Poesia 22 - Porosidade Etérea
INDICATIVO
Verdade incontroversa: a Internet e, em particular, o movimento bloguista trouxe à luz do dia um número incalculável de autores e de leitores.
A maioria, julgo, são autores que, ou não escreviam ou faziam-no para a gaveta. Muitos dos já consagrados não desdenham usar a blogosfera para mais rapidamente chegarem aos seus leitores antecipando ou mesmo ultrapassando a edição em livro.
Na literatura, em geral, e na poesia em particular, a expansão, o interesse cresce em progressão geométrica graças à Internet. Um dos resultados desse interesse, já o disse, é o espaço cada vez maior dedicado, nas livrarias, aos livros de poesia.
Há outros blogues que, não mostrando produção própria, têm como objectivo, divulgar quem escreve: consagrados ou recém chegados. Entre centenas de casos destaco o blogue da Inês Ramos a que deu o título de “porosidade etérea” onde se fala da poesia em todas as suas vertentes: poemas, eventos, notícias, efemérides, concursos, biografias de poetas, lançamento de livros, declamações, enfim, um autêntico magazine , no caso webzine, dedicado à poesia. Neste magnífico trabalho da Inês Ramos, destacam-se ainda os convites que, de vez em quando, dirige aos poetas seus visitantes para lhe enviarem trabalhos subordinados a um tema ou um género. Sem júris nem complicações adjacentes acaba por seleccionar um trabalho e dá-lhe o nome de “vencedor” cujo prémio passa pela sua sonorização.
SOBE
Poesia erótica, foi um dos recentes desafios da Inês ao qual responderam seis autores. São esses trabalhos que vamos ouvir, hoje. Rui Diniz, Constança Lucas, Luís Graça, Beatriz Barroso, Luís Pinto e António Salvado são os nomes participantes. Comecemos por ouvir “Momento” de Rui Diniz
MÚSICA
Piano de fundo,
é Jarrett em Viena,
um murmúrio
na roupa
que largamos em cena...
Umas mãos saudosas,
suaves e quentes,
invadem
teus espaços
incandescentes...
A boca de nós dois
resolve o mistério
por detrás
do sabor
de um beijo sério...
As verdades que vestimos
deixámos à porta,
que aqui dentro,
o momento,
é só o que importa...
Tens na pele
marcado
o mestrado da vida
e eu tenho na minha
suavidade contida...
Gritas e gemes
no teu mar revolto,
arrepios
atravessam-te
quando te volto...
Com as mãos na parede
eu entro em teu corpo,
vês que na verdade
ele tem estado
morto...
As mãos saudosas,
que agarram o arrepio,
são vivas lembranças
do teu rodopio...
Deixaste-me o corpo,
escorrendo prazer,
encontrei-te
nas nuvens
e refiz-te Mulher...
Se o orgasmo que soltas
for um grito infinito,
nós dois cantaremos
no prazer
deste calor...
bendito.
MÚSICA
“Foi um adeus” de Constança Lucas
MÚSICA
Foi num adeus que mais te amei
nas nossas mãos as cores cantaram
numa harmonia de saudades futuras
nos quereres contorcidos em ondas quentes
onde o lenço imaginado corria pelo vento
nas ruas da nossa cidade encantada
só de palavras e afeições longas
olhávamos as folhas em silêncio
por tanto querermos os toques
em arrepios de ternuras
lânguida corri pelo teu corpo
por nada nele deixar de querer
fiquei embevecida com o teu canto
por infinitos tempos das nossas peles
MÚSICA
“Meu falo, meu touro” de Luís Graça
MÚSICA
Meu falo, touro
em ponta, desembolado
alfange, mouro, em ronda
sempre excitado
Eu calo, rouco
e tu zonza, nua num estrado
que range, pouco
numa onda, sodomizado
Meu halo, louco
é santo divinizado
abrange in loco e conta
que é castrado
Empalo, touro
meu falo, desembolado
alfange, mouro, em ronda
foi sepultado
MÚSICA
"Invento-me" de Beatriz Barroso
MÚSICA
Invento-me neste desejo de te abraçar...
Invento-me hera, planta trepadeira,
agarro minhas gavinhas,
minhas expansões, com força,
em tuas estacas, para me poder à terra fixar...
Invento-me abelha, insecto,
Apenas para invadir a tua flor,
Que nasceu de meu desejo,
Para em teu mel, esse néctar,
a minha sede eu poder saciar ....
Invento-me leoa perdida de seu cio,
À procura de um trilho, um sinal, rasto teu,
Para que na floresta da vida,
Eu te possa encontrar...
Invento-me vento, Nortada, brisa, aragem,
Para de forma empolgada,
Agitar teu rio, ondular teu mar...
Invento-me, nestas todas metamorfoses
de ser eu própria, que trago silenciadas no meu espírito,
E ensaio-me assim, neste ser,
Nestas mil formas adoptadas,
Só porque te encontro ao inventar-me,
Mas porque te invento somente a ti!
MÚSICA
Paráfrase sobre a "Canção das Canções" de Luís Pinto
MÚSICA
Paráfrase sobre a "Canção das Canções"
Desce a noite. Despedi-me dos pastores.
Inebriado pelo perfume do mosto olho para a minha amada.
Surge-me como a aurora, bela como a lua, brilhante como o sol.
Desperta no leito de cedro coberta de penas de pomba.
A mais bela de todas as mulheres extasia-se ao ver-me.
E pelo seu corpo verdejante como floresta perfumada
Pastam rebanhos de gazelas, corços, veados saltaricando na sombra dos seus cabelos.
A sua voz doce de favos, reclama-me e extasia-me.
- Leva-me contigo, meu amado. Ou deita-te a meu lado e canta-me
amores.
Sou morena. Sou formosa. Sou tua. Ponho no meu pescoço
O colar de pérolas que exala o perfume do nosso vinho.
Repousa a tua cabeça nos meus seios, no meu ventre de lírios,
Na doçura da minha boca de frutos silvestres,
Quero desfalecer de amor nos teus braços fortes. Conforta-me.
Como és encantador e belo, meu amor. Vamos para o festim da floresta
Que já entoa a chegada da Primavera.
E introduz-me uvas passas na minha boca que espera a tua.
Saboreia a minha saliva e ouve a minha voz que te segreda palavras de conforto
Porque esta noite procurei-te e não te encontrei. Desejo ser tua
Como na primeira vez quando nos encontrámos nos outeiros.
Quero conceber dum amor frenético, penetrante, quente, aromático.
Oh! meu amado amigo e esposo. Os ninhos já estão prontos.
Escolhamos o nosso.
E faz-me ouvir a tua voz desfalecida quando me abraças e me possuis.
Como são deliciosos os teus afagos, as tuas carícias,
Os beijos com que cobres o meu corpo inteiro. O aroma que vem de ti
Excede o de todos os aromas.
Desfaleço de amor. Os teus lábios são lírios, que destilam a mirra mais preciosa.
Bebe do nosso vinho perfumado, sacia a tua sede de desejo e toma-me.
Leva-me.
Desfaleço de amor mas não tenhamos pressa.
Quando regressarem os pastores
Estamos escondidos na ilha dos amores.
MÚSICA
Finalmente vamos ouvir o poema de António Salvado, intitulado "Anelo"
MÚSICA
Quem me dera ser o vento:
tu, nua, receberias
nos teus seios meu alento.
Ou ser rosa:
a cortarias, no teu peito a deporias
como adereço opulento.
MÚSICA
Ouvimos hoje, por amabilidade da Inês Ramos os seis poemas concorrentes ao tema Poesia Erótica, organizado no seu blogue Porosidade etérea.
Até ao próximo programa
SOBE - INDICATIVO