coreto e a namorada fugiu com o homem gorila de um circo libanês.
Nos tempos de outrora, tudo era perfeito. Ou, pelo menos, parecia perfeito.
O mundo ainda não era colorido e resistia em tons de sépia contra todas as maldades. As raparigas casavam virgens, os filhos respeitavam os pais, os compromissos eram feitos para serem honrados.
Nos tempos de outrora, o homem ainda acreditava em si mesmo. Isto porque o outrora (como o homem) era um ingénuo. Não surpreende que tenha sido extinto, como também vão ser extintos os papagaios, os golfinhos e os fãs da Barbra Streisand.
Há certas invenções que só mesmo no outrora. Quer coisas mais outrora do que os berlindes, o Citroen 2 CV ou as calças à boca de sino? Está bem, está bem, os miúdos das aldeias ainda jogam aos berlindes, ainda há 2 CVa andar por aí e as calças à boca de sino voltaram à moda. Mas nada disto é hoje como era outrora. Como uma sombra não é uma pessoa, o reflexo do passado não passa de um fantasma.
Fico a pensar em para onde vão as palavras que caem em desuso. O que será que acontece com as palavras que, passados os seus momentos de glória, são relegadas ao esquecimento? Imagino que são recolhidas, como cães abandonados, por funcionários de uma qualquer repartição pública. E é lá que eles travam o seguinte diálogo.
Chefe temos um problema. Fugiu o outrora.
Não pode ser, Constantino. Já é a terceira palavra que foge este mês.
E a coisa poderia ter sido pior. Ainda conseguimos agarrar o alvíssaras, o homessa e o catadupa. Entretanto, tivemos que atirar no catatau. Acho que ele feneceu.
Não pode ter fenecido.
Acho que sim, chefe. Ele levou três tiros.
Não pode ser. Já ninguém fenece. No máximo morreu, faleceu, extinguiu se, cessou de viver. O fenecer é que feneceu, há muitos anos. Que péssimo exemplo, Constantino. Francamente, usar a palavra fenecer depois dela já estar morta... São pessoas como você que tomam o nosso trabalho difícil.
Desculpe, chefe. É que estou nervoso. Temo pelo pior só de imaginar que o outrora está por aí, livre para actuar. O que iremos fazer?
Temos que ser radicais. Carregue a sua pistola com alguns neologismos e vá já para a rua. Traga me o outrora vivo ou morto.
Está bem, está bem. Mas preferia evitar tanta violência. Às vezes, chefe, fico a pensar no que fazemos. Parece uma missão impossível, quanto mais palavras recolhemos, mais palavras temospara recolher. É como se a língua hoje em dia tramasse contra nós. Isto já foi mais fácil. Outrora.
O que disse?
Eu estava a dizer que outrora...
Arrá! Apanhei te, seu calhorda! Não te mexas senão atiro. Considere se preso, outrora. Daqui já não sais para lado nenhum. Pensavam que enganavam me. Mas sempre desconfiei que tu e o Constantino fossem cúmplices.
E como soube?
Pelo nome. Ninguém mais chama se Constantino hoje em dia.
Ou como diria o meu Tio Olavo: "Outrora as coisas eram bem diferentes. Para ter uma ideia, o ar ainda era limpo e o sexo ainda era sujo."

(No "País das Palavras" do "Diário de Notícias")

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O lado escuro da força

Você nunca ouviu falar de Ben Klassen. O tipo foi mais um dos muitos milhares de americanos inventores de bugigangas de utilidades duvidosas. Ben inventou o abridor de latas eléctrico. Não me pergunte como nem porquê ele cometeu tal coisa. Só sei que ficou rico. E não entrou para a história. Ou melhor, entrou. Mas por outro motivo.
Em 1971, Ben fundou a Igreja Mundial do Criador. E escreveu a Biblia do Homem Branco, no qual faz ataques sórdidos contra judeus, negros e todas as pessoas que não nasceram brancas. Até se suicidar, em 1993, Ben conseguiu arrebanhar ovelhas racistas em mais de 20 estados americanos. Sempre a defender o Holocausto nazi e a dizer que o cristianismo era um truque dos judeus para dominar o mundo. A morte de Ben (que, entretanto, teve o seu nome envolvido em crimes dos mais diferentes tipos) não serviu para acabar com a seita. Em 1995, um jovem do Illinois, chamado Matthew Hale, autoproclamou se o sumo pontífice da igreja de Ben. Matthew é um tipo voltado para as mais modernas técnicas de marketing. E elegeu a Internet como a grande catedral da sua igreja. Chegou até mesmo a criar um site infantil com jogos lúdicos e palavras cruzadas que ensinam os miúdos a serem racistas.
E é aí que encontramos a ligação entre a imbecilidade de tipos como Ben e Matthew e o tema desta coluna. Vivo a dizer que o marketing pode ser uma coisa socialmente aceitável. Pelo menos no sistema capitalista que vivemos. Mas de vez em quando deparo me com tristes exemplos que provam que não estou totalmente certo nas minhas afirmações.
O marketing pode ser uma poderosa e terrível arma para vender ideologias estúpidas, religiões malditas e partidos e políticos inescrupulosos. Basta juntar na mesma sala marqueteiros sem carácter, gente sem vergonha na cara, algumas ideias desprezíveis e alguns investidores e, pronto, está construído o cenário perfeito para mais alguns problemas sociais (como se o planeta precisasse de mais).
Não é de graça que a Internet está a tornar se o palco principal para a actuação destes loucos e aldrabões. É um meio rápido, barato e poderoso. Livre e democrático o suficiente para deixar expandir até mesmo o que não presta.
Matthew Hale e sua Igreja do Homem Branco estão por detrás do recente massacre de Chicago, quando um jovem resolveu aproveitar a comemoração da independência dos EUA para atirar contra membros de minorias raciais. Matou um negro e um asiático e deixou feridas outras 12 pessoas. Depois o tipo matou se. Mas é provável que a sua ausência não seja tão relevante. A Igreja do Homem Branco já é maior do que a própria Ku Klux Klan (que não actualizou os seus métodos tendo em vista as últimas tendências de mercado, perdendo adeptos).Só espero que este lado negro do marketing não cresça em Portugal. Na verdade, ele já anda por aí, disfarçado de outras coisas. Se o encontrar em alguma esquina, por favor, dê lhe um murro na cara.
Ou como diria o meu Tio Olavo: "A única diferença entre a inteligência e a estupidez humana é que a inteligência tem limites."

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O cão engarrafado

Imagine um dia ver na TV um anúncio a comunicar que a Sagres e a Superbock decidiram unir se numa única empresa. Ou seja, a tradicional rivalidade entre as duas marcas havia acabado e passavam a ser verdadeiras almas gémeas de cevada.
Dificil? Pode ser. Impossível? Nem tanto. Um cenário como este acaba de acontecer no Brasil.
Sem que ninguém esperasse, as duas mais tradicionais marcas de cervejas brasileiras (a Brahma e a Antárctica) fundiram se numa só.
Com o negócio, passam a ser a segunda maior cervejeira do mundo em volume de litros produzidos, perdendo apenas para a americana Anheuser Bush, dona da Budweiser. Ficam até à frente da holandesa Heineken. Passam também a ocupar o terceiro lugar planetário enquanto produtores de bebidas alcoólicas.
Trata se de um negócio que prevê uma facturação anual de quase 10 000 milhões de dólares. Um gigante que pretende chegar a outros países do mundo.
A fusão é um caso exemplar da nossa era de globalização. Os tipos estavam em guerra aberta há rnais de cem anos. Não havia no Brasil nada mais contrário que as duas marcas de cerveja. Eram inimigos declarados e com um marketing extremamente agressivo.
Separadas, disputavam litro a litro a hegemonia no sector. Juntas, representam mais de 70 % do mercado de cerveja brasileiro.
As declarações dos responsáveis pelas duas empresas são claras: "Se a gente não se intemacionalizar, alguém intenacionaliza a gente", declarou um alto executivo da Brahma. E arrematou: "Vamos para a briga. A nova empresa nasce com apetite para enfrentar os grandes competidores intenacionais de frente."
O consumidor brasileiro reagiu de maneira ambivalente a esta fusão. Por um lado, sentiu orgulho em saber que há uma empresa nacional com tamanha dimensão. Por outro, sentiu se defraudado nos seus gostos e interesses pessoais. Por mais que as empresas afirmem que nada mudará em relação aos seus produtos, pouca gente acredita.
O consumidor tem a certeza de que uma Brahma nunca mais será uma Brahma. E que uma Antárctica nunca mais será uma Antárctica. O consumidor teme que os sabores únicos de cada cerveja se misturem num líquido incapaz de agradar a quem quer que seja.
O caso virou motivo de discussão nacional. Por exemplo, o prestigiado cronista Zucnir Ventura da revista Época, escreveu: "A globalização é engraçada. Em vez de unificar, dividiu. fragmentou, balcanizou. E criou a mesmice planetária: o comportamento único, a cultura homogénea, a arte pasteurizada, a economia sem fronteiras, o capital predatório. Tudo com gosto de MacDonald's e Coca Cola. Não satisfeita, obriga agora o Brasil a adoptar a cerveja unica."
Se pensa que não tem nada que ver com o assunto, engana se. Os tentáculos da AmBev (o nome da empresa resultante da fusão) em breve estarão a entrar Europa adentro.
E vale sempre a pena lembrar que a Brahma andava a tentar comprar a cevejeira colombiana Santo Domingo, nada mais nada menos que a dona da Sagres. Será que a Ambev em breve estará num bar perto de si?
Ou como diria o meu tio Olavo: "A cerveja é a melhor amiga do homem. A cerveja é o cão engarrafado."

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O fim do "marketing"

Ser ou não ser latino? Eis a questão. Como qualquer jovem de qualquer país latino, cresci a ser ensinado a fazer diferente dos meus antepassados. Disseram me que se quisesse vencer na vida teria de ser organizado, frio nas minhas decisões, deveria ter sempre um plano pormenorizado para tudo, enfim, teria de ter um comportamento germânico ou, no mínimo, anglo saxão.
Foi o que fiz. Foi o que milhões de outros indivíduos nascidos em inúmeros outros países fizeram. Inclusive os de Portugal.
Se uma coisa caracterizou este século do império americano, foi o destruir quotidiano da auto estima dos povos latinos. Pelo menos em tudo aquilo que supostamente tem a ver com os aspectos práticos da vida. Nós (os povos latinos) passamos a acreditar que somos óptimos para pintar, dançar, festejar, comemorar, criar, sentir e beber. Mas somos péssimos, é óbvio, para liderar, construir, organizar, planear e fazer.
Se ficarmos apenas no terreno do marketing, a coisa fica clara. Qual é o grande guru de marketing latino? Não, não estou a falar de grandes empresários que nasceram ou são filhos ou netos de latinos. Estes não valem. Até porque no seu trabalho bebem na cartilha do anglo saxonismo.
Se quisermos ser rigorosos teremos de admitir que nos anos 80 houve uma inflexão. Apareceram as teorias de gestão orientais e uma catefrada de japoneses a arrotar postas de pescada sobre como vencer no mercado. Mas, mais uma vez, o que valia era o universo do rigor e da organização milimétrica como forma de pensar o mundo e a vida.
Pois bem, a coisa começa a mudar. Alegrem se, amigos, o planeta prova que está sempre a girar e, aparentemente, está a chegar a vez de nós (almas alegres e insensatas) darmos as cartas.
A última moda em teoria de gestão e de marketing a aparecer nos EUA é o que os gringos chamam de no marketing, ou seja, não marketing ou sem marketing, se preferirem.
Segundo estes novos teóricos, acabou o mundo do planeamento a longo prazo, dos negócios e produtos pensados por longos meses ou anos antes de serem lançados. Dos estudos rigorosos de viabilidade de mercado. Dos pré testes e pós testes infinitos. Aparentemente, não há mais tempo para nada disto. A velocidade com que hoje tudo acontece está a levar ao fracasso quem não tiver a agilidade suficiente para mudar tudo da noite para o dia.
Tal teoria é um reflexo perfeito da sociedade de informação e das novas tecnologias e da quebra das fronteiras de mercados. As modas já não duram, os gostos do consumidor transformam se em instantes. Produtos são lançados hoje do outro lado do mundo e amanhã já estão disponíveis num supermercado perto de si. A competitividade cresceu exponencialmente, o chamado know how deixou de ser um bem protegido para ser partilhado. Há novas maneiras de produzir, comunicar e distribuir. Nada mais lógico que haja uma nova maneira de planear tudo isto.
O no marketing prega que o melhor plano é não ter plano. Que não há verdades absolutas. Que os testes já chegam desactualizados às mãos dos decisores. Que as novidades já nascem velhas. E que é preciso ter um grande jogo de cintura para sobreviver a tudo isto.
Ou seja, enfim, 0 nosso jeitinho português irá servir para alguma coisa. O nosso mal afamado desenrasca vai tornar se o nosso grande património. Quem viver, verá. Eu vou.
Ou como diria o meu Tio Olavo: "Não adianta levar tudo tão a sério. Quem esquenta de mais a cabeça transforma caspa em pipoca."

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O declínio do império americano

Cada festial de Cannes fecha um ciclo. E abre outro. Cannes é o réveillon publicitário do planeta. É a Páscoa do anúncios. É o Carnaval dos spots e campanhas.
Não fui a Cannes este ano. Nem no ano passado. Sinceramente, acho o Estoril mais castiço do que aquela praia da Riviera francesa. Não ir a Cannes serve me com uma forma de preservar a minha análise sobre o trabalho lá apresentado. Estou isento da tradicional loucura canneana de achar que aquilo é o resumo perfeito da melhor publicidade do mundo.
Não é. Nunca vai ser. Nem é o objectivo do festival.
Cannes é um resumo sim. Mas é um resumo parcial. Como todos os festivais internacionais, Cannes não tem, por exemplo, a mais pequena sensibilidade a respeito da publicidade feita com sabor local. Há lá um síndroma de Que a boa publicidade é aquela com sentido universal.
Parvoíce pegada.
Um bom anúncio é aquele que fala com alguém. E este alguém costuma ter passaporte, bilhete de identidade, hábitos, gostos, culturas. Um português não pensa igual a um dinamarquês. E qual é o problema disto? Vai perguntar aos publicitários que acreditam piamente, sem deixar espaço para conversas e discussões, na chamada ideia worldwide, aquela que funciona aqui e no Ceilão, como se o Ceilão fosse ali pelos lados de Alcabideche.
A prova disto é o anúncio ganhador do Grand Prix na categoria de press & poster. Mais imbecil mpossível.
O anúncio não diz rigorosamente nada. O anúncio resume se a apresentar a foto de um casal pretensamente moderninho onde com muito esforço vemos que os seus mamilos estão deformados a representar a marca da Playstation. Não há texto, não há títulos, não há mais nada. Nem ideia. É uma foto e pronto. E nem sequer é uma boa foto.
Se calhar sou eu é que estou a ficar velho. Mas se é para fazer este tipo de publicidade e julgar se vanguarda, vou ali e já volto. Se é para assassinar décadas e décadas de saber publicitário acumulado, se é para dizer que o que fazemos no nosso dia a dia está completamente ultrapassado, prefiro então dedicar me a descobrir com é que vai ser a comunicação comercial no universo das novas tecnologias.
Se ainda tinha alguma dúvida, passo a ter certezas. Estamos a assistir o declínio do império americano no campo da publicidade. O copy strategy (baseado na ideia de que cada anúncio deve comunicar um benefício único do produto), que nada mais é do que uma sistematização de conceitos inventada pelos americanos, está cada vez mais a cair em desuso.
Se até há pouco tempo a busca da simplicidade e da clareza era a grande missão dos criativos publicitários, agora o que é considerado genial é anúncio hermético, intricado, quase impossível de ser decifrado.
Cannes serve para sinalizar coisas. Uma legião de jovens publicitários de todos os continentes vêem os anúncios premiados em Cannes como a bússola que deve guiar o seu trabalho. Já de alguns anos a esta parte, Cannes tem sinalizado que a boa publicidade é um arremedo de raciocínio bem produzido e que só pode ser entendido pelos próprios publicitários.
Deve ser por isto que cada vez mais é difícil encontrar novos publicitários que saibam fazer um folheto com pés e cabeça, anúncios com princípio, meio e fim, spots de televisão que não precisem de um tradutor para explicar o seu conteúdo, outdoors que se leiam nas ruas e peças publicitárias em geral em que se vejam o produto, a marca do cliente e, heresia das heresias, o telefone e a morada da empresa anunciante.
A culpa, é claro, não é dos organizadores do festival. A culpa é dos publicitários. E, sinceramente, nem é dos jurados. Eles apenas mimetizam o comportamento ingénuo dos mercados publicitários que representam.
E a verdade é que quem está a estabelecer (dentro dos mercados) os critérios para julgar a publicidade são tipos de pouco mais de vinte anos, que mal saíram dos cueiros, que fizeram pouquíssimas campanhas de verdade mas que já ganharam imensos prémios com os chamados anúncios fantasmas (anúncios que ninguém pediu, ninguém vai ver e que vivem e morrem em si mesmos).
Não tenho nada contra em ganhar prémios com anúncios fantasmas. Ganhar prémio é sempre bom. Mas daí a achar que um bom anúncio fantasma é uma prova da capacidade de um profissional de fazer bons anúncios reais vai uma longa distância.
Enquanto isto, a malta do marketing directo, os web designers e os profissionais de digital brand dão pulos de alegria ao ver o grau de infantilidade com que os publicitários se comportam. Eles estão a assistir de camarote o nosso longo e divertido haraquiri. Só é preciso mais meia dúzia de festivais de Cannes como este nara os clientes questionarem (como dizem os espanhóis) de uma puta vez a necessidade de fazer e pagar por um anúncio. Aí, amiguinhos, vai faltar dinheiro e emprego para todos.
Mas, se calhar, não há problema, vai sobrar tempo para ir fazer fantasmas na praia. Sinceramente, não espero estar vivo para isto.
Ou como diria o meu Tio Olavo: "Aqui se faz, aqui se paga."

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Acredite se quiser

Aterro em Lisboa depois de dez dias nos EUA. Descubro que Portugal continua no mesmo lugar, o que de certa maneira é bom, pois ficaria chateado se na minha ausência decidissem mudar o País para Porto Rico (apesar do meu espanhol ser aceitável, não danço salsa lá muito bem).
Da minha viagem, trago umas últimas notas sobre o estranho universo dos camones. Nada que seja muito profundo, mas que pelo menos pode dar uma ideia sobre o quanto (parafraseando o Vasco Pulido Valente) está cada vez mais perigoso o mundo em que vivemos.
Por exemplo: vi no canal NBC uma longa reportagem sobre os homens adoradores de gordas. Sério. E não estou a falar de gordinhas. Estou a falar de gordonas mesmo, mulheres de duzentos quilos ou mais. Não tenho nada contra a obesidade (diga se de passagem, neste momento, estou tão gordo que já perguntaram me se estou grávido de seis meses, o que é uma mentira e uma injustiça, pois só estou grávido de quatro), mas o que eles mostraram na TV assemelhava se mais a um documentário do Greenpeace do tipo "Salvem as Baleias" do que uma edição supervitaminada do 86 60 86. Primeiro apareceram as imagens de uma parada de gordas do género daquelas que os gays americanos costumam fazer. As gordas empunhavam cartazes com frases como "Força à flacidez!", "Kate Moss go home!", "Meu mundo por um Donnuts" ou "Quer dar uma voltinha com os meus pneus?". Elas desfilavam a comer nacos de pizza e hambugers tamanho familiar. Depois foi a vez de algumas gordas mostrarem os seus dotes na passerelle. Era o concurso Miss Gorda EUA, feito nos mesmos moldes que qualquer outra competição de beleza. Haviam gordas de biquinis, gordas de vestido de noite, gordas de roupa interior. A vencedora até que era simpática. Pelo que vi na TV, até que não me incomodaria em conhecê la em carne e osso. Mais carne do que osso, é claro. Mas o melhor ficou para o final. Entrevistaram o marido de uma das gordas em concurso. As declarações do tipo eram surpreendentes. Ele disse que sempre gostou de gordas, mas a sociedade o reprimia de tal forma que teve dificuldade de assumir as suas preferências. Havia namorado várias magras apenas para disfarçar. À noite saía à caça de gordas, numa vida dupla insurportável. Até que um dia resolveu acabar com a farsa. Contou aos pais o que ia na sua alma. Eles choraram um pouco, mas depois aceitaram. Hoje ele vive feliz e até ganha dinheiro com a situação. Virou produtor de vídeos eróticos com mulheres pesos pesados. Diga se de passagem, está a ficar milionário.

Outra história interessante veio nos jornais. Uma senhora casada tinha um amante. Até aí nada de mais. O problema é que o amante ficou impotente. Caridosa, a senhora decidiu presenteá lo com uma operação para colocar uma prótese de pénis. O problema é que ela não tinha dinheiro. Daí resolveu encaminhar os papéis na Segurança Social com o nome do verdadeiro marido. A operação foi feita. O resultado não foi dos mais animadores. Digamos que o pénis não havia recuperado toda a rectidão do seu carácter. A senhora e o amante resolveram processar o hospital.
Para isto pediram ajuda a um advogado. Que por coincidência nada mais era do que o tal marido. Que, surpreendentemente, não gostou nada de saber que a mulher tinha um amante com uma prótese deficiente no pénis. Resultado: a senhora e o amante estão a ser precessados pelo marido por fraude. Moral da história:
"Amiga, se vai reformar o pénis do seu amante, nunca conte com a ajuda do seu marido. Eles são demasiado egoístas para dar uma mãozinha."

Ou como diria o meu Tio Olavo (sobre as gordas): "A minha mulher está de dieta: come cocos e bananas o dia inteiro. Não é o tipo de comida que emagreça muito, mas não acredita na quantidade de calorias que ela perde ao trepar nas árvores."

Ou como diria o meu Tio Olavo (sobre 0 adultério): "O meu melhor amigo fugiu com a minha primera mulher. E quer saber de uma coisa? Sinto imensa a falta dele."

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O grande Tony Orlando

Você sabe quem é Tony Orlando? Pois é, eu também não. Ou melhor, também não sabia até ser empurrado para dentro de um teatro em Nova Iorque. A história é assim: estava distraidamente a caminhar pela Rua 52 quando hordas de japoneses e idosos louros interromperam a minha passagem e me obrigaram a entrar no Virgínia Theatre. Como faltavam cinco minutos para o início da sessão, acabei por comprar um bilhete. Não me arrependi. O espectáculo em causa chama se Smokey Joes Cafe. Não é uma peça de teatro. É mais um recital dos grandes hits de dois compositores americanos dos anos 50 e 60, responsáveis por músicas como Stand By Me, Jailhouse Rock e On Brodway. Pois bem, foi aí que descobri quem era Tony Orlando.

O grande, o maravilhoso, o inesquecível Tony Orlando ficou famoso internacionalmente aos 16 anos quando gravou a música Candida. Mais para a frente, em 1973, conquistou todos os primeiros lugares dos hit parade do planeta com a música Tie a Yellow Ribbon Round the Ole Oak Tree. Isto mesmo. Foi ele que gravou aquela porcaria. E ganhou rios de dinheiro. Tornou se vice presidente da CBS Records, passou a apresentar programas de televisão e eu nunca daria por ele se, por algum misterioso motivo, Tony Orlando não fosse o cabeça de cartaz do Smokey Joes Cafe. O tipo, um balofo bigodudo, já sem nenhuma voz, não só é a estrela do espectáculo como não pode abrir a boca nem para dar urn bocejo sem que a plateia fique histérica e comece a aplaudir. Não é normal. Aparentemente, Tony Orlando é um daqueles fenómenos locais que só os nativos compreendem.

Fenómenos como o musical Cats. Se bem que Cats seja um sucesso internacional. Passo em frente do Winter Theatre e leio na fachada: "Cats. Now and forever!" Acho que se trata de uma ameaça. Cats deve ser o pior musical já estreado na Broadway. E olha que a Broadway se farta de estrear repolhos estragados disfarçados de espectáculos.
Estou me nas tintas se Cats já está há anos em cartaz. É um equívoco. Um grande e inexplicável equívoco. Como diria o teatrólogo Nelson Rodrigues: "Toda a unanimidade é burra." Cats é uma prova disto.
Falo isto depois de ter tentado assistir àquela amálgama de miados e tipos mascarados de pantera cor de rosa. Está bem, está bem, tive azar na hora de comprar o bilhete. Pedi um lugar perto do palco. O fulano vendeu me um chamado on the stage que ficava... On the stage, literalmente. O meu lugar era em cima do palco. Basicamente eu ficava de frente para a plateia e os bailarinos ficavam de costas para mim. Resultado: a única coisa que me lembro de Cats são uns rabos a abanar e um gordo sentado na terceira fila que não parava de olhar para mim e de tirar macacos do nariz.

Nova Iorque está cheia de equívocos como este. Ainda ontem passei pelo mercado do Columbus Circle e reparei numa coisa interessante. Havia várias barracas a vender T shirts decoradas com os mais variados bonecos, desde os recentes South Park aos inevitáveis Calvin ou Simpsons. As T shirts tinham mais ou menos o mesmo preço e o mesmo gosto duvidoso. Mas uma das barracas destacava se da multidão. Era a que vendia T shirts brancas, ou seja, sem desenho, marca ou mensagem nenhuma. Estas T shirts custavam o dobro do preço. Fui perguntar porquê. Eo vendedor respondeu me: "São mais caras por trazerem a grande mensagem deste fim de milénio, que é o facto de não valer a pena trazer mensagem nenhuma. Além do mais, isto não passa de uma T shirt, não são as tábuas de Moisés. As pessoas estão dispostas a pagar para deixar claro que são inteligentes e sabem disto."
"Ok, that's America". Não sei porquê, mas estou com umas saudades loucas de comer caldo verde.

Ou como diria o meu Tio Olavo: "Em Roma, como os romanos. Nos EUA, qualquer loira que se pareça com a Brooke Shields."