Coisitas...gralhas! 10

 


Tema
«Um rosto moreninho»

Pergunta/Resposta
   Sou professora e num teste pedi aos alunos do 6.º ano que classificassem morfologicamente "moreninho" (de rosto "moreninho"). Grande parte respondeu-me que estava no grau diminutivo. Não previ esta resposta. Posso considerar que um adjectivo tem grau diminutivo? Na Nova Gramática do Português Contemporâneo não há qualquer referência a estes casos.
   O que devo explicar aos meus alunos? Agradeço desde já toda a vossa atenção, esperando uma resposta com a maior brevidade possível.
   Obrigada.

Ana Batista
Leiria
Portugal


   Aí está um tipo de situação em que por vezes nós, professores, nos deixamos cair, colocando questões com um grau de dificuldade maior do que, à partida, nos parecia!
   A questão de formas como moreninho, morenaço, bonitinha, jeitosinha, feiinho, etc. não tem sido muito estudada. Se tivermos em conta o sufixo, vemos que ele veicula, à partida, uma ideia de aumento ou de diminuição. A analogia que os seus alunos fizeram é excelente (moreno+inho = moreninho). Para a capacidade de compreensão que eles têm da língua, a resposta é óptima!
   Bom, mas se aquelas formas não equivalem a diminutivos nem aumentativos, pois não estamos na classe dos nomes, como classificá-las?
   A análise mais completa que encontrei acerca deste tema é da autoria de Ana Maria Brito e encontra-se na Gramática da Língua Portuguesa de Mira Mateus e outras, 5.ª edição, pág. 388. Aí, a autora fala de formas menos habituais de construir o superlativo absoluto.
   Uma delas é a repetição do adje(c)tivo: «O João está moreno, moreno, moreno.» Ou seja: «O João está muito moreno.»
   Outra tem que ver, precisamente, com o tema em apreço. Há situações em que um adje(c)tivo é intensificado através de um sufixo, mais comum nos nomes. Um «rosto moreninho» é um «rosto muito moreno»; um «rosto bonitinho» é um «rosto muito bonito».
   Assim sendo, o grau em que está o adje(c)tivo em causa é o grau superlativo absoluto (poderíamos acrescentar sintético), ainda que num tipo de construção que me parece de difícil compreensão para um aluno do 6.º ano…
   
   Gostaria de deixar aqui uma pequena provocação acerca da língua e da sua aquisição explícita. É por questões como a de que aqui se trata que nenhum professor de Português pode assumir que os seus alunos já sabem a língua, estejam eles em que nível estiverem (básico ou secundário). Será que sabem? Será que nós, professores, já sabemos a nossa língua?
Edite Prada
Do Ciberdúvidas


Tema
Reafectar

Pergunta/Resposta
   Gostaria que me dissessem se existe a palavra "re-afectar". Por exemplo:
   «Ao desmontar uma biblioteca, eu tive que a re-afectar a outra.»
   Não encontro em dicionário nenhum esta palavra, curiosamente é muito usada verbalmente.
   Obrigada.
Ana Cristina Oliveira
Portugal


   Por acaso, também não encontrei a palavra dicionarizada, mas dei com os seus elementos constitutivos. Ao verbo afectar – que, entre várias acepções, também significa «subordinar» – é perfeitamente possível agregar o prefixo re-, que pode exprimir as ideias de «repetição, intensidade, reciprocidade e movimento para trás». Assim, está muito bem formado o vocábulo reafectar (sem hífen, com a ideia de «tornar a afectar»), eventual razão por que tantas vezes o ouve.
   
   PS – Já agora, veja aqui por que motivo deveria ter dito, antes, «Ao desmontar uma biblioteca, eu tive de a reafectar a outra.»
R. G.
Do Ciberdúvidas


Tema
Adesão e aderência

Pergunta/Resposta
   Há dias ouvi alguém a dizer o seguinte na rádio: «... é por isso que o público português mostra tão pouca aderência ao cinema português.» Achei que era um disparate do senhor, mas qual não foi a minha surpresa, quando, compulsando vários dicionários, verifiquei que, afinal, adesão e aderência são sinónimos!
   Sempre achei que adesão tem um sentido filosófico ou intelectual e aderência usa-se só no sentido físico. Por exemplo: «A Adesão ao partido X ou Y» e a aderência dos pneus ao piso molhado...» Estou enganado?

Armando Dias
Aduaneiro
Lagos
Portugal


   As palavras adesão e aderência são muitas vezes consideradas sinónimas, pois ambas exprimem a ideia de ligação. Utilizam-se, no entanto, em contextos diferentes.
   Por exemplo, deverá dizer-se «a adesão do público português aos filmes», e não “a aderência do público aos filmes”.
   O termo adesão é utilizado normalmente em relação a pessoas, enquanto a palavra aderência se utiliza em relação a coisas, a substâncias.
   A palavra adesão tem o significado de «união», «junção», «acordo», «aprovação», «manifestação de apoio ou de solidariedade», «ligação ideológica», podendo ser utilizada em expressões deste género: a adesão a um tratado, a adesão a uma doutrina ou a um princípio, a adesão a um modo de vida, a uma ideia, a um partido político, a adesão a uma moda, a adesão aos filmes, ao teatro, à literatura. No conceito de adesão está presente o pensamento, a vontade, o sentimento de quem adere, de quem aprova, de quem escolhe.
   A palavra aderência designa a «qualidade do que é aderente», o «acto de aderir», a «ligação de superfícies», a «ligação de uma substância a outra», podendo ser utilizada em expressões deste género: a aderência dos pneus à estrada, a aderência da argila ao arado, a aderência da sujidade à pele, a aderência do pó aos móveis. A palavra aderência utiliza-se, pois, quando se pretende designar alguma substância ou matéria que está aderente a algo, ou referir uma ligação concreta, material, normalmente de pouca solidez ou que se pode vir a separar.
   Estou a referir os significados comuns dos termos, exceptuando os dos contextos científicos e técnicos da Biologia, Medicina e Física, em que estes termos têm significados específicos.
   Estas palavras são provenientes de duas palavras latinas formadas a partir do mesmo verbo latino, o verbo ‘adhaerere’, que significava aderir. Em português, aderência começou por significar “favor”, “favorecimento”, “valimento”, “protecção”, sendo no século XIX por vezes utilizada no sentido de “apego a algo” como a crenças, ideologias, seitas, mas passou a usar-se relativamente às ligações materiais, às ligações de substâncias. Os dicionários actuais, aliás, registam esse valor antigo do termo, porque presente ainda em textos modernos, como os de Almeida Garrett.
   Quanto à palavra adesão, ela sempre designou uma ligação forte ou uma vinculação a ideias, princípios, causas.
   1. Aderência provém de ‘adhaerentia-’ (que significava «ligação», «aderência»), originária do verbo ‘adhaereo’, do particípio presente, ‘adhaerens’, ‘adhaerentis’. E o verbo ‘adhaereo’ latino significa «estar ligado a, ficar fixo em, ficar aderente a»; «estar contíguo»; «parar, não avançar». Assim, esse particípio presente significaria «estando ligado a», «aderente». Daí a pouca firmeza da ligação denominada de aderência.
   2. Adesão provém do latim ‘adhaesione-’. Trata-se do acusativo do substantivo ‘adhaesio’, ‘adhaesionis’, também formado do verbo ‘adhaereo’, mas do particípio passado ‘adhaesus’, que significava «aderido», «aquilo que aderiu, que se fixou». A adesão é, assim, originariamente, mais sólida e persistente que a aderência.
   
   Concluindo, deverá, então, dizer-se, por exemplo, «a aderência da tinta à madeira», mas «a adesão de alguém a uma causa».
   
   Maria Regina Rocha
25/02/2005
Do Ciberdúvidas


Tema
Porta a porta "vs." porta-a-porta

Pergunta/Resposta
   Diz-se porta a porta ou porta-a-porta? Casa a casa ou casa-a-casa?
   É como dia-a-dia? Quais as regras a aplicar?
   Obrigada pela atenção dispensada.

Sofia Monteiro
Portugal


   A utilização ou não do hífen varia se for substantivo ou locução. Passa-se como no caso de dia-a-dia ou de dia a dia, tal como regista Rebelo Gonçalves, no seu Vocabulário da Língua Portuguesa.
   Assim, eu escreveria:
   1. «Faço no dia-a-dia»; mas: «Faz-se dia a dia».
   2. Será um casa-a-casa»; mas: «Vamos casa a casa».
   3. «Recomenda-se o porta-a-porta; mas: «Visita-se porta a porta».
   
   D’Silvas Filho ®
Do Ciberdúvidas


Tema
Iguaizinhos + dicionários de dificuldades

Pergunta/Resposta
   Foi uma dúvida que me surgiu e não descobri nenhum livro que me ajudasse a esclarecê-la. «Igualzinhos» ou «iguaizinhos»?
   Poderei, por analogia, dizer que será iguaizinhos, já que dizemos/escrevemos também animaizinhos?
   Gostaria que me indicassem livro(s) que esclarecesse(m) estas dificuldades.
   Muito obrigado.

J. Luís Baptista
Portugal


   Como poderá ver numa das nossas respostas anteriores sobre o plural dos diminutivos, a regra, nestes casos, é juntar os sufixos -zinho ou -zito no plural (-zinhos; -zitos) às formas do plural das respectivas palavras primitivas, depois de suprimido o -s final.
   Sendo, portanto, iguais o plural do adje(c)tivo igual, o respe(c)tivo diminutivo será iguaizinhos. Tal como animaizinhos (ou animaizitos), cãezinhos (ou cãezitos), melõezinhos, fogõezinhos, etc., etc.
   Quanto à segunda parte da pergunta, tem (felizmente, já) muito por onde escolher. O que se sugere a seguir é o que poderá encontrar mais facilmente em livrarias portuguesas: Dicionário de Erros e Problemas de Linguagem, de Rodrigo de Sá Nogueira (Livraria Clássica Editora, Lisboa), Dicionário de Questões Vernáculas, de Napoleão Mendes de Almeida (Livraria Ciência e Tecnologia Editora, São Paulo), Dicionário de Dificuldades da Língua Portuguesa, de Domingos Paschoal Cegalla (Editora Nova Fronteira, Rio de Janeiro), Dicionário de Erros Correntes da Língua Portuguesa, de João Bosco Medeiros e Adilson Gobbes (Editora Atlas, São Paulo), Português Prático, de Ivo Korytowski (Editora Campus, Rio de Janeiro), Os Pecados da Língua, de Paulo Flávio Ledur e Paulo Sampaio (Editora AGE, Porto Alegre, quatro volumes), A Vida Íntima das Palavras, de Deonísio da Silva (Arx, São Paulo), Prontuário Universal de Erros Corrigidos de Português, de D'Silvas Filho (Texto Editora, Lisboa) e Saber Escrever, Saber Falar, de Edite Estrela, Maria Almira Soares e Maria José Leitão (Dom Quixote, Lisboa). Isto para já não falarmos do tanto que tem aqui sempre em linha, no Ciberdúvidas da Língua Portuguesa...
       J. M. C.
Do Ciberdúvidas


Tema
Rainha (sem acento no i)

Pergunta/Resposta
   Rainha não deveria levar acento?
   Tendo em consideração que a palavra "Rainha" tem a divisão silábica “ra-i-nha”, não deveria então a palavra ser acentuada no “i” com acento agudo? Na ausência deste, parece-me que somos levados a ler rai-nha.
   Agradecia uma explicação.
   Obrigada.

Lídia Almeida
Lisboa
Portugal

   A palavra rainha não é acentuada. A quebra do ditongo nem sempre se faz através do acento gráfico: essa quebra pode dar-se naturalmente na palavra, por força das letras que se encontram junto a um potencial ditongo, fazendo com que os seus elementos passem a fazer parte de sílabas diferentes.
    Isso acontece no exemplo que dá, rainha, em que a semivogal i vem seguida do dígrafo nh da sílaba seguinte, que a anasala, levando-a a formar por si só uma sílaba. Outros exemplos disso são: bainha, campainha, ladainha, moinho, ventoinha, etc.
   A quebra do ditongo acontece também, sem necessidade de acento gráfico, se ele vier seguido das consoantes r, l, z (ex.: cair, cairdes, juiz, Madail, paul, raiz, Raul) ou dos sinais de nasalidade m, n, ns (ex.: ainda, Caim, oriundo, ruim, ruins), desde que não se possam combinar com outra vogal com a qual formem sílaba.
   Noutros casos, é necessário recorrer ao acento gráfico para que o ditongo com a vogal precedente não se concretize: aí (diferente de ai), país (diferente de pais), saía (diferente de saia), caía (diferente de caia), caíra, concluís (diferente de concluis), concluíste, juíza, juízo, Luís, Luísa, raízes, ruína, etc.
    Por regra, levam acento agudo o i e o u tónicos/tônicos que não formam ditongo com a vogal anterior, desde que não formem sílaba com r, l, m, n, z ou não estejam seguidos de nh:
   cafeína, construído, distribuído, egoísta, faísca, heroína, juízo, peúga, proíbe, reúne, saúde;
   construir, raiz (mas raízes) , juiz (mas juízes), paul, retribuirdes, tainha.
Do Ciberdúvidas


DE FORMA A, DE JEITO A, DE MODO
Estas expressões, de tipo afrancesado, seguidas da preposição a e verbo no modo infinitivo, devem passar assim para português correcto: de forma que, de jeito que, de modo que, sempre acompanhadas de tempo conjuntivo. Frase de exemplificação: "Quando entrares no cinema, depois de as luzes apagadas, senta-te vagarosamente, de maneira que não dêem pela tua chegada tardia." Escrever-se ou dizer-se, por exemplo, do seguinte modo, embora seja habitual, é que se considera erro crasso: "Quando entrares no cinema, depois de as luzes apagadas, senta-te vagarosamente, de maneira a não darem pela tua chegada tardia."
Alves da Costa
Jornal Olivais


DORSAL
-Porque o adjectivo dorsal deriva, como é evidente, do substantivo dorso (leia-se dôrso), e não dòrsal, como estamos sempre a ouvir dizer aos microfones da Televisão e da Rádio. Mas certo é que a prosódia oficial deste vocábulo, já registada por João de Deus, em 1895, no seu "Dicionário prosódico", é dursal, aliás como sempre ouvimos pronunciar, na zona do chamado português-padrão, situada entre o sul do Mondego e o Vale do Tejo.
Agora, porém, os redactores do inverosímil "Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea", contrariando a prolação histórica deste vocábulo, que sempre foi dursal, resolveram averbar nas suas páginas a defeituosa pronuncia por nós atrás criticada, o que veio agravar mais a situação das pessoas menos esclarecidas, que, já fora das escolas, não sabem como redigir e falar correctamente a sua língua.
O adjectivo dorsal (leia-se dursal, pois assim é que está certo) costuma agregar-se ao substantivo espinha, quando nos pretendemos referir à coluna vertebral dos seres humanos.
Alves da Costa
Jornal Olivais


DIGNITÁRIO
- Vasco Botelho de Amaral ensinou, e muito bem, a páginas 156, 1.Q volume, do seu "Dicionário de Dificuldades da Língua Portuguesa", que era erro vulgar dizer-se dignatário em vez de dignitário, porquanto foi desta palavra latina que derivou a portuguesa.
Acrescentemos, por nosso turno, que o lapso de troca do i pelo a deve ter ocorrido provavelmente por confusão estabelecida com o termo signatário.
Alves da Costa
Jornal Olivais


DITO CUJO
- Vulgarizada infortunamente por uma telenovela brasileira, esta expressão dito cujo, embora seja apenas usada em linguagem jocosa, é com sobeja razão, um disparate imperdoável, que, no tempo da outra senhora, poderia merecer algumas palmatoadas nas mãos de quem a empregasse.
Na página 330, edição de 1951, da "Gramática Normativa da Língua Portuguesa", ensinou o brasileiro Francisco da Silveira Bueno que o emprego do pronome relativo cujo só se considera legítimo, quando o antecedente e o consequente estejam expressos na frase, e entre os quais se possa estabelecer uma relação de posse. Fora disso, reputa-se de errado o emprego de tal pronome.
Como exemplo desta asserção, regista-se aqui uma frase, em que o emprego do relativo cujo se considera modelar: "Cheio de vergonha, o homem (antecedente), cujo filho (consequente) foi preso há dias por suspeita de homicídio, declarou aos amigos que, em face do sucedido, não se encontrava com nenhuma coragem para continuar a viver em Portugal.
Alves da Costa
Jornal Olivais


DIFERENClALlDADE
- Para quê mais este inconcebível disparate, gerado, em momento de aflição discursiva, por um político incipiente, no decurso de agitada e polémica discussão parlamentar? Com os termos seguintes, já com longa tradição na língua portuguesa, poder-se-ia ter evitado a queda na caricata situação, felizmente acidental, em que se despenhou o infeliz orador: Diferença, dissemelhança, desigualdade, disparidade e até divergência. Com diferencialidade, constituída por 16 letras, é que não, pois representa um atentado linguística de bradar aos céus!
Alves da Costa
Jornal Olivais


DEFLAÇÃO
- O falecido professor Rebelo Gonçalves, com o qual aprendemos bastantes regras de bem falar a nossa língua, afirmou ser inexacto dizer-se deflàção. E nós concordamos, sem quaisquer restrições, com a sua abalizada opinião. Tal neologismo, provavelmente inspirado, por via francesa, no inglês deflation, está a usar-se, com bastante insistência, como antónimo de inflação, para designar o acto de se reduzir a super-abundância de papel-moeda em circulação no mercado.
Passemos, portanto, a dizer deflação, com a surdo, como o do substantivo relação, e deixemos, para as pessoas presumidas e mal-falantes, o arrebicado deflàção, que nem ao Diabo deve certamente agradar.
Alves da Costa
Jornal Olivais


DECRETO-LEI- O plural deste substantivo composto (espurio, como lhe chamou Vasco Botelho de Amaral) faz-se por adjunção de um s a cada um dos dois elementos de composição. Diga-se, pois, correctamente: decretos-leis, e não decretos-lei, plural arrevesado, bastante frequente, que se desviou das normas tradicionais.
Alves da Costa
Jornal Olivais


DECLINAR O NOME - Se pretendêssemos declinar um nome em português, segundo os paradigmas latinos, teríamos de mencionar todos os casos ocorrentes desse mesmo nome. Em relação a Flávio, por exemplo, seriamos obrigados a papaguear desta forma, como acontecia nos saudosos tempos das nossas lições de Latim-Português: nominativo (Flávio), vocativo (ó Flávio!), genitivo (do Flávio), dativo (ao ou para o Flávio), acusativo (o Flávio, como complemento directo), e ablativo (no, com ou pelo Flávio).
Declinar só faz sentido, presentemente, em línguas como: o latim, o romeno, o alemão ou o russo, já que se torna ocioso mencionar todas as suas congéneres. Em português declara-se, diz-se, menciona-se ou indica-se um nome, nunca se declina, até porque a nossa gramática não admite declinações.
Vasco Botelho de Amaral também se ocupou deste assunto, embora abreviadamente, na página 137, 1.2 volume, do seu inesquecível "Dicionário de Dificuldades da Língua Portuguesa", dado à estampa em 1936.Francisco Alves da Costa
Jornal Olivais


DESPISTAR
- Desde há longos anos empregado em português com o sentido específico de sair da pista, desnortear-se ou desorientar-se, o verbo registado em epígrafe começou agora a ser insistentemente usado por alguns médicos, em vez de rastrear, na frase despistar uma doença {tradução literal do francês dépister une maladie}.
Ora, nós não precisamos deste barbarismo para nada, pois em português de lei já dispomos, felizmente, da locução rastrear uma doença, a qual traduz, com rigorosa propriedade, a ideia que desejamos transmitir ao nosso interlocutor.
E que pretendem, afinal, aqueles médicos, senão pesquisar, investigar, procurar, indagar, encontrar, descobrir, desvendar a pista de uma doença, precisamente o contrário da ideia que o verbo despistar exprime? Deixemos, portanto, despistar os veículos, as pessoas ou animais, que sejam forçados, por qualquer motivo, a sair do seu caminho (pista), desde que lhes não aconteça qualquer desastre, mas continuemos a manter na linguagem quotidiana a expressão rastrear uma doença, conforme a prática tradicional dos clínicos da craveira do professor Ricardo Jorge, cujo amor à nossa língua sempre se manteve na primeira linha das suas preocupações.
Francisco Alves da Costa
Jornal Olivais


CRISÂNTEMO
- Proveniente do grego chrysânthemos,
flor doirada, por intermédio do latim chrysânthemon, a pro-
núncia deste nome botânico terá de ser, sempre esdrúxula,
conforme determina o seu étimo. Quem profere crisantêmo,
em lugar de crisântemo, está-a imitar inconscientemente o
acento francês.
Francisco Alves da Costa
Jornal Olivais


DESLARGAR
- Este verbo, ocorrente nas páginas 263, 265, 270, 283, 298 e muitas outras do romance "Que farei quando tudo arde?", escrito por António Lobo Antunes, considera-se de formação espúria e contraditória. E isto porquê? Porque largar é sinónimo de soltar, desprender, e, como o sufixo des- traduz uma ideia de negação, logo: deslargar significará necessariamente não soltar, não largar, o que representa, na realidade, a ideia aposta àquela que se deseja transmitir ao nosso interlocutor. Usemos apenas, portanto, o verbo largar, sem qualquer prefixo de reforço, se nos pretendermos exprimir em português de boa cepa, e deixemos apodrecer o inditoso deslargar no arquivo das invenções inúteis, ainda que estas sejam perfilhadas por escritores de renome.
Francisco Alves da Costa
Jornal Olivais


DESCULPABILlZAÇÃO
- A mania, que certos políticos granjearam ultimamente, de se quererem evidenciar das outras pessoas pelo emprego de palavras de formação exótica (tais como: conflitualidade, facilitismo, priorização, amiguismo ou confiabilidade), leva-os por vezes à criação de aberrações linguísticas da natureza do termo referido no título desta entrada lexicográfica.
Ora, se nós dispomos, há séculos, do vocabulário desculpa, constituído apenas por oito caracteres, para expressar a ideia de justificação, por que motivo havemos de aceitar agora a palavra desculpabilização, formada por mais nove letras, cujo acréscimo nada beneficia o sentido já bastante explícito do pensamento que se pretende transmitir?
Como não podia deixar de ser, os colaboradores do sempre discutível e dispendioso "Dicionário da Língua Contemporânea", apesar das nossas constantes objurgatórias acerca deste assunto e similares, não se retraíram de dar acolhimento, nas suas páginas, a este inqualificável disparate! Não os imitemos no bizantinismo, pois a linguagem tradicional, herdada dos nossos antepassados, merece maior respeito!
Francisco Alves da Costa
Jornal Olivais


CRISÂNTEMO
- Proveniente do grego chrysânthemos, flor doirada, por intermédio do latim chrysânthemon, a pronúncia deste nome botânico terá de ser, sempre esdrúxula, conforme determina o seu étimo. Quem profere crisantêmo, em lugar de crisântemo, está a imitar inconscientemente o acento francês.
Francisco Alves da Costa
Jornal Olivais


CREDITO BARATO
- Assim como não devemos dizer preço barato, em lugar de módico ou baixo, por que se trata de uma impropriedade habitual de expressão, assim também não será legítimo usarmos o mesmo adjectivo para qualificar o substantivo crédito, pois as mercadorias é que se podem considerar caras ou baratas. Diga-se, portanto e unicamente: crédito alto ou baixo (e até acessível), jamais crédito caro ou barato, conforme é já habitual ouvir-se proferir na Televisão e na Rádio.
Francisco Alves da Costa
Jornal Olivais


COVEIRO
Já em 1895, na página 221 do seu "Dicionário Prosódico", João de Deus mandava pronunciar este substantivo como "cuveiro" (enterrador de cadáveres), e não coveiro, prolação característica do linguajar interamnense, que respeitamos, embora continuemos a proferir surdamente a primeira vogal do vocábulo atrás mencionado, conforme sempre ouvimos articular em Lisboa, donde somos naturais.
Poteriormente, a páginas 182 do "Vocabulário Ortográfico e Ortoépico", publicado em 1909, Aniceto dos Reis Gonçalves Viana estabeleceu a seguinte distinção: "coveiro" (o itálico é nosso): entrador; coveiro, cabana. Fernando J. da Silva, cuja opinião coincide com a deste conhecido ortógrafo português (falecido em 1914), consoante se pode verificar no seu "Dicionário da Língua Portuguesa", também registou, no entanto, a abertura do primeiro o de coveiro, mas apenas quando esta palavra (usada principalmente no Alentejo) se referisse a uma cabana de pastores, junto à malhada, onde se recolhem cabritos enquanto
as respectivas progenitoras são ordenhadas.
Os colaboradores do recente "Dicionário da Língua Portuguesa Conternporânea" também nele registaram a pronúncia, de "cuveiro" para designar o enterrador de mortos; não acrescentaram, porém, qualquer informação relativa a coveiro (choupana), cuja existência, por se considerar bastante rara, talvez pensassem não merecer qualquer registo.
Francisco Alves da Costa
Jornal Olivais


COUVE
Originária da província italiana da lombardia, sempre ouvimos chamar, desde a nossa infância, couve lombarda a uma crucífera, de folhas carnudas, muito saborosas, à qual se atribui agora (não sabemos porquê) apenas o nome de lombardo.
Para reforço da nossa afirmação, convém mencionarmos aqui o seguinte: em 1965, na poesia "O Guarda chuva", inserta na página 179 do livro "Obra Poética de José Carlos Ary dos Santos", ainda se pode ler a designação tradicional de couve lombarda, por nós sempre defendida, mas agora
infortunadamente votada ao ostracismo por alguns dos seus vendedores. Mais adiante, a páginas 26 da mesma obra, o inesquecível poeta fala outrossim de lombardas e repolhos, o que vem fortalecer ainda mais a nossa modesta asserção.
Ora, até aqui, tal mudança designativa poderia considerar se desculpável, porquanto as línguas, no decurso dos séculos, estão sujeitas a transformações de natureza gráfica ou semântica. Retemos ainda na memória, por exemplo, a palavra tratante, que se tomava outrora como sinónimade negociante, mas que presentemente contém o sentido pejorativo de: malandro, velhaco, patife, mariola. O que nos causou, porém, agora grande perplexidade foi o facto de termos surpreendido, num anúncio televisivo (sempre a mesma pecha),
o nome de couve (palavra do género feminino) seguida erroneamente do adjectivo lombardo (no masculino). Então é assim, estropiadamente, sem se olhar à concordância, que se deve falar e escrever em português moderno? Afinal a que sexo é que pertence a couve: ao feminino ou ao masculino?
Não será melhor que os redactores de mensagens comerciais, antes de as publicarem, as façam submeter a uma análise de pessoas competentes em matéria gramatical, a fim de se não sujeitarem posteriormente à mordacidade pública?
Francisco Alves da Costa
Jornal Olivais


A importância da língua portuguesa em Moçambique

   Qual é que foi a mudança que a língua portuguesa causou a nível da cultura, na sociedade moçambicana?
Benites Lucas José
Brasil
29/03/2004

   A Língua Portuguesa é culturalmente muito importante para os moçambicanos por inúmeros motivos. Procurarei sintetizar alguns, os fundamentais:
   
   Elemento estruturante da identidade nacional
   
   O Estado africano foi criado durante a implantação do colonialismo europeu que não teve em consideração na sua gé[ê]nese as identidades africanas. Assim, o clássico modelo de nação, ambicionada pelas soberanias ocidentais, foi ado(p)tado pelos povos africanos que se tornaram independentes no processo de descolonização da última metade do século XX, com Estados formados pela integração de grupos com identidades culturais e lingu[ü]ísticas muito diferenciadas. Neste contexto histórico, político e cultural, a língua portuguesa pela sua capacidade de endogenizar povos lingu[ü]isticamente variados é um elemento substancial da construção das identidades nacionais. Por outro lado, a afirmação e assimilação do português em espaços africanos com fronteiras estatais que separaram uma mesma identidade linguística (fa(c)to muito comum em Moçambique) opera um processo de diferenciação de comunicação lingu[ü]ística em relação à do outro Estado que é em si um fa(c)tor de identidade nacional. Muitos intelectuais africanos dos países da CPLP afirmavam que o português «exprime a construção das nacionalidades». Neste contexto de contingência histórica, a língua portuguesa em África (principalmente em Moçambique, onde a geografia não forjou nenhum crioulo) não é um instrumento neutro, um contigente meio de comunicação entre o povo, mas a expressão da sua afirmação nacional. Assim, durante a guerra de libertação nacional levada a cabo pelos moçambicanos contra o colonialismo português (1964/74), o ensino da Língua Portuguesa ocupou um lugar de destaque como afirmação e estratégia política. Todos os guerrilheiros aprendiam e sabiam falar português. Mais do que um patrimó[ô]nio, a Língua Portuguesa é uma realidade onde o sentimento e a consciência nacional se fazem pátria.
   
   Fa(c)tor de desenvolvimento econó[ô]mico
   
   Nas sociedades contemporâneas o desenvolvimento econó[ô]mico dos Estados está intimamente associado aos avanços da ciência e da tecnologia. O Produto Interno Bruto de um país depende muito dos seus índices de investigação científica. Em Moçambique, a forma mais imediata de acesso ao conhecimento é através da língua portuguesa, língua do sistema educativo.
   Por outro lado, em Moçambique, o domínio da língua portuguesa é essencial como fa(c)tor estruturante do próprio Estado, pois o português é a língua da administração e uma administração pública eficaz é outro fa(c)tor essencial do desenvolvimento econó[ô]mico, tanto mais que, neste país, o tecido empresarial ainda se encontra em processo de formação histórica. O escasso domínio da língua da administração provoca em certas circunstâncias um desmoronamento das estruturas do Poder Central, havendo uma certa impotência do Estado em manter sob o seu controlo os serviços do território e as suas populações.
   
   Afirmação de cidadania
   
   O domínio da língua portuguesa é igualmente uma afirmação de cidadania e de democratização da sociedade moçambicana. O fraco domínio do português dificulta a comunicação entre as populações e o Estado, marginalizando as do desenvolvimento econó[ô]mico e da participação política e cívica. O domínio da língua portuguesa é, assim, fa(c)tor imprescindível de resgate dos diversos espaços e linguagens, para que todos possam contribuir para a transformação de indivíduos obje(c)tos em cidadãos sujeitos responsáveis pela sua posição na sociedade.
   
   Finalmente e para concluir, o prezado consulente pergunta: «Qual foi a mudança que a língua portuguesa causou a nível da cultura, na sociedade moçambicana?»
   
   Para além do fa(c)to de ser um elemento essencial da identidade moçambicana como já referimos, há outra “mudança”... A Língua Portuguesa em Moçambique criou uma nova literatura, extremamente rica e plurifacetada, infelizmente muito pouco conhecida no Brasil. Contudo, vale a pena recordar que um dos maiores poetas de língua portuguesa do século XX foi um moçambicano, José Craveirinha.
José Manuel Matias
Do Ciberdúvidas


Tema
Pronúncia de Internet + Autoridade na língua

Pergunta/Resposta
   Sou jornalista e estou a fazer uma reportagem sobre a palavra "Internet" nas diversas línguas (português, inglês, espanhol).
   Gostaria de saber qual é a vossa opinião sobre a palavra "Internet":
   1. É feminina? É masculina?
   2. Leva artigo (a/o)?
   3. Deve ser escrita com maiúscula?
   4. Existe alguma autoridade da língua portuguesa (academia, sociedade) que seja a encarregada de incluir novas palavras na língua lusófona?
   5. Já foi incluída a palavra "internet" nos dicionários da língua portuguesa?
   6. Sendo "Internet" uma palavra já aceite pelos falantes da língua portuguesa, queria saber qual foi a data (ano) em que foi incluída na listagem de vocábulos ou dicionários? Onde posso procurar esse decreto?
   7. Foi a Sociedade da Língua Portuguesa que fez essa inclusão do termo "Internet"?
   8. É verdade que existe um acordo ortográfico para países lusofalantes? Foi esse acordo que estabeleceu a inclusão da palavra "Internet" nos dicionários de português?
   Agradecia muito as suas respostas.
   O “site” onde seria publicada a informação é um jornal digital que funciona como meio de práticas de jornalismo digital do Mestrado em Jornalismo Digital do Instituto Universitario de Posgrado e o endereço da nossa publicação é http://elbatiscafo.iup.es

Alda da Silva Sousa
Jornalista
Espanha

   Internet
   Em termos de falante da comum língua portuguesa, a nossa pronúncia do vocábulo `Internet´ é "éte", com e praticamente mudo em Portugal, como camionete (palavra já registada no Dicionário da Academia 2001). Ora nesta terminação costumamos em Portugal e no Brasil anteceder o vocábulo do artigo feminino: `a camionete´. Não admira, assim, que quer a Academia das Ciências de Lisboa, quer a Academia Brasileira de Letras tenham considerado `internet´ um substantivo feminino.
   Quanto à letra inicial da palavra, nós em Ciberdúvidas usamos a maiúscula quando nos referimos propriamente à rede (ex.: `a Internet está em expansão´) e a minúscula quando nos referimos aos dados, à informação, à comunicação (ex.: `encontrei na internet´, como dizemos `vi na televisão´).
   A palavra `internet´ já aparece em vários dicionários portugueses, nalguns com a indicação de que se trata de palavra estrangeira.
   Não foi a Sociedade da Língua Portuguesa que fez a inclusão da palavra na língua. Ela entrou na altura em que a rede começou a divulgar se no país, como muitas outras palavras da informática também assim entraram.
   Não foi por acordo ortográfico que Portugal e Brasil decidiram aceitar o termo. As instâncias oficiais e os dicionaristas foram obrigados a reconhecer a sua existência, porque as comunidades lingu[ü]ísticas escolarizadas o utilizavam. Como deve saber, modernamente considera se a comunidade, assim culta, soberana na ado(p)ção de novos termos ou de novos valores semânticos das palavras (acrescento, de minha lavra: com o dever de respeitar o precioso patrimó[ô]nio da língua e de não desprezar a história de gerações de falantes que as palavras trazem consigo).
   
   Autoridade na comum língua
   Tradicionalmente, as entidades que em Portugal e no Brasil pontificam na língua são, respe(c)tivamente, a Academia das Ciências de Lisboa e a Academia Brasileira de Letras.
   No caso de Portugal, o último dicionário da Academia (70 000 entradas) apareceu com alguns lapsos de distra(c)ção e com várias ousadias consideradas aberturas excessivas por algumas pessoas (que, por isso, não aceitaram o propósito, expresso neste dicionário, de se assumir «como uma obra de orientação idiomática no domínio lexical»). Mas é inegavelmente uma referência.
   Como são tantas outras obras com mérito na língua. Exemplos para Portugal:
   Vocabulário de Rebelo Gonçalves. «Dicionário da Língua Portuguesa» da Texto Editora ou o da Porto Editora (ambos com cerca de 90 000 entradas), «Grande Dicionário da Língua Portuguesa», projecto da Sociedade da Língua Portuguesa (6 volumes na edição em meu poder), coordenação de José Pedro Machado, «Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa» (cerca de 230 000 entradas), (versão para Portugal), etc.
D´ Silvas Filho
30/01/2004
Do Ciberdúvidas


Tema
Ainda o gé[ê]nero dos nomes dos países e das cidades

Pergunta/Resposta
   Em anterior questão feita por outro consulente, que pretendia saber o que indicava o “género dos países e cidades” (ou o género do nome dos países e cidades, conforme vossa correcção) a resposta acabou por ser, na minha opinião, inconclusiva. Apresentaram exemplos de nomes de países e cidades com género masculino, feminino e ainda, segundo vossa opinião, sem género.
   Mais do que saber mais em relação àquilo que o anterior consulente realmente perguntava, pergunto vos: porque dizem que se trata de nomes sem género?
   Timor, Portugal, Évora ou Braga não são acompanhadas de artigo, é certo, mas dizemos “Portugal é bonito” ou “Faro está cheio de turistas”, não? Assim como diremos que “Israel diz se pronta a discutir termos do acordo” ou que “Braga é acolhedora”.
    (O interesse por esta questão surgiu aliás no título de uma peça que acabo de ver num jornal: “Israel diz se pronto para discutir muro de separação”. Formalmente correcto ou errado?)
   Obrigado.

Vítor Junqueira
Economista
Lisboa
Portugal

   Na Língua Latina, havia inicialmente dois gé[ê]neros: animado e inanimado.
   Com a evolução, a Língua Latina passou a três gé[ê]neros: masculino, feminino e neutro.
   Nas línguas novilatinas, o gé[ê]nero masculino e o gé[ê]nero feminino absorveram a maior parte das palavras de gé[ê]nero neutro.
   As gramáticas da Língua Portuguesa já não falam do gé[ê]nero neutro. Apenas falam de palavras invariáveis, como por exemplo: isto, isso e aquilo, que pertenciam ao gé[ê]nero neutro.
   Curiosamente, muitos topó[ô]nimos não têm gé[ê]nero ou hesitam no gé[ê]nero.
   Os topó[ô]nimos que não são acompanhados de artigo definido tendem normalmente para a concordância com o masculino. Como, aliás, acontece com os pronomes demonstrativos isto, isso, aquilo, que, embora invariáveis, concordam com o masculino. Exemplo: «Aquilo é bonito».
   Deste modo, Timor e Portugal, embora sem artigo definido, são acompanhados de adje(c)tivos do gé[ê]nero masculino.
   Há nomes de países cuja vogal final é a letra a. Colocamos normalmente no gé[ê]nero feminino, com algumas excepções como o Gana, o Sri Lanka, o Canadá.
   Quando a letra final não é a, vemos que a tendência é para o masculino. Por isso, Israel, embora sem artigo definido, concorda com adje(c)tivos do gé[ê]nero masculino. Para reforçar esta escolha, note se ainda que Israel é um nome próprio masculino.
   Devido à grande interferência da Língua Inglesa, da Língua Francesa e da Língua Espanhola nos meios de comunicação social e ao trabalho apressado dos jornalistas e dos tradutores, todas as confusões são possíveis, nomeadamente o gé[ê]nero dos nomes dos países ou das localidades.
   Recordamo nos de já ter lido, numa revista de Língua Inglesa, Israel ser referido no feminino singular. O que aliás está de acordo com uma regra da Língua Inglesa: «os nomes de países e de cidades podem personificar se e, quando tal sucede, atribui se lhes o gé[ê]nero feminino».
   Lendo a frase «Israel diz se pronta...», ficamos logo a prever que o texto original foi escrito na Língua Inglesa.
   Em relação ao nome das localidades e às concordâncias de gé[ê]nero, existe uma norma prática. Se o nome da localidade é simultaneamente um substantivo comum, então o nome da localidade tem o gé[ê]nero desse substantivo comum.
   Exemplos: «Vou ao Porto», «vivo na Guarda», «sou da Figueira da Foz», « fui à Foz do Arelho».
   Se o nome da localidade não corresponde a um nome comum, então a tendência é para não atribuir gé[ê]nero.
   Na Galiza há vários locais com o nome de Faro porque esta palavra significa farol. A cidade de Faro, no Algarve, tem o seu nome ligado a uma família árabe que foi possuidora daquela região. Como não há ligação à palavra faro, como sinó[ô]nimo de farol, esta cidade não fixou o gé[ê]nero, mas a vogal final o ajuda para a concordância com os adje(c)tivos no masculino.
   De igual modo, Évora e Braga atraem os adje(c)tivos femininos, pelo fa(c)to de os nomes destas localidades terminarem na letra a.
   
  A. Tavares Louro
Do Ciberdúvidas


Tema
Bom dia!, bons dias!, bom dia, etc.

Pergunta/Resposta
   Está correcta a utilização da expressão "bons dias"? Ou devemos usar "bom dia"? Se ambas estiverem correctas em que condições se usa uma ou outra?

Paulo Azevedo
Portugal

   Há um certo desnorteamento na utilização do hífen, a todos os níveis, como resultado da excessiva regulamentação obrigatória e da relativa arbitrariedade com que é usado mesmo quando não obrigatório.
   Ora no caso de se tratar da saudação bom dia! (desejo lhe um bom dia!), o que nós temos é uma estrutura que, no sentido dire(c)to, é equivalente a dia bom! (desejo lhe um dia bom); e, nesta forma, ninguém tem dúvidas de que o hífen é desnecessário.
   Sabe se que nas locuções (ex.: à vontade) se convencionou que não há necessidade de hífen. No entanto, uma coisa é a atitude, outra o nome que se lhe dá (ex.: ele ficou também à vontade com o à vontade dela); uma coisa é a a(c)ção, outra a designação (ex.: `esta cola tapa buracos´; ele é um tapa buracos). O nome (o substantivo) fica cara(c)terizado pelo artigo que antecede o composto.
   Com as saudações acontece coisa semelhante. Dum lado, temos as saudações bom dia!, boa tarde!, boa noite!, do outro temos o nome dessas saudações: o bom dia, a boa tarde, a boa noite´, sempre com hífen (ex.: `quando lhe digo bom dia! [dia bom!] estou a ser sincero no meu bom dia´). E o mesmo se passa para `boas festas!´ e `envio as boas festas´, etc.
   Sublinho que com este parecer não estou a estabelecer doutrina, pois me limito a seguir Rebelo Gonçalves.
   
   P.S. — Esta resposta foi elaborada ante uma dúvida sobre o hífen na saudação bom dia! Só depois de colocado em linha este meu parecer, reparei que a dúvida do consulente Paulo Azevedo era outra. Respondo agora especificamente à sua questão.
   
   1. Bons dias! — Na opinião expressa por Sá Nogueira e por Vasco Botelho de Amaral, esta forma de saudação é a vernácula e mais do uso do povo.
   2. Bom dia! — Esta saudação terá vindo da língua francesa. O dicionário Aulete em 1861 fala do «contemporâneo bom dia». Passou a ser mais frequ[ü]ente na cidade.
   3. — Presentemente, as duas formas são equivalentes (ex.: Dicionário recente Houaiss port.e.).
   4 — Para mim, pode haver alguma diferença na intenção ou na interpretação das duas expressões. Bons dias! terá o sentido de se desejar que tudo corra bem em todos os dias, ou, na generalidade, de se desejar felicidade sempre. Enquanto em bom dia! é se mais modesto no desejo: `neste mundo de permanente mudança, já não é mau que o dia de hoje seja bom; o que também está de acordo com a sabedoria popular: «o amanhã a Deus pertence», e, se «não há mal que sempre dure», também «não há bem que nunca acabe»...
   
   Ao seu dispor,
D´ Silvas Filho
Do Ciberdúvidas


Tema
Qual o plural de zé povinho?

Pergunta/Resposta
   Para o nome composto zé povinho, os dicionários Aurélio, Houaiss e Sacconi apresentam o plural zé povinhos.
       O correto não seria zés povinho? Gostaria muito que elucidassem esse ponto.

Priscilla Marques
Brasil

   A palavra Zé Povinho tem os seguintes significados:
   
   a) Figura caricatural que simboliza o povo português e foi idealizada por Rafael Bordalo Pinheiro.
       b) O povo português.
       c) As classes inferiores da sociedade; poviléu; arraia miúda; zé povo.
       Como zé povinho funciona frequ[ü]entemente como colectivo, usamos sobretudo no singular.
       Segundo nos informaram os trabalhadores das Faianças Bordalo Pinheiro, nas Caldas da Rainha, não usam a palavra zé povinho no plural. Eles mesmo evitam o uso desta palavra no plural, tanto mais que há vários modelos e, por isso, o mais importante é identificar os modelos.
       De acordo com as regras da formação do plural dos substantivos compostos ligados por hífen, ambos os elementos tomam geralmente a forma do plural quando são substantivos, de acordo com a Nova Gramática da Língua Portuguesa, de Celso Cunha e Lindley Cintra.
A. Tavares Louro
Do Ciberdúvidas


Tema
Porquê «armas brancas»?

Pergunta/Resposta
   Gostaria de saber porque é que certo tipo de armas são designadas por armas brancas e não por armas de uma qualquer outra cor.
   Obrigado e parabéns por este espaço.
Andreína Margarida
Portugal


   «Arma branca» é um obje(c)to manual de aço polido que serve para cortar ou perfurar.
   Neste caso, o adje(c)tivo branca não é usado dentro dos seus limites comuns (cor da neve ou do leite), mas em sentido mais amplo, visto que o aço polido refle(c)te a luz.
A. Tavares Louro
Do Ciberdúvidas


Tema
O plural de cidade fantasma

Pergunta/Resposta
   Gostaria de saber como se faz o plural de cidade fantasma. Será cidades fantasmas, partindo do princípio que se trata de dois substantivos, ou cidades fantasma, sendo este um determinante específico,como no caso de escolas modelo?
   Muito obrigado, desde já.

J. Luís Baptista
Portugal

   O estimado consulente está bem informado sobre as duas possibilidades de plural desta palavra composta. A dúvida reside justamente na classificação do segundo elemento. Sem prejuízo de opinião diferente (que a questão não é consensual), acho que não vai mal se for pelo que diz o muito bom Dicionário Houaiss na entrada fantasma: «seguindo um substantivo, ao qual se liga por hífen, é um determinante específico e significa "fictício, não existente, criado especialmente para iludir o fisco" (empresa fantasma, conta fantasma).»
   Porém, para complicar, julgo que, em «cidade fantasma», o segundo elemento não pretende veicular nenhuma das ideias de que fala o citado dicionário. Quer parecer me que, neste caso, «fantasma» transmite mais a ideia de «abandonada», «deserta», «em que não se vê vivalma»; uma cidade que morreu mas que mantém ruas e edifícios, embora talvez em mau estado, como um espírito que recusa passar ao outro mundo... como um fantasma, portanto. Tal pormenor parece dar força aos que consideram, sem contemplações, que se trata de palavra formada por dois substantivos, e que, como tal, devem ir ambos para o plural.
   Junto me ao consulente na dúvida, embora confortado com a ideia de que qualquer das soluções por que venha a optar se faz sentido.
R. G.
Do Ciberdúvidas


Tema
Pintassilgo e Pintasilgo

Pergunta/Resposta
   O apelido Pintasilgo da falecida eng.ª Maria de Lourdes é dito/lido por praticamente toda a população como se estivesse escrito 'Pintassilgo'. Está correcto?
   P.S. – O mesmo se passa com o apelido Abecassis (caso de Snu Abecassis) e Abecasis (Nuno Abecasis). Pronunciam se do mesmo modo?

Bruno Costa
Relações Públicas
Seixal
Portugal


   Pintassilgo, com dois ss e pronúncia a condizer, é a única maneira oficial (legal) de escrever e de dizer.
   Há, sim, a variante antiga e popular pintassirgo, em que o l permuta com r, por ambas as consoantes serem líquidas; devido a ser frequente tal mudança (de l em r ou o contrário) é que têm geralmente esta designação.
   Quanto a Abecassis, igualmente a sua prolação é correspondente à escrita, e não existem formas divergentes.
   
   N.E. A recém falecida primeira ministra portuguesa assinava Maria de Lourdes Pintasilgo, por razões que ainda não conseguimos apurar. Já quanto à diferença Abecassis/Abecasis, a explicação é esta: o ramo familiar de proveniência judaica usa o antropó[ô]nimo na forma original, com o duplo s; o ramo cristão novo dos Abecassis passou a usar um só s até aos nossos dias: Abecasis.
F. V. P. da Fonseca
Do Ciberdúvidas


Tema
Que futuro para a língua portuguesa no século XXI?

Pergunta/Resposta
   A língua portuguesa tem possibilidades reais de vir a desempenhar o papel de língua internacional no século XXI? Ou, pelo contrário, a língua de Camões será relegada para um segundo plano assumindo esse papel línguas como a inglesa ou a espanhola?
   Agradecia uma resposta realista.
   Felicidades pelo vosso trabalho.
   Muito obrigado.

Júlio Lima
Málaga
Espanha

   A expansão de determinada língua é sempre condicionada por factores extralinguísticos. Como já o expressei em anterior resposta, ela é consequência não da vontade dos seus falantes, não de políticas de língua isoladas, mas sim do discurso científico que produz, da expressão cultural e artística que cria e, acima de tudo, das relações económicas que veicula.
   Com base neste pressuposto, comprova se que neste início do século XXI, várias línguas existem no mundo que produzem mais ciências, mais cultura e arte, e que veiculam mais relações económicas do que o português. É o que acontece com o Alemão, com o Castelhano, com o Francês e com o Inglês. Mas o consulente interroga: que futuro para o Português? A Língua Portuguesa tem possibilidades reais de vir a desempenhar o papel de língua internacional no século XXI?
   Respondo, sem hesitar: o Português tem perspectivas de vir a ser uma língua de comunicação internacional com mais pujança que o Alemão e o Francês. Não há nenhum país de língua alemã, espanhola ou francesa que tenha a dimensão demográfica e as potencialidades de crescimento económico como o Brasil.
   Ou seja: a projecção internacional do português neste século está associada à projecção internacional do Brasil, nas relações económicas mundiais e na sua afirmação cultural e artística. Uma realidade que começa de certo modo já a delinear se no contexto da cultura de massas.
   A televisão brasileira começou já a exportar para o mundo as suas telenovelas. E embora algumas não ultrapassem o limiar da mediocridade, outras há que são prodigiosamente criativas na utilização que fazem do Português. Recordo ter lido num jornal há alguns anos que as telenovelas brasileiras fizeram mais pela expansão da nossa língua comum do que seis congressos científicos, vinte dissertações académicas e cinquenta artigos científicos – afirmação feita por um ilustre professor universitário.
   Acrescente se ainda o facto de existirem em África dois países de média dimensão, Angola e Moçambique, que, ao enveredaram por processos de paz, reúnem todas as condições de se afirmarem como grandes países e darem maior projecção ao Português.
   Acredito, pois, que o Português venha a ser uma das línguas de comunicação internacional deste século.
José Manuel Matias
Do Ciberdúvidas


Vão mexer na sua língua
Por Sérgio Rodrigues no "ibest"

A recente reunião de cúpula – que em Portugal se chama de cimeira – dos integrantes da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), em São Tomé e Príncipe, teve oficialmente como tema “A sociedade de informação como contributo para a boa governação e transparência”. Bom, pelo menos foi esse o nome da coisa em Portugal. Aqui, traduziu se assim: “A sociedade de informação como contribuição para a boa governança e transparência”. Um dos temas abordados na declaração final dos chefes de estado, entre os quais estava Lula, foi o já velho – concebido em 1990 – mas ainda teórico acordo de unificação da ortografia do português nos oito países pertencentes à CPLP.

Ninguém saberia disso lendo a cobertura dos jornais brasileiros, que só mencionaram o assunto de passagem, ou mesmo consultando o site da CPLP, uma casca vazia onde se informa que o conteúdo está “em remodelação”, mas deu se em São Tomé um passo importante para que a reforma ortográfica de 1990 saia do gavetão onde se arquivam as boas intenções lusofônicas. Até então, era necessário que todos os oito países membros ratificassem qualquer acordo para que ele entrasse em vigor. Como, em 14 anos, apenas Brasil, Portugal e Cabo Verde tinham dito sim à reforma ortográfica, faltando o jamegão de Angola, Guiné Bissau, Moçambique, São Tomé e Príncipe e Timor Leste, as perspectivas de emperramento da questão eram quase infinitas. Desde a última terça feira, dia 27, porém, a unanimidade não é mais necessária. Ou seja, agora vai – supõe se. Mas será que vai?

Tratando se de lusofonia, convém manter reservas de cautela. Talvez não estivessem tão errados nossos enviados especiais à África quando deram à reforma ortográfica uma pequena fração da importância dispensada à informação de que um funk brasileiro chamado “Namorar pelado” faz sucesso por lá. Sim, claro que seria de bom tom contar aos leitores quais mexidas estão planejando fazer em sua língua – parte tão íntima deles, afinal. Em seu favor, nossos distraídos enviados especiais poderiam argumentar que as tais mexidas: 1. são pequenas; 2. na hora da verdade, podem não conseguir a proeza de acabar com o cisma ortográfico iniciado em 1911 entre Brasil e Portugal; 3. são irrelevantes quando se trata de promover uma verdadeira integração lingüística, como fica claro na própria necessidade – cômica, embora no fundo triste – de haver duas versões, a da contribuição e a do contributo, para o tema de uma reunião de chefes de estado em que se busca integração.

Em linhas bem gerais, a reforma de 1990 acaba com a hipocrisia de fingir que as letras K, W e Y não existem em nosso alfabeto; extermina para sempre o trema, que já não se usava em Portugal e, até outro dia mesmo, nem na “Folha de S. Paulo”; derruba o acento de “idéia” – e pouco mais do que isso. Para os portugueses a mudança é ligeiramente mais dolorida, pois ficou combinado que aqueles seus encontros de consoantes em que uma delas emudece – director, acção, exacto, óptimo – desaparecem em prol da grafia mais simples, que no caso vem a ser a brasileira.

Nada de muito polêmico. Não faltam casos em que a grafia será facultativa, para não desagradar ninguém em qualquer lado do Atlântico: pode se escrever “higiênico”, à brasileira, ou “higiénico”, à lusa – tanto faz. Também não se toma partido diante das formas “facto” e “fato”, “sector” e “setor”, tendo prevalecido o argumento de que, nesses como em outros casos, as consoantes às vezes emudecem, às vezes não.

Como se vê, não estamos diante de uma revolução. E nem poderíamos estar, já que a ortografia representa a camada mais superficial da língua, seu verniz e só. O sucesso da reforma de 1990 é provavelmente melhor que seu fracasso, mas infinitamente mais importante para a livre circulação de livros e idéias entre os países que falam português seria uma integração que não está ao alcance de canetada alguma – uma integração que fundiria, por exemplo, contribuição e contributo num vocábulo só. Mas aí já estamos numa dimensão profunda em que a língua, mais do que sopa de letrinhas, é cultura, história e vida.
srodrigues@nominimo.ibest.com.br
(Texto de Sérgio Rodrigues publicado no "ibest" http://www.ibest.com.br


Tema
Bom dia! e o bom dia

Pergunta/Resposta
   Está correcta a utilização da expressão "bons dias"? Ou devemos usar "bom dia"? Se ambas estiverem correctas em que condições se usa uma ou outra?

Paulo Azevedo
Portugal

   Há um certo desnorteamento na utilização do hífen, a todos os níveis, como resultado da excessiva regulamentação obrigatória e da relativa arbitrariedade com que é usado mesmo quando não obrigatório.
   Ora no caso de se tratar da saudação bom dia! (desejo lhe um bom dia!), o que nós temos é uma estrutura que, no sentido dire(c)to, é equivalente a dia bom! (desejo lhe um dia bom); e, nesta forma, ninguém tem dúvidas de que o hífen é desnecessário.
   Sabe se que nas locuções (ex.: à vontade) se convencionou que não há necessidade de hífen. No entanto, uma coisa é a atitude, outra o nome que se lhe dá (ex.: ele ficou também à vontade com o à vontade dela); uma coisa é a a(c)ção, outra a designação (ex.: `esta cola tapa buracos´; ele é um tapa buracos). O nome (o substantivo) fica cara(c)terizado pelo artigo que antecede o composto.
   Com as saudações acontece coisa semelhante. Dum lado, temos as saudações bom dia!, boa tarde!, boa noite!, do outro temos o nome dessas saudações: o bom dia, a boa tarde, a boa noite´, sempre com hífen (ex.: `quando lhe digo bom dia! [dia bom!] estou a ser sincero no meu bom dia´). E o mesmo se passa para `boas festas!´ e `envio as boas festas´, etc.
   Sublinho que com este parecer não estou a estabelecer doutrina, pois me limito a seguir Rebelo Gonçalves.
   
   Ao seu dispor,
D´ Silvas Filho
Do Ciberdúvidas


Tema
Manoel, Manuel

Pergunta/Resposta
   Por que no Brasil todos os meus familiares grafam Manoel com "o" e os de Portugal Manuel com "u", se somos todos da mesma família?

Joaquim Manoel Fernandes Monte
Brasil

   Segundo o «Dicionário Onomástico Etimológico», de José Pedro Machado, os bizantinos usavam a forma `Manouel´ e há registos antigos em Portugal do nome Manoel. Neste país, ainda temos vários manoéis; um deles é o cineasta Manoel de Oliveira, bem conhecido; e, nas listas telefó[ô]nicas, Manoel ainda aparece, até como apelido.
   A Grafia Manuel está porém oficializada de longa data em Portugal. O «Vocabulário Ortográfico da Língua portuguesa», da Academia das Ciências de Lisboa, publicado em 1940, já registava Manuel e não Manoel. Notar que, se a terminação uel é mais frequ[ü]ente, a terminação oel também existe na língua em nomes comuns.
   É natural que no Brasil se conservasse a grafia Manoel, o que aceito perfeitamente: a família na língua também é sempre a mesma. E, no fundo, qualquer das duas formas de escrever tem idêntico valor espiritual para os crentes: representam, uma e outra, o termo bíblico adaptado Emanuel (Deus connosco), atribuído a Jesus (Jehoxuá: «Jeová ajuda ou é salvador»), curiosamente profetizado muitos anos antes.
   Sublinho que as nossas normas ortográficas em vigor aceitam que os nomes sejam grafados de acordo com o seu registo oficial.
   
   Ao seu dispor,
D´ Silvas Filho
16/07/2004
Do Ciberdúvidas


COIMA
Já por diversas vezes alguém, cujo nome não conseguimos averiguar, tem pronunciado côima (com o fechado) aos microfones de certa estação televisiva, useira e vezeira na transmissão de prolações erradas, quando a maior parte das pessoas profere cóima (com o aberto).
Ora, a pronúncia de cóima está consagrada, há séculos, como se pode verificar nestes passes do "Foro Real", de Afonso X, o Astrónomo, que foi rei de Castela no decurso do século XIII: "coomya ou coomhya (metáteses de coo yma), formas inscritas nas páginas 256, 272 e 294 da referida obra; cooma, variante sintética da anterior, exarada a folhas 172, 225, 256 e 272 do mesmo incunábulo; e coomha, registada nas páginas 265, 267 e 270 do livro atrás indicado.
Do artigo XV, incluso no II volume, página 73 das "Ordenações Afonsinas", edição da "Fundação Calouste Gulbenkian", extraímos a propósito a seguinte abonação: "Outro sy ao que dizem o decimo sexto artigo, que as nossas Justiças e Almotacees fazem responder os Clérigos perante sy contra sua vontade polas cousas da Almotaçaria, e o que pior lhe, penhoram polas cooimas (o grifado é nosso), e degradamnos aas vezes..."
Também posteriormente, na folha 17 das "Ordenações de D. Duarte", elaboradas no século XV que este rei português, surge a forma de cooima, que, por contracção vocálica, deu origem à nossa actual palavra coima.
Mas por que motivo deveremos nós pronunciar coima, com o aberto, e não fechado, se essa vogal não se encontra graficamente acentuada no texto original? Muito simplesmente por que, segundo informou em 1536 o padre Fernão de Oliveira, na sua "Gramática da Linguagem Portuguesa", as vogais duplas foram usadas, até aos princípios do século XVI, para indicar sons abertos e não surdos. Recordemos, a este propósito, os seguintes exemplos, em que se verifica a fusão ou crase das vogais duplas: Saa = Sá, jai = já, ataa = atá (até), Aaveiro = Aveiro, See = Sé, fee =fé, guallee = galé, almotacee = almotacé e moor = mor (forma contracta de maior, que se lê com o aberto).
Como é do conhecimento geral, mas não é ocioso repetir, coima (proveniente do latim calumnia) significa: multa, penalidade por danos, pena pecuniária. Ora, na sua evolução fonética para português, o Ida palavra romana, porque se encontrava entre vogais, sincopouse, dando origem ao ditongo au, cujo som aberto determinou, por seu turno, a criação de um som correspondente em português. Recordese, a propósito, a deturpação popular de autocarro em ótó carro, com redução do ditongo au à vogal aberta à. Quanto ao n, porque era de prolação nasal, assimilouse regressivamente ao m anterior, donde resultou a deturpação caumnia, que, por transposição de letras (metátese), deu origem a coima (com o aberto), que é como se deve pronunciar este vocábulo.


CENTÉSIMO
Por influência do ordinal décimo, algumas pessoas mal elucidadas proferem erradamente centéssimo, em vez de centézimo, que é a pronuncia correcta deste numeral, conforme ensinou Xavier Roberto, nosso inesquecível professor de Latim, na página 224, 2. coluna, edição de 1984, do seu famoso "Prontuário da Língua Portuguesa", em confirmação da doutrina expressa por João de Deus e António José de Carvalho na página 170, 1.9 coluna, edição de 1895, do precioso "Dicionário Prosódico de Portugal e Brasil", a cujos ensinamentos nós recorremos ainda hoje com bastante frequência.
Francisco Alves da Costa
Jornal Olivais


CARÁCTER
Conforme já tivemos ocasião de afirmar noutro local, a palavra carácter, que no grego charactér, donde proveio, por intermédio do acusativo latino charactére, se pronunciava antigamente, nos dois números, sempre com acento sobre o e, hoje admite duas acentuações diferentes: carácter (no singular) e caracteres (no plural), exactamente como acontece na língua castelhana.
O termo carácter designa, como sabemos, feitio moral, cunho, aprumo, índole, marca, figura, temperamento, cariz, maneira de agir, letra de tipografia.
Não se diga nem escreva, portanto: carácteres, em qualquer daqueles sentidos, pois tal prática representa um erro flagrante, que merecia, nos tempos na nossa infância, o castigo implacável da férula professoral.
Talvez seja oportuno referir ainda neste local o péssimo hábito, contraído agora por certos anunciantes das estações televisivas, de se afirmar pomposamente que determinadas bebidas espirituosas possuem carácter.
Ora isto considera se uma irreverência flagrante, visto que tal substantivo apenas se aplica relativamente a pessoas ou coisas personificadas, o que neste caso não se verifica.
Francisco Alves da Costa
Jornal Olivais


Remates ao lado... da gramática

     O Euro 2004 1 parece ser um bom período para lembrar aos relatores e comentadores desportivos que não existe o verbo recepcionar com o significado de "receber a bola". Os brasileiros usam recepcionar quando querem dizer que alguém oferece uma recepção. Cartão vermelho, pois, para o "recepcionou a bola".
     Cartão amarelo para outra falta do jornalismo desportivo falado, que está já a tornar se rotineira: a fórmula "vencer à". Está, obviamente, errado. Não se diz "venceu à Espanha", mas sim "venceu a Espanha".
     Continua, inexplicavelmente, a confusão mental de alguns jornalistas sobre a conjugação do verbo haver. O mais caricato é que já se chegou ao ponto de começar por dizer bem e, na passada, "emendar" para a forma errada.
     E já que estamos a tratar do deve e haver do uso da língua, haja uma alma caridosa que explique a José Rodrigues dos Santos 2 que não se diz "tem a haver", mas sim "tem que ver". Se ele, ao menos, mudasse para o francesismo "tem a ver"..


1 Abreviatura do Campeonato [Copa] da Europa de Futebol, que está a decorrer em Portugal entre as sele(c)ções nacionais do Velho Continente.

2 Dire(c)tor de Informação da estação pública portuguesa de televisão, RTP, e pivô do seu Telejornal.
Do Ciberdúvidas


Tema
Porra

Pergunta/Resposta
   Qual a origem da palavra "porra"? Apesar de se ter vulgarizado e ser comummente usada e aceite sem qualquer tipo de reprovação, foi me dito que esta palavra tem um significado bem mais "agressivo". É verdade?
   Obrigado.

Rodrigo Sapatilhas
Portugal

   Digamos que é um vocábulo... grosseiro. Quer na acepção de «porcaria» («Tira esta porra da minha vista!»), quer como termo de conotação sexual (o mesmo que pénis e esperma), quer ainda quando se usa como interjeição, traduzindo sentimento de ira, discordância ou contrariedade (o mesmo que irra!, apre!, arre!, puxa!). Terá, segundo José Pedro Machado, a mesma origem da palavra homó[ô]nima com sentido de cacete, moca, pau (daí o termo porrada, «pancada», «bordoada»): 'puerro', porrum', «alho» (daí o adj. porráceo, «que tem o cheiro do alho porro»).
   In Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa + Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea, da Academia das Ciências de Lisboa + Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa + Novo Dicionário de Calão, de Afonso Praça
J.M.C.
Do Ciberdúvidas


Tema
Velocidade

Pergunta/Resposta
   Sou professora de português e, há uns dias atrás, surgiu me uma dúvida para a qual não encontrei resposta nas diferentes gramáticas que consultei, uma vez que divergiam em opiniões.
   Dizemos «mais velocidade» ou «maior velocidade»?

Susana Machado
Professora de Português
Portugal


   Eu digo: ‘este carro passou com maior velocidade do que o anterior’ (e estou a pensar numa quantificação, como, por exemplo, os 100 km/h).
   Digo também: ‘os jogadores têm de imprimir mais velocidade nos seus ataques’ (e estou só a pensar em rapidez, sem quantificar).
   Sublinho, no entanto, que esta distinção não é taxativa na linguagem corrente.
   
   Ao seu dispor,
D´ Silvas Filho
Do Ciberdúvidas


A propósito de Os dias da semana com ou sem artigo

   Na resposta Os dias da semana com ou sem artigo de José Neves Henriques o exemplo diz que 2ª feira é o segundo dia da semana.
   Sabendo que muitos assim pensam informo que, de facto, não é assim, pois a norma portuguesa diz que 2ª feira é o primeiro dia da semana.
   Neste momento não sei qual o nº da NP mas caso seja preciso tentarei obtê lo do IPQ.
   Obrigado.
Sebastião Oliveira
Aposentado
Lisboa
Portugal
04/06/2004

   Resposta
Quem diz que a segunda feira é o primeiro dia da semana, ignora que a semana começa no domingo.
   Reparemos até que o nome deste segundo dia começa pela palavra segunda e não primeira.
   Como o primeiro dia de trabalho semanal é a segunda feira e não o domingo, as pessoas são levadas por esta ideia de trabalho e ficam a pensar que a segunda feira é o primeiro dia da semana. A verdade é que o trabalho nada tem que ver com os nomes dos dias da semana.
   Qualquer bom dicionário ensina que a segunda feira é o segundo dia da semana, como por exemplo o Dicionário da Língua Portuguesa de José Pedro Machado.
   Antigamente, o sábado era o dia de descanso semanal e dedicado à oração. Não foi, pois, no sétimo dia que Deus descansou? O próprio Cristo recebeu críticas por pregar e curar ao sábado.
   Quanto ao domingo, que é o dia consagrado ao Senhor, este passou a ser um dia de descanso semanal dedicado à oração, depois da propagação do cristianismo, do aparecimento do catolicismo e de outras religiões afins.
   De tudo isto, eis a confusão gerada.
   
   P.S. – E, como já várias vezes esclarecemos aqui no Ciberdúvidas, atenção que, para escrever como escreveu, 2.ª feira (ou 3.ª, ou 4.ª, ou 5.ª, e por aí adiante), e número abreviadamente (n.º), é indispensável o pontinho a seguir ao numeral e ao n...
   
   Cf. Nomes dos dias da semana: origem
José Neves Henriques
Do Ciberdúvidas


Tema
Travessão no discurso dire(c)to

Pergunta/Resposta
   Tenho uma dúvida bastante consistente (que se tem adensado porque encontro opiniões divergentes) sobre o uso do travessão na transcrição do discurso directo. Dou o seguinte exemplo:
   "– Há um vilarejo a dez quilómetros daqui – respondeu o funcionário."
   A primeira oração, correspondente à fala da personagem, acaba sem qualquer pontuação? A explicação do narrador (de que se tratava da fala do funcionário) começa com minúscula em todos os casos ou apenas quando estamos na presença de um verbo de elocução?

Hélder Santos
Portugal

   Eu escrevo:
   — Há um vilarejo a dez metros daqui — respondeu o funcionário.
   E começo com minúscula as explicações introduzidas, quando poderiam ser separadas com vírgula.
   O travessão é a convenção para distinguir a separação entre discurso dire(c)to e indire(c)to (o que não se consegue tão bem com a vírgula, de aplicação mais generalizada). É também a convenção para a mudança de interlocutor no discurso dire(c)to (e, na prosa moderna, não é indispensável mudar de parágrafo, se a outra fala se segue imediatamente).
   Eu próprio só uso o travessão com estes fins e nunca o uso como parênteses, para evitar confusões. Mas há autores que, contudo, parece terem condenado o travessão ao ostracismo e não o usam para introduzir o discurso dire(c)to. O processo pode dar maior fluência à narrativa, mas o risco é estabelecer se algum desinteresse na leitura, em leitores pouco habituados a esse método de escrita.
   Ao seu dispor,
D´ Silvas Filho


Tema
«Os onze»

Pergunta/Resposta
   Diz se/escreve se «os onzes» («onze», significando equipa de futebol, faz parte da linguagem do futebol) ou «os onze»?
   Obrigado.
João Carlos Margarido
Aveiro
Portugal


   Diz se os onze, pois se subentende a palavra "jogadores". São «os onze jogadores». O numeral "onze" não tem plural.
       Maria Regina Rocha


Tema
O Porto é campeão pela 2.ª vez consecutiva?

Pergunta/Resposta
   Há dias interroguei me sobre esta expressão:
   «O Porto é campeão pela 2.ª vez consecutiva.»
   Será que o Porto:
   a) já foi campeão, no ano anterior (1.ª vez consecutiva) e, logo, campeão há dois anos?
   b) foi campeão há alguns anos, repetindo agora a mesma série de vitórias?

Miguel Belo
Portugal

   O adje(c)tivo consecutiva significa «que se segue imediatamente; sucessiva; ininterrupta». Não se pode, portanto, falar nessa 1.ª vez como consecutiva, porque ela inicia uma série, não lhe dá sequência.
   O FC Porto, após um período sem ganhar o campeonato, veio a sagrar se campeão na época passada, proeza que repetiu neste ano, ou seja, é campeão duas vezes seguidas, e a 2.ª vez é consecutiva, o que vai de certa forma ao encontro da ideia veiculada na alínea a) da pergunta.
   Mas – e perdoe me se estiver errado – julgo que não era esta a dúvida que o feito do clube azul e branco terá suscitado no nosso estimado consulente. Não estará ela, a dúvida, relacionada antes com o epíteto bicampeão? Bicampeão significa «campeão duas vezes», mas essas vezes não têm de ser seguidas. Fazendo contas, o FC Porto, campeão nacional pela 20.ª vez, é bicampeão 10 vezes. O Benfica, que este ano terminou a prova em 2.º lugar, é, por força dos seus 30 títulos, bicampeão 15 vezes, tricampeão 10 vezes, pentacampeão 6 vezes, e por aí fora. Isto percebe se melhor se nos lembrarmos de que o Brasil se sagrou pentacampeão mundial ao vencer esta última edição do Campeonato/Copa do Mundo, em 2002, depois de já ter vencido a prova em edições dispersas (1958, 1962, 1970 e 1994). Porém, vai se enraizando essa ideia de que bicampeão = campeão duas vezes seguidas, tricampeão = campeão três vezes seguidas, etc.
Do Ciberdúvidas


    Tema
Sobre o verbo desacreditar

Pergunta/Resposta
   O verbo "desacreditar" pode ser usado como oposto de "não acreditar"?
   Podendo ser usado, é correcto dizer «Desacredito em Deus»?

Ana Romão
Estudante do ensino secundário
Portugal

   Não tenho a certeza de ter percebido bem a sua pergunta: desacreditar como oposto de "não acreditar"...? Não será antes como oposto de "acreditar" (prefixo de oposição des + acreditar)?
   Bom, vejamos o que diz o Dicionário Houaiss a respeito desse verbo:
   «1. fazer perder ou perder o bom nome, a reputação; desabonar, descreditar 2. manter opinião depreciativa em relação a; desvalorizar 3. emitir conceitos desfavoráveis a respeito de; difamar, depreciar 4. possuir descrença em relação a 5. tornar( se) indigno de crédito, fazer perder ou perder a boa reputação, a estima, a consideração desfrutada 6. infamar 7. pouco usado, não acreditar (em algum facto).»
   Assim sendo, se tomar desacreditar como antó[ô]nimo de acreditar, à luz da acepção 7 é possível, embora pouco usual, dizer «desacredito em Deus».
       R. G.
Do Ciberdúvidas


Tema
À volta de demais e de mais

Pergunta/Resposta
   Hoje, ao compulsar algumas páginas do Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea da Academia das Ciências de Lisboa (DAC), para que luz desse às minhas incertezas, não logrei encontrar esclarecimentos sobre o que passo a expor:
   1. É comum ouvir se que um espectáculo foi "de mais", quando a ele se associam adjectivos encomiásticos (belíssimo, fantástico, etc.). Contudo, para tal acepção, o DAC não apresenta qualquer registo abonatório. "De mais" será, neste caso, a forma correcta de escrever esta expressão?
   2. Não será "demais" relembrar que... Abonar me á a ortografia?
   3. No referido dicionário (I, 1098), "demais" e "demais a mais" são considerados brasileirismos. Mas nem Fr. Domingos Vieira, no século XIX, no seu "Grande diccionario portuguez", se permite tal comentário!
   4. A Academia prossegue, no segundo volume do mesmo dicionário (p. 2336), com a apresentação de exemplos que não deixam de suscitar dúvidas:
   a) "Comeste de mais." – Não deveria ser "comeste demais"?
   b) "Não foi porque estava cansada e de mais a mais não tinha dinheiro." – Pretenderiam escrever "demais a mais"?
   c) "Um facto por de mais sabido." – Fr. Domingos Vieira, op. cit., regista "por demais".
   Muito obrigado pela resposta que houverem por bem dar me!

Manuel Morais
Portugal

   De mais é uma locução adverbial de quantidade que significa em quantidade excessiva.
   Demais pode funcionar como advérbio e equivale a além disso e de resto.
   Demais pode funcionar como adje(c)tivo.
   Os demais e as demais são pronomes indefinidos equivalentes a os restantes e as restantes.
   As dificuldades ortográficas surgem quanto à utilização da palavra demais como advérbio de quantidade em oposição a de mais: locução adverbial de quantidade.
   Regra prática para escolher a forma adequada: opor de mais a de menos. Se de menos for possível é natural que de mais também seja possível.
   Alguns autores não distinguem de mais de demais e usam estas formas como variantes ortográficas, especialmente quando a oposição a de menos não é esclarecedora. (vide D' Silvas Filho – Prontuário Universal da Texto Editora, pg. 160, nota 637).
   Comentário às questões propostas:
   1 – «O espectáculo foi de mais» pode ser uma estrutura de superfície correspondente a estruturas profundas como «O espectáculo foi longo de mais» e «O espectáculo foi bom de mais». Nestes casos, de mais serve de locução adverbial de quantidade para os adje(c)tivos subentendidos.
   «O espectáculo foi demais» pode ter como estrutura profunda «O espectáculo foi alegre, elegante, enfim, demais». Neste caso, demais funciona como adje(c)tivo pois pode significar excessivo, exuberante, etc., de acordo com o contexto.
   2 – Na frase «Não será 'demais' relembrar que...», a palavra demais funciona como adje(c)tivo pois pode equivaler a excessivo.
   Como adje(c)tivo, só poderá ser demais.
   3 – Demais, como advérbio significando além disso e de resto, tem uso desde o século XII; como adje(c)tivo, tem largo uso no Brasil. Esta questão é irrelevante para muitos dicionaristas.
   4 – a) «Comeste de mais» pode ter como oposto «comeste de menos». Logo é fácil justificar o uso da locução de mais.
   4 – b) De mais a mais é uma forma fixa que mostra a força de um motivo. Neste caso, introduz a razão que sobreleva o cansaço. (conforme Dicionário de Morais e outros dicionários).
   4 – c) Por demais significa em excesso ou em demasia. É uma forma fixa e, por isso, deverá ser «Um facto por demais sabido». (conforme Dicionário de Morais e outros dicionários).
   Conclusão: o Dicionário da Academia não segue estritamente as regras dos dicionaristas mais antigos em algumas das grafias tradicionais.
Do Ciberdúvidas


Tema
Um copo de água

Pergunta/Resposta
   Como se pede a um balcão de café?
   – Queria um copo de água, por favor.
   – Queria um copo com água, por favor.

Inês

   O Dicionário de Questões Vernáculas do conceituado estudioso brasileiro Napoleão Mendes de Almeida diz, na entrada Copo d’água, o seguinte: «Correto é o emprego da preposição ‘de’ em expressões como ‘uma xícara de café’, ‘um copo d’água’, ‘uma garrafa de cerveja’. Não há motivos que exijam a construção ‘um saco com açúcar’, ‘uma caixa com fósforos’, ‘um copo com água’, ‘uma garrafa com cerveja’, ‘uma barrica com pinga’, ‘Quantas cartolas com vinho o senhor quer?’, ‘A senhora deseja um cálice com licor ou um copo com água mineral?’.»
Do Ciberdúvidas


   Tema
Colapsar

Pergunta/Resposta
   Trabalho em rádio e surgiu me a seguinte dúvida: tenho ouvido e lido colapso transformado de substantivo em verbo, por exemplo, «a ponte colapsou».
   Podemos escrever «a ponte colapsou» ou apenas «a ponte sofreu um colapso»?
   Obrigado pela resposta a esta questão e a toda a ajuda que me têm dado com o vosso trabalho ao longo destes anos.

Sérgio Sousa
Porto
Portugal

   O verbo colapsar (de colapso + ar) já se encontra registado no dicionário brasileiro Houaiss – que, além da acepção mais corrente do léxico médico ou da botânica («O sal colapsa as células»), também atesta esse sentido figurado. Ou seja, «alterar de forma abrupta», «falhar subitamente», «arruinar se». Por exemplo: «Com a tempestade, o elétrico colapsou»; ou ainda: «O sistema econômico colapsou profundamente».
   «Sofeu um colapso», porque colapso só o sofre quem tem coração, na minha opinião, deve ser de todo evitado para estruturas inertes como uma ponte...
   E continue a contar com o Ciberdúvidas até... o Ciberdúvidas poder continuar!
José Mário Costa
Do Ciberdúvidas


Caralho
"Afonso Praça escreveu um "Novo Dicionário de Calão" que merece compra, consulta e leitura. Não é obra perfeita. Existem falhas. A maior delas encontra se na pág. 61 e respectiva definição de "caralho".
Ouçamos: "Termo chulo para designar o pénis; usa se também como expressão de irritação ou revolta".
Certo. Parcialmente certo. Mas só parcialmente. Afonso Praça não teve cuidado com os regionalismos. Não olhou, por exemplo, para o Porto. O "caralho" do Porto não é um "caralho" qualquer. Nem sequer é expressão de "irritação" ou "revolta". O "caralho" do Porto não agride. É um "caralho" meigo, nobre, íntimo, expressão sincera de amizade. No Porto, quando ouvirem chamar pelo "caralho", convém olhar para trás. O "caralho" podemos ser nós. O "caralho" é um tratamento entre amigos que se amam e respeitam. Como "caralho" que são. Ser um "caralho" é ser amigo de alguém.
No fundo, é ser amigo de um outro "caralho". Aliás, a expressão tem um significado tão profundo, que é sempre acompanhada de um possessivo.
Ninguém é, simplesmente, "caralho". Quando um portuense chama o "caralho" do amigo, trata o sempre por "meu caralho", ou "seu caralho". Há um sentido de posse entre "caralho". Os "caralho" pertencem se.

Onde é que andaste, meu "caralho"?
Por aí a pastar. E tu, seu "caralho"?

Claro que existem excepções. Nem toda a gente chega ao estatuto de "caralho". No Porto existem também os "caralhos" em potência: são os "caralhotes" (que Afonso Praça igualmente esquece). Um "caralhote" é alguém que tem todas as condições para ser "caralho" mas ainda não chegou lá.
Talvez com a idade. Talvez com a experiência. Ou talvez nunca. Um "caralhote" pode transformar se em "caralho" ou não. Se falhar, não fica "caralho" isso é que era doce! Se falhar na carreira da "caralhice", torna se na mais reles espécie de "caralho" que existe sobre a Terra. Torna se azedo. Pulha. Inimigo do seu amigo.Transforma se num "caralhão".

Quem é aquele "caralho"?
Aquele "caralho"? Aquele "caralho" é um "caralhão" de primeira. Nem te conto.

O ideal, portanto, é começar por ser "caralhote" e dar o salto para o "caralho", fugindo dos "caralhões". E como é que isso se faz? Eu só conheço uma maneira: evitando "encaralhar"."
Tenho dito....
(Autor anónimo)

ooooooooooooooooo

Tema
Pronúncia de Lisboa

Pergunta/Resposta
      
É verdade que, infelizmente, o sotaque lisboeta tende a prevalecer sobre os outros sotaques. Desta forma muitas das vogais que de certa forma já são mudas ainda ficam mais mudas ao ponto do próprio nome da cidade 'Lisboa' parecer mais um 'L'sboa'. Desagrada me ver que todos parecem estar de acordo em relação à pronúncia de 'Filipe', que eu sempre ouvi assim pronunciado, mesmo pela minha bisavó, mulher extremamente culta, que dizem ser 'Felipe'. Acho mesmo muito mais feia esta segunda forma, e algo pretensiosa. Qualquer dia, se a tendência continuar , os brasileiros, que, têm a mesma língua chegam a 'L'sboa', ouvem um 'B'm d'a, com'stá?' e não reconhecem a sua própria língua. Eu por mim, vou continuar a dizer 'Filipe' , 'ministro' , etc. pronunciando bem os dois 'ii'. Não acho que seja pronúncia afectada. Da mesma forma, os lisboetas dizem 'Rio Douro', 'Riu Dôro', e ninguém lhes diz nada. Que eu saiba 'Rio' é uma palavra dissilábica Ri o, e não devia ser pronunciada como em 'Ele riu', tal como a má pronunciação de todos os ditongos 'ou' que soam mais como 'ô'...

Pedro Teles
Porto
Portugal

      Não é de forma nenhuma consensual que a pronúncia de Lisboa seja considerada a norma.
      O gramático Jerónimo Soares Barbosa, na sua Gramática Filosófica da Língua Portuguesa (1881), escreveu o seguinte: “entre as diferentes pronunciações de que usa qualquer nação nas suas diferentes províncias, não se pode negar que a da corte e território em que a mesma se acha seja preferível às mais, e a que lhes deva servir de regra. Os gregos e os romanos assim o julgavam; aqueles a respeito de Atenas e estes a respeito de Roma; e nós o devemos igualmente julgar a respeito de Lisboa, há muitos anos corte de nossos reis e centro político de toda a nação.” Estas palavras mostram que no fim do século XIX a fala de Lisboa não era considerada a da norma e havia quem o desejasse, pelo prestígio da capital.
      Estas palavras não alteraram a realidade, e a boa norma prosódica sempre foi considerada a de Coimbra (a lusa Atenas), berço da Academia, difusora, durante séculos, da norma linguística. Efectivamente, repare se que se pode dizer que esta ou aquela particularidade é característica do falar de Lisboa ou do Porto, ou do Algarve, etc., sempre por referência à norma de Coimbra.
      No século em que estamos, século XXI, não me parece que o argumento da capital, que até ao momento nunca teve peso a nível linguístico e que tende a perdê lo a nível político e social, possa ser invocado para conferir prestígio a uma forma de falar em detrimento de outras.
      Assim, caro consulente, claro que a pronúncia de “coâlho” e “riu” por “coelho” e “rio” vai ser sempre considerada como uma particularidade da fala lisboeta, e não a norma.
      No entanto, a referência que faz ao enfraquecimento das vogais átonas pré tónicas, essa não é uma particularidade local. Trata se de um fenómeno característico deste último período de evolução da língua portuguesa. A vogal pré tónica “i” na palavra “ministro” sofre, no falar contemporâneo, um processo de dissimilação e enfraquecimento, sendo lida como “e”. Já com o substantivo próprio “Filipe”, o fenómeno não é tão visível, dado o carácter mais estável dos nomes próprios.
      Esse enfraquecimento não ocorre nem ocorrerá na saudação “Bom dia”, porque aí, quer o “o”, quer o “i” são vogais tónicas e não átonas. Por outro lado, na expressão “Como está?”, é natural a crase no discurso oral (“com’stá”), dado a primeira palavra terminar em vogal átona e a segunda começar por vogal também átona.
      A terminar, direi que a pronúncia é também um elemento de identidade e cada um de nós tem o direito de utilizar aquela com que se identifica.

Do Ciberdúvidas

oooooooooooooooooooooo

COCHE
Este vocábulo, que foi introduzido em Portugal por via francesa, e em França por intermédio do alemão Kutsche, provém do húngaro kocsi (leia se kôtchi) ou do checo, segundo outras opiniões mais ou menos abalizadas.

Coche (carruagem antiga e sumptuosa), que algumas pessoas pronunciam cóche, deve ser proferido com a vogal o fechada, conforme ensinaram os doutos filólogos: Morais Silva, Aniceto dos Reis Gonçalves Viana, Cândido de Figueiredo, João de Deus, Xavier Roberto e Carolina Michaellis de Vasconcelos.

No decurso da leitura de uma obra antiga, intitulada "Anedotas Portuguesas e Memórias Biográficas da Corte Quinhentista", encontrámos a seguinte abonação:"... indo D. André em hum couche (o grifado é nosso) com alguns fidalgos plo racio de Lxa (= Lisboa), encontrou se com D. Thomas que vinha com outros em outro couche..."

No romance francês "A Herança Trágica", de Constant Guéroult, publicado em 1880, em versão portuguesa de Cunha de Sá (autor de traduções muito esmeradas), lemos ainda o seguinte passo: "... Um côche, com dois belos cavalos atrelados..."

Também o escritor António Feliciano de Castilho confirmou ser assim a prolação deste vocábulo, na página 44 do seu livro "Tributo Português à Memória do Libertador", publicado em 1908.

Disto se pode, pois, concluir que a dicção de côche é, de facto, a mais congruente com a do termo húngaro kocsi (leia se kôtchi), donde o vocábulo proveio, não a preconizada pelos organizadores do "Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea", dado à estampa em 2001.

Como informação complementar, ainda acrescentamos aqui o seguinte: Aurélio Buarque de Holanda Ferreira também ensinou, a páginas 423, edição de 1986, do "Novo Dicionário da Língua Portuguesa", ser com o fechado, e não aberto, a prosódia correcta de coche.
Francisco Alves da Costa
Jornal Olivais


CISTER
Esta ordem religiosa, cujo nome algumas pessoas pronunciam Císter, relacionando a com a palavra sister (pronunciada sísta), de origem inglesa, que quer dizer irmã, deverá proferir se oxitonamente, isto é, Cistér, a rimar com: Ester, clister e malmequer. O lexicógrafo brasileiro Maximiano Augusto Gonçalves também comungava da mesma opinião, conforme se pode verificar, a páginas 55 do seu livro "Dificuldades Básicas da Língua Portuguesa", dado a lume no Rio de Janeiro em 1965.
Francisco Alves da Costa
Jornal Olivais


LUSITÂNIA SHOW
António Gomes de Almeida

A FRAGRÂNCIA DO VOCABULÁRIO

Este título é capaz de parecer um bocado estapafúrdio, mas eu vou já explicá lo, para não haver confusões.
Acontecem, de vez em quando, fenómenos linguísticos muito curiosos. Não senhores, não vou falar outra vez dessas palavras estranhas, esquisitas e bicudas que, de repente, saltam para o linguajar de toda a gente e são usadas, a propósito e a despropósito, nos discursos, nas notícias, nos diálogos de rua ou de café, como autênticas pragas, piores que percevejos, porque se agarram à nossa fala e não há insecticida, nem “Gramaticida”, capaz de as exterminar.
Não vou falar (já falei várias vezes) do “portantos”, que todos os analfabetos cá da Lusitânia usam, com o à vontade que lhes dá a burrice congénita e não assumida. E, quando falo de analfabetos, incluo neles muitos Senhores Doutores com canudo e tudo, que, lá por terem diploma e cartões de visita com dê erre bem evidente, não deixam de, “portantos”, enfeitar os seus dizeres e os seus escreveres com mimos tão gramaticalmente asneirentos como este.
Nem vou falar (também já falei vezes bastantes) do “incontornável”, outro palavrão que alguém foi desencantar lá das profundezas de algum dicionário espúrio, e que se usa muito em artigos de fundo de jornais ditos “de referência”, em discursos políticos e em entrevistas tão sérias quanto chatas.
É que anda por aí uma nova palavra, em uso corrente, no vocabulário actualmente em uso por alguns profissionais da comunicação, em especial pelos Publicitários... Bem, “nova” é uma maneira de dizer. A palavra é velha, é mesmo bastante antiga. Só que tem estado esquecida, aninhada nas páginas poeirentas dos dicionários pouco usados e sempre em perigo de serem atacados pelos bichos que lhes roem as entranhas e os deixam ilegíveis. Ora, lá de vez em quando, um curioso, um coca bichinhos com pouco que fazer, põe se a folhear, por desfastio, um desses velhos repositórios das riquezas da nossa bela língua – e, de repente, salta lhe perante os óculos uma palavra arrumada há longos anos, sem uso, a desfazer se no esquecimento.
Foi o que aconteceu, há pouco tempo, com a palavra FRAGRÂNCIA –
um termo requintado que veio, inesperadamente, perfumar o nosso Vocabulário do dia a dia.
Não é palavra nova, já o disse. Só que, talvez desde o tempo dos poetas românticos do século XIX, não era substantivo que se visse por aí. Só muito raramente tem sido utilizada por falantes ou escreventes modernos. Mas eis que, repentinamente, ela salta para a ribalta – e, se os senhores repararem bem, estamos rodeados de FRAGRÂNCIAS por todo o lado. Muito especialmente pelo lado dos anúncios que nos são lançados pelas nossas televisões.
De repente, parece que todos os produtos anunciáveis têm FRAGRÂNCIA. Até houve um que, na voz muito doce e meiga da locutora, tinha... FRAGÂNCIA! Assim mesmo, sem o R... Bem, de certo modo, é natural e desculpável o erro: a palavra estava tão esquecida que a senhora não sabia como pronunciá la. Rapidamente foi corrigido o erro e, em anúncio gravado de novo, o tal produto passou a ter FRAGRÂNCIA, como deve ser. (Não digo os nomes do produto nem da locutora, para não envergonhar escusadamente pobres analfabetos que não têm Prontuário em casa).
O que é certo é que têm aparecido muitos produtos igualmente cheios de FRAGRÂNCIA. Escutem com atenção os blocos publicitários e ficarão a saber que, por exemplo, a “Lacoste” tem uma bela FRAGRÂNCIA. Que o “Quanto” deixa por todo o lar uma imensa FRAGRÂNCIA. Que o “Rochas” tem uma agradabilíssima FRAGRÂNCIA. E até o “Airwick” deixa na sua casa de banho uma estonteante FRAGRÂNCIA...
Não sei se há mais. Se calhar, há. Também não sei se todos estes anúncios foram concebidos pela mesma agência de publicidade. Se foram, os clientes bem podem e devem refilar, porque andam a ser bem enganados por criativos que, uma vez usada a criatividade para um, a aproveitam para todos.
Se os anúncios são de agências diferentes, então é porque o nacional copianço continua a funcionar de acordo com as nossas melhores tradições.
Enfim, o caso não é grave. Mas é, pelo menos curioso. Não é habitual ver uma palavra que, depois de ter estado esquecida tanto tempo, é redescoberta e incluída de novo no nosso Vocabulário corrente, dando lhe um perfume renovado. E que, ao ser assim usada, com esta insistência tão insólita, torna este comentário, sem dúvida – “incontornável”.
Por isso eu digo que, “portantos”, isto da FRAGRÂNCIA é um assunto que, para dizer a verdade – não me cheira lá muito bem.
(Texto de António Gomes de Almeida)


CIRCUITO
Seguindo as pisadas indeléveis do insigne dicionarista Morais Silva (autor do século XIX), também o professor Domingos de Azevedo aconselhou, na sua "Gramática Nacional" de 1880, a prosódica de cir kúito para esta palavra, prática aliás filiada na prolação latina, que deve ser também adoptada relativamente ao ditongo ui dos seguintes vocábulos: intuito, fortuito e gratuito.
Já anteriormente, Gaspar Alvares Marques, autor do "Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa", dado à estampa em 1878 havia adoptado a prosódia por nós aqui preconizada, e que é felizmente seguida por todas as pessoas bem falantes.
De acordo com as opiniões de João de Deus, Gonçalves Viana e Cândido de Figueiredo, o professor J. Peres Montenegro registou igualmente, com a pronúncia correcta, como lhe competia, o termo referido em epígrafe, conforme se pode observar a páginas 117 do seu "Vocabulário Ortográfico, Prosódico e Remissivo da Língua Portuguesa", sem data de publicação expressa, mas que supomos enquadrada nosanos 30 do século passado.
Mais próximo de nós, confirmaram outros sim a prolação de circúito, e não circuíto (na escrita oficial sem acentos), pelos menos 17 lexicógrafos portugueses e brasileiros, cujas obras tivemos a paciência de consultar.
Para quem já se tenha esquecido aqui registamos, segundo o sentido expresso na frase, os significados normais do vocábulo supramencionado: volta, rodeio, cerca, digressão, âmbito, cercadura, círculo, circunferência, contorno, redor, roda, circunlóquio, sucessão de fenómenos periódicos.
Francisco Alves da Costa
Jornal Olivais