Tema
Descriminalizar dif. de descriminar
Pergunta/Resposta
No Brasil, quando se debate a liberação do uso de drogas, costuma se dizer "descriminalização", "descriminalizar", ou seja, deixar a lei de prever um fato como crime. O Dicionário Houaiss reconhece esta forma como sinônimo de "descriminar" (cujo uso é raro). Qual a preferível, descriminar ou descriminalizar? Qual regra se aplica para a formação de palavras novas como nesse caso? Grato, uma vez mais.
Eduardo A. Paglione
Brasil
Como o consulente verificou, existem as duas formas e ambas estão corre(c)tas. Elas têm uma ligeira diferença de significado, o que leva a um diferente emprego, como passo a explicar.
São formas derivadas de criminar e criminalizar .Criminar (e incriminar) significam «pronunciar como criminoso», «imputar crime a», «acusar». Criminar provém do latim ‘criminare’ (“acusar”). Criminalizar é um termo de ocorrência posterior, que significa «declarar que determinado acto se considera crime».
Assim, descriminar vai, pois, significar «tirar a culpa a alguém», «desculpar», «ilibar do crime», «inocentar», enquanto descriminalizar significa «excluir a criminalidade de um acto ou de um facto», «considerar que não é crime um determinado acto ou facto».
No contexto que apresenta, será de utilizar a palavra descriminalizar . Parece estar em apreciação se se deve considerar juridicamente que um determinado a(c)to ou fa(c)to deixe de ser denominado de crime, e não se deve ser retirada a imputação de um crime a uma pessoa incriminada.
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Tema
Ainda a pronúncia da palavra actriz
Pergunta/Resposta
Não estou de acordo com a pronunciação da palavra actriz. Que eu saiba o "c" está lá precisamente para abrir o "a" anterior. Eu digo 'actriz' com o "a" aberto da mesma forma que digo 'actor' com o "a" aberto. Este fenómeno de fechar as vogais tão típico do dialecto lisboeta um dia vai tornar o nosso português imperceptível.
Peço desculpa pela 'ousadia' da questão, mas o grupo que constitui o Ciberdúvidas é todo constituído por 'alfacinhas' , ou há alguém de fora da capital?
Mais uma vez parabéns pelo excelente sítio que proporcionam (o qual admito visitar diariamente).
Pedro Teles
Portugal
A primeira questão que refere (o facto de a seguido de c ser aberto) é errónea, porque, na verdade, o c não se diz (apesar de já se ter dito...).
[No português do Brasil atriz e ator não levam sequer este c mudo, com se sabe. Cf. Ortografia e pronúncia do português europeu]
A regra apontada é válida, por exemplo, para o francês, em que, quando uma vogal é seguida de dois sons consonânticos, deve ser aberta: “á[ks]ion”, ('action'), “é[ks]périence”, “á[kt]rice”, e por aí fora (note se que o acento antes de [] não existe graficamente; serve apenas para assinalar a abertura da vogal). Porém, no francês, a consoante que segue a vogal está bem presente foneticamente.
Quanto à segunda questão (dizer actriz com a fechado e actor com a aberto), posso adiantar lhe que esta parece ser uma variação em curso (semelhante à de armário /ármário/, oscilar /óscilar/) que talvez decorra desse desaparecimento fonético da consoante que segue a vogal e que provavelmente só daqui a algum tempo poderá ficar decidida. Estas mudanças são muito lentas e graduais e, por isso, talvez nenhum de nós chegue a presenciar o momento em que uma das variantes se cristalize na língua.
A terceira questão que levanta é interessante. A verdade é que a variedade lisboeta não é a que mais fecha a vogais (lembremos o /pauco/ por pouco em Lisboa, /poco/ dos dialectos minhotos, ou os /pôrcos/ por porcos de algumas zonas de Trás os Montes), mas talvez a que mais reduz as vogais: feminino é /femenino/ (quase não se percebendo as vogais /fmnino/), ministro é /menistro/ (idem), etc.
Há que perceber, em relação a esta questão das variedades do português, que não há dialectos melhores e piores. Há, sobretudo, que aceitar a variedade como um factor de enriquecimento linguístico, cultural e histórico.
No entanto, como sempre houve e sempre haverá necessidade de regular a língua (devido, cada vez mais, aos meios de comunicação social e à facilidade de comunicação), tem de se estipular uma norma e essa norma, actualmente, é nos dada pela variedade lisboeta (por razões demográficas e institucionais, principalmente).
Muitas vezes, esta variedade é conotada como a variedade “prestigiante” e “prestigiada” mas e parece me importante salientar este assunto essa estereotipização não pode permanecer no entendimento de um linguista, excepto se se tratar de problemas de normativização ou consultoria, como acontece no Ciberdúvidas.
Mas, mesmo sendo a consultoria de Língua um dos propósitos do Ciberdúvidas, o grupo de consultores não é apenas constituído por alfacinhas. Há, inclusivamente, consultores falantes de variedades não continentais do Português!...
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Pergunta/Resposta
Ouve se muita gente, na rádio, pronunciar "veículo" da seguinte forma: "vei í culo".
Será motivo para puxão de orelhas? Ou estarão perdoados?
L.G.
Um profissional da rádio não pode negligenciar nem o conteúdo nem a forma daquilo que diz, no exercício das suas funções. Sendo ouvido por milhares de pessoas e identificado por elas, de algum modo, como figura de autoridade, tem uma enorme responsabilidade na divulgação e na consolidação de formas de expressão que o público, confiadamente, passa a copiar.
Veículo é ve ículo, e não vei ículo, naturalmente.
É claro que todas as coisas têm a sua razão de ser, mesmo os erros. Tal como a natureza «tem horror» ao vácuo, o português tem horror ao hiato (duas vogais contíguas que não formam ditongo).
Para o evitar, uma das formas é intercalar um i entre as vogais em hiato, como fazem os nossos compatriotas nortenhos em «a (i) água». Ninguém leva a mal, até se acha graça, e nem sequer se considera errado.
Mas num profissional...
T. A.
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CHEGAMOS
Provavelmente por influência da tele novelas brasileiras, granjeou se agora o péssimo hábito de se ensurdecer a vogal a da terminação amos dos verbos da primeira conjugação, quando empregamos o pretérito perfeito do modo indicativo. Ora, este ensurdecimento vocálico apenas terá justificação, no caso de nos referirmos ao tempo presente, nunca ao passado, pois aqui teremos de abrir sempre a vogal à para evitarmos a confusão entre os dois tempos verbais. E, quanto a este facto, a regra é bem explícita: nos verbos da primeira conjugação, sempre que aludamos ao passado, teremos de acentuar graficamente a vogal a, a fim de a distinguirmos do tempo presente. Exemplifiquemos com as seguintes frases: "Chegámos ontem de Paris cerca das três horas da manhã". (Aqui acentuámos o a, porque se trata de um acto ocorrido no passado). "Com a generalização das viagens aéreas, hoje nós chegamos mais depressa ao nosso destino". (Neste caso, porquanto se trata de um acto presente, não precisamos de abrir a segunda vogal).
Tomámos este verbo apenas como exemplo; mas a regra aplica se, como é obvio, a todos os outros da primeira conjugação.
Francisco Alves da Costa
Jornal Olivais
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CARO
Quando desempenha funções adverbiais, com o sentimento habitual de por alto preço, a palavra caro permanece invariável, conforme o exemplo dado na seguinte frase: "... Viu se, porém, que em sua frente estava um homem disposto a vender caro a vida..." (página 179, edição
de 1972, do romance "A Filha do ladrão", de Tomás da Fonseca).
Só em funções adjectivas é que o termo caro terá de concordar, em género e número, com o substantivo que qualifica, segundo o exemplo desta frase: "... E principalmente a ganância de certos comerciantes que torna a vida cara às pessoas."
Francisco Alves da Costa
Jornal Olivais
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CAFÉ CONCERTO
O plural deste composto espúrio, como lhe chamou Vasco Botelho de Amaral, só poderá ser cafés concertos, e não café concertos, como já ouvimos alguém imprudentemente aconselhar aos seus familiares, em conversa entabulada à mesa de uma pastelaria lisboeta.
Francisco Alves da Costa
Jornal Olivais
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CACHEIRO
Talvez por influência do termo caixeiro, com o qual não se aparenta, há pessoas que proferem càcheiro, com a aberto, quando esta palavra se deve ler, à semelhança de cacheira (cacete, moca), sempre com o a da antepenúltima sílaba surdo. Esta mesma pronúncia foi também aconselhada por João de Deus, em 1895, na página 143,1 . coluna, do seu "Dicionário Prosódico de Portugal e Brasil".
Cacheiro quer dizer que se esconde, e emprega se principalmente em relação ao ouriço, que, na iminência de um perigo, se oculta, por enrolamento, sob os próprios espinhos.
Francisco Alves da Costa
Jornal Olivais
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BOLSO
Apesar de, consoante a regra estabelecida por Cândido de Figueiredo, o plural deste substantivo deve ser pronunciado bôlsos (algibeiras), com a vogal da penúltima sílaba fechada, o certo é que a sua prosódia, no plural, se faz normalmente com a primeira vogal aberta (bólsos), pelo menos na chamada região do português oficial, situada entre o sul do rio Mondego e o Vale do Tejo, principalmente na região de Lisboa. E (é caso para deitar foguetes) foi também esta a pronúncia registada na página 554, .° volume, do "Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea", publicado em 2001 pela "Academia das Ciências de Lisboa".
Francisco Alves da Costa
Jornal Olivais
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BELZEBU
Segundo estipula a regra, todas as palavras oxítonas (agudas) terminadas em u dispensam qualquer acento gráfico. Labora, portanto, em erro quem escrever, à maneira espanhola, como já temos observado: nú, tú, perú ou belzebú. Tal acento apenas se deve aplicar, quando se pretenda anular o ditongo, à semelhança do que se faz, por exemplo, com baú ou Esaú, a fim de que estes vocábulos não constituam rimas de pau, mau ou colorau.
Francisco Alves da Costa
Jornal Olivais
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ATRACÇÃO EXERCIDA PELAS PREPOSIÇÕES SOBRE OS PRONOMES PESSOAIS COMPLEMENTARES
Sempre que um verbo, regido pela preposição, anteceda um infinito, ligado a qualquer forma do pronome pessoal atónico, este será normalmente colocado o mais próximo possível dessa preposição. Exemplos: "Gostaria de te falar a sós...", "Estou preparado para te ouvir confessar o disparate que fizeste..." e "Até se desvendar a verdade sobre o assunto, muita gente ainda será incomodada".
Às vezes surgem, porém, exemplos contraditórios desta regra na prosa de autores consagrados, como Camilo Castelo Branco, facto que não nos obriga, como é óbvio, a imitá los: "Queria ter padecido mais para convencer me de que és a minha recompensa..." (trecho das "Cenas Inocentes da Comédia Humana", página 160, 5ª edição). Noutra obra do mesmo autor, encontrámos também esta redacção espúria, com o pronome complementar em posição deslocada: "O seu advogado lia a declaração, e carecia de coragem para impugnar lhe a validade..." ("O Bem e o Mal", página 198, edição de 1978).
Ora, para que as frases daquele escritor ficassem impecáveis na sua redacção, os pronomes oblíquos me e lhe teriam de ser colocados logo a seguir à preposição para, e não após os verbos no modo infinitivo.
É desculpável, porém, em casos semelhantes, recorrer se à deslocação pronominal, desde que se procure evitar sons desagradáveis ou cacofónicos. De qualquer maneira, com um pouco de cuidado, será sempre possível evitar o embate de sílabas dissonantes, sem transgredirmos as normas gramaticais.
Francisco Alves da Costa
Jornal Olivais
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ANOMALIA
Proveniente do grego anomalia, por via latina de forma idêntica, este vocábulo, tomado como sinónimo de anormalidade, aberração ou desvio, deve pronunciar se como anumalia, e não anomalia, conforme ensinamento ministrado por João de Deus, a páginas 66 do seu "Dicionário Prosódico de Portugal e Brasil", cuja sétima edição, por nós habitualmente consultada, foi dada a lume nos fins do século XIX (precisamente em 1895).
Como não podia deixar de ser, os redactores do recente "Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea", que bastas vezes se mostraram permeáveis ao apadrinhamento de irregularidades linguísticas inconcebíveis, pactuaram, sem quaisquer justificação, com a pronúncia por nós verberada, e à qual jamais daremos a nossa aprovação.
Francisco Alves da Costa
Jornal Olivais
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BEJA
Algumas pessoas proferem o e desta cidade alentejana como se fosse igual ao da terminação eja das palavras cereja, igreja e cerveja, o que se considera regionalismo. O e de Beja, conforme a chamada pronúncia padrão da zona situada entre o sul do Mondego e o Vale do Tejo, articula se normalmente aberto, e não com o som de a surdo, como os da palavra cama.
Duarte Nunes de Leão, escritor do século XVI, muito conceituado pela correcção da sua escrita, deixou nos, pelo menos, cerca de 10 exemplos de boa pronúncia deste conhecido topónimo, entre as páginas 858 e 1001 da "Crónica e Vida del Rei D. Afonso V", edição de 1975, de que registamos aqui apenas uma citação para não tornarmos esta nota fastidiosa: "... Feita a profissão pella excelente senhora, a que da dignidade e do nome esbulharaõ, o Príncipe se foi a Béja, onde a Princeza estava com o Infante D. Affonso seu filho, que então era de cinco annos..."
Francisco Alves da Costa
Jornal Olivais
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ANTÁRCTIDA
Segundo ensinou o professor Jaime Séguier, na página 1355, edição de 1981, do seu "Dicionário Prático Ilustrado", é Antárctida que se deve dizer, e não Antárctica. Esta forma errónea, em nossa modesta opinião, deve ter surgido por influência do nome do Oceano Glacial Antárctico. Rebelo Gonçalves já havia registado correctamente o nome de Antárctida (substantivo), e não Antárctica (adjectivo), na página 81 do seu monumental "Vocabulário da Língua Portuguesa", dado à estampa em 1966.
José Pedro Machado, com a sua proficiência tradicional, averbou igualmente a forma referida em epígrafe, portanto a correcta, na página 141, 1.9 volume, do seu "Vocabulário Onomástico Etimológico da Língua Portuguesa", publicação em 1984.
Francisco Alves da Costa
Jornal Olivais
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ÂNGORA
Martins Sequeira, no seu "Rol de Estrangeirismos", em concordância com opiniões expendidas por Gonçalo Viana e outros filólogos de renome, preconiza o emprego da forma paroxítona Angora, em lugar de Ângora ou Angorá.
À primeira vista parece que não seria difícil ao nosso povo perfilhar a pronúncia proposta pelo autor do citado livro, visto que esta não se opõe às suas tendências de preguiça glótica. No entanto, a prática mostra nos precisamente o contrário, pois quase ninguém profere aquele topónimo com acentuação grave.
Conquanto algumas pessoas (poucas) articulem naturalmente Ângora, de acordo com o tradicional acento etimológico, outros preferem adoptar a prosódia francesa de Angorá, principalmente quando se referem a certa espécie de lã fina, de pêlo comprido, semelhante ao dos gatos angorenses.
Ora, se bem que verifiquemos, por vezes, deslocações tónicas em determinados vocábulos, na sua passagem doutras línguas para a nossa, tais deslocações, porque se consideram excepcionais, não podem invalidar a regra de conservação dos acentos primitivos. Deste modo, como o termo geográfico Ângora se filia no grego ágkyra (âncora), registado por José Inês Louro no livro "O Grego Aplicado à Linguagem Científica", tudo nos induz a crer que, realmente, a única acentuação correcta deste substantivo é a dactílica Ângora, correspondente à otomana Âncara, nome da capital da Turquia, pronunciada esdruxulamente pelos seus habitantes, conforme já tivemos ocasião de verificar em programas televisivos transmitidos por esse país, e jamais Ancara, como nos tentam agora impor algumas pessoas mal esclarecidas.
Francisco Alves da Costa
Jornal Olivais
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DESPOLETAR
Queria saudar os autores dos comentários publicados acerca do verbo "despoletar". E como ele é maioritariamente usado em acepção errada, vale sempre a pena dar oportunidade à nossa memória de impressionar se com o que está certo desencadear.
O que não está certo é que continue a trabalhar se em meios de comunicação social, editoras, etc, em regime de "agente único" , isto é, em que, por "contenção de custos", "por causa do 11 de Setembro" ou porque toda a gente é "muito boa" a Português, se parte do princípio de que todo e qualquer texto dispensa um escrutínio especializado ao rigor da sua forma e do seu conteúdo, quando a regra geral é escrever textos de memória (de memórias erradas?) e sob pressão de prazos limite, ou seja, sem tempo útil para verificação.
Se aceitarmos como boa a análise de que cada vez mais se abrem oportunidades de ascensão a cargos de visibilidade pública a cidadãos com formação literária insuficiente (quanto mais não seja por comparação com gerações anteriores); de que esses cargos se traduzem em alocuções, declarações, opiniões, textos ou mesmo livros difundidos maciçamente; de que esses discursos orais ou escritos não são, na sua maioria, entregues a profissionais com formação especializada para detectar e corrigir o que está errado; fácil se torna concluir que vivemos em exposição permanente ao erro teledifundido.
Assim, por forçada familiarização e semelhança fonética, à nossa memória assoma mais rapidamente, por exemplo, "despoletar" do que "desencadear",mesmo sendo "desencadear" o que queremos realmente dizer. E quantas vezes acabamos por render nos ao incongruente, ao disparate, ao estrangeirismo ou até ao oposto do que pretendíamos dizer...
O que quero defender é o ponto de vista de que os meios técnicos poderosíssimos de que actualmente dispomos tanto nos permitem difundir e conservar o nosso património linguístico como desagregá lo em três tempos, permitindo que se preencham os vazios momentâneos dos nossos mais belos painéis de azulejos temáticos com peças baratas em plástico, de indústria exclusivamente norte americana, espanhola ou brasileira.
Obrigado pela lembrança de que há quem se lembre disto.
Aurélio Moreira (Copiado da ML "O Correio dos Outros" Pedro Aniceto Interlog)
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Bera
Aqui fica uma achega à origem da utilização entre nós, do vocábulo bera : " Números 2 a 6 da Rua Garrett.....um estabelecimento de artigos de origem americana, que grande celebridade conquistaram, despertando um quase delírio na pacata Lisboa do princípio de novecentos. Luxuosamente montado pela Bera American Diamond Palace, essa loja servia para exposição e venda de jóias falsas, preciosíssimas no seu fabrico, a que o nosso público logo chamou " brilhantes bera ".
O extraordinário êxito obtido, arrastou até à Baixa, dos quatro bairros da capital, verdadeiras multidões, que ficavam embasbacadas com tal beleza. De noite, principalmente, era verdadeiramente feérico o efeito dessas maravilhas, autênticas criações de arte, que todas as senhoras ambiciavam possuir. " ( in O Chiado Pitoresco e Elegante, Mário Costa).
Para além da curiosidade, estão aqui expressos alguns conceitos nucleares da publicidade e do merchandising. Por outro lado, o american way já vem de longe.
José Oliveira Dias.
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ANEL
Conforme ensinou o professor Augusto Moreno, a páginas 11 do "Novo Guia Ortográfico da Escrita Oficial", publicado em 1946, o plural dos vocabulários terminados no singular em ei faz se com e aberto, por isso (acrescentamos nós) claudicam as pessoas que os tomam como rimas de leis ou seis. Ora, para entrarmos de acordo com as normas gramaticais, prefira se e escreva se, portanto: anéis, azeméis, baixéis, batéis, bordéis, broquéis, buréis, cartéis, cinzéis, corcéis, cordéis, coronéis, dorséis, enxaiméis, fardéis, farnéis, fiéis, frouxéis, hotéis, lauréis, ouropéis, painéis, papéis, pichéis, pincéis, quartéis, tonéis, vergéis e xairéis, sempre com acento agudo na última sílaba.
Francisco Alves da Costa
Jornal Olivais
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Símbolos de unidades
Pergunta/Resposta
Consulto o Ciberdúvidas de vez em quando e, a propósito de outra coisa, encontrei o seguinte nas respostas anteriores " Expressões latinas e diversos " e " Símbolos, mais uma vez ": "... os símbolos das unidades devem ser separados dos algarismos por um espaço (ex.: 68 ºC, 10 s, etc.)."
Num curso de revisão, foi me ensinado que os símbolos de temperatura não devem ser separados por espaço, como consta também no Código de Redacção Interinstitucional , entre outras referências.
Gostaria de saber qual é, afinal, a maneira correcta de indicar estes símbolos.
Obrigada.
Cristiana Malheiro
Portugal
1. O Sistema Internacional de Unidades (SI) recomenda, na sua b), de 2.2:
«Os símbolos das unidades devem ser colocados após o valor numérico completo das grandezas correspondentes, deixando espaço entre o valor numérico e o símbolo da unidade». Logo, deve se grafar: 10 s (dez segundos), como escreveu.
2. Em nota de rodapé, na obra de Guilherme de Almeida: «Sistema Internacional de Unidades», da Plátano, lê se: «Exce(p)tuam se os casos do grau ( º ); e de minuto ( ´ ) e segundo ( ? ) unidades de ângulo plano, fora do SI.» Assim, deve se escrever 68º, 68?.
3. Quanto aos valores de temperatura, eu escrevo 68 ºC, pois considero ºC (sem espaço entre º e C) o símbolo do grau `Celsius´ e, portanto, na regra geral indicada em 1. Nota: o símbolo de temperatura `kelvin´ é simplesmente K (maiúscula).
Ao seu dispor,
D´ Silvas Filho
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A fêmea do elefante
Pergunta/Resposta
Eu queria saber o que quer dizer a palavra aliá , uma vez que quando andei na primária foi esse o feminino de elefante que aprendi; estarei errado até agora?
Por favor expliquem me...
Elvécio Borges de Souza
Matosinhos
Portugal
Aliá , segundo o Dicionário Houaiss (versão Português do Brasil), e citando o Glossário Luso Asiático de Monsenhor Dalgado (1609), «é a fêmea do elefante». Portanto, aquilo que aprendeu na primária está corre(c)to.
Maria Celeste Ramilo
Do Ciberdúvidas http://ciberduvidas.sapo.pt
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Nobel
Pergunta/Resposta
Porque é que os locutores da da RTP e da SIC, exceptuando José Alberto Carvalho, continuam a dizer «/nóbel/» em vez de /nobél/ ? Não sabem que o homem se chamava Nobel , pronunciado com a tónica na última sílaba? Se querem inventar uma pronúncia própria para os nomes, porque é que não dizem Bill /Gátes/ em vez de Bill /Gaites/ ou /u dois/ [U2] em vez de /iu tu/?
Carlos Pestana
Lisboa
Porque é que os locutores da RTP e SIC (?) continuam a dizer «Nóbel» (em vez de /No bél/ ? pergunta o nosso prezado consulente. Pelo seguinte:
a) Por ignorância alguns, certamente.
b) Por falta de interesse no estudo e conhecimento da Língua Portuguesa. c) Pelo prazer de serem diferentes dos outros vaidade.
d) Por falta de respeito à nossa língua.
e) Por falta de a(c)ção de certas instituições estatais ou no sentido da correcção do nosso idioma.
f) Por culpa de todos nós. Se cada um de nós, ao presenciar um erro, escrevesse uma carta à RTP, à SIC e outras televisões e estações de rádio, a nossa língua em breve começaria a apresentar muito mais corre(c)ções em todos nós. E pensemos nos nossos filhos
tanta necessidade de bom português!
Antigamente, era o povo que fazia a língua. Agora é como se fala (mal) na TV e na rádio...
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Apagão
Pergunta/Resposta
Vivo no Canadá e fiquei espantada quando ouvi os portugueses do noticiário da Antena 1 chamarem apagão ao corte geral de energia que aconteceu na área de Nova Iorque e sul de Toronto.
Calculo que esta palavra seja dos brasileiros. Somos nós que temos que adaptar as palavras deles?
Quando eu saí de Lisboa há 24 anos nunca tinha ouvido esta palavra, que eu pessoalmente rejeito no meu português.
Obrigada.
Flávia Rolo Duarte
Canadá
Ora aí está um excelente exemplo da inventiva de quem usa (bem) a língua como instrumento de comunicação e ao contrário do muito que se ouve por aí na rádio e na televisão portuguesas... A língua também pode (e deve!) criar novas palavras... Nesse caso, até é uma excelente criação linguística. Não tínhamos nenhum outro vocábulo com esse sentido tão preciso e bem mais forte do que a expressão "corte geral de energia". E não é melhor usar apagão do que 'blackout'?
Apagão, formado de apaga(r) + ão é, pois, uma forma criativa de numa só palavra dizer se o que aconteceu nessa noite em que a energia elé(c)trica faltou em Nova Iorque e no sul de Toronto. Ou seja: tudo se apagou; logo, tratou se de um... (grande) apagão.
Os brasileiros, com a sua inesgotável capacidade de dar asas à nossa língua comum, há muito inventaram o apagão, até pelos problemas similares que vão tendo com o seus inúmeros apagões. Por isso, os excelentes dicionários Houaiss e Novo Aurélio Século XXI já registam o novo vocábulo.
Neste aspe(c)to, na minha opinião, os portugueses só têm de aprender com eles...
José Mário Costa
Do Ciberdúvidas http://ciberduvidas.sapo.pt
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BOMBORDO Assim como abrimos a vogal da sílaba tónica do termo náutico bordo (O), que não se deve confundir com o substantivo bordo (o), árvore da família das aceráceas ou suco dela extraído, assim devemos proceder em relação aos seus cognatos: bombordo (lado esquerdo dos navios, quando se olha da ré para a proa), ou estibordo (lado oposto a esse).
Domingos de Azevedo também registou, na sua "Gramática Nacional", edição de 1880, a pronúncia por nós preconizada para aqueles vocábulos
Francisco Alves da Costa
Jornal Olivais
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Vinte e nove conselhos para escrever bem:
1. Deve evitar ao máx. a utilizº de abrev., etc.
2. É desnecessário empregar um estilo de escrita demasiadamente rebuscado. Tal prática advém de esmero excessivo que raia o exibicionismo narcisístico.
3. Anule aliterações altamente abusivas.
4. não esqueça as maiúsculas no início das frases.
5. Evite lugares comuns como 'o diabo foge da cruz'.
6. O uso de parêntesis (mesmo quando for relevante) é desnecessário.
7. Realize que os estrangeirismos estão out; palavras de origem portuguesa estão in.
8. Evite o emprego de gíria, mesmo que pareça nice, tá fixe?
9. Palavras de baixo calão podem transformar o seu texto numa grande merda.
10. Nunca generalize: generalizar é um erro em todas as situações.
11. Evite repetir a mesma palavra, pois essa palavra vai ficar uma palavra repetitiva. A repetição da palavra vai fazer com que a palavra repetida desqualifique o texto onde a palavra se encontra repetida.
12. Não abuse das citações. Como costuma dizer um amigo meu: «Quem cita os outros não tem ideias próprias».
13. Frases incompletas podem causar
14. Não seja redundante; não é preciso dizer a mesma coisa de formas diferentes, isto é, basta mencionar cada argumento uma só vez ou, por outras palavras, não repita a mesma ideia várias vezes.
15. Seja mais ou menos específico.
16. Frases com apenas uma palavra? Livra!
17. A voz passiva deve ser evitada.
18. Utilize a pontuação correctamente o ponto e a vírgula especialmente será que já ninguém sabe utilizar o ponto de interrogação
19. Quem precisa de perguntas retóricas?
20. Conforme recomenda a A.G.O.P, nunca use siglas desconhecidas.
21. Exagerar é cem milhões de vezes pior do que a moderação.
22. Evite mesóclises. Eu evitá las ei!
23. Analogias na escrita são tão úteis como chifres numa galinha.
24. Não abuse das exclamações! Nunca! O seu texto fica horrível!
25. Evite frases exageradamente longas, pois estas dificultam a compreensão da ideia nelas contida e, por conterem mais do que uma ideia central, o que nem sempre torna o seu conteúdo acessível, forçam desta forma o pobre leitor a separá las nos seus diversos componentes, de maneira a torná las compreensíveis, o que não deveria ser, afinal de contas, parte do processo da leitura, hábito que devemos estimular através do uso de frases mais curtas.
26. Cuidado com a hortografia, para não estrupar a língoa portuguêza.
27. Seja incisivo e coerente, ou não.
28. Não fique escrevendo no gerúndio. Você vai deixando seu texto pobre causando ambiguidade e esquisito, ficando com a sensação de que as coisas ainda estão acontecendo.
29. Outra barbaridade que você deve evitar é usar muitas expressões que acabem por denunciar a região onde mora, carago!
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BATÍSCAFO
Se dizemos piróscafo, nome conferido pelos cientistas ao primeiro barco movido por meio de vapor, e que ainda hoje é utilizado, também como pronúncia esdrúxula, pelos italianos, por que razão havemos nós de deslocar agora para a penúltima sílaba o acento de batíscafo (submersível esférico, inventado pelo professor Augusto Piccard para investigações submarinas)? Digamos, pois e sempre, batiscafo, com acento predominante no ie quisermos falar com muita correcção, e deixemos o estrambótico batiscafo, a rimar com desabafo, para quem não se importar de fazer publicamente má figura.
Há décadas em elaboração e publicado finalmente em 2001, o "Dicionário de Língua Portuguesa Contemporânea", cujos ensinamentos nem sempre se podem considerar modelares, apesar do cabedal científico de quem nele colaborou, apresenta o registo paroxítono, mas erróneo, de batiscafo, acentuação que não devemos obviamente perfilhar.
Francisco Alves da Costa
Jornal Olivais Março 2003
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AZEMÉIS
Como determina a regra, todas as palavras agudas terminadas em ei fazem o plural com e aberto, e não surdo. Erra, por isso, quem diz ou escreve azemeis, em consonância com seis ou reis (monarcas), em vez de azeméis (almocreves, recoveiros). Este preceito aplica se igualmente aos seguintes vocábulos: anéis, cordéis, hotéis, papéis, pincéis, coronéis e outros da mesma rima, inúmeras vezes deturpadas na sua pronúncia.
Acerca deste assunto igualmente se referiu Vasco Botelho de Amaral, quando tratou do topónimo Vila Nova de Azeméis, a páginas 14 e 169, respectivamente dos volumes 2 e 3 das suas "Palestras da Língua Portuguesa", publicadas entre 1951 e 1952.
Francisco Alves da Costa
Jornal Olivais Março 2003
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ARRESTO
Na página 217 do seu "Dicionário de Ri
mas", Costa Lima, a cuja opinião recorremos com frequência, fez rimar a palavra arresto (apreensão, embargo, penhora) com gesto, incesto, resto, protesto e manifesto. E já assim era há mais de 100 anos, conforme se pode observar, a páginas 93, 1ª coluna, do ainda hoje indispensável "Dicionário Prosódico de Portugal e Brasil", organizado por João de Deus e António José de Carvalho. Profira se, por conseguinte, arrésto, com e aberto, e não arrêsto, com e fechado, como fazem algumas pessoas mal esclarecidas.
Francisco Alves da Costa
Jornal Olivais Março 2003
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A propósito de erros *
Por Mário de Carvalho **
O grande problema não é saber se poucas coisas. Nem tampouco saber se mal as coisas. É antes saber se um excesso de coisas erradas. Esta última asserção não é a minha, mas não me recordo do nome do autor. Vai com as minhas desculpas se for vivo ou com as minhas homenagens se já se encontrar em estado de as desculpas não lhe servirem de nada.
Chego ao quiosque dos jornais e uma menina adianta se, a dizer que queria um maço de tabaco. "Queria?" pergunta o estanqueiro, subtil. A menina emenda: "Queria, não! Quero!". Ah, ah, ah, ih, ih, ih, amigos como dantes. E na face do homem quando me atende, lê se a alegria benemérita do didactismo satisfeito. A rapariga estava a ser imprecisa e ele corrigiu. Ganhou o dia. Se não em trocos, pelo menos na preservação daquilo que ele pensa ser a bem falância do português. A menina, natural e espontânea, aplicou a sua competência linguística e logo foi despojada pela maiêutica do homem da tabacaria que até podia chamar se Esteves.
Mas na tabacaria não fornecem água. É na leitaria, ao lado, que me é propiciada, dia sim, dia não, uma prelecção linguística sobre o "copo de água". "Um copo de água!" pede o cliente distraído, portador daquela lusa mania de diluir o sabor do café. "Um copo de água?", ri se o empregado, "veja lá!". "Ah, pois", emenda o outro, "um copo com água, claro". Ah, ah, ah, oh, oh, oh! Eu nestas coisas não intervenho. Para quê? Perdia a discussão e passava por iletrado...
Vai se ligar a televisão, ouve se o jornalista a pronunciar Medicina em vez de "medecina", ou vizinho em vez de "v'zinho" ou Istambul em vez de "chtambul" e percebe se que há para ali oculto um professor de dicção que julga que o "i", na língua portuguesa, se pronuncia como em "ira". Nisto, como na maior parte das coisas da vida, o que se está mesmo a ver tem a particularidade de estar errado. O Sol não é do tamanho de um pires e chega até a ser um bocadinho maior que o Peleponeso. Além disso, ao contrário do que aparenta, já há quatrocentos anos que deixou de girar em torno da Terra.
Os linguistas chamam ao exercício desta falsa sapiência "hipercorrecção". Como se não sabe que se sabe pouco, é se excessivo e temerário no corrigir. Muito tempo se desbasta a aprofundar esta falsa ciência, nos locais próprios, como leitarias, barbearias, paragens de autocarros, bichas (hipercorrecção "filas") para o passe social, locais e ocasiões muito propícias a eruditas afirmações.
Talvez fizesse falta na RTP um (looooongo e frequentíssimo) programa de Língua Portuguesa, que se ocupasse destas minudências. Quanto às outras televisões, um sistema (pode ler se "sestema") de multas pesadíssimas (diria mesmo incomportáveis) para as paulitadas e calinadas talvez se revelasse despoluidor. Em certos casos, como os da utilização de palavreado bizarro como "Crocefaia" ou "óliunidslave", nunca menos de oitocentos mil contos, elevados ao quádruplo em caso de reincidência. Neste campo da comunicação social, o princípio do poluidor/pagador devia ter uma expressão bem vincada, exemplar e mui desencorajadora.
Todos nós os portadores de bom senso (coisa que nada tem que ver com o senso comum) somos, uma vez por outra, pecadores nestas matérias. Uma ignorância, um engano, um destreino, uma fixação antiga, um equívoco, uma tineta, e lá sai de que nos arrependermos. É tanto de desconfiar o sujeito que diga que nunca comete erros, como o advogado que proclama jamais ter perdido uma causa. Eu nunca me atreveria, neste ponto, a atirar pedradas e a deixar expostos os meus telhados de vidro. Qualquer escritor sabe que, em certos momentos, depois de dúvidas embaraçosas, se lhe impõe optar pela transgressão. Não há purista, por exemplo, que me convença a escrever "bugiganga" em vez de "bibelô". E se formos a ver as propostas dos puristas para evitar certos estrangeirismos, são de fugir a sete pés...
Agora, parecer me iam adequadas umas insistentes e pacientes palavras, nesses meios de comunicação com influência sobre o senso comum (coisa que nada tem que ver com o bom senso), que erradicassem o "copo com água", a "caixa com fósforos" e o "tiro com arco". E, a talho de foice, não seria mau que os falantes indagassem sobre os diversos valores do "i" na fonética portuguesa. Só para terem uma ideia. Há por aí boas gramáticas. Quotizavam se...
*texto escrito para o jornal "Público", de 28.05.96
** escritor português, formado em Direito, advogado e jornalista, nasceu em Lisboa em 1944. Estreou se com os "Contos da Sétima Esfera" (1981), seguido de "Casos do Beco das Sardinheiras" (1981), obtendo o Prémio Cidade de Lisboa com "O Livro Grande de Tebas, Navio e Mariana" (id.). Outras obras publicadas: "A Inaudita Guerra da Avenida Gago Coutinho" (1983), "A Paixão do Conde de Fróis" (1986, Prémio Dom Dinis, "ex aequo"), "Quatrocentos Mil Sestércios" (1991), "Um Deus Passeando pela Brisa da Tarde" (1995, Grande Prémio da Associação Portuguesa de Escritores), "Era Bom Que Trocássemos Umas Ideias sobre o Assunto" (1995), "Fabulário" (1998), entre outros.
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ALFINETE DE AMA
Conquanto se diga vulgarmente, na linguagem quotidiana, alfinete de dama, a única designação correcta deste objecto é alfinete de ama, como ensinou Vasco Botelho de Amaral, em 1958, na página 110, 1.9 volume, do "Grande Dicionário de Dificuldades e Subtilezas do Idioma Português".
Francisco Alves da Costa
Jornal Olivais Março 2003
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ACTRIZ
Se nós proferirmos àtor, com a sempre aberto, por que não havemos também de pronunciar assim o a de actriz? Aliás, a regra é bem explicíta: o c, colocado antes do t, serve para abrir a vogal anterior. Logo: atriz, e não âtriz, com a surdo, como pronuncia muita gente ilustre. Xavier Roberto e Luís de Sousa, vocabularistas de reconhecido mérito, também perfilharam esta opinião, conforme se pode observar na página 207, edição de 1974, do "Prontuário da Língua Portuguesa", cuja leitura aconselhamos aos estudiosos do nosso tão maltratado idioma, agora ainda mais vilipendiado por algumas inconcebíveis afirmações, embora esporádicas, expressas nas páginas do recente "Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea", dado à estampa em 2001.
Francisco Alves da Costa
Jornal Olivais Março 2003
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Tema
Aceito(a) e aceite
Pergunta/Resposta
O particípio passado irregular aceito(a), do verbo aceitar, é alternativa correcta ao comummente ouvido e lido aceite? Segundo creio saber, por exemplo, a frase «A proposta foi aceite» está correcta; mas será que «A proposta foi aceita» ou «O requerimento foi aceito» estão igualmente correctas?
Luís A. P. Varela Pinto
professor do Ensino Secundário
Portugal
Não é correcto dizermos que aceito/a é alternativa a aceite , porque uma coisa não é alternativa a ou de outra. Duas coisas é que podem constituir uma alternativa, quando, de entre as duas, temos uma para escolher, porque alternativa é , principalmente, a opção entre duas coisas. É também a sucessão de duas coisas reciprocamente conclusivas. Mas não é o caso. Aqui não há sucessão.
Tanto é correcto o particípio passado aceito/a como aceite . Estão, portanto, correctas as frases:
a) A proposta foi aceite .
b) A proposta foi aceita .
c) O requerimento foi aceito .
No Brasil, usam muito as frases b) e c).
O verbo aceitar , além dos particípios passados aceito eaceite , irregulares, tem ainda aceitado , regular. O irregular usa se com os auxiliares ser e estar ; o regular, com os verbos ter e haver .
J.N.H.
http://ciberduvidas.sapo.pt
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ACEITE
Há pessoas de cultura universitária, portanto mais responsáveis, que empregam este substantivo como se fosse um particípio, prática muito usual, que reputamos de errada, pois aceite, não é, nem nunca foi, sinónimo de recebido.
Quando ouvimos falar em aceite, a ideia que nos ocorre imediatamente é a de que se trata do acto de considerar negociável, pela aposição de assinatura, numa determinada letra de câmbio. Nada mais! Se pretendermos, porém, aludir aos particípios do verbo aceitar, usaremos aceito ou aceita, conforme os casos. Exemplos: "A decisão do Governo, segundo constam não foi bem aceita pelos sindicatos" e "Não será certamente bem aceito pelos funcionários públicos o novo projecto ministerial sobre o futuro sistema das suas aposentações".
Cândido de Figueiredo também tratou deste assunto, com a sua competência habitual, na página 27, 1 . Volume, das "Lições Práticas da Língua Portuguesa", edição de 1944.
Francisco Alves da Costa
Jornal Olivais Março 2003
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ARÍETE
Não imitemos os que pronunciam ariête ou ariéte, pois a prosódia exacta desta palavra é aríete, com acento agudo sobre o í
Proveniente do latim ariete , carneiro, este vocábulo refere se também à máquina de guerra, usada pelos Antigos, para arrombamento das portas e muralhas dos castelos.
O aríete era nomeadamente constituído por um enorme tronco de freixo, com uma cabeça de carneiro, feita de ferro ou bronze, implantada numa das suas extremidades. Por meio de cordas ou tiras de couro, suspensas de uma armação, esse tronco era balançado por diversos soldados, tantas vezes quantas fossem necessárias, até estes conseguirem arrombar as portas das fortalezas nas respectivas muralhas, por onde pudessem depois introduzir se em território inimigo.
Nas "Epanáforas de Vária História", página 251, edição de1977, de D. Francisco Manuel de Melo, encontrámos a seguinte abonação do termo: "...combatiõ contra o casco donavio, furiosamente, impelidos da resaca, que o mar desde fóra vinha levantando: pello modo, que jugauão contra as antigas muralhas os Arietes, ou Vayuens Romanos..."
Francisco Alves da Costa
Jornal Olivais Março 2003
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ARGUIDO
Se não tivessem abolido o trema do sistema ortográfico nacional, não assistiríamos agora ao espectáculo degradante de ouvirmos certas pessoas, de formação universitária, articularem arghido (acusado, réu), em lugar de arguido (ar gu i do), que é como pronuncia toda a gente bem esclarecida.
Rebelo Gonçalves, na página 106, 1ª coluna, do seu "Vocabulário da Língua Portuguesa", a fim de obviar a possíveis lapsos de pronúncia, teve até o cuidado, a nosso ver, muito louvável, de colocar entre parênteses a vogal u deste vocábulo, com trema sobreposto, embora este diacrítico tivesse oficialmente sido postergado das palavras portuguesas, por forçado Acordo Ortográfico Luso Brasileiro, ainda vigente, de 1945.
Francisco Alves da Costa
Jornal Olivais Março 2003
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AO TODO
Numa informação radiofónica, transmitida pela "Antena 1", o locutor de serviço, pessoa aliás bem conhecida pelo cuidado e rigor com que se expressa, anunciou aos radiouvintes que determinados políticos iriam participar em ao todo seis reuniões. Ora, esta expressão foi erroneamen te construída, talvez por influência da péssima linguagem empregada por alguns intérpretes de certos anúncios televisivos. A forma correcta de tal jornalista se exprimir seria transpondo a preposição em para depois da locução ao todo, nunca na posição anómala em que foi arbitrariamente colocada.
Este imperdoável disparate deve ter sido originado por outras locuções de construção idêntica, agora muito na berra, cujos autores colocam sistematicamente as preposições dos advérbios de exclusão (só, somente, apenas), contrariamente ao uso disperso por inúmeras obras dos nossos melhores escritores, que as situam sempre depois daqueles advérbios.
Francisco Alves da Costa
Jornal Olivais Março 2003
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ANTIGUIDADE
Ensinou Rebelo Gonçalves, na página 85 do seu "Vocabulário da Língua Portuguesa", edição de1966, ser a pronúncia deste vocábulo antiguidade, com articulação da vogal u, e não antighidade, como aconselhou, e muito mal, o autor do "Prontuário Erros Corrigidos de Português", dado à estampa em 1984.
Já em 1880 Domingos de Azevedo havia emitido a opinião de que, na palavra atrás referida, se devia proferir aquela vogal, consoante se pode observar na página 206 da sua "Gramática Nacional". João de Deus e António José de Carvalho, eminentes lexicógrafos do século XIX, averbaram igualmente a pronúnciafigurada de antiguidade no "Dicionário Prosódico de Portugale Brasil", publicado em 1895, a cujas abonações, porque fidedignas, nos referimos com bastante insistência. Durante a frequência do nosso curso universitário, tam bém nunca ouvimos outra prolação diferente da referida no parágrafo anterior, por isso aconselhamos a que se continue a dizer antiguidade, com a vogal u bem articulada, em lugar de antighidade, conforme propôs infaustamente o autor daquele prontuário.
Posteriormente a estas abonações, no decurso do ano 2001, vieram os colaboradores do "Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea" a confirmar a prosódica aconselhada por nós para este vocábulo, pois já assim era no latim antiquitate , donde o nosso termo derivou.
Francisco Alves da Costa
Jornal Olivais Março 2003
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ABONO
Durante a transmissão de um programa televisivo, ouvimos certo ministro pronunciar, com algum empolamento, e por diversas vezes, esta palavra, com "o" aberto (abóno), o que se considera um erro inadmissível, pois todos os vocábulos terminados em "ono" são, e sempre foram, proferidos com o fechado. Recordem se as rimas correspondentes: abandono, colono, desabono, dono, entono, mono, Outono, patrono, sono e trono, que ninguém articula, porque seria errado, com "o" aberto.
Francisco Alves da Costa
Jornal Olivais Março 2003
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GÓLGOTA.
Designa se por Gólgota ou Calvário o monte, situado em Jerusalém, em que Jesus Cristo foi crucificado, entre dois ladrões, no decurso do ano 33 da nossa era.
Como já em latim, donde este conhecido topónimo deriva, a segunda sílaba era breve, não se justifica a sua pronúncia grave (Golgota, a rimar com janota), como fez, muito convictamente, uma conhecida apresentadora de concursos televisivos, à qual já escrevemos, por diversas vezes, sem qualquer êxito, a solicitar a correcção dos seus constantes e repetidos lapsos de pronúncia. Diga se e escreva se, portanto, Gólgota, com acento na primeira sílaba, pois assim é que está certo!
Francisco Alves da Costa
Jornal Olivais Março 2003
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A língua nasceu solta e desenvolta. Nasceu virada para fora de si, irmanada com os lábios, os dentes e as cordas vocais que lhe deram a fala, a música, o grito e o silêncio, próprio da caverna onde livremente se encontra enclausurada. A língua serve se dos olhos, de tudo ao seu alcance e fora dele para, sem papas, testemunhar a nossa relação com a vida. A língua é assim aquela coisa que nos permite, dentro do nosso silêncio, dizer tudo sem nada ter dito. Pois em língua e só nela carpimos os nossos mortos, contamos as nossas histórias e estórias, cantamos as nossas noivas quando rumo à casa do futuro marido deixa para trás a casa que a viu nascer e crescer. E só a língua permite a cada um dizer tudo, menos aquilo que se pensa, num jogo social em que cada um, munido do disfarce que julgar ideal, vai passando pelos círculos que a teia tece.
A língua, essa coisa esguia, nem sempre severa, guiada pela mente, vestida de uma mão ou, por vezes, de apenas três dedos que podem ser de conversa , vai dando largas às fantasias e aos sonhos.
A língua, na sua fantasia, tem vestidos: vestidos requintados e com enfeites de lantejoulas; vestidos com contornos de emoção, roupa de mendigo com remendos mas nada para botar defeito; vestidos com bordados e afrontas que para muitos são heranças que os séculos lhe foram juntando num pé de meia. E com todos estes vestidos chega a bifurcar se em língua do coração, do sentir, da alma e língua de contacto com o resto do mundo. Mas como a dificuldade é um mal dividido pelas aldeias, as línguas não são excepções à regra, lá têm elas o seu estilo de cooperação: a língua de viagens, a do contacto, acaba pedindo emprestadas as roupas de emoção da língua do sentimento; esta por sua vez vai deixando que a língua do sentimento faça uso de suas letras com a permissão alfabetizada, é claro, de quem dita as regras do jogo.
Apesar de ter nascido solta e desenvolta, livre, ainda há quem pense ser dela o dono policiando no escuro a língua, não vá um mal intencionado beliscar um acento ou acrescentar uma abertura em lugar incerto ou, ainda, quem sabe?, virgular o que deve ser pontofinalizado. Mas a língua não se importa que a façam voar em vozes e falas, que a enrolem em pergaminhos, folhas simples ou papel reciclado; o certo é que em silêncio ela grita e mesmo quando, inseguros, nela deitamos a mão...questionando... a língua é sempre testemunha.
Em que língua escrever
As declarações de amor?
Em que língua cantar
As histórias que ouvi contar?
Em que língua escrever
Contando os feitos das mulheres
E dos homens do meu chão?
Como falar dos velhos
Das passadas e cantigas?
Falarei em crioulo?
Mas que sinais deixar
Aos netos deste século?
Ou terei de falar
Nesta língua lusa
E eu sem arte nem musa
Mas assim terei palavras para deixar
Aos herdeiros do nosso século
Em crioulo gritarei
A minha mensagem
Que de boca em boca
Fará a sua viagem
Deixarei o recado
Num pergaminho
Nesta língua lusa
Que mal entendo
Ou terei de falar
Nesta língua lusa
E eu sem arte nem musa
Mas assim terei palavras para deixar
Aos herdeiros do nosso século
Em crioulo gritarei
A minha mensagem
Que de boca em boca
Fará a sua viagem
Deixarei o recado
Num pergaminho
Nesta língua lusa
Que mal entendo
E ao longo dos séculos
No caminho da vida
Os netos e herdeiros
Saberão quem fomos
E, assim, as mensagens vão passando porque a língua também vai permitindo, assumindo se como portador de mensagens, voando nos ecos dos que ainda podem gritar pela liberdade, deslizando nas lágrimas invisíveis dos que apenas com seus olhares denunciam a pobreza extrema.
(Odete Semedo no http://ciberduvidas.sapo.pt
06/06/2003
*Maria Odete da Costa Semedo nasceu em Bissau a 7 de Novembro de 1959. Licenciada em Línguas e Literaturas Modernas pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa. Foi Presidente da Comissã Nacional para a UNESCO Bissau. Fundadora da "Revista de Letras, Artes e Cultura Tcholona". Publicou um livro de poemas "Entre o Ser e o Amar", em Bissau (1996). É actualmente investigadora, na capital guineense, do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas, para as áreas de Educação e Formação.
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AIRBAIG
Muito usado em linguagem automobilística para designar a almofada, que se enche automaticamente de ar, no momento de um acidente, este anglicismo pode traduzir se por saco de ar, ou até insuflável. Não precisamos, portanto, do anglicismo para nada.
No "Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea"
também se aconselha, e muito bem, a expressão almofada de
ar para versão daquele dispensável neologismo.
Francisco Alves Costa in Jornal Olivais
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Vemos, ouvimos e lemos...
Não é preciso um grande esforço de atenção para nos apercebermos, nas mais diversas situações, dos maus tratos que a língua sofre no dia a dia, em serviços prestados quer por empresas privadas quer públicas.
Uma manhã destas, ao ouvir no noticiário da Antena 2 que o Grande Prémio da APE fora atribuído a Lídia Jorge, chamou me a atenção um "vão haver" menos espectáculos", por parte do locutor de serviço, que me distraiu, confesso, do resto da notícia...
Também me causa uma certa estranheza a tendência que os portugueses têm para ler à inglesa nomes que o não são. Não faltou por isso a referência a "um dos " Nóbel "da Paz"; o mesmo se pode dizer de " Gulbênkian " (salvo honrosas excepções)...
Todos os dias as nossas caixas de correio são bombardeadas com publicidade. Peguei na das grandes superfícies e uma vista de olhos apressada permitiu me detectar bastante falta de rigor em matéria de acentuação no curto texto publicitário e o recurso a estrangeirismos mesmo quando a tradução é óbvia. Por vezes, o erro é o reflexo da forma como a própria marca vem escrita.
No Jumbo, seleccionei uns Camarões "Crús" , da marca Auchan, um bife do acem e alguns " packs (pack duplo, pack 10 CDs)"... A câmara video ainda não vem com acento...
No Continente também apresentam os brocolos e o açucar sem acento. Já no famigerado perú , ele se dispensava... É peru ! Como cru .
É certo que uma marca tem as suas liberdades, mas não entendo muito bem a inexistência de acento no refrigerante oasis (não devia ser Oásis ? Ou lê se Oasís ?), bem como a sua existência na active drink "Santál" (ou será Santàl ? em qualquer dos casos, inútil em Português)...
Na Worten encontramos mais um estrangeirismo escusado, um gift center ...
Passo também uma vista de olhos pelas ofertas da Telepizza. Bom, preferia escolher uma pizza (já agora, o dicionário da Academia das Ciências de de Lisboa propõe piza ) com orégãos e não com oregãos . Outra coisa, as ofertas não são acumuláveis entre sì , mas penso que seja gralha...
Por falar em compras, tive de ir fazer as minhas, mas continuei atenta...
No Minipreço, fui informada de que, se ainda não recebi nenhum cupão, é porque eles só saiem na loja onde aderi ao Clube!
Ao pôr gasolina no carro, dei uma espreitadela ao serviço BP Car Wash: o horário é que me incomodou um bocado: das 7H ás 23H...
No entanto, o pior ainda estava para vir...
À saída da Rotunda do Centro Sul, em Almada, em direcção a Lisboa, pode ver se, no acesso à auto estrada, uma nova e grande placa de sinalização a regular o trânsito. O horário é de causar arrepios: Das 6 ás 10! É que os organismos públicos têm mais responsabilidade!
Esta é apenas uma pequena amostra da forma como a nossa língua é agredida diariamente e do mau serviço que persistentemente se presta aos seus utentes. E como a ignorância não paga imposto...
Maria João Matos
http://ciberduvidas.sapo.pt
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Tema
Saco azul (II)
Pergunta/Resposta
Como a nossa consultora Maria Regina Rocha tinha prometido, aqui está a sua investigação suplementar sobre a origem e o significado da expressão Saco azul .
Ciberdúvidas
Ponto prévio
Descobrir a origem de uma expressão pode ser tarefa fácil, se ela tiver sido proferida por pessoa de renome, estiver registada ou for recente. No entanto, muitas das expressões que enriquecem a nossa língua permanecem com uma origem obscura, podendo ela vir a ser descoberta na casualidade de uma consulta bibliotecária.
Não sei qual a origem deste termo. Do que li, dou conta aos consulentes.
Significado e conotação
O termo saco azul não teve sempre a conotação tão negativa que hoje lhe é atribuída.
Segundo o Grande Dicionário da Língua Portuguesa de António de Morais Silva, de 1949 1958, saco azul era a designação dada ao conjunto de importâncias provenientes de receitas eventuais, sem designação oficial, donde saíam verbas para despesas não previstas, em certos serviços públicos. Como as verbas atribuídas pelo Estado tinham uma grande rigidez de aplicação em rubricas específicas, a existência de um «saco azul» permitia por vezes agilizar o sistema.
Posteriormente, não só em organismos oficiais como sobretudo na escrita de firmas e empresas particulares, o termo ganhou a conotação de dinheiros ilícitos, ou porque provenientes de corrupção ou porque, mesmo não sendo daí provenientes, não eram registados de forma lícita, e apenas um n.º restrito de pessoas sabia do seu montante ou proveniência, não sendo, pois, declarados para quaisquer fins oficiais, nomeadamente os impostos. O seu registo interno, para quem a ele tinha acesso, também era (é) denominado de «Contabilidade Paralela» ou «Caixa 2», sendo este último termo o utilizado no Brasil.
Origem
Primitivamente, o dinheiro era guardado e transportado em sacos. Daí a associação de saco a dinheiro, desde o tempo dos romanos. Em Roma o sacculus (saco para o dinheiro) desempenhava um importante papel na administração pública e era uma das insígnias dos quaestores , magistrados encarregados dos dinheiros públicos, da cobrança de impostos.
O termo «saco azul» relaciona se com a expressão «contas de saco», que já está registada na 8.ª edição do dicionário acima referido (1889 1891) com o significado de «recebimentos e gastos sem cálculo e sem escrituração». Esta 8.ª edição do dicionário ainda não regista o termo «saco azul», mas a edição de 1949 1958 já regista os dois termos, sendo as «contas de saco» referidas como despesas de que se não toma nota ou gastos de dinheiro sem contar ou recebimentos e gastos sem cálculo.
O facto de o termo «saco azul» já estar dicionarizado pelo menos desde a década de 40 do século XX como relativo às tais receitas eventuais em serviços públicos leva me a estabelecer uma relação entre o termo «saco azul» e o papel selado (que era azul) ou os livros de contabilidade das finanças públicas que inicialmente também eram azuis.
Talvez a associação seja apenas a da cor (saco azul = que continha dinheiro) ou talvez não.
O papel selado existiu em Portugal desde o século XVII até ao último quartel do século XX. Consistia numa forma de cobrança do imposto de selo. Era um papel que tinha o selo da lei e servia para documentos oficiais, escrituras, certidões, procurações, requerimentos, etc., constituindo uma receita de muito grande montante.
No início (1661), para a administração do papel selado havia na capital um tesoureiro geral e nas províncias os tesoureiros das câmaras que lhe prestavam contas. O papel que sobejasse com selo seria entregue até 15 de Janeiro do ano seguinte em troca de outro do ano corrente. Em 1668 foram abolidos todos os impostos extraordinários, o do papel selado inclusive. Foi restaurado o papel selado em 1797, sendo mais tarde (1802) objecto de alvará e instruções régias.
Criaram se, então, depositários particulares do papel selado, que o vendiam. Esta receita proveniente da venda do papel selado era legal e objecto de registo, mas era uma receita à parte e os que o vendiam recebiam uma percentagem. O interesse em vender papel selado era grande, e esses depositários do papel selado eram escolhidos, em princípio, pela sua probidade.
Talvez possam interessar alguns dos artigos das «Instruções para regular a forma da Distribuição do Papel Selado, a Arrecadação do seu produto...», aprovadas pelo príncipe regente em 25 de Agosto de 1802, que dizem o seguinte (transcrição com a grafia actual):
«II. O Intendente deve dirigir as Ordens necessárias, para que as Câmaras competentes elejam os Depositários Gerais, que devem ser Pessoas estabelecidas, e residentes nas mesmas Terras, com probidade, e crédito, abonadas e afiançadas pelas Câmaras nomeantes na quantia, que ao Intendente parecer racionável. No caso porém de alguma Pessoa residente nas Terras de Depósitos Gerais, e de cuja probidade o Intendente tenha as necessárias informações, meter no Cofre da Repartição metade do valor da competente fiança, o Intendente prontamente lhe passará sua Nomeação, segundo as Cláusulas expressas na presente Regulação, ficando semelhante Depósito servindo de Fiança, e Abonação.
III. Cada um dos Depositários Gerais deve nomear, e estabelecer dentro do seu Distrito, e em todas as Terras de Auditório (...) um Depositário Parcial que tenha loja de venda pública.
(...)
VII. Aos Depositários Gerais provisionalmente, e em quanto se não regulam seus Prémios, será abonado em o produto do seu consumo, e remessa de dinheiro feito à sua custa, o Prémio de oito por cento, dos quais cinco serão para os Depositários Parciais, e três para os Gerais, o que se entende quando os Depositários Parciais forem nomeados pelas Câmaras.
(...)
XI. Até ao décimo dia do mês sucessivo a cada quartel devem os Depositários Parciais remeter aos seus Depositários Gerais o produto da venda do mesmo quartel, juntamente com uma Conta do Papel existente (...).
XII. Até ao último dia do mês sucessivo a cada quartel devem os Depositários Gerais entrar para o Cofre da Repartição com o produto dos seus distritos, relativo ao dito quartel, abonando se lhes o desconto determinado na presente Regulação (...).»
Cf. Saco azul (I)
Maria Regina Rocha
http://ciberduvidas.sapo.pt
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Tema
Como se pronuncia Setúbal +Alfragide +trouxe ?
Pergunta/Resposta
Desejava saber como se pronunciam as seguintes palavras:
Setúbal
Alfragide
Trouxe
Muito obrigado.
Augusto Santos
Capitão da Marinha Mercante
Oeiras
Portugal
Na pronúncia de Portugal, Setúbal tem e mudo na 1.ª sílaba (o mesmo de que ou de ) e a aberto na sílaba final, a este velarizado por influência do l . Claro que a palavra é grave, e tem de levar acento agudo no u, por terminar em l .
Alfragide começa por um a aberto e velarizado, como o do termo anterior, o 2.º a é fechado ( como em para ) e o e final é mudo (como o de Setúbal ).
Trouxe profere se como se tivesse dois ss ou c e, em teoria, contém o ditongo ou , dado que na pronúncia corrente e normal este vale de ô.
F. V. P. da Fonseca
http://ciberduvidas.sapo.pt
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Tema
O género/gênero de síndrome esíndroma
Pergunta/Resposta
Encontrei aqui no Ciberdúvidas o esclarecimento relativo aos géneros das palavras "síndrome" e "síndroma". De acordo com esse esclarecimento, ambas as palavras são do género feminino. No entanto, lembro me de ver em tempos, algures, uma indicação de que, tal como outras palavras de origem grega terminadas em a (grama, poeta...), ‘síndroma’ deveria ser do género masculino. Há algum motivo para que ‘síndroma’ não siga esta regra? Ou a regra não é bem assim? Obrigada.
Ana Gomes
Portugal
Síndroma ou síndrome são vocábulos do género feminino. O segundo é ainda mais aconselhável por representar melhor o étimo grego syndromé «conjunto».
Como se sabe são termos médicos e indicam um conjunto de sintomas que caracterizam um estado patológico que não constitui propriamente uma doença, p. ex., síndrome do cólon (ou do intestino )irritável . A palavra já era feminina em grego e o seu género manteve se.
F. V. Peixoto da Fonseca
http://ciberduvidas.sapo.pt
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AEROPORTO
Bastas vezes pronunciado èrópôrto por certos locutores televisivos e radiofónicos, este vocábulo (sinónimo de aeródromo ou campo de aviação, como se dizia antigamente) deve ser proferido assim: aerópôrto, com todas as sílabas correctamente articuladas.
Francisco Alves Costa in Jornal Olivais
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Um aberrante "Destak"
"Destak"é o título de um jornal de distribuição gratuita nas estações dos comboios em Portugal. "Destak": assim mesmo, com aquele ka fazer de que tal como o do anómalo Kinas .
Aquele kno nome da estapafúrdica mascote do próximo campeonato/copa europeu/européia de futebol foi justificado como forma expedita de "passar" melhor o evento que se vai realizar em Portugal, em 2004.
Mas que golpe publicitário terá inspirado as mentes brilhantes que fazem um jornal em Portugal, escrito em português e para leitores na sua esmagadora maioria portugueses ainda por cima sob o aval da companhia ferroviária do Estado português, a CP , para se acocorarem também assim ao destaque do aberrante kdeste "Destak"?!
É caso para uma chuva de novas increpações de mestres puristas como Cândido de Figueiredo ou Vasco Botelho de Amaral, lá na sua última morada: não bastasse o galicismo do destaque e ainda o ajoujaram mais com o k em cima!...
José Mário Costa no Ciberdúvidas http://ciberduvidas.sapo.pt
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Tema
Como se pronuncia sequestro /seqüestro eequestre /eqüestre ?
Pergunta/Resposta
Eu costumo dizer «/sequestro/» e «/ecuestre/».Como se devem pronunciar estas duas palavras?
Dizem me que se pode também dizer «/equestre/».
Poderão tirar me esta dúvida?
Obrigado.
Manuel da Costa
Portugal
Quanto a equestre /eqüestre , saiba que apenas /ecuestre/ é possível. Quanto a sequestro /seqüestro , o Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea (da Academia de Ciências de Lisboa) considera possíveis as duas pronúncias ( /sequestro/ e/secuestro/ ). Porém, o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa coloca o trema em cima do /u/, o que significa que considera possível apenas a forma /secuestro/ .
Provavelmente, até há algum tempo, era possível dizer se sempre /secuestro/ e /ecuestre/ mas, por força de uma regra geral da ortografia do Português, segundo a qual num qu , seguido de iou e, o unão se diz, cada vez há de ser mais audível a pronúncia /sequestro/ (sem o u). Talvez isso não aconteça com equestre (pelo menos a curto prazo) uma vez que, infelizmente, é nos mais comum a palavra sequestro/seqüestro do que a palavra equestre/eqüestre.
Em suma, equestre /eqüestre é sempre /ecuestre/ mas sequestro /seqüestro pode ser /secuestro/ ou /sequestro/ .
http://ciberduvidas.sapo.pt
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ACREDITAR SE Quando reflexo, este verbo é sinónimo de alcançar boa reputação junto de alguém. Na vulgar acepção de crer, nunca se deve empregar antecedido, como algumas pessoas fazem, de qualquer pronome pessoal complementar. É por tal motivo que se consideram erradas frases do tipo da seguinte, embora bastante vulgarizadas entre o povo: "Ele não se acredita em mim!"
Visto que o verbo acreditar desempenha aqui uma função de natureza transitiva, e não reflexa, para correcção da referida frase basta apenas suprimir se lhe o pronome se, e tudo ficará naturalmente expresso em português de lei.
Francisco Alves Costa in Jornal Olivais
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ACERVO Filiada no latim acervu, a pronúncia deste vocábulo, como nos ensinou Domingos de Azevedo, na sua "Gramática Nacional", edição de 1880, faz se com e aberto, idêntico ao da forma verbal observo, e não com e fechado, igual ao do substantivo nervo.
Para quem já se tenha esquecido registamos aqui a seguinte informação: acervo significa: montão, cúmulo, abundância, cópia, grande quantidade, vocábulos com os quais poderemos variar, sem arrebiques, o nosso estilo.
Francisco Alves Costa in Jornal Olivais
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AFUGENTAR
Porque o g anterior às vogais e ou i se pronuncia como se fosse um jota, nunca se deve proferir afuguentar, em vez de afujentar (pôr em fuga), como fez um advogado muito conhecido em sua casa, pois tal dicção é considerada uma silabada indesculpável. Esta confusão deve ter surgido pelo facto de algumas pessoas, contrariamente aos ensinamentos de Cândido de Figueiredo, darem agora o nome de guê à letra que sempre ouvimos designar por gê desde os saudosos tempos de nossa infância.
Francisco Alves Costa in Jornal Olivais
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ABERRAÇÃO \
Já o lexicógrafo João de Deus tinha ensinado, em 1895, no seu "Dicionário Prosódico", feito de colaboração com António José de Carvalho, que a prosódia exacta deste vocábulo era aberração (distorção), com os dois primeiros aa surdos, como os da preposição para, e não áberração, disparate que já ouvimos alguém proferir aos microfones de uma estação televisiva, a cujos locutores enviamos habitualmente as nossas modestas sugestões de correcção de semelhantes disparates.
Francisco Alves Costa in Jornal Olivais
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A
É modo afrancesado empregar se esta preposição em frases como as seguintes: 1 "Para completarmos o nosso estudo acerca da época filipina ainda há muitos documentos a consultar"; 2 "Já disse tudo quanto tinha a dizer sobre o assunto"; 3 "Não podemos dar os preparativos da festa por terminados, pois ainda há muito a fazer". Para escrevermos em português de boa gema torna se necessário substituirmos a preposição a destas frases pela sua correspondente para. Quanto às duas últimas, porém, ainda poderemos empregar a palavra que, em lugar da preposição a, para lhes conferir maior sabor vernáculo.
Francisco Alves Costa in Jornal Olivais
(Já tinha saudades!)
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Tema
O se calhar e o talvez
Pergunta/Resposta
Gostava que me explicassem a diferença entre as duas frases: «Se calhar o motorista adormeceu» e «Talvez o motorista tivesse adormecido». Pensei que «se calhar» e «talvez» tivessem o mesmo valor, e não consegui encontrar nenhuma regra que me explicassem por que, no caso de «talvez», tenho que usar o pretérito mais que perfeito composto do conjuntivo, e não o posso usar na construção da outra frase.
Obrigada pela ajuda.
Natália Fialho
Portugal
Se calhar é uma expressão que aplicamos com muita frequência sem nos darmos conta de que ela própria é a primeira oração de uma estrutura condicional. Se é uma conjunção subordinativa condicional e calhar é o futuro do conjuntivo do verbo calhar e transmite a ideia de «vir a propósito, no momento certo».
Assim temos:
Se calhar , o motorista adormeceu.
Se calhar , vou ver a Joana.
Se puder , vou ver a Joana.
Se quiser , vou ver a Joana.
Relativamente a talvez , temos de construir toda a estrutura de eventualidade, usando o conjuntivo. Assim teremos:
Talvez o motorista tenha adormecido . = Estamos a referir nos a uma eventualidade anterior a outra já passada.
Talvez vá ver a Joana.
Talvez possa ir ver a Joana.
Talvez queira ir ver a Joana.
Cf. Talvez tenha visto
Marta Pereira
http://ciberduvidas.sapo.pt
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Tema
Bagdade + antropónimos/antropônimos + topónimos/topônimos
Pergunta/Resposta
Oiço tanto pronunciar /Bágdad/ (com o "d" final mudo) como /Bagdáde/ (com a tónica prolongada no final). Aliás há jornais portugueses que escrevem Bagdad e outros Bagdade. Como deve ser fonética e ortograficamente? Qual a regra destes topónimos/nomes de origem estrangeira não aportuguesados e com outros como Kremlin, Dusseldorf, Putin, Bush, etc. ? Aliás, há outros casos similares ao de /Bagdad/ e/ou /Bagdáde/. Por exemplo : diz se /David/ (com o de mudo) ou /Davide/ (com o som "de")? /Jacob/ ou /Jacobe/?
Muito obrigado e... bem hajam.
Armando Dias
Aduaneiro
Lagos
Portugal
Bagdade é um topónimo adaptado gráfica e foneticamente à língua portuguesa, que aparece no Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea , da Academia das Ciências de Lisboa, não como entrada lexical mas fazendo parte da definição de "bagdali": «natural ou habitante de Bagdade ». Sendo uma palavra que acaba na sílaba de , não há motivo nenhum para que ela não seja pronunciada. Seguindo a regra geral de acentuação em português, é uma palavra grave (com o acento tónico na penúltima vogal a ).
Kremlin surge, no mesmo dicionário, com indicação de que a vogal tónica é [ e ] e a última sílaba é pronunciada da seguinte forma: [ lin]. Como diz o Prof. Peixoto da Fonseca em resposta anterior, «sempre que possível devem usar se aportuguesamentos».
A respeito dos antropónimos e topónimos em geral, acho de todo o interesse o seguinte artigo sobre o Acordo Ortográfico:
Câmara aprova Acordo Ortográfico
A Câmara dos Deputados aprovou dia 21/02/2001 o acordo ortográfico da língua portuguesa, assinado em Lisboa, em 1990. A exemplo do Brasil, os outros sete países onde o Português é a língua oficial: Portugal, Guiné Bissau, Angola, Moçambique, São Tomé e Príncipe, Cabo Verde e Timor Leste também estão adotando o vocabulário ortográfico comum, nos termos do acordo. A reforma ortográfica, que atinge apenas 2% da escrita, deixa praticamente intactas as regras de acentuação gráfica, mas suprime o trema, simplifica as regras do hífen e elimina as consoantes mudas, como a letra "c" da palavra exacto. Para colocar o novo acordo em prática, o deputado José Lourenço (PMDB BA), nascido em Portugal, sugeriu, durante encontro com o presidente de Moçambique, Joaquim Chissano, a unificação dos livros de português, matemática e ciências do ensino fundamental a serem usados pelos oito países. O acordo agora deverá ser ratificado pelo Senado Federal.
O texto a seguir, repassado por José Félix, de Portugal, a Eliane Malpighi, está publicado com o título: "Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa", pela Imprensa Nacional Casa da Moeda, E.P., Lisboa , 1991
Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa (1990)
Base I
Nomes próprios estrangeiros e seus derivados:
As letras K, w e y usam se nos seguintes casos especiais:
Em antropónimos/antropônimos originários de outras línguas e seus derivados: Franklin, frankliniano; Kant, kantiano, Darwin, darwiniano; Wagner, wagneriano; Byron, byroniano; Taylor, taylorista;
Em topónimos/topônimos originários de outras línguas e seus derivados: Kwañza, Kuwait, kuwaitiano; Malawi, malawiano;
Em congruência com o número anterior, mantêm se nos vocábulos derivados eruditamente de nomes próprios estrangeiros quaisquer combinações gráficas ou sinais diacríticos não peculiares à nossa escrita que figurem nesses nomes: comtista, de Comte, garrettiano, de Garrett; jeffersónia/jeffersônia, de Jefferson; mülleriano, de Müller, shakespeariano, de Shakespeare. Os vocábulos autorizados registarão grafias alternativas admissíveis, em casos de divulgação de certas palavras de tal tipo de origem (a exemplo de fúcsia/fúchsia e derivados, buganvília/buganvílea/bouganvíllea).
Os dígrafos finais de origem hebraica ch, ph, e th, podem conservar se em formas onomásticas da tradição bíblica, como Baruch, Loth, Moloch, Ziph, ou então simplificar se: Baruc, Lot, Moloc, Zif. Se qualquer um destes dígrafos, em formas do mesmo tipo, é invarialvelmente mudo, elimina se: José, Nazaré, em vez de Joseph, Nazareth; e se algum deles, por força do uso, permite adaptação, substitui se, recebendo uma adição vocálica: Judite, em vez de Judith.
As consoantes finais grafadas b, c, d, g, e t mantêm se, quer sejam mudas quer proferidas nas formas onomásticas em que o uso as consagrou, nomeadamente antropónimos/antropônimos e topónimos/topônimos da tradição bíblica: Jacob , Job, Moab, Isaac, David , Gad; Gog, Magog; Bensabat, Josafat. Integram se também nesta forma: Cid, em que o d é sempre pronunciado; Madrid e Valladolid, em que o d ora é pronunciado, ora não; e Calecut ou Calicut, em que o t se encontra nas mesmas condições. Nada impede, entretanto, que dos antropónimos/antropônimos em apreço sejam usados sem a consoante final Jó, Davi e Jacó .
Recomenda se que os topónimos/topônimos de línguas estrangeiras se substituam, tanto quanto possível, por formas vernáculas, quando estas sejam antigas e ainda vivas em português ou quando entrem, ou possam entrar, no uso corrente. Exemplo: Anvers, substituído por Antuérpia; Cherbourg, por Cherburgo; Garonne, por Garona; Genève por Genebra; Jutland por Jutlândia; Milano por Milão.
Aconselho também a leitura do livro de Edite Estrela e J. David Pinto Correia Guia Essencial da Língua Portuguesa para a Comunicação Social [Edição do II Congresso dos Jornalistas Portugueses, Lisboa, 1988] que aborda estes temas, assim como uma resposta anterior do Ciberdúvidas intitulada Antropónimos Estrangeiros .
Maria Celeste Ramilo
http://ciberduvidas.sapo.pt
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Tema
Patético dif. de pateta
Pergunta/Resposta
Consultei alguns dicionários, que me dão, como significado de patético , «comovente/comevedor». Ora, frequentemente, ouço e vejo escrito patético , onde o(s) autor(es) pretende(m) significar algo como «a qualidade de pateta», ou, como se diria em linguagem corrente, «... o gajo é parvo...».
Qual dos sentidos é, pois, o correcto?
Gostaria de ver esclarecida esta dúvida.
Agradecido.
P.S.
Fiquei agradavelmente surpreendido com Ciberdúvidas, pois desconhecia a sua existência. Dado que me preocupa o (mau) estado da Língua Portuguesa e procuro usá la (e sempre que possível, fazê la usar...) correctamente, penso que vou ficar "cliente".
Domingos A. Rações Santos
Bancário
Portugal
É erro crasso empregar se patético com o significado de «a qualidade de pateta ». São duas palavras diferentes que nada têm que ver (e não têm a ver , como se diz por aí) uma com a outra. Vejamos então as duas:
Pateta , mas. e fem., é um espanholismo. Significa pessoa pouco inteligente; com mania de ser ou de estar um tanto apalermada, tola, idiota, ingénua, infantil.
O espanhol pateta provém de pata , também espanhol, com significado de perna e pé dos animais.
Patético provém do latim pattetiaus, adjectivo, a significar «patético, impressivo, tocante».
Em português significa «que comove a alma, despertando sentimento de piedade ou de tristeza; confrangedor, tocante».
José Neves Henriques
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Tema
Língua portuguesa, língua chave?
Pergunta/Resposta
Já há algum tempo venho ouvindo especialistas afirmarem por diversos meios que a língua portuguesa é a que dentro das românicas permite uma maior compreensäo das outras. Mais concretamente, de 90 por cento do Espanhol/Castelhano, 50 por cento do Italiano e 30 por cento do Francês (...). Defendem que, por esta razão, quando o mundo descobrir este facto, a língua de Camões converter se á numa das mais faladas do planeta. Gostaria de saber se isto é verdade ou não. E, no caso de resposta afirmativa, se não poderia ser aproveitado este facto como forma de atrair pessoas para a aprendizagem da nossa língua por exemplo em países do Oriente e outros? Esta iniciativa poderia ser encaminhada para os que já dominam a língua inglesa e que, complementarmente, poderiam aprender a língua portuguesa como representante do grande grupo das línguas românicas sem ter de se preocupar com as outras.
Muito obrigado.
Júlio Lima
Málaga
Espanha
Não sei exactamente se as estatísticas a que o consulente se refere estarão correctas. Tenho algumas dúvidas de que um falante de Português compreenda 90 por cento do Castelhano, 50 por cento do Italiano e 30 por cento do Francês. É um dado objectivo, porém, que os portugueses têm mais facilidade em compreender um espanhol do que um espanhol um português. O mesmo fenómeno acontece na América Latina entre os brasileiros e os outros latino americanos de língua espanhola. Há certamente razões para esta circunstância. Contudo, não acredito que este facto, a existir, seja em si, factor essencial para a expansão do Português no mundo.
Aprendemos línguas estrangeiras considerando a funcionalidade que elas têm.
A expansão de determinada língua é sempre condicionada por factores extralinguísticos. É consequência não da vontade dos seus falantes, não de políticas de língua isoladas, mas sim do discurso científico que produz, da expressão cultural e artística que cria e, acima de tudo, das relações económicas que veicula.
As línguas desempenham uma função crucial na génese das culturas e civilizações, e o Português só desempenhará esse papel neste século, na medida em que se impuser como língua de ciência, de expressão cultural e artística e que seja um «meio de afirmação e uma poderosa vertente da economia de um país», como recentemente escreveu a linguista portuguesa Helena Mira Mateus num artigo no semanário "Expresso".
Assim, a expansão do Português no mundo surgirá naturalmente, quanto mais ciência se fizer em língua portuguesa, quanto mais cultura for criada em língua portuguesa, quanto mais arte for criada em língua portuguesa e quando os países integrantes da CPLP se afirmarem nas relações económicas internacionais. Estes factores serão essenciais para que falantes de outras línguas necessitem e queiram aprender a falar Português.
José Manuel Matias
http://ciberduvidas.sapo.pt
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Qual o plural de "memorandum"?
Pergunta/Resposta
Penso que o plural de "memorandum" (no sentido de anotação, por exemplo) é "memoranda". O Dicionário da Academia das Ciências não o regista. O mesmo acontece com a edição brasileira do Dicionário Houaiss. Muito obrigado.
Mário César Borges d'Abreu
Gestor
Lisboa
Portugal
« Memorandum »
a) Como adjectivo , significa: memorável, digno de ficar na memória, de ser lembrado.
b) Como substantivo , significa: livrinho de lembranças, onde tomamos nota do que precisamos de nos lembrar em determinado momento. É também aquela espécie de nota diplomática que uma nação envia a outra com a exposição resumida do estado de uma questão.
Deriva do verbo latino « memorare », lembrar, recordar.
O gerundivo deste verbo enuncia se assim: memorandus ,memoranda ,memorandus (masc., fem. e neutro). Abreviadamente, escreve se: memorandus ,a,um . Este é o caso nominativo, o de sujeito.
Mas, como sabemos, o português não provém do nominativo, mas do acusativo o caso do complemento directo: memorandum ,memorandam ,memorandum (masc., fem. e neutro).
O nosso memorando , provém do acusativo neutro. E digo neutro porque aquilo que temos de nos lembrar não é masculino nem feminino em latim é neutro: « memorandu(m) ».
A pronúncia do m final era muito fraca; por isso, na passagem para a nossa língua, foi desaparecendo na pronúncia dos falantes:
« memorandu(m)» > « memorandu » (= memorando ).
O plural desta forma neutra é « memoranda ». Daqui, haver atrasadamente (e às vezes até mesmo agora), quem dissesse " os memoranda ". É evidente que este plural não tem pés nem cabeça, porque o latim há muito que está aportuguesado em memorando . É, pois, ridículo empregar se memoranda como plural do portuguesíssimo memorando .
Mais ainda: temos o português fórum , do latim « fórum ». Haverá alguém que diga "os fora" (pronuncia se fó rà)?
Mesmo que o singular em português fosse «memorandum», como em latim, o plural nunca seria «memoranda», mas «memoranduns», porque os nossos substantivos terminados em um fazem sempre o plural em uns : atum, atuns; jejum, jejuns; e não só os substantivos: algum, alguns; comum, comuns, quer seja substantivo quer adjectivo; um, uns, etc.
Se alguma dúvida permanecer, cá estou ao seu dispor.
Cf. Memorando / "memorandum" / memorial
José Neves Henriques
http://ciberduvidas.sapo.pt
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Como é que uma tragédia pode ser humanitária !?
A Imprensa, o audiovisual e os comentadores políticos não se calam quanto à « tragédia ?humanitária ?» resultante da guerra contra o Iraque, que parece iminente e inevitável. A propósito da tragédia que se abaterá sobre os iraquianos estamos todos de acordo. Desde os que acham no mínimo estranha esta preocupação dos EUA pela segurança mundial, pelo respeito dos direitos humanos do povo do Iraque e pelo cumprimento da Resolução do Conselho de Segurança da ONU (quando ali mesmo ao lado do Iraque há um campeão do mundo na violação das ditas resoluções), até aos que alinham denodadamente nesta grande frente pró ?eixo do Bem?. Mas como é que uma tragédia pode ser humanitária !? Ou há guerra, e haverá necessariamente tragédia ?humana à semelhança de outras desgraças emisérias humanas planetárias , ou o belicismo dominante dava lugar a uma acção qualquer em prol da humanidade. Aí, sim, humanitária . Porque humanitário é o que «ama os seus semelhantes», que «é compassivo para com as outras pessoas». Cf. Caos humanitário?! Tema