Histórias da Publiciddade 8

 

 

A crónica do Daniel Sak...

A crónica do Daniel Sark caiu me na memória, por factos canhotos, direi melhor, de gentes ás direitas que com a esquerda faziam do bom e do melhor. Pois, bem os conheci.
Yoichi, um japonês meu assistente em 1988, para alem de surdo e mudo, tudo de mãos, fazia com a esquerda. O nosso entendimento era perfeito. Ao trabalho que o homem fazia, só faltava falar e eu limitava me a ficar espantado e sem voz.
Um belo dia, Yochi perguntou me com que mão me masturbava eu.
Sem palavras, cinicamente, mostrei me desentendido. Fiz lhe um sinal com os dedos e o Yochi lixou me, porque com papel e lápis passou a explicar me o que sabia de outros canhotos quanto á auto masturbação. Quanto mais me desentendia com aquele paciente japonês, mais rascunhos ele fazia e ao que me deu a perceber, os seus amigos com jeito na esquerda, optavam pela mão direita na satisfação de prazeres, já que a grande vantagem, residia na falta de jeito com a direita, que ao invés da esquerda, mais habilidosa, transmitiam movimentos irregulares ao pénis, provocando alguns safanões numa desrritmia infernal, até alcançarem o orgasmo. Com suaves tremuras.
Lembro também Júlio Fuertes, meu professor de pintura. Ao pequeno almoço via o besuntar torradas com a outra mão, a que menos utilizava profissionalmente. Júlio usava a mão direita em movimentos tão irregulares e desajeitados que fazia derramar a manteiga para a torrada seguinte. Bem me dizia o professor ao mastigar a primeira torrada. "Já tenho a seguinte ao alcance da mão esquerda."
Com a Margarida passava se tal e qual.
Conheci a há muitos anos em Indianápolis. Foi em Maio de 1972 que me serviu um hambúrguer a tresandar a cebola, na mesma cidade, mas servido com a mão esquerda e reparei que por cima do avental vermelho e amarelo ia dando umas coçadelas junto ás verilhas mas com a outra mão, a direita. Deu me a atenção para o centro do avental da Margarida, porque das duas uma. Ou a moça era canhota no desajeitado coçar das partes, ou não era no serviço das mesas, porque de pão com carne picada, meu amigo, entendo eu. Certo é que nunca cheguei a saber se será na contra mão que estão todos os segredos de quem usa a mão contrária. Se houver por aí alguém que me dê uma mãozinha, não direi que não.

Manuel Peres

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A IRMANDADE.

Caros Amigos:

Sim, eu pertenço a uma irmandade Mas uma irmandade muito especial: não tem sede, não se reúne periodicamente, não tem almoços, nem ritos de iniciação e muito menos tem códigos secretos. E mesmo assim, ainda é uma irmandade: os Canhotos.
Os seus membros encontram se sempre por acaso. E só interagem depois de
reconhecerem se mutuamente.
Quase sempre é assim: uma pessoa a passar olha a outra escrevendo ou comendo com os talheres e lá vem a frase surpresa sempre acompanhada de um sorriso
"Ah....você é Canhoto....?? Pois olha, eu também....!!"
Mesmo que elas sejam pessoas completamente diferentes; uma careca, outra
cabeluda, uma torce para um time e a outra para o adversário, uma pode ser
Hippie e a outra Banqueiro, uma tem gases e a outra prisão de ventre, nada
disso interessa: a partir daí uma ligação etérea foi feita.
Digo etérea porque realmente é algo que não reverte em lucros, fama,
afinidades, nem marcar encontros ou almoçar, ou qualquer outra coisa. É
apenas um sentimento: "descobri alguém como eu".
Melhor ainda: sente se uma cumplicidade rarefeitíssima de agentes secretos
ou algo como Butch Cassidy & Sundance Kid.
Este clima inconsciente de mistério e que passa de geração em geração se
deve aos Canhotos terem sido considerados "diferentes" ao longo da história,
sendo o ápice o churrasquinho de Canhotos na época da inquisição. Ou também
por algumas denominações políticas (esquerda=comunista), ou mesmo a palavra
"sinistra" para designar a mão esquerda.
Mas, na verdade, mesmo entre os Canhotos, ocorrem categorias. Uma delas, o
Ambidestro (pertenço a esta classe) em que a maior parte é feito com a
esquerda e as poucas restantes com a direita.
Claro que ser Canhoto não é só o mistério e folclore. Alguns contorcionismos
forçados ainda permanecem no dia a dia dos Canhotos: as tesouras, os
talheres perfilados ao contrário na mesa, as borboletas* (Rio de Janeiro) ou
Catracas* (São Paulo), e principalmente o sádico abridor de latas (que
felizmente está desaparecendo, substituído pelas "aberturas fáceis").
Mas mesmo assim, os Canhotos não se consideram diminuídos socialmente, muito pelo contrário.
Por isso não são e nem querem constituir se em força política ou
reivindicatória. O motivo é que isso acabaria por desvanecer a condição de
exclusividade e mistério.
Seria como agentes secretos fazendo um partido político e saindo às ruas em
passeatas: fim imediato do glamour.
Este é um dos motivos do porquê as lojas especializadas em artigos para
canhotos não duram muito tempo: superexposição sobre o tema não combina com Canhotos.
Me recordo da mais recente loja especializada em Canhotos que encontrei há
um ano atrás (se é que ainda está aberta).
O facto é que todos paravam na montra para ver os objetos "exóticos". Sim,
ao olhar o rosto das pessoas via se claramente que continuavam
inconscientemente a consider os canhotos diferentes.
E ao aproximar me um pouquinho mais da montra, um artigo me chamou
particularmente a atenção.
Era uma t shirt que dizia em um humor cortante, algo como "Se não fôssem os
canhotos, o que seria da humanidade". E a seguir uma seguia se uma lista
enorme de canhotos famosos que incluia desde Newton a Einstein.
Gostei e já ia entrando para comprar quando parei por um instante e percebi
que eu estava em Espanha.
E que em Espanha "Canhoto" se escreve "Zurdo". E "Surdo" (de surdez) se
escreve "Sordo".
Imediatamente recuei e mentalmente imaginei me usando a t shirt em Portugal
ou no Brasil e as pessoas a passarem por mim a ler: "Si no fueran los
zurdos, lo que seria de la humanidad". E logo a seguir o comentário baixinho
entre elas: "Olha....quanta gente famosa era surda, e ele também
é....coitadinho**".

Um Abraço

Danyel Sak

*não pude encontrar palavra equivalente em Português de Portugal. Mas seria
a máquina controladora de entradas: em que se insere um ticket e que
obviamente está do lado da mão direita.

**apenas uma citação, sem intenções ofensivas aos descapacitados auditivos
que merecem todo o meu respeito e apoio

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A MULHER DE CÉSAR VAI AO HIPERMERCADO.

"Eu sou cirurgião, mas detesto ver sangue".
"Sou contabilista, mas não me venham com números e porcentagens".
"E eu mecânico: mas não gosto quando pedem para colocar a mão em motores".
"Senhores, sou bombeiro mas por favor, não me chamem para ir a um incêndio".

Estranho não? Mas às vezes não é isto que ocorre em publicidade.
Se somos profissionais temos que gostar e compreender as funções intrínsecas do nosso ofício.
Na verdade, publicidade serve para vender. De forma eficiente e bonita, claro. Por isso a publicidade não é arte, ela é (no bom sentido) o vampiro das artes: utiliza a arte (cinema, fotografia, literatura, etc.) para vender. E para fazer boa publicidade é preciso ser um vendedor.
Ocorre que a publicidade, em parte, não é mais eficaz porque alguns que pensa que ela "é algo giro, na moda". Então estes seres que pululam em algumas agências não tem o objetivo de vender, mas sim, estar na moda. Pobre cliente.
E mais: alguns até detestam o Capitalismo. Como?? Sim, detestam.
Mas como? Se estão dentro de uma das ferramentas mais importantes que ela possui: as agências.
Para citar alguns exemplos, aqui a descansar ao lado de minhas mulheres e meus cães, recordo me há uns anos atrás, de um destes seres.
Quando ouvia falar em supermercado fazia cara de nojo "hummm...eu supermercado...?" Se via passar uma camisa de chambray (aquela simples, azulzinha) disparava logo: é burguês! (por favor, contenham o riso do ridículo da frase). Isso além de "os hamburgers não vão dar certo por aqui" ou "as TVs privadas não vão dar certo porque já temos duas, e são suficientes".
Sim é claro ele era publicitário mas não podia "comprometer se com o capitalismo". Mas claro que para este ser, isso não incluia beber bons vinhos e possuir um carro do ano: a luta contra o capitalismo se centrava somente dentro da agencia, claro.
Então aos poucos conversei com ele: "Olhe, a publicidade pertence ao capitalismo. Então não seria melhor; para não conspurcar os seus princípios, ir cortar cana com os companheiros insurretos na Nicarágua? Ou tentar restaurar o comunismo na Albânia? Seria mais coerente".
Este é um dos motivos porque a publicidade não é mais eficiente: a publicidade é o capitalismo, mas as suas formas enganam e às vezes acabam por atrair seres literalmente opostos. E mais: é preciso entender não só o cliente, como os seus valores.
Sim, porque queiram ou não, a linguagem dos negócios é conservadora (isso não quer dizer sem graça) porque envolve dinheiro, money. E o fato e gravata é o seu uniforme preferencial.
Assim, se surgir um destes seres saltitantes, rasgados e na moda em uma reunião, por melhor que seja a campanha, a porcentagem de aprovação ficará diminuída em muito.
Mas então é preciso ser "sisudo"? Bem, nem tanto ao mar, nem tanto à terra.
Para isso temos que satisfazer duas condições: estar em um ambiente capitalista maduro e ter mostras dadas de que sabe o que faz.
Exemplos claros disso são Steve Jobs (da Apple, Pixar), Sam Walton (Wal Mart) e Philippe Starck.
Eles podem. Pois além de estar em um ambiente de total maturidade capitalista, em que os personagens de ambos os lados estão aptos a interagir por um objectivo comum, todavia tem mostras dadas de sua capacidade.
Por isso adquiriram (friso: adquiriram) o direito de apresentar se como acham que devem apresentar se. Pois isso já não compromete a sua performance.
Os demais seres pululantes e modernos serão vistos pelos empresários nas reuniões apenas como "seres curiosos que algumas vezes tem algumas ideias giras, mas não podemos levá los sempre à sério".
Recordo me que quando fundei a Z. Publicidade este foi um dos mecanismos de sucesso na época: aliar campanhas eficientes e criativas a apresentações com aspecto sério. Se este foi o preço a pagar, valeu muito a pena.
Afinal, os profissionais, tem de ser como a mulher de César: não basta ser honesta; é preciso parecer honesta. Não basta ser profissional: é preciso parecê lo também.
E sobre o hipermercado? Bem, isto já é outra história.

Um abraço

Danyel Sak

(Texto originalmente publicado jornal "Meios & Publicidade)

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SORRY, VOCÊ É UM TECHNO EATER.

Caros Amigos:

Enquanto estava a cochilar junto a minhas mulheres e meus cães em plena chaise longue voltada para um pôr do Sol inebriante, vimos que todos ao nosso redor tornaram se Techno Eaters. Este têrmo foi cunhado já há algum tempo por uma pessoa muito próxima: eu.
Assim, você pode estar muito contentinho ao acordar, com a sua pasta de dentes CleanPower, o seu autoclismo cromado TotalSilence, o seu chuveiro com jactos de prazer prazeirosamente prazeirosos Directwater, os seus talheres com design da Alsácia StatusEating, o seu automóvel ultra potente com motor Injectionfull, a luzinha verde OnTime que acende imediatamente na portagem, a sua secretária anatómicamente curvilínea WorkPro, as máquinas ajustadíssimas da sua empresa ProductionFast, o seu computador Premiumbite, o seu browser Talkfast, a luzinha verde Ontime RoundTrip que acende automaticamente na portagem de volta, o seu elevador Highsilence, a sua fechadura OneMagicLap, o seu fogão Warmperfect, a sua geladeira FrostArtic, o seu sofá HiperCousy, o seu televisor com imagem RoyalReal, o seu vidro AntiReflex, as suas cuecas/calcinhas) Skinsatin, o seu colchão Softdreams e o seu copo (onde coloca a dentadura BrightTeeth) Glasscrystal.
Sim, você, sem preceber, tornou se um Techno Eater: come tecnologia estrangeira 24 horas
por dia. Aliás, alguns já não comem: engolem.
Isso é apenas uma evolução daquele senhor que você encontrava há tempos, todos os dias nos produtos aliementares que consome: o "Importado Por": aquela etiqueta branca que contém a tradução dos ingredientes e o "modo de fazer" e que substituem departamentos de pesquisa inteiros, desenvolvimento de tecnologia, máquinas, centenas de pessoas. E apenas necessitam:

O tal Senhor para contactos
1 Telefone/Fax/E mail
1 impressora caseira para fazer as etiquetas "Importado Por" e a respectiva tradução do produto
1 caixa de etiquetas para impressora
1 Rapaz para operar a Impressora

Mas você vai dizer "E nós?" Bem, nós desempenhamos o papel importantíssimo de Techno Eaters.
Então, mostre um sorriso (que contém a prótese dentária SuperWhiteBright, sure), abra a boca e Bon Apetit. Burp!

Um Abraço,

Danyel Sak

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A TARA DAS LETRINHAS.

Caros amigos:

Enquanto estava a repousar junto às minhas mulheres e meus cachorros, recebi
alguns mails sobre uma Crónica anterior minha, que versava sobre o
renascimento do design dos automóveis (a do Túnel de Vento). E
solicitaram me algumas considerações a mais.
Recordei me então da actual (perdão leitores, mas sei que compreenderão)
Tara das Letrinhas.
Antes os automóveis tinham compreensíveis e mais que suficientes
referências: SS (Super Sport), SL (Super Luxo), V8 e mais uma ou outra
referência.
Mas com o tempo, a tal praga das letrinhas multiplicou se mais rapidamente
que vírus de sexo nos computadores das empresas.
Quem deve ter espalhado foi algum engenheiro de motores que, farto de sopa
de letrinhas que o obrigavam a tomar na infância, resolveu descontar a sua
ira na humanidade sobre rodas.
E o pior é que a tal humanidade aderiu, mesmo sendo as letrinhas verdadeiros
hieróglifos, incompreensíveis para a maioria dos mortais: HDI, CLK, TT, SW,
SLE, SI, XLS, CA e por aí vai.
E mais: hoje em dia as letrinhas chegam ao ponto de proporcionar status a
quem as possui. No momento, o rei das letrinhas é o tal do TDi.
Olhe, um conselho: se você não tiver o tal do TDi pregado na carroceria do
seu automóvel, melhor deixar o seu carro na garagem e pegar um autocarro ou
ir à pé. É menos humilhante.
Porque o seu automóvel pode ter tudo: ar condicionado graduação Ártico,
serviço de bar e restaurante, cinema 360º, massagistas. Mas se não tiver a
tal plaquinha TDi, será olhado com cara de nojo até pela velhinha que está
na passadeira a atravessar a rua.
Com isso, o tal TDi fez com florescessem dois mercados: o dos psicólogos e o
dos fabricadores das plaquinhas das tais letrinhas.
A neura de não ter a tal plaquinha TDi é tanta, que o paciente ao sentar se
no divã, primeiro olha automaticamente para ver se é um divã TDi.
Já os fazedores de plaquinhas TDi estão a fazer a festa: fabricam no vão de
escada estas 3 maravilhosas letrinhas e logo a seguir o seu possuidor vai ao
bate chapas mais próximo para pregá las no seu carro. Perdão: com as
letrinhas agora já não possui um carro, mas sim um automóvel.
Mas atenção: o "i" tem que ser obrigatóriamente minúsculo. Ninguém sabe ao
certo o porquê, mas o facto é que se for maiúsculo será falso, a potência
não estará garantida e o mais importante: saberão que possui umas letrinhas
TDi falsas; o que é pior que não possuir letrinhas TDi.
Assim, mesmo que possua uma carroceria que de tão enferrujada dá tétano a
quem olha, e um motor combinado Lada/Trabant pré revolução comunista, com as 3 letrinhas o status estará assegurado. Até, é claro, surgirem as próximas
letrinhas da moda.

Um abraço

Danyel Sak

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A SÍNDROME DE SALSICHA, OS INDUSTRIAIS E OS GESTORES.

Há pouco um industrial procurou me e assim tive que deixar um pouco minhas
mulheres e meus cachorros para verificar o que se passava.
Logo ao encontrá lo logo diagnostiquei: a Síndrome das Salsichas atacava
outra vez.
O que ocorre é que o Industrial/Gestor está totalmente imerso em seu
negócio: sejam eles roupas, calçados ou salsichas.
Isso faz com que ele pense em salsichas o dia inteiro, viva as salsichas,
coma as suas salsichas, respire as suas salsichas e durma com as suas
salsichas. Nada mais justo.
Porém, ao haver o encontro entre Consultor/Industrial Gestor isto pode
causar alguma dificuldade. Pelo facto do Industrial/Gestor preocupar se
continuamente, pode gerar uma ideia fixa que acabará por não solucionar o
problema que pretende.
Expliquei a ele então que é exactamente como quando queremos dormir e
estamos sem sono: quanto mais insistimos em dormir, mais insónia temos.
Continuei a explicar então que ele deveria expor me todos os factos, de uma
forma clara e tranquila pois ele estava com a Síndrome de Salsicha.
O Industrial está claro, sorriu, o que serviu para descontrair o ambiente.
E assim foi: expos me todos os factos, dados e preocupações do seu produto.
E logo de imediato veio a tradicional angústia: "e então? e então?".
É nesta hora, expliquei, que devemos enfrentar a Síndrome de Salsicha. Por
isso sempre é bom, ao final das reuniões reservar um bom tempo.
Disse "olhe, vamos abaixo ao café". Falei, claro, como se não quisesse nada.
Ele concordou e descemos.
E então, enquanto sorvíamos umas bicas, começamos a conversar
descontraidamente sobre tudo: viagens, hobbies, música e porque não?
Salsichas.
O facto é que, sem notar, este Industrial, após passar a primeira parte do
briefing de forma séria, porém, infelizmente austera em demasia (o que gera
um bloqueio muito grande), na cafetaria passou a abranger minúcias
importantíssimas de seu produto.
Pronto: a Síndrome de salsicha estava quebrada. Havíamos vencido.
De posse dos dados, a solução encontrada foi perfeita e resultou: vendeu. Só
poderia ser assim.
E hoje, quando toca o telefone, deixo as minhas mulheres e meus cachorros
por instantes, atendo ao telefonema e escuto uma boa gargalhada dele que,
antes de tudo diz "Vencemos a Síndrome de salsicha!!".

Um abraço

Danyel Sak

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Os Vampiros dos Sonhos

Caros Amigos:

Há algum tempo li um artigo sobre os vampiros do quotidiano. Mas não os clássicos sugadores de sangue. Não; falo aqueles que são de carne e osso e que sugam as energias das pessoas.
Quem leu o tal artigo que posteriormente virou um livro viu toda a catalogação e tipos que existem e sabe do que se trata.
Refletindo sobre isso, há algum tempo atrás descobri que também estão entre nós os Vampiros dos Sonhos.
Como sei disso? Porque encontrei alguns deles. Mas digo que não foi fácil. Simplesmente porque o meu objetivo não era encontrar nenhum. Aliás, como poderia encontrar se nem mesmo sabia que eles existiam...?
Então surgirá a pergunta "mas então como vou saber se eles existem...?. Simples: basta ter um sonho. Não é daqueles sonhos de deitar, dormir, sonhar e acordar. Não. Falo dos sonhos que você tem entre um dia e outro de trabalho. Não cito quais, pois cada um sabe dos seus.
Então você pensa neles, sonha com eles e após um determinado tempo até começa a trabalhar para que eles se concretizem.
Mas, de repente surgem os vampiros de sonhos. Sim, eles são humanos, pessoas comuns.
Aparecem e começam a fazer parte do seu sonho. Seja porque você os procurou porque esta pessoa poderia ser uma peça importante da construção, ou porque ele acabou aparecendo no seu caminho atraído pelo seu sonho.
No início você vai pensar que são pessoas comuns (e realmente são) e começa a interagir com elas. Após algum tempo você sente que algo está estranho, mas não sabe direito o que é. Passado mais algum tempo a sensação começa a tornar se mais forte, pois em plena construção do seu sonho você esforça se muito para um lado e quando percebe, ele esvazia se de outro.
Mesmo assim, continua esforçando se e ele esvaziando se. Passado mais um tempo você começa a perceber que este tipo de comportamento segue um padrão.
E logo ao seu lado, sem você perceber, o vampiro estava a sugar o seu sonho.

Mas porque os Vampiros dos Sonhos agem assim?

Na verdade é um assunto muito complexo, mas há pistas suficientes para evitá los, que no fundo é o que nós queremos, certo?
Não estamos a nos referir aos, por exemplo, casos clássicos de sócios, em que, estes sim, buscam a usurpação do seu sonho. Ou dos casos quotidianos de patrões x empregados. Falamos mesmo do seu sonho.
Na verdade ele não quer sugar o seu sonho: ele quer sugar a sua energia para canalizá la para o sonho dele. Ou então simplesmente para que ele não se concretize. Assim como o vampiro suga o seu sangue para manter a energia dele.
Como foi citado acima, você está construindo de um lado e ele sub repticiamente está a sugar a energia.

Mas porque nos sentimos atraídos pelos Vampiros dos Sonhos?

Porque eles não se apresentam como vampiros e sim como pessoas comuns, que na realidade são.
A quantidade de Vampiros de Sonhos e a indumentária com a qual se apresenta, depende de país para país. Mas uma coisa é certa: assim como a Transilvânia possui fama por ser um dos seus berços dos vampiros dos filmes, o mesmo ocorre com os Vampiros dos Sonhos: alguns países tem uma quantidade muito maior que outros.
Após travar conhecimento com eles você verá um comportamento padrão: a ilusão de que a ajuda deles será crucial, que o seu conhecimento/apoio será um catalisador para acelerar o processo do seu sonho. E que ele realmente compartilha do mesmo sonho que você.
Exatamente por isso nos sentimos atraídos: queremos juntar forças.

O que fazer para parar o processo do Vampiro de Sonhos?

A detecção é muito difícil e principalmente leva tempo. Na realidade o mais certo é você passar por uma experiência destas e na próxima estará com o seu radar interno mais ligado e detectará a tempo.
Se você for realmente perspicaz, fará como os caçadores de vampiros que vê nos filmes: parar um pouco e começar a sentir. Apenas sentir.
Após algum tempo, começar a observar em volta e aí sim, as pistas que você não conseguia ver surgem a sua volta. Na verdade elas não surgem: elas estavam o tempo todo à sua volta, mas você não as viu porque estava muito ocupado na construção do seu sonho.

Mas é possível vencer os Vampiros de Sonhos?

Sim, é possível, mas a um custo muito grande. O aconselhável é o que foi recomendado acima: simplesmente parar.
Caso você detecte e continue o que ocorrerá é que estará atrelado ao Vampiro dos Sonhos.
Neste caso, para conseguir o objetivo dos seus sonhos, deverá trabalhar triplicado em relação ao esvaziamento que ocorre. Como um pneu furado: se ele esvazia a um ritmo, você deverá estar a encher a um ritmo muito maior. O problema é que executar isso continuamente o deixará esgotado, pois do outro lado o esvaziamento é constante.
E o pior: quando finalmente você atingir o seu sonho atrelado ao Vampiro de Sonhos, estará tão cansado, que o seu sonho não será aquele que imaginou ao início: ele será outro. Terá se transformado em uma coisa completamente diferente do que você almejava no início.
E o mais importante: os sonhos tem um componente de prazer muito grande. E este sonho transformado não possuirá mais aquele prazer que você buscava. Que foi a centelha que o fez começar a busca do sonho.
Assim, mesmo a ganhar, você na verdade estará a perder.
O melhor conselho é parar e recomeçar com o radar redobrado após a experiência.

Epílogo

Caso você se encaixe no perfil do Caçador de Sonhos, certamente mais dia, menos dia encontrará alguns Vampiros de Sonhos no seu caminho.
Você passará por um processo que certamente recordará.
Assim aproveite este processo para recolher impressões e da próxima vez saber reconhecer um deles e simplesmente desviar se de seu caminho.
Foi o que aconteceu recentemente ao encontrar mais dois deles.
O caso mais interessante transcorreu em uma viagem de comboio: entrou, como sempre sorridente, bem apessoado, e a demonstrar cabalmente que possuia o sucesso. Sentou se na poltrona ao lado e começou o diálogo.
A conversa versava sobre o sucesso e que você seria bem vindo com a sua colaboração para galgarem juntos este caminho brilhante. Sempre acompanhado de entrega de cartões de visita e exemplos e mais exemplos de sucesso.
Mas, à medida que as horas de viagem passavam e a conversa transcorria, o Vampiro de Sonhos, ao perceber pouco a pouco que foi descoberto, começava a encolher se timidamente.
Mas como sempre procurava não demonstrar isso.
Ao final de algumas horas de viagem, o Vampiro de Sonhos, sem deixar transparecer que estava desconcertado, despediu se muito polidamente e sempre dizendo "vamos manter contato o mais breve e ainda mantinha o sorriso pendurado forçosamente enquanto se afastava pela plataforma.
Nunca mais apareceu: desta vez as estacas verbais, afiadas e fincadas no lugar certo o enterraram para sempre.

Um abraço
Danyel Sak

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O talismã brasileiro

É curioso como a imagem pessoal e profissional de uma pessoa pode ser afectada pelos acontecimentos mais inesperados, sobre o qual o próprio não tem qualquer controlo. O exemplo pessoal que apresento exige um introito para o qual peço a paciência do leitor.

Introito
Aqui há poucos anos, num festival de publicidade, o João Rapazote vem ter comigo e dá me uma palmada no ombro : " Tomé! Há que anos! Como é que vai isso? Ainda continuas doido como antes?"

Que raio de resposta é que se dá a uma pergunta destas? Revi rapidamente o tempo passado desde que o conhecera até então, não dei por mudança interior digna de registo e respondi " Acho que sim".

Nova palmada no ombro e um sorriso de orelha a orelha " Eh, pá, nunca mudes."

Há dias o tema ressurgiu num encontro aqui com o Luís. Há que anos, pá, que é feito, e, no decurso da sopa ao balcão lá conto que sou copy free lancer, que estou a acabar um livro com o Beja Santos sobre a nova sociedade de consumo e que sou mestre de Reiki.

" Pois é, tu sempre foste um gajo metido nessas coisas."

Saí do encontro a remoer a imagem que criei nos colegas e conhecidos. Quando eu conhecera o Luis Gaspar não andava "metido nessas coisas". Como é que eu arranjara uma imagem destas?

Pessoa amiga a quem contei estas minhas perplexidades sugeriu: "Não seria por causa daquele talismã brasileiro? "

Chi! Nunca mais me lembrara desse episódio vergonhoso. Aí vai ele.

A história
Começo a trabalhar na Ciesa , uma colega minha tinha a filha no Brasil e tornámo nos correspondentes. Isso deu direito a uma chuva de prendas do Brasil como LPs do Milton Nascimento que ainda não tinham cá saído, várias coisas compradas numa feira hippie do Rio e, finalmente, o talismã.

Era um colar formado por um cordel manhoso que tinha pendurado um bonequinho em madeira, pintado de preto. O boneco teria sido benzido por uma mãe de santo e destinava se a absorver as energias negativas que me envolvessem. Deveria usá lo sempre para me proteger das ditas energias.

O boneco tinha prazo de validade de alguns meses: quando estivesse saturado de negatividade, partia se.

A minha vontade foi deitar aquilo for a. Mas a mãe viu o boneco, enterneceu se de saudades com a filha e eu lá o pus por delicadeza. Só que a mãe de santo não contara com as energias a que um copy está sujeito e, passados dois dias, o boneco partiu se com um estalo sonoro, ouvido por quem estava à minha volta.

Fica toda a gente a olhar para mim enquanto eu puxo o fio de dentro da camisa com qqqqo boneco feito em dois. E lá tive de contar a história do boneco, da mãe de santo e isso tudo.

Só falta dizer que o boneco se partiu no meio da apresentação de uma campanha ao cliente.

Artur Tomé
Copywriter@netc.pt

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Os cabeças de vento

Caros amigos:

O outro dia estava a passear com as minhas mulheres e meus cachorros quando
vimos um maravilhoso Pontiac descapotável vermelho a passar. Na verdade,
todas as cabeças viravam para vê lo.
Pensei e comprovei comigo mesmo: os automóveis da década de '50 a '70 eram
um colírio para os olhos.
Dizem que eram projectados de acordo com as curvas femininas. Realmente, é
só olhar para as formas estonteantes de alguns deles com o Cadillac,
Corvette, Bel Air e vemos cinturas derrapantes e saliências deliciosamente
provocativas e exuberantes.
Mas nestas mais recentes décadas ao que parece, os engenheiros deram um
golpe bolivariano e prenderam e congelaram os designers industriais em uma
câmara criogenizada (como o Walt Disney). E a seguir, libertaram a sua arma
favorita: o famigerado Túnel de Vento.
Claro, a engenharia é um componente essencial, mas como tudo, usada em
excesso causa dependência. Com isso, o tal Túnel de Vento saiu do controle e
virou uma verdadeira borrasca de vento que varreu as linhas dos automóveis
para baixo do tapete de borracha.
E a primeira grande consequência foi, ao abrir as revistas e ver os anúncios
de automóveis: estava de costas. Eram como as capas das Playboys
brasileiras: todos virados de costas e a mostrar a derriére; a tal bunda.
Claro, como iam mostrar a frente ou o lado dos automóveis, se eram todos
praticamente iguais, como mulheres siliconadas.
A verdade é que os cabeças de vento, perdão, Túnel de Vento tinham vencido.
Acredito até que, para economizarem, uma fábrica emprestava para a outra o
tal tunelzinho de vento. Afinal, os automóveis eram iguais mesmo.
Mas, de tanto ser usado e abusado, o tal Túnel de Vento não deve ter
resistido: deve ter quebrado e ido para o conserto. E os designers
industriais congelados, aproveitaram esta oportunidade, arrombaram a porta
das celas criogenizadas e novamente tomaram o poder.
Pelo menos é o que se pode ver nos mais recentes modelos: formas bonitas,
feias, maravilhosas, estranhas. Mas novas formas, formas diferentes, um
maravilhoso reflorescimento criativo. Até, é claro, que o tal tunelzinho de
vento volte do conserto.

Um abraço
Danyel Sak

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VAMOS SER ETÍOPES.

Caros Amigos:

A Etiópia não foi convidada para a cúpula dos países ricos. Mas em pelo
menos um sector, deveria ser convidada a falar sobre o seu case nacional: as
Olimpíadas.
Afinal, como é que a Etiópia poderia se destacar nos esportes tendo uma
dieta nacional tão lightésima? Simples: especializando se no que tem de
melhor: pessoas resistentes. Desta conclusão foi um pulo, ou melhor, uma
corrida, para a conquista de medalhasolímpicas.
Assim, como publicitário e consultor, se aplicarmos esta Lei Etíope aos
negócios, acabaremos por perguntarnos porque é que aqui ainda não somos
especialistas certos sectores, e até avançamos para outros países?
O estômago é um bom início para responder a questão acima: afinal, neste
país não nos orgulhamos da comida e do modo como ela é bem preparada? Até os estrangeiros comprovam isso.
Exactamente por isso poderíamos ter algumas Multinacionais únicas e de
grande sucesso.
Um caso exemplar são os Pastéis de Belém.Porque até hoje não temos filiais
dos Pastéis de Belém pelo país afora?
Claro, gostamos muito da atmosfera dos Pastéis de Belém original. Mas, como
outro qualquer negócio, nem sempre podemos nos deslocar até lá. Então lá
vamos nós para a pastelaria da esquina.
Na verdade, se tivessemos filiais dos Pastéis de Belém por todo o país,
certamente iriam ocorrer duas coisas:

1. Nunca mais levaríamos o nosso regime á sério
2. Os Pastéis de Belém certamente iniciariam uma caminhada a caminho da
internacionalização.

Mas, diriam alguns, com a boca cheia de creme: "Mas internacionalização dos
Pastéis....?"
Tudo pode ser comprado e vendido se embalado em um bom marketing. E se tiver um bom produto, melhor. Veja o exemplo daqueles discos achatados de carne chamados "hamburgers" ou daquele líquidos negro chamado "cola" vendidos pelo mundo afora.
Ainda bem que em um e outro ponto do país já podemos ver alguns casos de
expansão moderadíssima, como é o dos leitõezinhos da Bairrada e das Sopas.
E para finalizar, cito umAliás, um um facto que vi há tempos:

Se você fôr alguma vez a Segóvia, repare em uma coisa. Para ir à parte
histórica da cidade, antes você passa pela parte nova.
Pois bem, quando termina a parte nova e se inicia a subida para a parte
antiga, encontramos uma pequena rotunda divisória com uma estátua. Pensamos "Deve ser mais um daqueles cavaleiros cruzados que libertou a cidade".
Vamos nos aproximando e a silhueta da estátua que está a se formar não se
parece com isto, é mais uma pessoa, um senhor. Quem sabe seja o primeiro
Presidente da Câmara ou o bispo local.
Chegamos ainda mais perto e vemos que a estátua se compõe de um senhor e
vários leitãozinhos. Como...?? Isso mesmo.
E depois de perguntar acabamos por saber que este senhor e sua família são
os donos do mais famoso restaurante local e do prato mais apreciado:
cochinillo asado. Ou seja: o leitãozinho. E que grande parte dos turistas,
não vem somente pela Catedral ou pelo Aqueduto Romano: voltam mesmo é pelo tal cochinillo.
E a cidade agradecida, acabou benemeritamente por fazer a estátua para
homenagear o senhor e seus cochinillos. Haja leitõezinhos.

Um abraço
D
Danyel Sak

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Lido é outra coisa.

Tinha começado a trabalhar como copy junior na Ciesa e não podia ter
começado melhor. Duas das contas em que entrei eram as Conservas Pitéu e uma campanha para os vinhos verdes. Com direito a prova dos produtos a anunciar.

A Ciesa parecia um pique nique permanente.

Bom, mas vamos às conservas Pitéu que, ainda hoje, são conservas de
especialidades de peixe. Com dezenas de variedades.

Lá criámos uma campanha que foi aprovada internamente e foi aprovada pelo cliente. Já não me lembro como era a campanha mas tinha criatividade que dava gosto. Aquelas dezenas de especialidades de peixe eram anunciadas de forma a abrir o apetite de quem visse ou ouvisse os anúncios e eu fui para o estúdio de gravação todo vaidoso pela minha contribuição criativa para aquele trabalho.

Não é que o sacana do Carlos Duarte olhou para os textos e torceu o nariz?
Disfarcei a antipatia que senti pela atitude dele e preparei me para o
prazer de ouvir aquele texto que ia ser lido pelo Vitor de Sousa.

A locução soava excelente e eu estava todo deliciado até que dos
altifalantes saíu algo como se tivessem atirado um saco de gatos para dentro de uma frigideira ao lume.

"Dezenas de especialidades de peixe", a sair de uns altifalantes num estúdio de gravação é um susto sonoro que abana qualquer um.

O Carlos Duarte faz sinal de corte para o Vitor, volta se para mim com os papéis e dita a sentença : "Arranjem outros textos".

Artur Geraldes Tomé
COPYWRITER@netc.pt

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Valeu, Bob!

Lembro que quando era pequenininho, de repente surgia a notícia que no dia seguinte íamos ao Centro do Rio fazer compras. Ah, era algo inesquecível.
Coisa de não dormir à noite só de pensar no dia seguinte. Tão bom quanto ir à praia.
Então, acordávamos bem cedo e lá íamos nós passear pelo Centro do Rio, entre lojas, carros e avenidas enormes.
Haviam dois pontos altos no passeio. O primeiro eram as Lojas Americanas (que existem até hoje e se tornaram uma rede enorme).
Elas tinham de tudo. E depois das compras sérias, chegava a minha vez: ir direto aos brinquedos. Aquilo era um sonho, muito mais emocionante que as lojas Tóyrus.
Era um corredor enorme com todos os tipos de brinquedos, desde os mais simples como os piões de madeira, passando por todos os instrumentos musicais, até chegar no máximo: todos os tipo de autoramas.
Depois de passar por ali, saía se flutuando e então vinha o segundo ponto alto do passeio: a ida ao Largo do Machado ou ao Flamengo.
Mas o que tinha de tão especial no Largo do Machado ou no Flamengo? Era um lugar diferente na hora de comer. Um lugar chamado Bob's, aquela coisa nova chamada lanchonete e que depois virou fast food.
O Bob's era o máximo. Depois quando cresci, fiquei sabendo a história dele:
Um americano chamado Robert (Bob) Falkenburg (o nome já parece predestinado ao negócio) morava no Rio. E um dia, resolveu montar a lanchonete no estilo das americanas. E foi até a América, importou tudo e montou o negócio: um sucesso. Aliás, um sucesso muitos e muitos anos à frente de todos.
Mas o Bob's era mais que isso. As pessoas trabalhavam (trabalhavam? Se estavam sempre sorrindo e brincando, com aquele jeito carioca...e não era sorriso de plástico) de macacão branco impecável e tênis conga branco; uma moda à frente do seu tempo.
E como a onda dos fast foods nem existia, o Bob's tinha um jeito todo
especial, só dele. Não só por introduzir no cardápio o chá gelado (que
somente décadas e mais décadas depois viraria moda no mundo todo) como também na quantidade da comida.
Como assim? A comida e os sanduíches não eram estandartizados. Ou seja: a porção do sanduíche e das fritas era no olhômetro.
Daí, pedia se uma porção de babatas fritas e ela não vinha sempre com aquele tamanhinho...não! A pessoa que servia, caprichava mesmo. As batatas (deliciosas) eram servidas dentro dos copos de papel de 300ml (um charme) e junto vinha um garfinho de plástico vermelho com o logo do Bob's para a gente comer. Era batata que não acabava mais.
E se pedisse para o rapaz colocar mais, ele colocava sem fazer cerimônia e ainda sorrindo.

Eram tempos em que o queijo do hamburger vinha caprichadíssimo, em gande quantidade, como tudo o que eles serviam: o Bob's era simpático e fraterno e muito generoso.
Os anos se passaram e o Bob Falkenburg acabou conseguindo outro sucesso: casou com uma das mulheres mais bonitas do Brasil (e certamente com um dos sorrisos mais doces e bonitos): a Silvia Falkenburg.
Enquanto isso eu cresci e o Bob's sempre dando uma mãozinha: dias de Carnaval, quatro noites pulando sem parar (isso sem contar pular durante o dia na Banda de Ipanema e Banda do Leblon).
Eu e a Cinthia saindo dos Bailes desidratados, cansadíssimos e com fome decarnavalesco. E, claro, lá íamos nós para a porta do Bob's, aindafantasiados, esperar ele abrir e comer alguma coisa enquanto víamos o dia jáclaro. Dias maravilhosos.
Os anos passaram, passaram e o Bob's acabou sendo vendido para uma multi.Muita coisa mudou, as porções standartizadas, as roupas e os fast foods quesurgiram pelo mundo todo.
Mas mesmo assim, o hamburger e as fritas continuam bons. Foi o que eu e aCinthia concluímos quando fomos visitar o Bob's que abriu por aqui. Eentre um hamburger e outro lembramos destas e muitas outras histórias deliciosas. Valeu,
Bob!

Um abraço

D.
Danyel Sak

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Caro Luis

Lembrei me há dias do relógio da Isabel. História que sempre achei dever figurar em qualquer manual de comunicação, publicitária ou não.
A coisa aconteceu ainda eu (nós?) não trabalhávamos em publicidade, pelo que será instrutivo contá la às novas gerações de criativos ( aliás, muitos deles estariam, na altura, a brincar com castelos de areia em Copacabana).
O filme ( pois de um filme se tratava ) era uma história banal. Numa
piscina, ele estava estiraçado numa espreguiçadeira e ela, de fato de banho e relógio no pulso, preparava se para saltar para dentro da piscina.
É então que ele exclama:

Oh Isabel, olha o relógio!

E ela responde que não faz mal, porque era um (marca do relógio) à prova de água.
Pois o "Oh Isabel, olha o relógio!" tornou se no bordão mais ouvido e citado em Portugal durante mais de um ano. Talvez estivesse associado a alguma anedota malandra que a minha ingenuidade da altura desconhecia. Mas o pessoal que citava o claim por tudo e por nada fazia o com os mesmos sorrisos subentendidos como se estivesse a falar do busto de Napoleão,
O que eu acho de mais notável nesta história, e que considero digno de
estudo pelos catedráticos da comunicação,( e interroguei várias pessoas de diferentes idades sobre o assunto) é que, com tanta popularidade que o claim alcançou, o anúncio foi um anúncio falhado.

Ninguém fixou a marca do sacana do relógio,

Tomé

"Velho" Artur Tomé.

"Não faz mal! Tenho um CORTEBER à prova d'água!".

Eu lembro me. Como recordámos um dia destes sou um bocado mais velho do que tu.
Julgo que a malta que viu o filme nunca se lembrará da marca do relógio (entre outras razões) porque ela não existe há muitos anos.
Não me parece que a frase estivesse associada a qualquer significado "picante". A recordação (a minha) resulta da bela imagem da mulher, meio nua, a cores (?) à beira da piscina. Repara que eu disse "meio nua" e não "em fato de banho"! É que tenho a ideia de que se tratava de uma grande "brasa"!
Mas tens razão: entre memorizar uma marca ou, em vez disso, um pormenor do filme que a anuncia daria um belo estudo.
Ou será que tal "estudo" cabe na eterna discussão "forma v. conteúdo"?
Não sei onde vou colocar o teu texto mas lá que o vou "meter" não tenhas dúvidas!
1 ab do lg

Luis

Talvez a solução mais prática fosse a publicação do meu texto com a tua resposta (fundamental ) no correio pensando bem, também dá para as histórias da publicidade, anúncios de antigamente ou para o curso. É contigo.
Mas a memória da marca não tem a ver com a idade. Lembro me de discutir isso com o Manuel Gil Pinto e outros velhotes da publicidade e, ou não recordavam ou não tinham a certeza.

Tu é que tens uma memória de elefante

Abraço
Tomé

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Ficção científica ganha cliente

Corria o ano de 1974 e a Cinevoz criara a Delta, uma pequena agência que tinha como cliente principal a Empresa de Cervejas da Madeira.
Isso deu direito a um dos meus pesadelos criativos. A Madeira ainda não tinha televisão e a campanha era feita á base de rádio e cartazes. Havia três marcas de cerveja, cada uma com as variantes branca e preta, nos tamanhos mini, normal e de litro e eu tive de criar 18 spots de rádio, com 3 slogans diferentes, 6 claims para as versões branca e preta de cada uma, mais 18 introduções de conversa fiada para cada tamanho !!

Adiante, que a história não é esta.

A directora da Delta, a Pamela, que era, na altura a maior autoridade
nacional em marketing de cervejas, gozava comigo pelos interesses que eu manifestava por iogas e ficção científica. Até que recebemos a visita de um cliente potencial, cujo representante era um indivíduo magro e seco, com uma atitude militarista no relacionamento.

Após 5 minutos de conversa introdutória a apresentar a agência, e
desesperada por não arrancar um sorriso ao homem, a Pamela aponta para mim e apresenta me:

E aqui o Artur Tomé é o nosso especialista em ficção científica.

O cliente potencial fita me com um olhar de falcão.

Qual é o melhor livro de ficção científica?

Há tantos bons, depende do gosto de cada um...

Qual é o melhor?

A pergunta tinha um tom de ameaça e vi preocupação e suspense no rosto da Pamela. Gostos de cada um, o tanas...O melhor livro de FC era o que ele achasse que era o melhor livro de FC .

Comecei a pensar depressa. O 2001 do Arthur Clark? Tinha passado ao cinema, soava como banalidade. City, do Simak? Demasiado bucólico e ele nunca admitiria uma sociedade de cães a criticar a civilização do Homem. O Xadrez Cósmico, do Van Vogt? demasiado místico para uma pessoa como ele.

Mais que Humanos, do Theodore Sturgeon.

A Pamela conseguiu disfarçar um suspiro de alívio ao repara no brilho de aprovação que surgiu nos olhos do cliente.

E ganhámos a conta.

Artur Geraldes Tomé
COPYWRITER@netc.pt

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O Júri

"Onde estiveste ontem depois de sair do escritório."
A pergunta foi tão assustadora que nem merece ponto de interrogação.
Ser acordado ás seis da manhã e com os lençóis aos pés da cama, dobrados e mais uma sansonite arrumadinha a deitar por fora, de calças, camisas, meias e laminas da barba, é quase tão dolorido como abrir o duche com a água quente no máximo. Com uma diferença.
A temperatura da água pode ser regulada de seguida, o desespero de quem não acreditou que eu não estive com putas naquela noite, não.
"Põe te a milhas e vai lá pró pé dessas gajas"
Pedi tudo. Pedi calma. Olhos nos olhos também prometi, mais coisas. Não resultou. Nem para mim olhava. Lembrei a frase de Herberto, "se eu quisesse enlouquecia".
Saí do quarto, nu e descalço e lá veio ela outra vez. Apagou me a luz da casa de banho, sem se calar. "Se morreres, que seja na escuridão".
Lá de dentro ainda lhe disse. "Quero fazer amor contigo". Respondeu me: "Nem que me cheirasses a lavado, meu porco".
Desisti.
Como de costume, fiz a barba, subi para a banheira, a custo de uma topada na cerâmica que me pôs num trambolho o dedo grande que ficou o dobro, pudera, o sol mal entrava aquela hora pelo janelo. Pedi lhe por favor, á terceira, lá me abriu a porta.
Tudo me era dado como se estivesse pela primeira vez numa cadeira de cinema, numa tasca improvisada, ou em frente de uma estante vazia.
Ainda com gotas de água nas costas, que as sentia como grãos de areia, comecei por ouvir bem baixinho Carmem Linares cantando Garcia Lorca, uma senhora canção popular e antiga. –" Desliga essa melga, não quero ouvir nada! "
Desliguei e tirei o cd.
Já na cozinha vi o leite ferver e subir, voltando a cair pelas abas do fervedor até apagar os bicos do gás. Não fui capaz de reagir. Morrer gaseado também não me cheirava e rodei até ao zero o botão do fogão.
Fui para a mesa que não tinha toalha, torradas, guardanapos e pão, como era hábito. Pensei que a coisa estava bem pior do que poderia ter imaginado. Passei pela sala á procura de uma outra palavra que tinha de ouvir e que me foi dita assim.
"Maxime......Com que então Maxime....." uma lágrima dela desfez se no mostrador do relógio de pulso, sem som, tal como a ausência de um gesto meu. Ela continuou em silêncio desfolhando aquele livro como se já o conhecesse, de trás para a frente, da frente para trás até parar naquela maldita página. Voltava a folheá lo e parava na mesma página.

Recordei tanta coisa, como há muito tempo não recordava,,, tanta coisa que não consigo mais lembrar.
Eu estava para ali armado em parvo como um satanás não cruel, uma coisa qualquer que não me apetecia decifrar.
"Diz me uma coisa"
Digo.
"Foste júri desta coisa"
Fui.

"Mas quando és júri publicam o teu nome"
Publicam.
"Também foste á cerimónia da entrega dos prémios"
Fui.
"A entrega dos prémios foi no Maxime"
Foi.
"Com muitas, muitas gajas"
Porra não estive com gajas !!
Com essa idade também que ias fazer......
Pára com isso.....

Por momentos, senti na cara, o calor de uma manhã quente de verão. Mas em Janeiro.
Em cima da mesa da sala, o anuário do clube e o cartão do Maxime, uma conciliação impossível . Porções que por mim, nada podiam fazer.
Precisava muito que ela parasse de soluçar. Dei um pulo á cozinha para lhe trazer um daqueles biscoitos que vem em embalagens lindas, mas que a nada sabem.
Queres um chá.....talvez erva do Príncipe? Lá se calou.
Enquanto a água fervia, sentei me no braço do sofá. Comecei por lhe falar daqueles com quem estive. Comecei pelo Presidente José Carlos Campos.
Isso é lá nome de um Presidente dum Clube de Criativos......tens a certeza que não estiveste com o Presidente da Junta Autónoma das Estradas?
Não, não estive. Mas também dei um abraço ao Zezo Carvalho.
O Zezo ? não toca bateria numa banda Brasileira num bar do Bairro alto?
Não, não é esse. O Zezo também teve o mesmo problema que eu.
Já sei......esteve no Royal Maxime e com as mesmas gajas.
Não, o Zezo também foi júri e não está no Anuário porque houve uma falha de revisão.
Já sei....no dia da reunião do júri ou lá o que é isso, tu e o Zezo.......
( Não aguentei mais um segundo e saí, a caminho da agência ).

Manuel Peres

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 O "spot" de Natal

Há dois anos, fui ao "Cantinho da Música" gravar o "spot" que convidava o pessoal a comprar nas lojas da Baixa.
O casal (são realmente casados) da agência, que dá pelo nome curioso de "Sobre Tudo", vinha acompanhado de uma menina dos seus três anitos que me foi apresentada como a sua filhota e que também ia "entrar" no "spot".
"E este é o Pai Natal!" – explicaram à miúda que não tugiu nem mugiu.
Fui para a cabina e iniciei a locução com a frase dita pelo Pai Natal usando a voz apropriada à personagem. Eu a falar e a miúda do outro lado a saltar da cadeira e a gritar:
"É o Pai Natal! É mesmo o Pai Natal!!"
A voz e mais uns "oh, oh, oh" a preceito tinham me, finalmente, transformado no Pai Natal.
Quando acabei a locução e entrei na sala técnica a garota veio ter comigo, pegou me na mão e perguntou:
"Pai Natal, como é que andas nas nuvens?"
Há duas semanas voltei a gravar com a miúda mais um "spot" da Campanha de Natal na Baixa. Está enorme e não se lembrava da história do Pai Natal...verdadeiro. Que pena! Foi, das dezenas da Pais Natais que já fiz, aquele que não vou esquecer!
E, lamentavelmente, não sei o nome da minha antiga admiradora!...

(Luís Gaspar Dezembro de 2001)

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 A Colher

Como uma empresa de consultoria e uma agência de publicidade, trabalhando em boa harmonia, podem modificar drasticamente, para melhor, claro, os procedimentos de uma organização.

Um dia levámos alguns amigos a um restaurante famoso e caro mas que prestava excelente serviço e cujo nome me dispenso de revelar.
Quando o chefe chegou junto da nossa mesa reparei que trazia no bolso superior do casaco, impecavelmente branco, uma colher.
Achei um pouco estranha a situação mas arrumei a na cabeça até ao momento em que outro empregado nos veio apresentar a lista de vinhos. Também ele trazia uma colher no bolso do casaco.
Fiquei francamente espantado quando descobri que todos os empregados traziam uma colher no bolso do casaco.
Quando o Chefe voltou à nossa mesa para pormenorizar a encomenda em aspectos menores, e até porque eramos velhos conhecidos, perguntei lhe o porquê das colheres nos bolsos de todos os empregados.
"Eu explico, senhor doutor..."
E, então, contou me que a gerência tinha encomendado à "Anderson Consulting", especialistas em eficiência, e à "Saatchi& Saatchi", a agência que mais contas ganhou no último ano, no mundo, um estudo sobre os procedimentos no restaurante.
Após vários meses de inquéritos e outras operações especializadas chegaram à conclusão de que a colher representava 73,84% das vezes em que os clientes deixavam cair utensílios o que dava uma média de queda de três colheres por hora e por mesa.
Como cada empregado, agora, transportava uma colher, o utensílio era imediatamente reposto voltando nova colher ao bolso do funcionário quando este se dirigia à cozinha por um outro motivo qualquer que não o de ir, de propósito, buscar uma colher. E o facto do cliente passar a ter a nova colher mais rapidamente não era pormenor de desprezar.
Habituado a estas descobertas da moderna gestão empresarial não deixei de me surpreender com esta excelente prestação das duas famosas empresas.
Porém, a partir de certa altura reparei que todos os empregados tinham um cordelinho que saía das respectivas braguilhas.
Surpeendido lá encontrei coragem para chamar o Chefe à minha mesa e perguntar o significado do cordelinho.
Nesse momento, ele baixou se ao nível do meu ouvido e explicou:
"Outra medida aconselhada pela Anderson e pela Saatchi, senhor doutor. Este cordelinho serve para, quando vamos urinar, puxar o pénis para fora das calças. Deste modo poupa se o tempo de lavar as mãos, além da economia na água e no sabão!"
"Desculpe...mas.depois como é que...o...metem para dentro das calças?"
"Bem, eu não sei como é que os meus colegas fazem mas eu uso a colher!"

(Tradução livre de Luís Gaspar de um texto que circula por aí, de autor desconhecido.)

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Mas que grande camelo...

Fazer aquele filme tinha sido uma grande aventura. Tratava se de um anúncio para a Trevira que contava a história de um europeu que, violentamente arrastado, de mãos atadas, pelo deserto por terríveis árabes montados em camelos, se apresentava impecável no seu fato porque... era feito de Terylene.
Com aventuras interessantíssimas pelo meio (algumas das quais contarei, aqui, um dia) o filme foi rodado num País do Norte de África em pleno deserto do Saará com camelos enormes montados por verdaeiros beduínos vestidos "à maneira"
Terminado o filme era a altura de o apresentar ao Cliente.
À primeira passagem a reacção do Cliente (um senhor alemão cujo nome procurei esquecer e que tinha fama de "unhas de fome") não foi má, isto é, só falou para pedir outra passagem. Dessa vez emitiu uns sons que, tudo indicava, pareciam de satisfação.
"Mas passem mais uma vez!"
Terminada a terceira passagem perguntou "que nuvens eram aquelas que se viam lá ao fundo".
"Não são nuvens. São as montanhas do Atlas!" esclareci eu.
"Montanhas no deserto? Não pode ser. No deserto não há montanhas. Não aceito um filme com montanhas!"
Diante do nosso espanto acrescentou:
"Se me fizerem um desconto de 50% no preço do filme ainda posso pensar no assunto!"
A Agência ficou silenciosa...que a Terylene era um Cliente importante.
"Não vai ter um desconto de 50%, meu caro senhor! Vai ter um desconto de 100%! Com uma condição: não leva filme nenhum!"
Foi assim que o "unhas de fome" teve de mandar fazer um filme com a mesma história (que era da Agência) à Telecine onde o Galveias Rodrigues, avisado por mim, lhe levou "couro e cabelo" pela novo filme.
Filme que acabou por ser feito nos areais do Guicho com dois camelos do Jardim Zoológico. Com uma nesguinha de mar num dos planos e as arribas noutro.

PS Depois deste filme o Jardim Zoológico deixou de "ceder" animais para fora do seu recinto. Os pobres camelos foram atropelados em plena Avenida da Liberdade quando regressavam, "à pata", a casa!

Esta fofografia chegou me às mãos depois desta história ter sido escrita e mostra o realizador e o operador (Luís Gaspar e Moedas Miguel) em plena filmagem no deserto. Sem Atlas à vista. A personagem que se vê à direita é o assintente de produção local de seu nome Amid. E não me esqueci do nome porque se tratou de um dos mais competentes profissionais da produção com quem trabalhei. No horizonte os beduínos "arrastavam" o prisioneiro...vestido de Trevira!

 E aqui vai outra história relacionada com este filme:

Assalto à Alfândega.

Já lá vão mais de vinte e cinco anos! Creio que segundo a lei portuguesa, crime praticado há tantos tempo está prescrito. Ou talvez dependa do crime, não é?
À cautelela contarei esta história sem mencionar nomes e locais...
Fora nos encomendado um filme cuja acção se desenrolava no deserto. Decidimos ( o orçamento tinha isso em conta) filmar no Saará. Com antecedência enviámos para um país do Norte de África o Director de Produção com vista à escolha de locais, apoio técnico, autorizações, alojamento, transportes, etc.
A Embaixada do País onde queríamos filmar tinha sido muito cooperante. Fornecera nos informações preciosas e uma delas tinha a ver com a forma de entrar com o material de cinema. Nunca tentássemos entrar sem uma autorização do departamento local de cinema. Isso poderia significar que o equipamente fosse apreendido na Alfândega. E nesse caso nunca mais o veríamos tal era a confusão por essa bandas.
As notícias do nosso Director de Produção eram escassas pelo que decidimos avançar, pelo menos até Algeciras, e aí esperar. Dois dias em Algeciras e quanto notícias...nada!
Que diabo! Tínhamos uma coisa que, na altura se chamava "Carnet ETA", que servia para transportar sem documentos de exportação/importação as mercadorias ou equipamentos necessários à nossa actividade! O material de cinema parecia caber na designação, portanto, vamos para a frente!...
Claro, chegados ao país em questão, o nosso material de cinema ficou apreendido na Alfândega! Não sei porquê acompanhei os funcionários até ao armazem onde as malas da câmara e acessórios ficaram depositadas no meio de milhares de outros volumes. A tal confusão referida pela Embaixada!
Já no exterior do porto, finalmente, encontrámos o nosso desaparecido Director de Produção que, diante da situação nos recomendou calma e que esperássemos por ele. Passado algum tempo surgiu dentro de um taxi. Convidou me a entrar e pediu aos restantes membros da equipa que aguardassem.
Entrámos na Alfândega sem que os guardas nos incomodassem. Seguindo as minhas indicações dirigimo nos ao vasto armazém onde se encontrava a nossa câmara. Sem ninguém à vista metemos as malas no taxi e saimos da zona do porto como havíamos entrado, isto é, sem que ninguém nos incomodasse!
Filmámos com o coração nas mãos. Mas nada aconteceu. Provavelmente seria à saída que os problemas surgiriam. Para evitar o porto onde o "crime" havia sido praticado mandámos o equipamento para Lisboa , de avião, sem contratempos.
Nunca foram prestadas contas pelo "assalto à Alfândega"!
Não cheguei a perguntar ao Director de Produção por onde tinha andado durante aqueles 15 dias para conhecer motoristas de taxi tão "úteis".

Luís Gaspar Fevereiro de 1998

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 O verdadeiro "fantasma".

Tostãozito ganho era tostãozito investido.
Nesse tempo, finais dos anos sessenta, a maior produtora de filmes de publicidade chamava se Telecine Moro e dominava uns bons 75% do mercado. O seu êxito, era voz corrente, devia se mais à posse e disponibilidade de meios de produção do que à qualidade dos filmes. As pequenas produtoras lutavam com quantas armas podiam e uma delas era a de produzirem com qualidade e outra equiparem se o mais possível. Por via disso, a Panorâmica 35, nesse mês de Maio tinha adquirido uma objectiva macro. Montada na ARRI fomos colocando diante dela os mais variados objectos para verificar as suas potencialidades. A certa altura o Carlos Gaspar acendeu um fósforo diante da objectiva.
"Interessante" – teria eu dito. "Acende lá outro e vamos filmar."
Fixámos o fósforo num grampo e..."acção!"
Quando se apagou a chama desliguei a câmara e respirei fundo porque a imagem que tinha estado a filmar deixara me sem fôlego.
"Manda revelar"
E no dia em que o "material" chegou não fui só eu a ficar deslumbrado. Todo o pessoal ficou maravilhado e impressionado com a imagem de um fósforo a arder captada com uma "macro". Uma imagem de grande beleza no início e mais tarde terrível quando, a meio da combustão, o fósforo fazia lembrar um corpo humano a ser consumido pelo fogo.
"Teresa, liga para o Gomes Ferreira."
"Gomes Ferreira? Como está o tempo aí, no Porto? Claro, chove sempre. Diga me, o
Canal 1 tem alguma companhia de seguros como cliente? Então um dia destes você tem aí um filme para mostrar aos tipos. Mande me o logotipo."
Nem repeti a filmagem. A que fora feita durante a experiência parecia me excelente e tinha exactamente 53 segundos. Ideal para um filme de 1 minuto.
"Fernando Pernes, escreve aí um texto lamechas q.b. sobre as vantagens de ter um seguro de incêndio".
"Eduardo, amanhã vou aí gravar um filme e gostaria de experimentar uma locução daquelas que te falei, "à inglesa", voz grave e meio sussurrada. Claro, eu levo a música. Tenho um disco com "pianadas" que deve servir."
Dias depois a voz do Gomes Ferreira gritava ao telefone:
"Luís Gaspar! Um tiro em cheio! A companhia de seguros comprou o filme e quer mais dois na mesma linha. Um para seguros de vida e outro para acidentes!"
O "Fósforo" começou a ser exibido nos cinemas e o seu êxito empurrou o para a televisão.
No Festival do Filme Publicitário desse ano, organizado pela Movirecord, na altura concessionária da publicidade na RTP, sem discussões nem surpresas o "Fósforo" ganhou o Grande Prémio. Para avivar memórias aqui vai o momento em que o realizador recebia o "Grande Galo" sob o olhar embevecido do Gomes Ferreira, ao centro.
"Oh. Luís, e se levássemos o filme a Cannes?"
Em Cannes, lá para o fim do festival, o Jorge Rodrigues, director geral da Latina e membro português do júri, disse me com o ar mais triste deste mundo:
"O seu filme estava entre os candidatos ao Grande Prémio mas, e para que não o venha a saber por outros, fui eu que o desclassifiquei!..

"???"
"Porque não é um filme original. Vi um igualzinho, na Alemanha, há dois meses."
Não lhe contei como é que o filme tinha nascido: o verdadeiro "fantasma". É dos livros, o verdadeiro "fantasma" não se copia!
Chegado a Lisboa contei o episódio ao Gomes Ferreira e à medida que a história progredia o saudoso amigo ia mudando de côr e chegado ao fim receei que fosse ter um colapso. Arfando, lá conseguiu dizer:
"O filme alemão é que é cópia do nosso! Fui eu que o vendi à companhia de seguros alemã!!!"
Não desejei o enfarte ao pobre Gomes Ferreira, claro, mas, confesso, lá que me deu algum gozo o seu desespero, isso deu.
É que eu, pai do "fantasma", não recebi um tusto pela venda aos alemães.

P.S. Até hoje não descobri que "fantasma" poderá ser feito com a imagem, fabulosa, de palha de aço a arder diante de uma macro.

(Luís Gaspar Agosto de 2001)

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