Estúdio Raposa

História 107
O aleive

 

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Vamos ouvir uma história recolhida por Ataíde de Oliveira do seu livro “Contos tradicionais do Algarve, editado pela Vega. Esta história chama-se “O aleive”. Aleive é o mesmo que calúnia ou traição. É uma história com muitos mortos e até vamos conhecer um fantasma. Vamos lá ouvir esta grande desgraça.

MÚSICA

Um príncipe, vendo-se em grande perigo numa tormenta no mar, prometeu casar com a rapariga pobre, mas honesta, da primeira terra a que aportasse. Salvou-se e na primeira terra a que aportou, foi recebido no palácio de um rei, a quem pediu as devidas informações.
- Próximo do palácio, respondeu o rei, mora uma infeliz menina, cuja mãe implora a caridade pública, e é a menina mais honesta do meu reino.
O príncipe foi logo ver a rapariga, gostou muito dela, e contratou logo o seu casamento. Desse dia em diante ia muitas vezes o príncipe visitar a menina, tanto de dia como de noite.
Ora o rei tinha uma filha, já mulher, que começou a ter ciúmes da rapariga, e chegaram a tal ponto, que ela premeditou armar um aleive, uma traição à pobre rapariga. Chamou um conselheiro e com este combinou a infâmia. Nessa noite foi o príncipe visitar, como costumava, a sua namorada, e viu à sua porta um homem a vestir-se.
- O que faz aqui? perguntou o príncipe.
- Eu lhe digo: costumo dormir todas as noites com a filha da pobre que aqui mora, sem esta saber; esta noite senti os passos da velha e safei-me nu, vendo-me agora forçado a vestir-me na rua.
Ficou o príncipe tão incomodado com esta resposta que não entrou em casa da namorada; no dia seguinte embarcou no seu navio e partiu para a sua terra.
Dias depois adoeceu a princesa e morreu. Era costume ficar guardas diante do panteão dos reis.
Depois que a princesa foi metida no seu lugar competente, apareciam todas as noites os guardas mortos. Não havia já soldados que se quisessem expor a uma morte certa. Soube o rei disto e mandou anunciar que daria uma tença por toda a vida ao soldado que fosse guardar os despojos da filha. Um soldado novo foi confessar-se e pediu ao padre que lhe desse algumas relíquias de santos. O confessor deu-lhe as relíquias e alguns conselhos. Nessa noite o soldado entrou na igreja, fechou-se por dentro, e em vez de se colocar no sítio, onde os seus camaradas costumavam postar-se, meteu-se dentro do confessionário. Próximo da meia-noite sentiu o soldado como que tremer o chão, e um fantasma, que saiu do lugar onde a princesa estava metida, a exclamar: estou sofrendo as consequências do aleive que levantei contra uma pobre rapariga.
E dizendo estas palavras avançou com fúria para o lugar em que os soldados se postavam. Não vendo nenhum, pôs-se a procurá-los, mas deu a meia-noite e o fantasma, recolheu à sepultura.
No dia seguinte toda a gente ficou admirada de ver o soldado vivo.
Este foi logo confessar-se ao padre.
- Esta noite não vais para o confessionário, mas sim para o nicho vazio do altar de S. Brás.
O soldado assim fez. Lá próximo da meia-noite repetiu-se a mesma cena, e depois do fantasma não encontrar os soldados no seu posto, dirigiu-se para o confessionário. Não encontrando aí ninguém, pôs-se a
olhar para toda a parte e logo deu a meia-noite. O fantasma então voltou para a sepultura da princesa.
Na noite seguinte foi o soldado esconder-se na tribuna. Repetiu-se a mesma cena: o fantasma depois de ter visitado os três lugares dirigiu-se para a sepultura, exclamando: só me poderei salvar se a infeliz vier a casar com o mesmo príncipe.
No dia seguinte foi o soldado contar tudo ao rei, que imediatamente reuniu os seus conselheiros, contando-lhes tudo o que o soldado lhe contara. Então o conselheiro, com quem a princesa combinara o aleive, disse:
- Essa rapariga a quem vossa filha se refere é a pobre rapariga que estava para casar com o príncipe, que aqui esteve.
Logo o rei mandou emissários chamar o príncipe que ainda não tinha casado. Veio ele, e sendo informado de tudo pelo próprio soldado, casou com a rapariga e ambos foram muito felizes.

MÚSICA

Ouvimos mais uma história recolhida por Ataíde de Oliveira.

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