José de Matos-Cruz


IMAGINÁRiO137
01 JUL 2007 · Edição Kafre · imaginario@imaginarios.org
Ano IV · Semanal · Fundado em 2004


 PRONTUÁRiO

 ACELERAS



Irrompendo em 1975, no Moto Journal francês, a saga de Joe Bar Team por Bar2 - aliás, Christian Debarre, um fanático do Gaston Lagaffe de André Franquin - é já um clássico dos quadradinhos sobre motards. Em sagração, as proezas e os azares de sete aceleras - que Vent d’Ouest reuniu em álbum, apresentado em Portugal pela Meribérica/Liber. Entretanto, Bar2 cedeu as manettes a Fane - aliás, Stéphane Deteindre, que assinou e ilustrou os tomos 2 a 4 - tendo voltado a conceber a quinta aventura. A partir do volume 6, sob chancela das Edições Asa, Fane garante a continuidade e justa consagração ao culto das duas rodas, como manifestação internacional ao nível da banda desenhada. Eis os parceiros: João Manias numa Triumph 900 Daytona, Eduardo Bielas numa Honda CB 1000 Big One, João Enrola-o-Cabo numa Susuki 750 GSX-R W, Pedro Gnomo numa Yamaha 1200 V Max, Guido Brasletti numa Ducati 900 SS, Jeremias Sencheta numa Harley Davidson 883 Sportstrack e Paulo Posichon numa Yamaha 600 XTE Supermotard. Estilo sarcástico, humor heróico, manias atrevidas na vertigem da velocidade ou em rasgos acrobáticos, eis os louros do Joe Bar Team...

BREVIÁRiO

Imprensa de Ciências Sociais edita As Cores do Império - Representações Raciais no Império Colonial Português de Patrícia Ferraz de Matos.

ANUÁRiO

1707 - Perdida na névoa, uma esquadra britânica encalha, tendo desaparecido dois mil homens. A Armada Real e a Marinha Mercante apresentaram um pedido de apoio ao Parlamento. A ajuda chegou em 1714, com a criação do Conselho da Longitude, o qual ofereceu uma recompensa de vinte mil libras à pessoa que pudesse resolver o problema tecnológico mais premente daquele tempo. O concurso estava aberto a toda a gente, e garantia-se que qualquer proposta seria tomada em consideração. O Conselho da Longitude continuou a existir durante mais de cem anos, e repartiu mais de cem mil libras em ajudas à investigação sobre a questão da longitude, mas nunca chegou a outorgar o Grande Prémio.

MEMÓRiA

01JUL2004 - Kafre publica o IMAGINÁRiO1, ainda apenas em versão newsletter.

02JUL1877-1962 - Herman Hesse: Prémio Nobel da Literatura em 1946 - «Cada espécie de homens tem as suas características, os seus aspectos, os seus vícios e as suas virtudes, os seus pecados mortais».

1938-02JUL1997 - Dórdio Guimarães: Escritor e cineasta, filho de Manuel Guimarães, companheiro de Natália Correia (1923-1993): «O poeta morreu de desgosto. Já nada na sua vida tinha importância» (Helena Roseta).

05JUL1857-1933 - Clara Zetkin: Em 1907, liderou a realização do I Congresso de Mulheres Socialistas - que estimularia em diversos países a participação feminina no combate político e revolucionário, definindo um programa de luta pelas reivindicações da mulher operária.

06JUL1907-1954 - Frida Kahlo: «Aguardo alegremente a saída - e espero nunca mais voltar» IMAGINÁRiO110.

CALENDÁRiO

1921-11MAR2007 - Betty Hutton: «Não sou uma grande cantora nem uma grande bailarina, mas considero-me uma boa actriz, e nunca fui levada por ninguém, a não ser Preston Sturges. Ele acreditava em mim».

14MAR2007 - Em Cuco Informativo, suplemento de quadradinhos publicado pelo Diário do Sul, Dâmaso Afonso privilegia a mostra Bd Checa na Bedeteca de Lisboa, e o 14º Concurso de Banda Desenhada e Cartoon Moura 2007. Contacto: datelier@clix.pt

16MAR-24JUN2007 - Museu Nacional do Azulejo expõe 7 Propostas Para a Arquitectura de Manuel Cargaleiro; painéis com 1,5 por 3 metros, executados em Vietri Sul Mare.

 




Verão 2007 - A propósito das comemorações do centenário de nascimento de Frida Kahlo e do cinquentenário da morte de Diego Rivera (1886-1957), entre Julho e Novembro de 2007, é aberto ao público o arquivo documental da pintora mexicana, que não pôde ser consultado durante quase cinquenta anos, o qual reúne cerca de trinta mil objectos pessoais, entre fotografias, desenhos e cartas tanto da artista como do marido IMAGINÁRiO110.

TRAJECTÓRiA

FRIDA KAHLO



Filha de um fotógrafo judeu-alemão e de uma mestiça mexicana, Magdalena Carmen Frieda Kahlo y Calderón nasceu em Coyoacán, a 6 de Julho de 1907. Aos três anos contraiu poliomielite, primeiro estigma físico das doenças e dos percalços que afectaram toda a sua existência. A partir de 1922, estudou técnica de desenho e com modelo na Escola Nacional Preparatória do Distrito Federal do México. Em 1925, enquanto aprendia gravura com Fernando Fernández, um acidente de autocarro provocou-lhe lesões permanentes (uma barra de ferro atravessou-a, da bacia à vagina). Começou a pintar, durante uma longa convalescença, com múltiplas cirurgias. Sobretudo, retratou-se a ela própria, seus medos e dores. Em 1928, aderiu ao Partido Comunista e conheceu Diego Rivera, celebrando-se o matrimónio no ano seguinte. Em 1931-1934, o casal permaneceu nos EUA, entre Detroit e Nova Iorque. Uma relação agravada pela impossibilidade de ter filhos, devastada por ciúmes e mútuas infidelidades, com amantes de ambos os sexos. Refugiada em Coyoacán, acolheu Leon Trotsky em sua casa. Em 1939, causou sensação em Paris, expondo na Galeria Renón et Colle. Em 1943, tornou-se professora de arte na Escola La Esmeralda da Cidade do México, cuja Galeria de Arte Contemporânea apresentou em 1953 uma ampla exposição da sua obra. Conotada por André Breton em 1938, esclareceria: «Pensaram que eu era surrealista, mas nunca o fui. Nunca pintei sonhos, apenas a minha própria realidade». Vítima de pneumonia, faleceu duma embolia pulmonar em Coyoacán, a 13 de Julho de 1954.

ANTIQUÁRiO

01JUL1867 - Em Portugal, é publicada a Lei de abolição da pena de morte para todos os crimes, exceptuando-se os militares; neste foro, a mesma manteve-se até ao Decreto com força de lei de 16MAR1911, vindo a Constituição de 1911 a prever que em nenhum caso poderia ser estabelecida tal pena. A Lei Nº 635, de 28SET1916, restabeleceu a pena de morte para «caso de guerra com país estrangeiro, em tanto quanto a aplicação dessa pena seja indispensável, e apenas no teatro de guerra»; esse regime vigorou até à Constituição de 1976 - a qual estabeleceu que «em caso algum haverá pena de morte». Em 1977, tal determinação foi adequada no Código de Justiça Militar. A abolição da pena de morte por crimes políticos fora formalizada pelo artigo 16º do Acto Adicional à Carta Constitucional de 05JUL1852. A última execução de pena de morte por motivo de delitos civis ocorreu em Lagos, em ABR1846. No Exército, o treino de recrutas para o acto de fuzilar prolongar-se-ia até 1982. Em 1989, Portugal defendeu a abolição da pena de morte nos países subscritores da declaração final da Conferência de Segurança e Cooperação Europeias, que decorreu em Viena. Em JAN2007, o Ministro da Justiça, Alberto Costa, anuncia que Portugal vai organizar, em associação com a Comissão Europeia, uma grande conferência contra a pena de morte, que decorrerá em Lisboa em OUT2007, durante a presidência portuguesa da União Europeia IMAGINÁRiO44.



07JUL1827-1915 - Sanford Fleming, engenheiro-chefe da companhia de caminhos-de-ferro Intercolonial e depois da Canadian Pacific, teria a ideia de dividir o Mundo em fusos horários, cuja confirmação saiu do Congresso Geográfico Internacional celebrado em Amberes, Bélgica, em 1870. Aí se encontravam periodicamente os cientistas para elaborarem uma proposta de normalização horária mundial. Em Outubro de 1884, diplomatas e especialistas reunidos em Washington, na Conferência Internacional sobre os Meridianos, recomendaram a todos os países que tomassem como referência o meridiano do Observatório de Greenwich, perto de Londres, e a partir dele contassem a longitude para Este e Oeste, com um meridiano principal em cada 15º (ou seja, uma hora), o qual dividiria o Mundo em 24 fusos horários. O dia global começaria em Greenwich, à meia-noite. Embora a Conferência não tivesse autoridade para impor as suas recomendações, tal determinação foi adoptada gradualmente, de forma quase universal. E todos os sistemas, desde a investigação científica até aos transportes por terra, mar ou ar, e às comunicações, passaram a reger-se pelo horário universal normalizado, com base na meia-noite de Greenwich.

VISTORiA

 

Era uma vez um certo Harry, chamado o Lobo da Estepe. Andava sobre duas pernas, usava roupas e era um homem, mas não obstante era também um lobo das estepes. Havia aprendido uma boa parte de tudo que as pessoas de bom entendimento podem aprender, e era bastante ponderado. O que não havia aprendido, no entanto, era o seguinte: estar de bem consigo e com sua própria vida. Era incapaz disso, daí ser um homem descontente. Tal provinha, decerto, do facto de que, no fundo de seu coração, sabia sempre (ou julgava saber) que não era realmente um homem e sim um lobo das estepes. As pessoas argutas poderão discutir quanto a ele ser realmente um lobo, a ter sido transformado, talvez antes do seu nascimento, de lobo em ser humano, ou de ter nascido homem, porém dotado com alma de lobo ou por ela dominado; ou, finalmente, indagar se essa crença de que ele era um lobo não passava de um produto de sua imaginação ou de um estado patológico. É inadmissível, por exemplo, que, na sua infância, fosse rebelde, desobediente e anárquico, o que teria levado os seus educadores a tentar combater a fera que havia nele, dando assim ensejo a que se formasse na sua imaginação a ideia e a crença de que era, realmente, um animal selvagem, coberto apenas com um ténue verniz de civilização. A esse propósito poder-se-iam tecer longas considerações e até mesmo escrever livros; mas isso de nada valeria ao Lobo da Estepe, pois para ele era indiferente saber se o lobo se havia introduzido em si por encantamento, à força de pancada ou se era apenas uma fantasia do seu espírito. O que os outros pudessem pensar a este respeito ou até mesmo o que ele próprio pudesse pensar, em nada o afectaria, nem conseguiria afectar o lobo que morava no seu íntimo.

Herman Hesse - O Lobo da Estepe (excerto)




IMAGINÁRiO136
24 JUN 2007 · Edição Kafre · imaginario@imaginarios.org
Ano IV · Semanal · Fundado em 2004

PRONTUÁRiO

ALTERNATIVAS



Um dos heróis mais amados da banda desenhada, cujas proezas se expandiram no ecrã pela imagem real e animada, Astérix regressa às origens em quadradinhos, sob chancela das Edições Asa, com o álbum do filme na 1ª Edição numerada e certificada que celebra os 45 Anos de aventuras, graças ao irresistível talento de René Goscinny & Albert Uderzo desde 1959: eis Astérix Conquista a América (1995) na companhia do inevitável Obélix, atravessando os oceanos em socorro do druida Panoramix, capturado pelos romanos e travando-se de razões com os índios que resmungam ugha! ugha!; e Astérix e os Vikings (2006) que vão parar à irredutível aldeia gaulesa, liderados por Grossebaf, dispostos a comprovar que o medo faz voar e onde acabam por dar asas ao inebriante Atrevidix, sobrinho do chefe Matasétix... Assim também, para os cinéfilos, mais emoções histriónicas são propostas em DVD, sob chancela Lusomundo, com as façanhas primordiais de Astérix e os Vikings (2006) por Stefan Fjeldmark & Jesper Møller: uma ressurreição espectacular, sagrando desafios genuínos e intemporais, ao consumar as amplas alternativas do imaginário.

CALENDÁRiO

MAR2007 - Em Bruxelas, a Société Moulinsart anuncia que Steven Spielberg iniciou, com a Dreamworks, a pré-produção de uma série de filmes baseados em álbuns de Tintin, cumprindo um projecto que remonta a 1982. O administrador Nick Rockwell não especificou se a obra inicial, a estrear «em 2009 ou 2010», será em imagem real ou animação, tendo embora como objectivo primordial expandir o sucesso do herói de Hergé - aliás, Georges Remi (1907-1983) - na China e nos Estados Unidos IMAGINÁRiO131.

1929-06MAR2007 - Jean Baudrillard: «Existe uma dupla moral : podemos ser imoralistas no plano imaginário, mas na realidade temos que ser éticos, politicamente correctos, estar do lado bom... Se, de alguma forma, quisermos reunir as duas facetas, então, tornamo-nos um mau elemento».

14MAR2007 - António Lobo Antunes é distinguido com o Prémio Camões 2007, em unanimidade do júri, pela «maestria em lidar com a língua portuguesa».

15MAR2007 - FBF Filmes estreia Suicídio Encomendado de Artur Serra Araújo; com João Fino e José Wallenstein.

16MAR2007 - Casa dos Açores presta homenagem a Lucia Vasconcelos, a Mulher e a Artista-Fotógrafa - com alocução de Fernando Aires, e evocação sobre a origem e a feitura do álbum O Rosto da Festa - Açores 2000-2006 IMAGINÁRiO23-38-84-123-127.

27MAR2007 - No Dia Mundial do Teatro, e assinalando o primeiro aniversário da reabertura, Teatro Municipal Maria Matos estreia Dúvida, Uma Parábola de John Patrick Shanley, com encenação de Ana Luísa Guimarães, sendo intérpretes Eunice Muñoz e Diogo Infante.

26MAI-03JUN2007 - Em Moura, decorre o 16º Salão de Banda Desenhada e Cartoon - Moura Bd 2007, organizado pela Câmara Municipal, e cujo 14º Concurso (aberto a portugueses e estrangeiros) tem por tema O Gato. Contacto: mourabd@iol.pt

MEMÓRiA

1681-25JUN1767 - Georg Philipp Telemann: Compositor alemão do Barroco, nascido em Magdeburgo, autor da colecção Tafelmusik.

27JUN1917 - Chiado-Terrasse ante-estreia Pratas, o Conquistador de Emídio Ribeiro Pratas.

28JUN1577-1640 - Peter Paul Rubens: «O meu talento é tal que não se pode estimar, todavia expressivo em tamanho... a ponto de ultrapassar a minha coragem.»

ANUÁRiO

 


1957 - Astroboy - A história de um miúdo-robô, planeado pelo cientista e investigador Doctor Boyton, após a morte do filho Toby, e que se torna publicamente conhecido como super-herói. No original japonês Tetsuwan Atomu, concebido em quadradinhos por Osamu Tezuka (1928-1989) e, a partir dos anos ’60, virtualizado pela sua empresa Mushi Productions em série a preto e branco, este pioneiro converter-se-ia no primeiro sucesso da mangà e da anime a nível mundial. Já em 2006, Imagi Animation adquiriu os direitos de Astroboy, para uma longa metragem em 3D por cumputador, a produzir em Hong-Kong com realização de Genndy Taryakovsky, e lançamento previsto para 2009.

INVENTÁRiO

Pratas, o Conquistador



Em 1917, Emídio Ribeiro Pratas dirigiu um dos raros exemplos de filme cómico entre nós, nesta época. «Pantomima cinematizada» lhe chamou o realizador, também argumentista e protagonista, tendo-a concretizado para a sua empresa Pratas Film.
Espantosamente descontraído em réplica nacional de Charlot - não só a vestimenta e os adereços, como a expressão facial e as situações burlescas - Pratas revelava-se, porém, pouco recriativo quanto à dinâmica interior da personagem chaplinesca, surgida três anos antes.
Efectivamente, Pratas privilegia o carácter subvertor e risível do marginal petulante, sempre a armar sarilhos, sabidão e sedutor inveterado, que fatalmente acaba de olho negro, numa fuga em fotograma acelerado ou a contas com a autoridade.
É de notar, porém, mesmo que expostos sem pretensões imediatas, certos laivos de crítica social a assumir em seu contexto histórico: as damas fingidamente púdicas, as cargas policiais, a típica mulher que pesquisa os caixotes...
Inteiramente manivelado ao ar livre, por Ernesto de Albuquerque, Pratas, o Conquistador tornou-se, ainda, um espectáculo soberbo para os populares de Lisboa. Assim se adivinha, por exemplo, no Terreiro do Paço, atravessado pelo desconchavado transporte para o Intendente!
Outros cenários naturais foram Santo Amaro, a Rotunda, a Rua António Maria Cardoso e a zona dos Jerónimos. Além de Pratas e de Aníbal Contreiras, contracenam Trindade Júnior, Aníbal de Aguiar e Fernando Domingos, porém as intérpretes femininas ficaram anónimas.
Com patrocínio do Cinema Condes (Titel & Colaço) e distribuição da Companhia Portuguesa de Comédia Cinematográfica (Pratas), Pratas, o Conquistador teve ante-estreia em 27 de Junho, e estreia a 10 de Julho de 1917 no Chiado Terrasse, onde Pratas era ajudante de projeccionista.
Nascido em 1899, tornou-se fiscal da Câmara Municipal de Lisboa, tendo participado em Ponto e Vírgula a Pão e Água (1929) de Contreiras e, como figurante, em Retalhos da Vida dum Médico (1962) e A Cruz de Ferro (1968) de Jorge Brum do Canto, falecendo em finais da década de ’60.

ANTIQUÁRiO

28JUN1927 - O professor e neurocirurgião Egas Moniz (1874-1955), Prémio Nobel da Medicina em 1949, executa a primeira angeografia cerebral IMAGINÁRiO62.

28JUN1997 - O Decreto-Lei Nº 165/97 aprova o estatuto da Cinemateca Portuguesa - Museu do Cinema, consagrando a natureza e o regime de funcionamento.







30JUN1487 - É editado O Pentateuco, considerado o primeiro livro impresso em Portugal, e actualmente na British Library em Londres; a bíblia em hebraico saiu das oficinas tipográficas do judeu D. Samuel Porteiro, em Faro. Há notícia de outros incunábulos prévios, mas o seu desaparecimento tornou impossível, até hoje, confirmar se são anteriores àquela data.

1967 - É posta em órbita uma série de satélites de comunicações que significariam, para a televisão, enormes avanços, pois permitiam-lhe chegar a uma diversidade de lugares e a maior velocidade em todo o Mundo. A cadeia britânica BBC celebrou o acontecimento com um concerto magno, Our World, o primeiro retransmitido em directo via satélite, no dia 25 de Junho, com uma audiência de trezentos milhões de pessoas pertencentes a vinte e quatro países. Para protagonizá-lo, a BBC escolheu um mito ascendente do Século XX: os Beatles. Estes prepararam uma canção que logo se guindou a número um das listas mundiais: All You Need Is Love, cujas letra e melodia, à maneira das baladas dos antigos trovadores, sagrariam um hino universal à fraternidade e à paz. Em 2000, All You Need Is Love voltou a ser entoada por milhares de pessoas na Cúpula do Milénio, em Londres, em saudação aos novos tempos.

BREVIÁRiO

Âncora Editora lança Relógios e Relojoeiros - Quem É Quem no Tempo em Portugal de José Mota Tavares e Fernando Correia de Oliveira.

Editorial Caminho lança O Livro do Meio por Armando da Silva Carvalho e Maria Velho da Costa.

Relógio D’Água edita Canções. Volume 1 (1962-1973) de Bob Dylan; tradução de Angelina Barbosa e Pedro Serrano IMAGINÁRiO13-61.

 




Edições Asa lança Joyce de Ian Pindar; biografia de James Joyce (1882-1941).

Gradiva edita, com Produções Fictícias, Groucho Marx [1895-1977]: Histórias Curtas e Grossas; organização de Robert S. Bader IMAGINÁRiO24.

Assírio & Alvim edita René Leys de Victor Segalen (1878-1919); tradução de Aníbal Fernandes.

Teorema edita Que Presente Tão Inapresentável (1999) de Joaquin Lavado/Quino IMAGINÁRiO11.

EMI Music Portugal lança em CD, stereo e surround 5.1, sob chancela Apple, Love (1967-1969) por The Beatles IMAGINÁRiO70.

Em Passagens, Vega edita O Andróide e o Humano de Philip K. Dick; prefácio de Jorge Martins Rosa.

EXTRAORDINÁRiO

 O INFANTE PORTUGAL
Primeira Jornada

 Capítulo Cinco
O CONTENTO DA SEREIA LEDA - 43

 
Inequívoca, a fluida Kostoglotov foi-se insinuando - até que o renitente anfitrião, ciente embora de que não teria ali uma qualquer serigaita, tratou de travá-la ainda no salão contíguo.

– Sente-se, madame... – e, melífluo, indicou-lhe o canapé.

Madame?! – reagiu, surpreendida mas cumprindo, a siberiana musa.

– Bom… – desculpou-se Nero Faial, quase inflamado e corrosivo. – É que há mulheres a quem eu não quero chegar e, por consequência, chamo-lhes senhoras.

Diacho, extravasaria ele uma mera euforia ou um erro metafórico? A maior verdade era que, como personalidade fictícia, habituada a persistir em mutações extremas, afectava Nero Faial um dédalo antigo no lidar da sugestão, na usura dos sentimentos.

 Continua



IMAGINÁRiO135
16 JUN 2007 · Edição Kafre · imaginario@imaginarios.org
Ano IV · Semanal · Fundado em 2004

PRONTUÁRiO

TROPELIAS



Inspirado numa tradição de banda desenhada europeia que consagrou os heróis adolescentes, caracterizados pela rebeldia e pela irreverência do humor em quadradinhos latino-americano, Titeuf deu-se a conhecer em 1992 - concebido e ilustrado por Zep, aliás o suíço Philippe Chappuis - logo se convertendo num fenómeno de popularidade. Entre nós sob chancela das Edições Asa, O Busílis da Questão surpreende este miúdo em crise de crescimento, ao privilegiar as tontices próprias duma deriva para a maturidade a par com as tonturas que já lhe despertam as curvas femininas... São pequenas aventuras triviais e quotidianas, de uma página, estilizando a cumplicidade com os outros rapazes, os caprichos das meninas birrentas, a emergência de arrelias familiares, os desafios na sala de aula ou a descoberta da sexualidade... Entretanto, Titeuf triunfou na literatura juvenil (2000) e expandiu-se no cinema de animação (2001), em correspondência às virtualidades dum ícone social que apela a uma identificação crítica pelos mais novos IMAGINÁRiO11.

CALENDÁRiO

1911-02MAR2007 - Lev Aslanovitch Tarassov, aliás Henri Troyat - escritor e biógrafo, eleito para a Academia Francesa em 1959: «Um dia sem escrever, fazia-o sentir-se culpado» (Maurice Druon).

1949-02MAR2007 - João Alfacinha da Silva, aliás Alface: «Comove, a desonestidade. A mim comove. O verme do embuste torna-se espectáculo dos mais doces. Outros apreciarão um crepúsculo arrancado a entardecer bovino. Eu não. Eu adoro passar por parvo.» (Carreira de Tiro - 1995)

08-30MAR2007 - Instituto Franco-Português apresenta IndigoNoir & Mecanosphere - uma instalação em forma de circuito onde se cruzam os assemblages visuais de IndigoNoir (Johan Viviers, Carlos G. Garcia) com as sonoridades espectrais de Mécanosphère (Benjamin Brejon, Adolfo Luxúria Canibal, Jonathan Hhy, Henrique Fernandes), em homenagem longínqua a Novalis, Robert Smithson e Alexander Graham Bell IMAGINÁRiO121.

MEMÓRiA

1889-1967 - Augusto Casimiro: «As belas mãos! Que doces mãos a acarinhar! / Brandas mãos que parecem lírios brancos / e afagos de luar...»

1912-1997 - Berta Cardoso: «Era uma fadista tradicional, nunca cantou outra coisa que não fosse o fado, e para o seu meio artístico era muito culta» (Ofélia Pereira).

 VISTORiA

Voz da Saudade, voz do esforço evocadora,
De alma que parte audaz chorando o Amor que deixa...
Voz para combater, clara e triunfadora,
Voz triste, a recordar, numa suave queixa...

 Voz de silêncio e solidão, voz de orfandade...

Voz da Alma a dizer divinos heroísmos...
– Um herói semideus inventou a Saudade,
Era lusíada... E lembrando a divindade
Foi em busca do céu através dos abismos...

Augusto Casimiro - A Evocação da Saudade (excerto)

BREVIÁRiO

 Assírio & Alvim edita Manifestos e Conferências de José de Almada Negreiros (1893-1970) IMAGINÁRiO84.

Costa do Castelo edita em DVD, Hiroshima, Meu Amor (1959) de Alain Resnais IMAGINÁRiO81.

Presença edita Peter Pan e o Feitiço Vermelho de Geraldine McCaughrean; tradução de Carlos Grifo Babo IMAGINÁRiO101.

Publicações Dom Quixote edita A Pirata - A História Aventurosa de Mary Read, Pirata das Caraíbas, romance de Luísa Costa Gomes.

Cavalo de Ferro edita Long John Silver de Björn Larsson; tradução de Liliete Martins.

Assírio & Alvim edita Escritos Corsários / Cartas Luteranas (1973-75) de Pier Paolo Pasolini (1922-1975) IMAGINÁRiO57.

ANUÁRiO

 




1587 - Durante assalto ao Convento da Primeira Capucha de São Francisco, o corsário Francis Drake arrasa o anexo Pharol do Cabo de São Vicente, mandado construir em 1515 por D. Fernando Coutinho, e primeira fonte de iluminação da costa de Portugal de que há notícia. O Bispo do Algarve revelara-se «compadecido da muita necessidade que d’elle tinham os navegantes», para lograrem «aviso em tempo de tempestade e se fazerem ao largo, desviando-se do perigo». O restauro dessa torre especial ocorreu em 1606, ao tempo de Filipe II. Tal como hoje existe, o Farol do Cabo de São Vicente, com o nome de D. Fernando, foi mandado construir por D. Maria II, tendo entrado em funcionamento em 1846.

 

 




1947 - No Almanach Spirou, é publicado Arizona 1880 de Morris - aliás, Maurice de Bévère (1923-2001) - onde aparece, pela primeira vez, Lucky Luke, o cowboy que dispara mais rápido do que a sua própria sombra, já montado em Jolly Jumper, distinguindo-se na conquista do Oeste a partir de 1948 IMAGINÁRiO5.

1969 - António de Macedo realiza Almada Negreiros Vivo, Hoje, documentário produzido por Francisco de Castro; inclui entrevista registada sem preparação prévia.

1971-77 - José Ernesto de Sousa produz e realiza Almada, Um Nome de Guerra, retrato multimédia do artista quando jovem, com música e projecção aleatórias.

NOTICIÁRiO

O Kinetographone - Na Avenida da Liberdade, 87, está em exposição um curioso aparelho com o nome que encima esta notícia e que consiste n’uma engenhosa combinação do cinematographo e do phonographo.









Kinetoscopio foi o nome que Edison deu ao aparelho que reproduz a fotografia animada, e phonographo é a disposição especial já conhecida que permite a reprodução do som. É pois o kinetographone a combinação destes dois aparelhos IMAGINÁRiO 61-64-118.

21MAR1897 - Diário de Notícias

ANTIQUÁRiO





21JUN1887 - Em Lisboa, iniciam-se os trabalhos de escavação a pá e picareta do Túnel do Rossio, entre a Estação Central e o lugar da Rabicha, em Campolide, a cargo da empresa Duparchy & Bartissol. Concluída a galeria com 2.610 metros em 26MAI1888, seguiu-se a consolidação e o assentamento dos carris, tendo uma locomotiva da Companhia Real dos Caminhos de Ferro feito a primeira travessia em 08ABR1889. A inauguração oficial decorreu a 11JUN1890, estando já terminado o edifício da Estação.

PARLATÓRiO

As aventuras em quadradinhos de que eu gostava, deixaram de aparecer por 1939. Pensei, então: tanto melhor! Perdia imenso tempo a ler coisas inúteis. Reconheço que partilhava, um pouco, do preconceito contra a bd que, por essa altura, começou a ganhar forma. Apesar de tudo, julguei que iria ter tempo para, finalmente, ler coisas sérias.

 

 Para minha grande surpresa, ao fim de um mês cheguei à conclusão de que não lera um único livro. Isso acontecia, simplesmente, pelo facto de a leitura de banda desenhada ocupar um espaço do imaginário, ou do cérebro, que não era utilizado para outro fim.
Alain Resnais

VISTORiA

Domingos

Sentindo aproximar-se a sua última hora, o comendador Domingos de Azevedo e Lorena mandou chamar junto ao leito os seus parentes mais chegados. E disse: «Como talvez saibam eu faria 85 anos no próximo mês de Março, se lá chegasse. Mas não chegarei lá e a isso se deve a vossa presença neste quarto. Quero dizer-vos que fiz tudo quanto quis e se mais não fiz foi porque a tal me não senti obrigado. Além de vós, que sois meus filhos, netos e bisnetos, existem por esse mundo fora muitos outros meus filhos, netos e bisnetos – cujos nomes e paradeiro faço questão de ignorar – e a quem igualmente deserdei. Nada vos devo, a uns e outros. Nada esperei de vós, nada vos pedi. Mas não quereria morrer sem vos informar que dissipei toda a minha enorme fortuna em mulheres, cavalos e jogo. E se alguma coisa resta são dívidas que não vos aconselho a contestar. Morro em paz comigo e oxalá a vida vos trate como eu me tratei a mim.» E mais não disse o comendador porque o seu primogénito, comendador ele-próprio, lhe apertou o pescoço (como aliás o velhote tinha previsto e ardentemente desejado).
João Alfacinha da Silva - aliás, Alface - Cuidado Com os Rapazes (1995 - excerto)

ELUCIDÁRiO

Regina Pacini - O Barbeiro de Sevilha IMAGINÁRiO128.





IMAGINÁRiO134
08 JUN 2007 · Edição Kafre · imaginario@imaginarios.org
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PRONTUÁRiO

 RADICAL



Durante décadas, a divisão do mundo em dois grandes blocos - os países do leste, as democracias ocidentais - consolidou o privilégio das agências de espionagem, com um poder quase ilimitado. O termo da Guerra Fria tornou mais sofisticada a respectiva intervenção, pelas margens da impunidade. A queda do Muro de Berlim, as roturas na Cortina de Ferro, a dissolução da União Soviética, alteraram o xadrez político internacional. Para os Estados Unidos, os principais desafios resultam, sobretudo, de ameaças terroristas, do tráfico de armas ou de drogas... Neste panorama se precipitou, em 1996, Missão: Impossível por Brian DePalma. Tom Cruise produziu e protagonizou Ethan Hunt - um agente hábil e corajoso, acusado de corrupção e perseguido pela própria Impossible Mission Force. Para Missão: Impossível 2 (1998), Cruise impôs a realização por John Woo, conferindo uma toada romântica à emoção intensa da aventura. Finalmente, em M:I:III (2006) de J.J. Abrahams - em DVD, sob chancela Lusomundo - Hunt/Cruise enfrenta uma aflição extrema sobre duas mulheres das suas relações familiares e profissionais. Além deste manancial dramático e humano, sob impressionante coreografia de explosões e acrobacias, ressalta uma vertigem labiríntica de perigo, ambições, suspeitas, bravura, perversão e integridade.

CALENDÁRiO

01MAR-17JUN2007 - Fundação Arpad Szenes-Vieira da Silva apresenta a exposição temporária Arpad Szenes - Obras da Fundação - retrospectiva de cento e vinte e nove obras, incluindo auto-retratos de infância, desenhos de juventude, ilustrações e pinturas.

08MAR2007 - Columbia & Warner estreia Ghost Rider de Mark Steven Johnson; com Nicolas Cage e Eva Mendes. Sobre o (anti)herói dos Marvel Comics, criado em 1972 por Roy Thomas & Gary Friedrich, e ilustrado por Mike Ploog.

21-27MAI2007 - No Teatro Maria Matos e nos Cinemas King, decorre a Monstra - sexta edição do Festival de Animação de Lisboa, sendo país convidado a Rússia; uma realização de Ânimo Leve, em parceria com EGEAC/EM, Teatro Meridional e Teatro Maria Matos.

MEMÓRiA

06MAI1897-1985 - Arpad Szenes: Artista plástico nascido em Budapeste, casado com Maria Helena Vieira da Silva em 1930 - um dos mais significativos representantes da Escola de Paris dos anos ’40 do Século XX.

1798-14JUN1837 - Giacomo Leopardi: «Cara me foi sempre esta erma colina / e esta sebe, que por diversos lados / o extremo do horizonte veda ao meu olhar».

1773-14JUN1867 - John Pace: «Inventor, Autor de Conceito, Construtor» (Great Exhibition - 1851)

BREVIÁRiO

2006 - Edições Asa lança Cantos de Giacomo Leopardi; tradução de Albano Martins.

PRIORITÁRiO




CINEMA - Revista da Federação Portuguesa de Cineclubes - Sendo director João Paulo Macedo, privilegia uma abordagem histórica e analítica sobre a sétima arte, como fenómeno cultural e social, sobre os movimentos nacionais, as obras maiores e as personalidades criativas, os certames em actualidade. Em foco no número 36, referente a JAN-MAR2007: Cineclubes de todo o mundo homenageiam Manoel de Oliveira, o Cinanima 2006, Memória de Juan Carlos Arch e Tributo a Shohei Imamura, The Departed: Entre Inimigos de Martin Scorsese e Uma história de violência: O filme americano de David Cronenberg. Contacto: revistacinema@fpcc.pt





DREAMGIRLS - Sony/BMG lança em duplo CD, Music From the Motion Picture DreamGirls - DeLuxe Edition, tendo por matriz o filme de Bill Condon - distinguido com os Oscars à Actriz Secundária (Jennifer Hudson) e à Mistura de Som. Inclui interpretações por Beyoncé Knowles, Jamie Foxx, Hudson e Eddie Murphy, além de um livrinho com 36 páginas inserindo os poemas e informação técnico-artística. Alguns títulos: Listen (Beyoncé), When I First Saw You (dueto Foxx/Beyoncé), And I Am Telling You I’m Not Going (Hudson).

INVENTÁRiO




Tendo irradiado em pleno ecrã com Tom Cruise, Missão: Impossível foi, antes, uma das grandes séries da televisão americana. Está, mesmo, na lista das dez mais populares de todos os tempos. A expansão de Missão: Impossível (1996 - Brian DePalma) comemorou os trinta anos desde o lançamento da saga original.

Concebida por Bruce Geller, esta teve uma primeira fase (1966-1973) com 171 episódios, sob chancela CBS/Paramount; e foi galardoada com o prémio Emi à melhor série dramática, em 1966 e 1967. O famoso tema musical de Lalo Schifrin introduzia a acção da IM Force, seguindo a mesma rotina. Uma mensagem gravada explica a missão ao coordenador dos agentes secretos, concluindo: «Se algum membro da sua equipa for capturado ou morto, o director alegará ignorância. Esta fita autodestruir-se-á em cinco segundos».

Os casos variavam entre ameaças políticas, intrigas de espionagem, e perversão científica ou criminal - desafios que os heróis enfrentavam, em situações de risco radical. No elenco, destacaram-se Martin Landau, Barbara Bane e Steve Hill; depois, Peter Graves, Greg Morris e Leonard Nimoy.

Em 1988, a ABC-Tv reactivou a Missão: Impossível, com argumento de Arthur Weiss e supervisão de Cliff Bole. Exibindo, com maior sofisticação, um aparato tecnológico que ficara célebre, as peripécias eram mais empolgantes e inverosímeis.

Graves voltou, coadjuvado por Tony Hamilton e Phil (filho de Greg) Morris. O veterano Morris interveio ainda em The Golden Serpent, o episódio-piloto realizado por Don Chaffey, e que teve difusão autónoma. O intrépido Jim Pelps e companheiros eram enviados à Austrália, para exterminarem uma plantação de heroina.

TRAJECTÓRiA

JOHN PACE

 

John Pace nasceu em Londres, em 1773. Por aquele tempo, dois relojoeiros, com o mesmo apelido, estavam registados em Londres, e seriam seus parentes: Thomas (1788-1840), e John, que laborava desde 1790. Aliás, outros Pace se referenciam como relojoeiros, na capital britânica, em datas tão recuadas como 1630. Os registos comerciais da cidade indicam que John Pace trabalhou em Bury St. Edmunds, como joalheiro e relojoeiro, durante cerca de cinquenta e três anos - até 1857, quando a mulher faleceu, e ele se radicou em Chelmsford. Aí permaneceu até à sua morte, em 14 de Junho de 1867. Era um homem profundamente religioso, e membro da Society of Friends, ou Quacres. Prestigiado pelo seu carácter industrioso, incansável e, sobretudo, engenhoso, Pace participou na Great Exhibition de 1851.

NOTICIÁRiO

Morte de Mr. John Pace - O nosso obituário regista o falecimento, com uma idade bastante avançada, de Mr. John Pace, que, durante longos anos, foi um muito respeitado residente nesta cidade, onde desempenhou o ofício de relojoeiro e ourives especializado em prata. Desde muito novo, Mr. Pace deu as maiores provas do seu engenho mecânico; alguns exemplos das quais, na forma de relógios capazes de funcionar durante anos sem dar corda, e que foram exibidos na International Exhibition de 1851. A sua aguda percepção de qualquer avanço no conhecimento científico levou-o a adoptar, de imediato, cada novo invento relevante; e diz-se que, certa vez, os habitantes de Bury se assustaram com o resplendor da sua loja, tendo sido ele o primeiro a substituir a penumbra dos tempos antigos, pela nova luz a gás. O seu bom coração e o desejo de contribuir para qualquer causa extremosa, especialmente as de carácter educativo, tornaram-no muito querido para além dos limites da comunidade religiosa a que pertencia, numa altura em que os membros da Sociedade de Amigos sofriam, em vários aspectos, da falta de espírito católico que, nos nossos dias, se tornou mais ampla e comum.
1867 - Norwich and Bury Post

CONSERVATÓRiO

25FEV1707-1793 - Carlo Goldoni: «Apenas morre por metade aquele que deixar uma imagem de si próprio nos sons de que é criador».

 1770-26MAR1827 - Ludwig Van Beethoven: «Graças a Deus, sei compor música, mas seria incapaz de fazer qualquer outra coisa, à face da terra».

15MAI1567-1643 - Claudio Monteverdi: «O objectivo da boa música é sensibilizar a alma».

EXTRAORDINÁRiO

 

O INFANTE PORTUGAL
Primeira Jornada

Capítulo Cinco
O CONTENTO DA SEREIA LEDA - 42

 Em si mesmo, contudo, percebia-se descoroçoado, fruste como a quilha de uma nave à deriva - entre tormentas e sem âncora que a mantivesse em porto seguro... Com a sensualidade romântica dos trágicos russos, Plevna Kostoglotov leu-lhe as fissuras existenciais no semblante volúvel, multifacetado e, feminil, dele almejou a camaradagem cativa, sem reticências, por um compadecido amante.

Lampejos paradoxais. Como fingir? Como fugir? Marinheiro ao rubro, Nero Faial presumia-se. Na vertigem que torna possível todas as histórias improváveis. E, ao prenunciar-se, Plevna Kostoglotov exerceria um vistoso quão mui facundo acesso ao compromisso.

– Então, posso entrar? – instou ela, com altiva discrição. – Assim, mais parecemos um hiato entre duas casualidades...

– Por certo! Também eu detesto ficar em suspenso... – correspondeu Nero Faial, facultando a intromissão. Era o artista plástico em rubor, a esboçar-se favorável, curioso se estaria perante uma dúvida ou uma dádiva.

 Continua





IMAGINÁRiO133
01 JUN 2007 · Edição Kafre · imaginario@imaginarios.org
Acesso directo em www.imaginarios.org · Ano IV · Semanal · Fundado em 2004


PRONTUÁRiO

OCULTOS



Na história ou no futuro, entre a Terra e o além, nenhuma criatividade reflectiu, em quadradinhos, um imaginário épico de ansiedade ante o desconhecido - no ciclo infinito da existência, pelos limites da ressurreição - como o Universo Marvel exposto por Stan Lee & Jack Kirby, durante os convulsos e marcantes Anos ‘60 do Século XX. À inquietação ontológica, à exuberância gráfica, corresponde um espectáculo empolgante - enquanto testemunho clássico/subversivo, a partir da natureza humana e respectivas mutações ou alternidades. Tantas vezes explorada ou reexposta, sob o signo individual ou corporativo dos super-heróis, tal matéria virtual repercutiu-se no núcleo familiar do Quarteto Fantástico - combinando perigo, adversidade, emoção e suspense, com uma fantástica verosimilhança. Por 1965, eis como se revelaram os Inumanos - uma raça guerreira e prodigiosa, liderada por Raio Negro e Medusa, radicada num exílio oculto e furtivo de Attilan, algures entre os contrafortes dos Himalaias. Até que uma ameaça transcendente - concebida por Carlos Pacheco & Rafael Marin, ilustrada por Jose Ladronn & Jorge Lucas, e publicada sob chancela Devir - leva os Inumanos a superar os limites cósmicos entre as origens e o futuro, às entranhas do Império Kree e a extirpar a inclemência dos exércitos Shi’ar...

VISTORiA

D. João da Câmara

 ¨Escuro como breu. Barbado. Usa lunetas
E é meticuloso, atencioso, exacto.

Escreveu várias op’retas
Com Gervásio Lobato.

 Traz o chapéu, um chapelinho, um testo,
À banda, sobre a trunfa encapelada e negra.

É autor do Afonso VI.
É autor da Toutinegra.

 Quer bem a toda a gente. A todos acarinha,
Sejam embora azuis, ou brancos, ou vermelhos.

Fez a Triste Viuvinha.
Além d’isso fez Os Velhos.

 Faltava-me falar d’outro sinal que tem:
Possui uma barriga arqueada, franciscana.

Fez o Pântano também,
Peça que deu em pantana...

 Que resta enumerar? Não quero ser omisso.
Artigos no Occidente e...? A Meia Noite. É isso.

Não a entenderam. Que pena!
Pois permitam-me a franqueza:
Obra do valor d’ela, inda não vi na cena
Em linguagem portuguesa.

A ele nunca lh’o ouvi
Que ele nunca fala em tal
Mas afirmam por aí
Que é Rohan, Mon’morency
E que tem sangue real.

Nota final:
Conversa sempre em tom pianíssimo
Em segredo, com unção...

 Como alguém que estivesse à frente do Santíssimo
E dissesse uma frase acerca do sermão.

 1907 - Illustração Portugueza - Nº 51

 CALENDÁRiO

12MAR2007 - No Teatro Nacional de São Carlos, Antena 2 e Associação Guilhermina Suggia promovem a conferência Guilhermina Suggia (1885-1950), sendo oradores Anita Mercier e Isabel Millet, e havendo uma participação musical ao vivo de Paulo Gaio Lima.

12ABR2007 - Artistas Unidos apresenta, no Convento das Mónicas, Hamelin de Juan Mayorga; com António Simão e Sylvie Rocha.

TRAJECTÓRiA

ARQUIMEDES

 

Físico e matemático grego, Arquimedes nasceu em Siracusa, Sicília, em 287 aC. Ainda jovem, mudou-se para Alexandria, estudando na Biblioteca com discípulos de Euclides. Regressado à pátria, devotou-se à exploração científica - envolvendo a Aritmética, a Astronomia, a Hidrostática e a Mecânica - com o privilégio do tirano Hierão. Durante a II Guerra Púnica, liderou a defesa de Siracusa atacada pelas tropas de Marcus Claudius Marcellus, com recurso a catapultas e outras máquinas de guerra. Após quase três anos de cerco, e invadida a cidade em 212 aC, quanto às lendas/versões sobre a sua morte, sobressai o ferimento letal de espada por um soldado romano - segundo Plutarco, contra as ordens do comandante - pois, absorto com uma figura geométrica, recusou-se a acompanhá-lo de imediato. Foi autor de uma dezena de tratados como Da Esfera e do Círculo (Matemática) e Do Equilíbrio dos Planos (Mecânica). Como investigador, determinou a razão entre o perímetro da circunferência e o seu diâmetro (número pi) ou a teoria da alavanca simples; inventou o parafuso sem fim, a espiral, a roda dentada ou o guindaste por combinação de roldanas para levantar pesos.

MEMÓRiA

287 aC-212 aC - Arquimedes: «A matemática é a mais alta das ciências, o dom mais alto que os deuses deram aos homens. Ela é mais poesia que a própria poesia».

07JUL1907-1988 - Robert Heinlein: «Devemos sempre atenção aos especialistas. Eles explicam o que nos está interdito, e porquê. Depois, é fazer o que queremos.»

ELUCIDÁRiO

Princípio de Arquimedes: Qualquer corpo mergulhado total ou parcialmente num fluido em equilíbrio, dentro de um campo gravitacional, sofre por parte desse fluido uma impulsão vertical, dirigida de baixo para cima, de valor igual ao peso do volume do fluido deslocado.
Tratado dos Corpos Flutuantes

NOTICIÁRiO

Um Novo Invento - O Telescriptor - Depois do telégrafo e do telefone, como meios de transmissão rápida, anuncia-se um novo aparelho que permite corresponder-se directamente, entre assinantes d’uma cidade ou de localidades afastadas, por escrito.

Trata-se d’uma espécie de teclado, com teclas correspondentes às letras do alfabeto e que pode ser ligado a uma rede de fios telegráficos ou telefónicos. Estabelecida esta comunicação, o proprietário do aparelho - que é muito simples e barato, segundo parece - serve-se dele como d’uma máquina ordinária de escrever, ao mesmo tempo que conserva a cópia do que escreveu; o seu correspondente, possuidor d’um aparelho semelhante, vê desenrolar-se diante dele uma cópia idêntica e pode, logo que a comunicação termine, responder-lhe pelo mesmo meio.

O telescriptor - tal é o nome do engenhoso aparelho - foi inventado pelo Senhor [Bernard] Hoffmann, de Viena, que consagrou a essa invenção uns dez anos, antes de o levar ao grau de perfeição e de simplicidade necessárias ao uso corrente.
15MAR1897 - Diário de Notícias

VISTORiA

 

Pelos dados existentes até hoje, só há um animal na galáxia perigoso para o homem - o próprio homem. Portanto, este deve proporcionar a sua própria competição indispensável. Ele não tem nenhum inimigo que lhe corresponda.
A história não regista, em qualquer parte e em qualquer tempo, religião alguma que tenha qualquer base racional. A religião é uma muleta para as pessoas não suficientemente fortes enfrentarem o desconhecido sem ajuda. Mas, como a caspa, a maior parte das pessoas tem uma religião, gasta nela tempo e dinheiro e parece sentir um considerável prazer em brincar com ela.
Nenhum Estado tem o direito inerente de sobreviver por meio de soldados alistados e, a longo prazo, nenhum Estado jamais sobreviveu. As matronas romanas costumavam dizer a seus filhos: «Volta com o teu escudo ou sobre ele». Mais tarde, este costume entrou em declínio. E Roma também.

Todas as sociedades são baseadas em regras para proteger as mulheres grávidas e as crianças pequenas. Tudo o mais é redundância, excrescência, enfeite, luxo ou insensatez, que pode - e deve - ser descartado nas emergências para preservar esta função primordial. Porque a sobrevivência da raça é a única moralidade universal, nenhum outro sustentáculo é possível. As tentativas de formular uma «sociedade perfeita» sobre qualquer outro fundamento além de «Mulheres e crianças primeiro!» são, não só sem sentido, como automaticamente genocidas. No entanto, idealistas ambiciosos (todos eles homens) insistiram interminavelmente - e, sem dúvida, continuarão a tentar.

 Todos os homens são criados desiguais.

Um inimigo nunca é um vilão aos seus próprios olhos. Tem isto em mente; pode proporcionar-te uma maneira de torná-lo teu amigo. Senão, o melhor é matá-lo sem ódio - e depressa.

O dinheiro é um afrodisíaco poderoso. Mas as flores funcionam quase tão bem como ele.

Um bruto mata por prazer. Um tolo mata por ódio.

É melhor ser um chacal vivo do que um leão morto, mas é melhor ainda ser um leão vivo. E, geralmente, mais fácil.

O sexo deve ser amigável. Caso contrário, opta pelos brinquedos mecânicos; são mais higiénicos.

Os homens raramente conseguem conceber um deus superior a eles mesmos (se é que conseguem). A maioria dos deuses tem os modos e a moral de uma criança mimada.

Nunca apeles à «boa índole» de um homem. Pode ser que ele não tenha. Invocar o auto-interesse dele dá-nos mais poder.

Uma moção de adiamento está sempre de acordo com os regulamentos.

Lei de Quéops: «Nada é nunca construído no prazo ou dentro do orçamento».

 Robert Heinlein - The Notebooks of Lazarus Long (1978 - excertos)





IMAGINÁRiO132
24 MAI 2007 · Edição Kafre · imaginario@imaginarios.org
Ano IV · Semanal · Fundado em 2004

 PRONTUÁRiO

 FLAGRANTES




Um dos artistas primordiais da moderna banda desenhada europeia, o italiano Milo Manara consagra - pelo signo erótico - as potencialidades gráficas/narrativas do imaginário para adultos, estilizado entre a exuberante realidade e o prodígio onírico. Uma expressão sofisticada, luxuriante, que em Curtas Metragens - oito histórias breves, intensas, contrastadas, sob chancela das Edições Asa - sublimam a mulher como inspiração privilegiada, na vertigem duma actualidade virtual, subvertida entre passado, presente e futuro. Levando às últimas consequências, pela síntese dos flagrantes exemplares, a sedução feminina como motivação provocativa, sensual - em tormentos e prazeres, perversidade e inocência, lirismo e êxtase - Manara celebra, além dos preconceitos ou das convenções, um tal universo múltiplo, pela estética insinuante, audaciosa, em que se transfigura a criatividade humana IMAGINÁRiO13-52.

CALENDÁRiO

24FEV-21MAR2007 - Galeria Municipal de Sintra apresenta D. Fernando II de Portugal - Ludwig II. Von Bayern, exposição de pintura por Carlos Michaëllis de Vasconcellos.

24FEV-15ABR2007 - Bedeteca de Lisboa mostra Czech Comics - Bd Checa, sendo comissário Petr Štpán.

27FEV2007 - Museu Nacional de Teatro expõe Teatro Moderno de Lisboa 1961/65 - Sociedade de Actores.

MEMÓRiA

570 aC-497 aC - Pitágoras: «A melhor maneira que o homem dispõe para se aperfeiçoar, é aproximar-se de Deus».

26MAI1907-1979 - John Wayne: «A vida é dura. Mas ainda é pior, se formos estúpidos».

1927-1985 - José Augusto Roussado Pinto: Jornalista e escritor, também sob pseudónimos como Ross Pynn, editor de banda desenhada - «Ela acabará por ser uma arte eleita, uma arte de raiz, uma arte dirigida a determinado público (como a pintura, a música, o teatro), e o seu futuro serão as paredes ou os álbuns de luxo».

ANUÁRiO

1957 - É editado The Black Cloud, romance de ficção científica do cosmólogo e astrofísico britânico Fred Hoyle (1915-2001); um defensor da panspermia, teoria segundo a qual a vida na Terra veio do espaço, semeada por meteoritos e cometas, aqui evolui para formas mais complexas e inteligentes, tendo em 1950 desenvolvido a ideia de um Universo estacionário.

BREVIÁRiO

Orion Books edita Innocent When You Dream; entrevistas com Tom Waits, com organização de Mac Montandom.

Âmbar edita O Grande Pintor de Conceição de Sousa Gomes, com ilustrações de Chico; a vida e o talento de um menino, aliás Júlio Resende.

Quetzal edita Madame de Staël [1766-1817], D. Pedro de Sousa [1781-1850] - Correspondência; recolha de Béatrix d’Andlau.

Anti/Edel lança em CD, Orphans: Brawlers, Bawlers & Bastards de Tom Waits.

Campo das Letras edita D. João (1665) de Molière (aliás, Jean-Baptiste Poquelin - 1622-1673); tradução de Nuno Júdice.

PRIORITÁRiO

 


Em Portugal, uma das contribuições artísticas menos notórias para os quadradinhos da época de ouro, mas com influência fundamental no fascínio de origem e no prestígio nostálgico, a criatividade literária - indissociável de uma correspondência visual - tem sido justamente reavaliada, sob a perspectiva de análise/identificação, por investigadores como Jorge Magalhães. Eis a proposta de José Padinha - Um Grande Novelista d’O Mosquito em Cadernos de Banda Desenhada - com expressivo arranjo gráfico de Catherine Labey - e, «graças ao modelo inspirador de Raul Correia», prestigiando ainda «uma escola novelística que, durante anos, ocupou no imaginário dos leitores um lugar tão relevante como as aventuras ilustradas», logo em sagração por Eduardo Teixeira Coelho. Contacto: cathlabey@netcabo.pt

TRAJECTÓRiA

PITÁGORAS




Pitágoras terá nascido na ilha de Samos, Jónia, cerca de 570 aC, filho de Parthénis e de Mnésarcnos, um rico joalheiro. Segundo a lenda, seria uma divindade tornada humana para difundir a arte, a filosofia e a ciência. Aluno de Hermodamas e ávido de saber, a partir da adolescência visitou os principais templos e cidades do mundo antigo. Esteve em Esparta, em Siros com Ferécides, em Mileto com Tales e Anaximandro. No Egipto, privou com o faraó Amasis em Sais, e foi discípulo de Sonchi. Encontrou o assírio Zaratustra, ou Zoroastro, em Babilónia. Decénios passados, voltou a Samos, sob tirania de Policrates. Por 532 aC, radicou-se em Crotona, Magna Grécia, onde fundou a Fraternidade Pitagórica - instituição iniciática para o ensino oral de astronomia, música e matemática. Designou Deus com o número 1, considerou a esfera como a forma geométrica mais perfeita, calculou a proporção dos sons melódicos, definiu a escala essencial do micro e do macrocosmo, reflectiu o Homem em alma, corpo e espírito. A natureza secreta de tal aprendizagem suscitou invejas e inimigos, sendo assassinado, ou escaparia para Metaponto, onde faleceu por 497 aC. Também incendiada a escola, a transmissão não-escrita à irmandade terá alterado ou diluído aspectos do conhecimento pitagórico.

JOHN WAYNE

 Era alto, forte, silencioso, ou surpreendendo pela voz metálica, com um olhar determinante e um sorriso amável. Sob o signo mítico de Hollywood, converteu-se no símbolo emblemático do western, modelado sobretudo por John Ford. Personificou distintos heróis, assumiu as mais diversas e arriscadas aventuras, permanecendo no entanto - e sempre - igual a si mesmo. A sua simples imagem representava o espírito americano; envergando uma farda, era a própria manifestação de comando. Comentaria John Ford, «é certo que fala pouco, mas o que diz significa algo». Nasceu Marion Michael Morrison em Winterset (Iowa), em 1907. A família mudou-se para a Califórnia, estudando na Glendale High School e, com uma bolsa como futebolista, na University of Southern California. Durante as férias de Verão, começou a trabalhar no Fox Film Studio, em funções de especialista nas técnicas de acção.
Em 1928, Wayne estreou-se no cinema - sob as ordens de John Ford, a quem atraíra pela sua simpatia - dobrando actores em cenas perigosas, e logo representando sob o nome de Duke Morrison. Em 1930, tornou-se uma primeira-figura - recomendado por Ford a Raoul Walsh, para A Pista dos Gigantes. Durante os oito anos seguintes, configurou um perfil heróico e invariável em cerca de oitenta filmes, sem honra nem glória. Até personificar Ringo Kid em Cavalgada Heróica (1939), dirigido por Ford - de quem se tornara grande amigo, e para quem passou sobretudo a actuar, ao longo de uma extensa carreira. Assim, a partir de 1939, foi protagonista de numerosos e memoráveis westerns. Em 1947, fundou a sua companhia de produção Batjac, através da qual concretizou vários filmes como actor, dois dos quais também como realizador: Álamo (1960) e Os Bóinas Verdes (1968), este sagrando a intervenção armada no Vietname.
Entretanto, John Wayne tinha-se convertido no perfil institucional do patriota conservador, segundo os princípios rígidos da Velha Guarda. Durante o mccarthismo, foi um dos fundadores e, mais tarde, presidente da Motion Picture Alliance for the Preservation of American Ideals. Em 1969, depois de quarenta anos em funções e mais de 250 filmes, Wayne conquistou o Oscar para o Melhor Actor, em A Velha Raposa (Henry Hathaway). Do seu primeiro casamento (1933-44) com Josephine Saenz, nasceram os actores Michael Wayne (1935) e Patrick Wayne (1939). Em 1976, assumiu o seu próprio drama de um homem indomável, porém minado pelo cancro, já num Oeste crepuscular, como O Atirador. Em tributo nacional, John Wayne daria rosto a uma Medalha do Congresso.

ELUCIDÁRIO

 Teorema de Pitágoras - Num triângulo rectângulo, o quadrado da hipotenusa é igual à soma dos quadrados dos catetos  (a2=b2+c2). 

Demonstração de Euclides (360 aC-295 aC) para o Teorema de Pitágoras - Nos triângulos rectângulos, o quadrado sobre o ângulo oposto ao ângulo recto é equivalente aos quadrados sobre os lados que formam o ângulo recto.
Stoichia/Elementos (300 aC) - Livro 1 - Proposta 47

EXTRAORDINÁRiO

 

O INFANTE PORTUGAL
Primeira Jornada

Capítulo Cinco
O CONTENTO DA SEREIA LEDA - 41

 Cada um no seu silêncio, assim ficaram durante longos instantes. A fitar-se. Embalado, porém, por uma daquelas estúpidas reminiscências - em vez de tiro, milho aos pardais - da boémia alfacinha, estilizou a deslindá-la o exacerbado pintor:

– Dantes, era São Vicente e corvos, depois Santo António e pombos... Como e com quem virá a seguir?

Plevna Kostoglotov tinha versáteis atributos à sua disposição e, embora fanática em cirílico, como Oktobraia conhecia, de ginjeira, a fala portuguesa ou os significados mais ocultos ou brejeiros de uma língua viperina. Por isso, insinuou:

– Com tradição ou contra tradição, não há contradição que resista a quem está de grão na asa...

– Ora essa, acredite na sobriedade da minha postura... – vacilou Nero Faial sem jeito, justificativo, como se fosse ele, e não a tentadora desconhecida, ali o intruso instável.

 Continua




IMAGINÁRiO131
16 MAI 2007 · Edição Kafre · imaginario@imaginarios.org
Ano IV · Semanal · Fundado em 2004


 PRONTUÁRiO

 EXPRESSÕES

 

Um olhar perturbante sobre a realidade, esmaltado por sugestões recorrentes entre a actualidade e o imaginário, tal é o fenómeno de certos filmes - que, à primeira vista, se consumariam no paradigma virtual dos seus reflexos e artifícios. E assim propõe Abel Ferrara com Maria Madalena - em DVD, sob chancela Lusomundo - pela reexposição/representação de um elã místico e sedutor que persiste em nossos dias, mas que remonta aos primórdios do Cristianismo. As manifestações e as provações da fé, a relevância e a controvérsia no papel da mulher, simbolizadas enquanto assunção do poder ou postura cultural, fundem-se num testemunho rigoroso e fascinante sobre os dilemas da emergência religiosa. Em causa, uma actriz que acaba de interpretar para o ecrã a discípula de Jesus, cuja personagem foi desempenhada pelo próprio realizador, e o apresentador dum programa de televisão sobre temas espirituais. A inquietude que leva Marie Palesi à renúncia artística até Jerusalém, a motivação de Tony Childress na divulgação mediática da sua obra, a obstinação de Ted Younger em desvendar os mistérios íntimos/comuns desses comparsas/protagonistas, ressaltam numa trama fascinante de crise e consciência, de conflito e arrebato, de enigma e assombro, envolvendo Juliette Binoche, Matthew Modine e Forrest Whitaker na singularidade prodigiosa dum cineasta polémico mas transfigurador.

CALENDÁRiO

20DEZ2006-19FEV2007 - Em Paris, Centro Pompidou apresenta a exposição Hergé, celebrando o centenário de nascimento do criador de Tintin (1929); em colaboração com a Fundação Hergé.

1938-19JAN2007 - Fiama Hasse Pais Brandão: «A pedra crê: esta / criança é de pedra. / Não crê que veio do ventre / e que um cordão de sangue / a liga à Natureza.» IMAGINÁRiO72-98.

1933-23JAN2007 - A.H. de Oliveira Marques: Professor catedrático, historiador e medievalista, ilustre Maçon - «Só em circunstâncias muito especiais vinha a público. Era muito discreto, de grande afabilidade e correcção, mas que exigia contrapartida» (António Valdemar).

MEMÓRiA

1909-1977 - Ricardo Malheiro: «O meu interesse intelectual no cinema não visa, como objectivo, o aspecto comercial e o lucro.»

13JAN1907-1966 - Serguei Korolev: Responsável pelo Programa Espacial da União Soviética - a partir da II Guerra Mundial, e no início da década seguinte, desenvolveu a missão Vostok, o primeiro projecto tripulado (concretizado em 1961), e planeou o lançamento do Sputnik, primeiro satélite artificial a entrar na órbita da Terra (1957).

22FEV1857-1941 - Robert Baden-Powell: «O Escutismo para rapazes começou em 1908, mas o desejo de criar tal movimento chegou-me muito antes. Quando era miúdo, gostava de rastejar em silêncio nos jardins que rodeavam a escola, para não ser descoberto, e de observar os sinais no terreno à minha volta, para decifrar o seu significado».

22MAI1907-1983 - Georges Prosper Remi, aliás Hergé: «As maiores aventuras são as que decorrem no nosso íntimo».

22MAI1907-1989 - Laurence Olivier: «Um actor deveria ser capaz de criar um universo na palma da sua mão.»

ANUÁRiO

 




1877 - A Agulha de Cleópatra é transferida para Inglaterra, encontrando-se actualmente em Londres, nas margens do Tamisa. Este obelisco foi construído em Heliópolis (Egipto), pelo faraó Tutmosis III, cerca do ano 1500 aC. Embora sendo uma estrutura decorativa e simbólica, de facto trata-se de um dos muitos relógios de sol gigantes que apareceram três mil anos antes dos relógios públicos da Europa. Outra Agulha de Cleópatra está no Central Park de Nova Iorque, para onde foi levada de Heliópolis, em 1880.






1927 - Em Coimbra, Branquinho da Fonseca, João Gaspar Simões e José Régio fundam a revista Presença - originando o segundo Modernismo, determinante movimento literário, nas áreas do pensamento e da criatividade. Até à sua extinção, em 1940, saíram cinquenta e quatro números IMAGINÁRiO74-104-128.

TRAJECTÓRiA

LAURENCE OLIVIER




Laurence Kerr Olivier nasceu em Dorking, Inglaterra, a 22 de Maio de 1907, de ascendência francesa. O pai, Gerard Kerr, era pastor protestante; a mãe, Agnes Louise, faleceu aos seus treze anos. Por ela - uma falta irreparável - estreara-se como actor em 1916, em récita de Stratford-on-Avon, com Julius Caesar de William Shakespeare. Estudou na Oxford University. Já em Londres, frequentou a Central School of Speech Training and Dramatic Art. Profissional na Birmingham Reportery Company em 1926, lançou-se na tela com A Temporary Widow (1929). Em 1930, casou com Jill Esmond e partiu para Nova Iorque, apresentando-se na Broadway, com Private Lives. Contratado por Hollywood em 1931, as primeiras experiências decepcionaram-no. Em 1935, triunfou em Londres com Romeo and Juliet, produção de John Gielgud. Em 1936, contracenou com Vivien Leigh em Hamlet, seguindo-se no ecrã Inglaterra em Chamas (1937). Uma relação tempestuosa em Hollywood - com acusação de adultério por Jill, que pediria o divórcio. Prestigiado com O Monte dos Vendavais (1939), em 1940 desposou Vivien, seguindo-se uma vivência matrimonial de euforias e depressões. Responsável pelo Old Vic, serviu na força aérea da Marinha até 1944. Em 1946, mereceu um Óscar Honorário como intérprete, produtor e realizador de Henrique V (1944). Em 1948, recebeu o Óscar como protagonista de Hamlet (1947), que dirigiu e também galardoado. Separado de Vivien, em 1961 consorciou-se com Joan Plowright - com quem trabalhara em The Entertainer, na Broadway (1958) e no cinema (O Comediante - 1959). Em 1963, passou a dirigir a England’s National Theatre Company. A partir de 1967, foi afectado por diversas enfermidades e intervenções cirúrgicas. Distinguido com os títulos de Sir em 1947 e de Lord em 1970, e em 1981 com a Ordem de Mérito do Império Britânico. Em 1978, outro Óscar Honorário sagrou o conjunto da sua carreira. Escreveu a autobiografia Confessions of an Actor (1984) e On Acting (1986). Sem esmorecer, continuou activo em filmes, peças e na televisão, consagrado pela aura mítica de um talento excepcional. Afectado por doença muscular, faleceu em Steyning, a 11 de Julho de 1989, sendo sepultado na Abadia de Westminster.

RICARDO MALHEIRO

Produtor e realizador do cinema português, nasceu em Vila Nova de Famalicão, a 9 de Julho de 1909. Foi actor em pequenos papéis - O Trevo de Quatro Folhas (1936 - Chianca de Garcia), A Revolução de Maio (1937 - António Lopes Ribeiro), Os Fidalgos da Casa Mourisca (1938 - Arthur Duarte), Pão Nosso... (1940 - Armando de Miranda) e, todos de 1943, Fátima, Terra de Fé! (Jorge Brum do Canto), O Costa do Castelo (A. Duarte), Amor de Perdição (A.L. Ribeiro), Ave de Arribação (A. Miranda); ou Um Homem às Direitas (1944 - J.B. do Canto) e A Noiva do Brasil (1945 - Santos Mendes). Em 1949-1963, realizou dezenas de curtas e médias metragens documentais - como Festa Brava (1952), Caminhos de São Francisco Xavier (1953), Sinfonia Metálica (1954), Enquanto o Barco Espera (1956). A partir de 1958, viveu e trabalhou alguns anos no Brasil. Exerceu actividade em todas as antigas colónias (nos anos ’50, associado a Felipe de Solms - incluindo a ficção longa O Costa d’África - 1954 de João Mendes), de África ao Extremo Oriente, tendo participado em cerca de duzentos filmes. Entre nós, foi pioneiro na utilização da cor, em 1956 (Madeira, Uma Canção de Fernando Garcia), e produziu o primeiro documentário em 70 mm, em 1968 (Tráfego e Estiva de Manuel Guimarães). Em 1967, com o apoio da Fundação Calouste Gulbenkian, lançou a série Artes e Letras - na qual colaboraram cineastas veteranos e da jovem geração - através da Cultura Filmes, de que foi sócio maioritário. Faleceu em Lisboa, 1977.

INVENTÁRiO



«Graças a Tintin, eu consegui ser o único jornalista que, praticamente, nunca escreveu uma linha», comentou um dia o criador Hergé. Foi em 10 de Janeiro de 1929, nas páginas de Le Petit Vingtième, que tudo começou para o repórter adolescente e audaz aventureiro, com toda a sua trupe irresistível - o tremendo capitão Haddock, o fiel cão Milou, o lunático professor Girassol, os inconfundíveis Dupont e Dupond, a diva Bianca Castafiore... A primeira tradução das proezas de Tintin foi portuguesa, através de Adolfo Simões Müller (1940).
 Primitivo ou moderno, Hergé sagra uma narrativa exuberante, uma escrita rigorosa, expondo a saga universalista, entre drama e euforia, tragédia e resgate, em que a camaradagem sobrevive, em paralelo aos valores do bem e do mal. «Tintin expõe as minhas próprias emoções e experiências. Ele tanto faz parte de mim, que morreremos juntos» - perspectivou ainda Hergé, a quem o biógrafo Benoît Peeters consideraria «um indivíduo infinitamente complexo».

VISTORiA


Lisboa sob névoa

Na névoa, a cidade, ébria
oscila, tomba.
Informes, as casas
perdem o lugar e o dia.
Cravadas no nada,
as paredes são menires,
pedras antigas vagas
sem princípio, sem fim.
Fiama Hasse Pais Brandão

BREVIÁRiO

Editorial Caminho lança Ruas e Gentes na Lisboa Quinhentista de António Borges Coelho.

Dargil edita, sob chancela ECM News Séries, Kafka-Fragmente de György Kurtág; inspiração em diários e missivas de Franz Kafka (1883-1924), por András Keller com a soprano Juliane Banse.




IMAGINÁRiO130
08 MAI 2007 · Edição Kafre · imaginario@imaginarios.org
Ano IV · Semanal · Fundado em 2004


 PRONTUÁRiO

 FESTIVAIS





Entre nós, a mais antiga e prestigiada manifestação dedicada aos quadradinhos, o Amadora Bd testemunha e celebra um investimento reiterado, sugestivo, além de um consagrado interesse por esta expressão artística, em suas modalidades e correspondências mundiais. Tal vem suscitando, paralelamente, outros fenómenos de apelo e aliciamento - para além do culto ou nostalgia; e permitindo manifestações virtuais, determinantes para o estudo ou reavaliação das obras, dos seus criadores ou das tendências. Finalmente, um certame com tão amplo historial de vivências, com tão rico memorial de referências é, na sua especificidade institucional, motivo/objecto de análise/reflexão em Práticas na Banda Desenhada - Os Visitantes do 16º Festival Internacional de Banda Desenhada da Amadora [2005] - sob chancela de Edições Afrontamento - pela experiente motivação do arquitecto Nelson Dona, director do Amadora Bd, sendo co-autoras a socióloga Helena Santos, professora na Faculdade de Economia do Porto, e Ana Cardoso, licenciada em Ciências da Comunicação e da Cultura e colaboradora no Centro Nacional de Banda Desenhada e Imagem/CNBDI. Ao visar os públicos de banda desenhada, eis propostas de observação e abrangência que consolidam e devolvem a complexidade primacial e primordial de um olhar em quadradinhos.

CALENDÁRiO

11FEV917-30JAN2007 - Sidney Sheldon: «Ninguém sabe de onde vem a inspiração. Em minha opinião, a criatividade é um dom. E a nós cabe trabalhar muito para desenvolvê-lo.».

MEMÓRiA

08JAN1867-1961 - Emily Balch: «Tendemos a especular sobre o que o futuro nos reserva. Mas os acontecimentos não nos afectam, apenas; em parte, somos nós a causá-los ou, pelo menos, influenciamos o seu curso».

1848-12MAI1907 - Joris-Karl Huysmans: «Cada um deve ser o jardineiro que cuida da sua própria alma».

14MAI1936-1973 - Bobby Darin: «Quero ser uma lenda, quando chegar aos vinte e cinco anos».

PRIORITÁRiO

Professor Catedrático do Departamento de Matemática da Universidade de Coimbra, escritor e poeta de vivências e por opções, Francisco José Craveiro de Carvalho é também um tradutor inquieto, interventor, e todos estes estímulos/estigmas convergem em duas obras de produção recente, com o sinal das afeições e um destino em equação: ainsÓniadefibOnacci - uma antologia de Katharine O’Brien, e Pirata de Bolso - sob chancela de Edições + (&) ´ - uma antologia «de alguns poemas que têm uma relação próxima com a Matemática». Contacto: fjcc@dolly2.mat.uc.pt IMAGINÁRiO16-117.

ANTIQUÁRiO

 


13MAI1917 - Num dos ermos vales da Serra de Ourém, três crianças guardam o rebanho na Cova da Iria, perto de Fátima, a cento e quarenta quilómetros ao Norte de Lisboa. Então, «uma linda senhora» aparece numa nuvem luminosa aos pastorinhos - Lúcia de Jesus dos Santos e seus primos, Jacinta e Francisco Marto - junto às azinheiras solitárias. A Virgem Maria fala-lhes de profecia em palavras de fé, tendo recomendado penitência e oração, para salvação dos males do Mundo. Promete ainda voltar todos os dias 13, durante seis meses. Quando as autoridades locais tiveram conhecimento desta visão, ameaçaram os meninos com castigos, caso eles não se retractassem. Mas os jovens crentes reafirmaram os factos, inspirando toda a população. No predito 13 de Junho, setenta mil pessoas aglomeraram-se, esperando o anunciado fenómeno sobrenatural. De súbito, o Sol rompeu, estrelando o céu, sobre a Terra. No dia 13 de Outubro, tal repetiu-se, ainda mais espectacularmente.

15MAI1927 - Principia a I Volta a Portugal em Bicicleta, da qual foi vencedor Augusto Carvalho da equipa de Carcavelos. A segunda edição apenas se realizou em 1931.

21MA1927 - Charles Lindbergh (1902-1974) consuma, em 33 horas e 31 minutos, o primeiro voo solitário sem escala sobre o Oceano Atlântico, entre Nova Iorque e Paris, a bordo do avião The Spirit of Saint Louis.

TRAJECTÓRiA

 SANTA CAMARÃO
AMOR NO RINGUE

 


Com rodagem de interiores e gravação nos estúdios da Tobis em Épinay-Sur-Seine, França, A Severa (1931) de Leitão de Barros deu início ao fonocinema nacional. A Canção de Lisboa (1933) de Cottinelli Telmo celebrar-se-ia como primeiro filme sonoro «feito em Portugal, por Portugueses e para Portugueses». Eis factos consabidos, sobre testemunhos histórico-artísticos que sobreviveram à voragem do tempo e à imprevidência dos homens... Qual foi, no entanto, a primeira longa metragem ficcional em que se falava a nossa língua? As referências apontam para Liebe im Ring (Alemanha) de Reinhold Schűnzel - que teve première em Berlim, Março de 1930, e estreado como Amor no Ringue em Lisboa, a 8 de Maio desse ano, no Teatro Politeama.

Intervinham o campeão português José Santa (Camarão), que na Alemanha granjeara reputação, após combates que demonstraram a sua coragem e lealdade como pugilista; e no papel de seu amigo ou segundo, Arthur Duarte, cujo prestígio se afirmou na UFA, enquanto actor e assistente. Com produção de Terra Film-United Artists, Amor no Ringue era protagonizado pelo campeão germânico e challenger ao título mundial Max Schemeling - como Mathias, um obscuro atleta a quem o manager descobre notáveis qualidades, mas que abandona ambições e trainings, a humilde noiva e a honesta família, por uma sedutora amante... Aliás, uma intriga convencional, quanto aos flagrantes e efeitos espectaculosos que se especularam.

No entanto, Mathias regenerar-se-á, após sensacional disputa e vitória sobre José Santa, reconciliando-se com os que o amam, e iniciando uma gloriosa carreira... Ora, seria essa derrota que, entre nós, chegou a provocar controvérsia, levando Camarão a esclarecer publicamente que perdeu por «exigências de argumento» e enquanto personagem romanceada, sem que os brios desportivos do campeão de Portugal sofressem a menor afronta. No entanto, uma legenda que assim ostensivamente o anunciava, viria a ser depois, sob protesto, suprimida da fita. Já no final dos anos ’70, Arthur Duarte confiou-nos que, durante a filmagem, Schmeling ter-se-ia visto em dificuldades para convencer José Santa a vergar-se, fingidamente, ao seu sucesso!

Por outro lado, o director Reinhold Schűnzel declarou que a participação no nosso grande boxeur tinha «excedido todas as expectativas» e, no próprio desenvolvimento da acção, o prestígio pessoal de Santa (Camarão) estaria devidamente salvaguardado. Conforme à época contava, no Cinéfilo, José da Natividade Gaspar, «a bravura e lealdade de jogo do vencido fazem-no partilhar dos aplausos» e, no Kino, António Lopes Ribeiro - sob o pseudónimo ACS - reconhecia que, em Amor no Ringue, há «qualquer coisa de inaudito - e muito belo», sublinhando ainda a fórmula internacional de sincronizar os distintos intérpretes pelas expressão e modelação labial nos países de origem, usando-se também na representação o inglês e o francês...

Anote-se, por fim, que Max Schemeling - eleito, em 1987, «o maior desportista alemão de sempre» - faleceu com noventa e nove anos, em 2005. Quanto às proezas de José Santa (1902-1968), foram realmente registadas em diversos documentários - cujas matrizes, lamentavelmente, falta ainda recuperar. A partir duma investigação realizada em 2001-2003, em Ovar (onde nasceu e faleceu) e em Lisboa, no Beco da Cardosa (onde viveu com a irmã, Josefa Exposta), Marcos Muge inventariou o Espólio do Santa (publicado no Jornal de Ovar, em 2004) e esculpiu a cabeça de Camarão, no decurso duma série de homenagens ao pugilista vareiro, a propósito do centenário, as quais decorreram na terra natal, em Alfama e Oliveira de Azeméis, até 2005.

NOTICIÁRiO

 



O Milagre de Fátima - A chuva, à hora prenunciada, deixa de cair; a densa massa de nuvens rompe-se e o astro rei - disco de prata fosca - em pleno zenith aparece e começa dançando num bailado violento e convulso, que grande número de pessoas imaginava ser uma dança serpentina, tão belas e rutilantes cores revestiu sucessivamente a superfície solar...

Milagre, como gritava o povo; fenómeno natural, como dizem sábios? Não curo agora de sabê-lo, mas apenas de te afirmar o que vi... O resto é com a Ciência e com a Igreja...
29OUT1917 - Ilustração Portugueza - Avelino de Almeida (excerto)

VISTORiA

 


¨Há nove anos Félix Lemâitre, uma criança com catorze anos de idade, assassinou um rapazinho que não conhecia porque lhe apeteceu vê-lo sofrer e ouvir-lhe os gritos. Rasgou-lhe o ventre com uma faca, deu voltas e mais voltas à lâmina na cavidade morna, e depois serrou-lhe lentamente o pescoço. Não mostrou nenhum arrependimento, revelou-se inteligente e atroz no interrogatório a que foi sujeito.

Durante meses, o Dr. Legrand du Saulle e outros especialistas mantinham-no pacientemente sob vigília mas nunca puderam verificar nenhum sintoma de loucura nem qualquer coisa que parecesse, sequer, uma mania. E tratava-se de uma criança a bem dizer educada, nem mesmo por outros pervertida!
Joris-Karl Huysmans - Além (1891 - excerto)

BREVIÁRiO

2006 - Assírio & Alvim edita Além (1891) de Joris-Karl Huysmans; tradução de Aníbal Fernandes.

Atalanta Filmes edita em DVD, L’Atalante (1934) de Jean Vigo.

EXTRAORDINÁRiO

 

O INFANTE PORTUGAL
Primeira Jornada

 Capítulo Cinco
O CONTENTO DA SEREIA LEDA - 40

 Era loira, felina e, em expectativa, estava reclinada de viés junto ao umbral. Até aos confins, Nero Faial sentiu-lhe o negrume da alma.

Continua




IMAGINÁRiO129
01 MAI 2007 · Edição Kafre · imaginario@imaginarios.org
Ano IV · Semanal · Fundado em 2004

PRONTUÁRiO

ALTERNÂNCIAS






Um dos autores fundamentais da moderna banda desenhada portuguesa, Filipe Abranches reúne em Solo uma parte significativa da sua laboração, entre 1988 e 2005, que se encontrava dispersa ou mesmo inédita. Além da oportunidade de revelação ou abrangência, esta subtil proposta - sob chancela das Edições Polvo - reformula a convencional leitura em colectânea, evidenciando um criador tão peculiar que, ao assumir explicitamente as suas filiações ou influências artísticas, nos coloca em paralelo perante a singularidade do seu olhar, pela simultânea conjugação duma inspiração imprevisível, duma sensibilidade eclética, dum estilo volúvel e dum talento versátil. Abranches justifica Solo, «porque a violoncelista nua de uma das histórias é solista numa orquestra. Mas igualmente por essas histórias serem produto de um trabalho solitário e do gosto pelo preto e branco, uma alternativa ao grayscale da realidade». Ainda mais, eis um manancial que intriga, evolui, inquieta - em impressões enigmáticas, em estímulos bizarros, em estigmas distorcidos - culminando um imaginário próprio, complexo, fascinante e perturbador.

CALENDÁRiO

1922-08JAN2007 - Yvonne De Carlo: «Uma das maiores beldades nos anos ’40 e ’50, uma das mulheres mais bonitas do Mundo. Era uma das últimas rainhas do glamour em Hollywood» (Kevin Burns).

1925-17JAN2007 - Art Buchwald: «Sendo a pessoa que sou, quero que se lembrem de mim pelo humor, pelo facto de os ter feito rir. Também quero que me recordem como um sujeito simpático - faz parte da fantasia».

27MAR-06MAI2007 - Teatro Maria Matos apresenta Dúvida - Uma Parábola de John Patrick Shanley; encenação de Ana Luísa Guimarães, sendo protagonistas Eunice Muñoz e Diogo Infante.

18-24JUN2007 - Organizado pela Hikari Global, decorre o Lisbon Village Festival, sendo convidado de honra o actor americano Robert De Niro IMAGINÁRiO24.

MEMÓRiA

1652-15JAN1717: Antónia Margarida de Castelo Branco - Casada em 1670 com Brás Teles de Meneses e Faro, entrada em 1675 no Convento de Santos, em 1679 por efeito de divórcio perpétuo e, no Convento da Madre de Deus em Lisboa, professando como Clara do Santíssimo Sacramento, até 1703 tendo escrito Fiel e Verdadeyra Relação Que Dá dos Sucessos de Sua Vida a Creatura Mais Ingrata a Seu Creador por Obediencia de Seus Padres Espirituaes e Novamente Tornada a Escrever por Hum Sucesso na Era de 1685 Annos - «Uns me notavam de invencioneira e outros de singular».
07MAI1857-1911 - Fialho de Almeida: «Eu estive n’um monte, ao fundo de uma herdade. Não imaginas a plenitude e que paz!»

PRIORITÁRiO

 



Mosquito, Uma Máquina de Histórias - Catálogo editado pelo Centro Nacional de Banda Desenhada/CNBDI, e alusivo à exposição apresentada, entre 30OUT2006 e 01JUN2007, em suas instalações na Amadora. Concebido por Cristina Gouveia, também autora dos textos com Jorge Magalhães, José Ruy, Leonardo De Sá e Sara Figueiredo Costa, tem design de Inês Vieira da Silva. Assinalando o septuagésimo aniversário do semanário infantil (1936-1953) fundado por Raul Correia e António Cardoso Lopes, do qual foram colaboradores - entre outros - Eduardo Teixeira Coelho, Jayme Cortez, Vítor Péon, José Garcês e José Ruy, eis uma obra que alia memória, análise e informação, profusamente ilustrada, e referencial para a história da imprensa sobre quadradinhos em Portugal. Contacto: bd.amadora@netcabo.pt

VISTORiA

 À medida que me elevava, a ascensão entrava a dificultar-se; folhas em tufos compactos prendiam-me os cabelos, os ramos oscilavam sob o peso do meu corpo, e de quando em quando soavam estalidos ameaçadores. Mas via já bem o ninho de águia; primeiro um alicerce de quatro ou cinco ramos de sobro, cruzados; depois um leito de folhas secas e pequenas hastes; sobre o leito folhas macias de trevos, de tamujes e fenos - e, forrando delicadamente o estojo, uma colcha de penugens brancas que a águia arrancava do peito, nos seus transportes de mãe. Com insano trabalho cheguei-lhe ao pé. Pulava-me o coração no peito, e qual não foi a minha alegria ao ver aconchegadas no ninho, uma de encontro à outra, adormecidas e tremendo de frio, duas aguiazinhas implumes, disformes ainda, mas de vigorosas proporções! Cerrara-se de todo a noite. Um claro luar com reflexos metálicos atravessava as vaporizações do arvoredo, penetrando-as de uma poeira de átomos cintilantes. Nas faias da ribeira, os rouxinóis faziam jogos florais arremessando-se os sonetos mais rítmicos; o veio cristalino dos regatos ia contando às folhagens húmidas dos balseiros e canaviais uma lenda antiga de fadas azuis e tesouros mouriscos, narrativa muito em segredo, ente murmúrios de beijos que ao longe mansamente se perdiam.

Dava trindades o sino da aldeia - e as aspirações pairavam naquele calado ar em que borboletas negras saltitavam, traçando sinais de mulheres predestinadas. A lua, na tela do céu esmaiado, lembrava, com as suas ranhuras, a máscara da comédia de uma ópera cómica, que a luz da ribalta ilumina. Ergui os olhos - acabava de ouvir um grito. Vi a águia pairar um momento por sobre a minha cabeça, de asas abertas, cujas rémiges em cutelo siflavam como velas de um moinho em actividade. Depois aquele vulto negro desceu perpendicularmente, raivoso da minha audácia e estendendo o bico de gumes curvos, para me ferir. Agarrado à corda dei um salto, abandonando o ninho, e fiquei suspenso na árvore um instante, a dez metros do chão pedregoso, batendo os dentes de terror. Que fazer? A corda por curta não chegava ao chão. Deixar-me cair era morrer. De repente, porém a enorme pernada dá um estalido seco, houve um atrito de folhas e lentamente vim baixando. Quando pousei no chão, com os dois filhos da águia no peito da camisola e a navalha nos dentes, senti um prazer sem limites. Tinha destruído uma felicidade e praticado a façanha de subir à azinheira, sem outro auxílio mais do que uma pequena corda nodosa e fina. Levaria os implumes para a herdade e criá-los-ia com carne e sangue fresco de cordeiro. E eles cresceriam, alcançando as poderosas formas dos pais - bico adunco e córneo, a terrível garra contráctil, simetria elegante nas asas, que um jogo muscular movimenta com inexplicável destreza. E pertencer-me-iam, estariam na gaiola por minha vontade, comeriam se eu quisesse. Esta ideia de ter alguém sob a minha obediência encheu-me de orgulho. Podia fazer mal sem ter medo das queixas que arrancasse. E vinham-me tendências para oprimir, para espicaçar, para expor à tortura. Também meu pai me batia! que sofressem! Na azinheira a águia ia de ramo em ramo, soltando, a cada investigação inútil, o seu grito melancólico. Corria as arvores próximas, voejava quase à flor do terreno, batendo com as asas dos tojais da selva, e indo em todos os sentidos como alucinada. Depois abriu as asas horizontalmente com um pulo, susteve-se nas penas como um pára-quedas, e com firmeza cortou o ar obliquamente subindo à região das nuvens. De quando em quando, na calada do campo morto, o seu grito de mãe roubada ouvia-se na escuridade, como o silvo de um barco em perigo que pede socorro.

Fialho de Almeida - O Ninho de Águia (Vila de Frades, 1881 - excerto)

 

ANUÁRiO

1984 - Imprensa Nacional-Casa da Moeda/INCM edita Antónia Margarida de Castelo Branco. Autobiografia (1652-1717), com prefácio e transcrição de João Palma-Ferreira, a partir do manuscrito considerado autógrafo da Biblioteca Nacional.

 1987 - Margarida Gil planifica e produz com João César Monteiro, e realiza Relação Fiel e Verdadeira, sendo protagonista Catarina Alves Costa: A jovem Antónia Margarida Castelo Branco é entregue por sua mãe a Brás Telles de Meneses e Faro, em nome de obscuros interesses entre famílias da aristocracia rural do Norte. Brás é um homem arruinado e boémio, com fama de violento e perdulário. A fortuna de Antónia é o primeiro sacrifício da esposa. Fascinada por um marido que a humilha e maltrata, ela segue-o na peregrinação por domínios cada vez mais nus, por casas cada vez mais inóspitas. A relação cresce em horror e miséria...

ANTIQUÁRiO

06MAI1927 - Em Diário do Governo, é publicado o Decreto Nº 13.564, primeiro diploma para o cinema da Ditadura Nacional, que institui a censura, determinando ser «rigorosamente interdita a exibição de fitas perniciosas para a educação do povo, de incitamento ao crime, atentórias da moral e do regime político e social vigorantes». Por outro lado, «torna-se obrigatória, em espectáculos cinematográficos, a exibição duma película de indústria portuguesa com um mínimo de 100 metros, que deverá ser mudada todas as semanas e, sempre que seja possível, apresentada alternadamente, de paisagem e de argumento e interpretação portuguesa». Embora controversa, a lei dos cem metros fomentou, entre nós, uma produção genérica de curtas metragens.

1937 - A Academia das Artes e das Ciências de Hollywood institui o Prémio Irving Thalberg - um Oscar especial, destinado a laurear «os criativos cujos trabalhos reflectem, constantemente, um elevado nível de qualidade».

 


06MAI1937 - O dirigível Hindenburg explode no ar, ante o olhar atónito dos que assistem à sua chegada à base naval americana de Lakehurst. A tragédia - motivada em ambiente de tempestade, por um raio ter feito arder o gás, embora se especulasse mais tarde de sabotagem anti-hitleriana - custa a vida a trinta e seis pessoas. Era a maior aeronave construída até então, e considerada a mais segura do mundo, tendo a engenharia alemã contribuído com toda a tecnologia disponível. Media duzentos e cinquenta e dois metros de comprimento, trinta e oito de altura, e podia transportar trinta e cinco passageiros. Levava uma carga de hidrogénio de mais de dois milhões de metros cúbicos, razão pela qual exigia muito rigorosas medidas de segurança IMAGINÁRiO128.



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