José de Matos-Cruz


IMAGINÁRiO299

· 16 NOV 2010 · Edição Kafre · imaginario@imaginarios.org
· Ano VII · Semanal · Fundado em 2004


PRONTUÁRiO

REVELAÇÕES


Cedo concebido e explorado sob o signo da produção artística, o cinema privilegiou e investiu na estratégia promocional, para a qual seriam destinadas significativas dotações, logo na montagem financeira dos projectos. Tal permitiu desenvolver uma sugestiva correlação conceptual e criativa - logrando notáveis materiais de divulgação e fascinação, cujo apreço peculiar se autonomizou e, historicamente, seria patrimonialmente valorizado. Tal cotejo subtil e iniciático entre o imaginário animado, a preto e branco, e uma colorida ilustração, de referências gráficas e plásticas, motivaria Cinema Em Cartaz - Colecção Internacional de Cartazes dos Primórdios do Cinema - documentário realizado por Fernando Carrilho, sob chancela da Videoteca Municipal de Lisboa e coordenação de António Cunha, a partir da exposição patente na Galeria Torreão Nascente da Cordoaria Nacional, em 2008, sendo comissária Adelaide Ginga. Em foco, sessenta exemplares sobre as cinematografias francesa, italiana, dinamarquesa, sueca, alemã e norte-americana, do período entre 1904-1914, pertencentes à Colecção de Joaquim António Viegas, que integra o acervo do Museu Municipal de Faro. Revelando uma memória excepcional, potenciando o apelo fílmico…

CALENDÁRiO

10MAR-21MAI2010 - Fundação Carmona e Costa - Espaço Arte Contemporânea, em Lisboa, apresenta Khôra - Alberto Carneiro | Rui Chafes, exposição de desenho e escultura, sendo curadora Sara Antónia Matos.

25ABR-02MAI2010 - No Cine-Teatro Caridade, em Moura, está patente uma Exposição Comemorativa do Centenário do artista de banda desenhada Fernando Bento (1910-1996). IMAG.257

29ABR2010 - Midas Filmes estreia Fantasia Lusitana de João Canijo; narração de Hanna Schygula, Rüdiger Vogler e Christian Patey. IMAG.1-13-63-220

06MAI-06JUN2010 - Teatro da Cornucópia apresenta Olá e Adeusinho de Athol Fugard, no Teatro do Bairro Alto, com Catarina Lacerda e Dinarte Branco; tradução de Jaime Salazar Sampaio, encenação de Beatriz Batarda.

08MAI2010 - Encerram as candidaturas à sétima edição do Prémio Stuart de Desenho de Imprensa El Corte Inglés / Casa da Imprensa, destinado a artistas gráficos com trabalhos publicados em todos os periódicos nacionais, nas áreas de Ilustração, Tira Cómica, Cartoon e Caricatura.

16-24JUL2010 - No Centro de Arte Moderna/CCB, decorre a Lisbon Jazz Summer School - 3ª Edição da Escola de Jazz de Verão de Lisboa, sendo artista convidado Danilo Perez.

MEMÓRiA

17NOV1910-2003 - Rachel de Queiroz: «Morrer, só se morre só. O moribundo se isola numa redoma de vidro, ele e a sua agonia. Nada ajuda nem acompanha» (O Brasileiro Perplexo - 1963)

1828-20NOV1910 - Lev/Leon Nikolaievitch Tolstoi: «Os ricos fazem tudo pelos pobres, menos descerem dos seus ombros». IMAG.56-194

1916-23NOV1990 - Roald Dahl: «A maior qualidade de um ser humano é a bondade. Em comparação, todas as outras, como a coragem e a perseverança, são secundárias».

28NOV1820-1895 - Friedrich Engels: «O factor em última análise determinante da história é a produção e a reprodução da vida imediata».

VISTORiA


Geometria dos Ventos

Eis que temos aqui a Poesia,
a  grande Poesia.
Que não oferece signos
nem linguagem específica, não respeita
sequer os limites do idioma. Ela flui, como  um rio.
como o sangue nas artérias,
tão espontânea que nem  se  sabe como foi escrita.
E ao mesmo tempo tão elaborada - 
feito uma flor na sua perfeição minuciosa,
um cristal que se  arranca da  terra
já dentro da geometria impecável 
da sua lapidação.
Onde se conta uma história, 
onde se vive um delírio; onde a condição humana exacerba,
até à fronteira da loucura, 
junto com Vincent e os seus girassóis de fogo,
à sombra  de Eva Braun, envolta no mistério

ao mesmo  tempo
fácil e insolúvel da sua tragédia.
Sim, é o encontro com a Poesia.
Rachel de Queiroz

VISTORiA


Era Outono. Pela estrada real duas carruagens seguiam a trote rápido. Na da frente viajavam duas mulheres. Uma, a senhora, magra e pálida. A outra, a criada, gorda e de um corado lustroso. Os seus cabelos curtos e ressequidos brotavam por baixo do chapéu desbotado, e a mão avermelhada, coberta por uma luva puída, ajeitava-os com gestos bruscos. O busto volumoso, envolto num lenço rústico, transpirava saúde; os olhos negros e vivazes ora espiavam pela janela os campos fugidios, ora observavam timidamente a senhora, ora lançavam olhares inquietos para os cantos da carruagem. A criada tinha bem junto ao nariz o chapéu da senhora, pendurado no bagageiro, um cãozinho deitado nos joelhos, os pés acima dos pequenos baús dispostos no chão, tamborilando sobre eles, em sons quase abafados pelo ruído dos solavancos das molas e do tilintar dos vidros.
De mãos cruzadas sobre os joelhos e de olhos fechados, a senhora balouçava levemente nas almofadas que lhe serviam de apoio e, com um leve franzir de cenho, dava tossidelas fundas. Tinha na cabeça uma touquinha branca de dormir e um lencinho azul celeste envolto no pescoço pálido e delicado. Uma risca brotava abaixo da touquinha e repartia os cabelos ruços, excessivamente lisos e empastados; havia qualquer coisa de seco e mortiço na brancura do couro daquela vasta risca. A pele murcha, um tanto amarelada, mal conseguia modelar as suas feições belas e esguias, que ganhavam um tom vermelho nas maçãs do rosto. Os lábios secos mexiam-se intranquilos, as ralas pestanas não se encrespavam, e o sobretudo de viagem formava rugas entre os seios encovados. Mesmo de olhos fechados, o rosto da senhora expressava cansaço, irritação e um sofrimento que lhe era familiar.
Recostado em seu banco, o criado dormitava na boleia; o postilhão gritava animado e fustigava a possante quadriga suada; uma vez por outra espreitava o outro cocheiro, que gritava de trás, da caleche. As marcas paralelas e largas das rodas estendiam-se nítidas e iguais pelo calcário lamacento da estrada. O céu estava cinzento e frio; a bruma húmida espalhava-se pelos campos e pela estrada. A carruagem estava abafada e saturada de poeira e água-de-colónia. A doente inclinou a cabeça para trás e abriu devagar os olhos, grandes, brilhantes, de uma bela tonalidade escura.

Leon Tolstoi - Três Mortes (excerto)

BREVIÁRiO

Edições + (&) ´ lança Calle de José Abascal de Francisco José Craveiro de Carvalho. IMAG.16-117-130-177-190-209-226-255-276

Universal edita em CD, sob chancela Archiv, Concerto Italiano pelo violinista Giuliano Carmignola, com a Venice Baroque Orchestra, sob a direcção de Andrea Marcon.

Alétheia edita Casanova - 1725-1798 - Actor, Espião, Amante, Padre de Ian Kelly.

Caminho edita Memórias Vivas do Jornalismo de Fernando Correia e Carla Baptista.

VISTORiA

Cassiano Ricardo

Nos fios lassos
da companhia telefónica
as andorinhas já se calam
fartas da primavera.
Francisco José Craveiro de Carvalho

COMENTÁRiO


Uma grama de acção vale mais do que uma tonelada de teoria.
Talvez a evolução superior dos arianos e dos semitas se deva à abundância de carne e leite em sua alimentação e, particularmente, pela benéfica influência desses alimentos no desenvolvimento das crianças. Com efeito, os índios pueblos do Novo México, que se vêem reduzidos a uma alimentação quase exclusivamente vegetal, têm o cérebro menor que o dos índios da fase inferior da barbárie, que comem mais carne e mais peixe. Em todo caso, nessa fase desaparece, pouco a pouco, a antropofagia, que não sobrevive senão como um rito religioso, ou como sortilégio, o que dá quase no mesmo.
De acordo com a concepção materialista, o factor decisivo na história é, em última instância, a produção e a reprodução da vida imediata. Mas essa produção e essa reprodução são de dois tipos: de um lado, a produção de meios de existência, de produtos alimentícios, habitação, e instrumentos necessários para tudo isso; de outro lado, a produção do homem mesmo, a continuação da espécie. A ordem social em que vivem os homens de determinada época ou determinado país está condicionada por essas duas espécies de produção: pelo grau de desenvolvimento do trabalho, de um lado, e da família, do outro. Quanto menos desenvolvido é o trabalho, mais restrita é a quantidade de seus produtos e, por consequência, a riqueza da sociedade; com tanto maior força se manifesta a influência dominante dos laços de parentesco sobre o regime social.
Como o Estado nasceu da necessidade de conter o antagonismo das classes, e como, ao mesmo tempo, nasceu no cerne do conflito entre elas, é, por regra geral, o Estado da classe mais poderosa, da classe economicamente dominante, classe que, por intermédio dele, se converte também em classe politicamente dominante e adquire novos meios para a repressão e exploração da classe oprimida.
Quando for possível falar de liberdade, o Estado como tal deixará de existir.
Friedrich Engels

EXTRAORDINÁRiO

OS HUMANIMAIS
Folhetim Aperiódico

TEM-TE NO LEITO,
TENTO NA LÍNGUA - 2

  Por outro lado, havia um requinte, uma macabra sofisticação que contrastava com a pungência de simples vítima. Os assombros de tal cenário implicariam, quase, a subtil insolência duma provocação inaudita.

Fixado pela rigidez, aquele corpo era como um espantalho paradoxal. Mais próximo ao vulto, um fio de sangue já coalhado escorria na fonte, de um pequeno orifício que não desfigurava o rosto ainda trigueiro. Fantástica era, porém, a intensidade dos olhos esbugalhados, hirtos e, mais extraordinário, pareciam de um estrábico!

Assim, como numa fotografia desfocada, realismo e impressionismo enquadrariam um retrato nítido, que fazia imaginar uma existência anterior àquele tempo de tragédia. Um ser humano, masculino, estilizado, na idade vertiginosa entre a imaturidade e a veterania. Com um frémito de emoções, essenciais ou românticas, a percorrer uma tal vitalidade fatalista.

  Continua  


  

IMAGINÁRiO298

· 08 NOV 2010 · Edição Kafre · imaginario@imaginarios.org
· Ano VII · Semanal · Fundado em 2004


PRONTUÁRiO

MITOLOGIAS



O primado do imaginário e a vanguarda do fantástico, mesclando mitologias e tecnologias, culminam no universo WarCraft - cujo sucesso como videojogo evolui em quadradinhos, entre nós sob chancela das Edições Asa. Tendo por referência o fenómeno da mangà nipónica, explorado sem fronteiras em promoção da indústria lúdica, por equipas de escritores e artistas, tais virtualidades atingem outros nexos ficcionais e rituais, sempre em prodigiosa mutação… Após Warcraft - Trilogia do Poço do Sol e Warcraft - Legends 1-2-3, outros desafios e adversidades, outras vicissitudes e proezas se consumam em Warcraft - Legends 4, por Richard A. Knaak, Dan Jolley, Tim Beedle, e Christie Golden (argumento) & Jae-Hwan Kim, In-Bae Kim, Fernando Heinz Furukawa e Ryo Kawakami  (ilustração). Eis quatro aventuras - Destino, Bloodsail o Pirata, O Sangue Corre Mais Espesso e Guerreiro Feito - em que se debatem heróis e monstros, em que se contrastam fantasia e emoção, em que se desvendam pavores e ideais, confrontando os desígnios da realidade até aos limites da magia. IMAG.227

MEMÓRiA

12NOV1840-1917 - Auguste Rodin: «O mundo não será feliz, senão quando todos os homens tiverem alma de artista, isto é, quando todos extraírem prazer do seu trabalho». IMAG.154

12NOV1920-1989 - Richard Quine: «Um grande comediógrafo do cinema americano, príncipe da elegância narrativa, desmistificador das convenções hollywoodianas, cineasta metalinguístico avant la lettre, que começou a revelar-se em meados do decurso da década de ‘50» (André Setaro). IMAG.230

13NOV1850-1904 - Robert-Louis Stevenson: «Os espíritos tranquilos não se confundem, continuam em seu próprio ritmo na ventura e na desgraça, tal como os relógios durante as tempestades. IMAG.1-35-41-151-187-257-260

15NOV1930-2009 - J.G. Ballard: Escritor de ficção científica, autor de Crash (1973) e Império do Sol (1984) - «Tive que crescer muito depressa - aprende-se muita coisa com a experiência de uma guerra, sob o controlo do inimigo». IMAG.46-247

CALENDÁRiO

1918-01ABR2010 - John Lincoln Freund, aliás John Forsythe: Actor norte-americano do teatro, do cinema e da televisão, voz de Charles Townsend em Os Anjos de Charlie (1976) e protagonista de Blake Carrington em Dinastia (1981), entre os pioneiros do Actors Studio (1947) - «Sou amplamente utilizável, embora não demasiado talentoso».

08ABR2010 - Costa do Castelo produziu e estreia, no Amoreiras e Classic Alvalade, Pare, Escute e Olhe de Jorge Pelicano.

1945-12ABR2010 - Werner Schroeter: «Um dos grandes criadores do cinema alemão. Um dos maiores vultos do cinema europeu e mundial» (Paulo Branco).

1925-13ABR2010 - Jaime Salazar Sampaio: Poeta, dramaturgo - «Quando escrevo, vivo dentro do universo das minhas personagens. Se não, não conseguiria. Tenho um cemitério de peças por causa disso. Aliás, tenho mais peças começadas do que acabadas». IMAG.235

14ABR2010 - O arquitecto Álvaro Siza Vieira é nomeado membro Honorário da Academia Americana das Artes e das Letras, recebendo o título numa cerimónia em Nova Iorque, a 19MAI IMAG.41-56

14ABR2010 - José Mourinho, treinador de futebol do Inter de Milão, inspira a personagem Big Mou, para uma aventura em banda desenhada do Pato Donald, na edição da revista Topolino em Itália.

29ABR-25MAI2010 - Em Lisboa, Galeria Bernardo Marques expõe Remember the Time de Guilherme Mampuya e Angola Mood de Jordi Burch.

30ABR-20JUN2010 - No Centro Cultural de Cascais, Fundação D. Luís I apresenta Puzzle This | To Enfold | To Enlace, exposição de pintura de Rui Macedo.

OBSERVATÓRIO

www.sherlock-holmes.co.uk - O Museu de Sherlock Holmes (1881-1904) - A mais famosa morada do Mundo, em 221 Baker Street, Londres, NW1 6XE Inglaterra. Aberto todo o ano, excepto no dia de Natal. Ali viveram Sherlock Holmes e o Dr. John Watson em 1881-1904, segundo as narrativas de Sir Arthur Conan Doyle (1859-1930). IMAG.17-66-71-116-128-140-184-227-281

VISTORiA


Entre os dois, sentia que tinha de escolher agora.
As minhas duas naturezas tinham memória em comum, mas todas as outras faculdades eram distribuídas muito desigualmente entre elas.
Preferi, então, o doutor já envelhecido e insatisfeito, mas rodeado de amigos e a alimentar honestas esperanças.
Dei um resoluto adeus à liberdade, à relativa juventude, ao passo leve, aos impulsos saltitantes e aos prazeres secretos que gozara na máscara de Hyde.
Talvez fizesse essa escolha com alguma reserva inconsciente, porque não desisti da casa em Soho, nem destruí as roupas de Eduard Hyde que tenho sempre prontas no meu gabinete.
Porém, durante dois meses, fui fiel à minha resolução.
Levei durante esses dois meses uma vida de tal severidade como nunca tinha levado, e gozei as compensações de uma boa consciência.
Logo o tempo começou, afinal, a obliterar o frescor de meu alarme.
Os louvores da consciência passaram a ser uma questão de hábito.
Comecei a ficar torturado com dores e anseios.
Era Hyde que lutava pela liberdade.
Finalmente, numa hora de fraqueza moral, compus mais uma vez e mais uma vez engoli a droga metamorfoseante.
O meu demónio, que por muito tempo tinha estado engaiolado, saiu rugindo.
No momento em que tomei a droga, fiquei consciente de uma propensão mais desenfreada e furiosa para o mal.
Devia ter sido isto, suponho, que desencadeou na minha alma a tempestade de impaciência com que ouvi as cortesias de minha infeliz vítima.
R.L. Stevenson - O Médico e o Monstro (excerto)

BREVIÁRiO

Porto Editora lança Poemas Portugueses - Antologia da Poesia Portuguesa do Século XIII ao Século XXI; organização de Jorge Reis-Sá e Rui Lage.

¯Universal edita em CD, sob chancela Decca, Ludwig van Beethoven [1770-1827], [Benjamin] Britten [1913-1976]: Concertos por Janine Jansen e Paavo Järvi, com Orquestra Filarmónica de Câmara de Bremen e Orquestra Sinfónica de Londres.
IMAG....204-210-228-229-236-237-239-256-268-285

Assírio & Alvim edita Canções de Inocência e de Experiência de William Blake (1757-1827); tradução de Jorge Vaz Carvalho. IMAG.63-156-204

Dreyer Gaido edita em CD, Página Esquecida por Bruno Borralhinho (violoncelo) e Luísa Tender (piano).

Oficina do Livro edita Elegia Para Um Caixão Vazio de Baptista-Bastos.
IMAG.24-151

Caminho edita O Homem Que Não Tira o Palito da Boca de João de Melo.
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Universal edita em CD, sob chancala Deutsche Grammophon, Frédéric Chopin [1810-1849] - Piano Concertos 1 & 2 pelo pianista Rafal Blechacz, com a Orquestra do Concertgebouw, sob a direcção de Jerzy Semkow. IMAG.92-191-203-247-265

Mu Records/Arte das Musas edita em CD, Silêncio pelo ensemble Sete Lágrimas.

Presença edita O Monte dos Vendavais de Emily Brontё (1818-1848); tradução de Fernanda Pinto Rodrigues. IMAG.30-189

Dom Quixote edita Ilusão (Ou o Que Quiserem) de Luísa Costa Gomes.
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Cavalo de Ferro edita A Volta Ao Dia Em 80 Mundos de Julio Cortázar; tradução de Alberto Simões. IMAG.205

TRAJECTÓRiA

RICHARD QUINE



Realizador do cinema americano, nasceu em Detroit (Michigan), em 1920; suicidou-se em 1989. Vivendo em Los Angeles desde os seis anos, ainda criança lançou-se como actor, em teatro, rádio e cinema. Frequentou a El Rodeo Grade School e a Mt. Vernom High School, seguindo-se estudos de Arte Dramática na Lawler Profissional School. Durante a II Guerra Mundial, serviu na Guarda Costeira. Em 1948, foi contratado pela MGM, iniciando uma sólida carreira em Hollywood, como director especializado na comédia. O seu gosto estilizado, reflectiu-se na iniciação de estrelas como Doris Day e Kim Novak. Em 1960, abordou o malogro do sonho americano, em Um Estranho Na Minha Vida/Strangers When We Meet. Aliado ao argumentista G. Axelrod, recriou o non-sense em obras como Quando Paris Delira/Paris When It Sizzles (1963), A Solteira e o Atrevido/Sex and Single Girl (1964) e Como Matar a Sua Mulher/How To Murder Your Wife (1965).

NOTICIÁRiO

A Fotografia das Cores

Diz o Figaro: «Foi descoberta a fotografia das cores, segundo diz um telegrama de Yokohama. Foi um sábio japonês que descobriu o que tanta gente tem procurado. Chama-se Aruzizwa Ryochi Niclome Sanjakanbos Kio Bashi Kui.» É de desejar que a descoberta não tome o nome do seu autor.
27NOV1890 - Diário de Notícias

EXTRAORDINÁRiO

OS HUMANIMAIS
Folhetim Aperiódico

TEM-TE NO LEITO,
TENTO NA LÍNGUA - 1

 14 de Setembro de 1892

Tinha uns vinte e cinco ou trinta anos, e pelo aspecto parecia não ser do trabalho manual. Com o cabelo arruivado, vestia calça de casimira escura, casaco de xadrez forrado de castorina azul, assertoado, com duas ordens de quatro grandes botões, uma protuberância na algibeira interior, esquerda, colete cor de castanha em risca ao alto, chapéu de coco mole, meias encarnadas às pintas e sapatos pretos com colchetes.

Estava subjacente no próprio ervado, debaixo de uma árvore frondosa, encostado a um morro com musgo. Imóvel. Defunto. Junto à mão direita, lassa, havia um revólver prateado, de marca Perigal.

Tudo era estranho naquela natureza morta. Um cadáver distinto e burguês em lugarejo ermo e descampado. Acaso o desamparo motiva o suicídio? Não, e não - uma qualquer coincidência bizarra estimularia os desígnios do desespero, naquele limiar desentranhado do paraíso.

 Continua


   

IMAGINÁRiO297

· 01 NOV 2010 · Edição Kafre · imaginario@imaginarios.org
· Ano VII · Semanal · Fundado em 2004

PRONTUÁRiO

PRIVILÉGIOS




Longe vão os tempos em que os cinéfilos, para reverem as fitas que lhes agradaram, tinham que esperar pela única, irrepetível oportunidade das reposições do Verão. Outros, mais afortunados ou envoltos em profundo culto, podiam ainda alimentar a expectativa de uma sessão especial no seu cineclube. Emoção, fascínio, nostalgia, prolongavam pois o ritual das salas, pelo feitiço da projecção entre as luzes e as trevas. Um desses bastiões exemplares é evocado em O Cineclube da Beira - Dos Anos 60 à Independência por José Cardoso, sob chancela Apenas Livros. Um testemunho histórico e fascinante que, ao envolvimento cultural, aliou a produção de filmes, através da Secção de Cinema Amador, reflectindo em Moçambique a própria experiência em Portugal... Tal fenómeno - mútuo e recíproco, sobre a divulgação / apropriação de imaginários - foi, afinal, alterado pela televisão que, através de emissão massiva mas propícia, levou à intimidade do espectador os clássicos ou os êxitos recentes, formatando embora o sortilégio do grande ao pequeno ecrã. Tudo se tornaria mais familiar, perdido no entanto o privilégio de uma selecção pessoal.

MEMÓRiA

1918-14OUT1990 - Leonard Bernstein: «Não me interessa uma orquestra que tenha o seu próprio som… O que eu quero é que, ao tocar, ela nos transmita o som do compositor». IMAG.266

1856-02NOV1950 - George Bernard Shaw: «Posso perdoar a Alfred Nobel por ter inventado a dinamite, mas só um diabo em forma de gente poderia conceber o Prémio Nobel». IMAG.102

06NOV1880-1942 - Robert Musil: «Em certo sentido, é mais importante escrever um livro, do que governar um império... E mais difícil, também». IMAG.56-202-231-236

07NOV1910-31JUL1980 - Francisco Graça / Francis: Actor de cinema desde Fátima Milagrosa (1928 - Rino Lupo); coreógrafo desde A Severa (1931 - Leitão de Barros); argumentista desde Nazaré - Bailados Verde Gaio (1962 - António Lopes Ribeiro). Professor de dança, primeiro bailarino da companhia de bailado Verde Gaio (1940).

1912-07NOV1990 - Lawrence Durrell: «Os meus romances são como gansos a grasnar no Capitólio. Não me sinto capaz de dar respostas. Isso seria decidir que eu sou Deus, ou Buda. E não sou».

CALENDÁRiO

1932-27MAR2010 - Richard Josepb Giordano, aliás Dick Giordano - Editor, ilustrador e artista norte-americano de banda desenhada, lançou Action Heroes em Charlton Comics, e assinou aventuras de super-heróis como Batman, Lanterna Verde/Green Lantern e The Flash, sendo executivo de DC Comics. IMAG.26-43

01ABR2010 - Alambique estreia Ruínas de Manuel Mozos; e Canção de Amor e Saúde de João Nicolau, com Ana Francisca e Miguel Gomes. IMAG.48-115-266

µ09ABR-23MAI2010 - No Centro Cultural de Cascais, Fundação D. Luís I apresenta Private Lives, exposição de fotografia de André Cepeda, Catarina Botelho, Duarte Amaral Netto, José Pedro Cortes, Mariana Viegas, Pedro Magalhães, Rita Castro Neves e Vasco Barata.

ANTIQUÁRiO

02NOV1540 - Nomeado Inquisidor-Mor por El-Rei D. João III, o Infante D. Henrique concede ao prior da Ordem de São Domingos a autoridade para verificar o tipo de livros vendidos em livrarias públicas ou privadas, além de proibir a impressão de qualquer livro sem examinação prévia. A 29NOV1540, legisla o inquisidor João de Mello que «não deviam imprimir cousa alguma sem primeiro a mostrarem aos censores nomeados, sob pena de execução e de dez cruzados de multa para as despesas da Inquisição». Todas as livrarias e todos os navios que chegassem aos portos do reino ou das colónias deviam ser examinados pelos «visitadores das naus» - sempre, membros do clero.

OBSERVATÓRiO

www.timburton.com/ - Tim Burton Gallery - Site oficial do cineasta, de entradas pública e privada, com animação, dedicado ao olhar pessoal e ao projecto criativo. Inclui The Art of Tim Burton, com mais de 1.000 ilustrações e 430 páginas, em livro com texto de Lea Gallo e design de Holly Kempf.
IMAG.3-7-10-44-146-227-229

VISTORiA

Um Homem Que Pensa

Infelizmente, não há nada mais difícil em literatura do que descrever um homem a pensar.
Um grande inventor, a quem perguntaram como conseguia ter tantas ideias novas, respondeu: «pensando constantemente nelas». Com efeito, bem podemos dizer que as ideias inesperadas só nos vêm porque já estávamos à espera delas. São, em grande parte, o merecido fruto de um carácter, de certas inclinações estáveis, de uma ambição tenaz, de uma incansável actividade. Como é que uma tal perseverança pode deixar de ser enfadonha? Vista por outro prisma, a solução de um problema intelectual é mais ou menos semelhante ao que acontece quando um cão pretende passar por uma abertura estreita levando um pau na boca; volta a cabeça para a direita e para a esquerda até que o pau passa de lado; nós fazemos precisamente o mesmo, só com a diferença que não tentamos ao acaso, antes sabemos mais ou menos, por uma questão de hábito, como havemos de manobrar. E muito embora seja natural que uma cabeça bem recheada tenha mais habilidade e experiência para se mover do que uma cabeça vazia, nem por isso ela fica menos surpreendida quando consegue deslizar através da abertura; a coisa passa-se com rapidez e notamos nitidamente dentro de nós um certo espanto ao verificarmos que os pensamentos, em lugar de esperarem pelo seu autor, se fizeram sozinhos. A este sentimento de leve espanto, muita gente hoje em dia deu o nome de «intuição», depois de lhe haverem chamado «inspiração», e julgam ver aí algo de superpessoal, quando se trata simplesmente de qualquer coisa de impessoal, ou seja a afinidade e a homogeneidade das próprias coisas que se encontram dentro de um cérebro.
Quanto melhor é esse cérebro, menos visíveis são os seus actos. Por isso é que o acto de pensar, enquanto se prolonga, é um estado lamentável, uma espécie de cólica de todas as circunvoluções do cérebro; mas quando termina já perdeu a forma do pensar sob a qual viveu, para assumir a da coisa pensada; e essa forma é, lamentamos dizê-lo, impessoal, porque o pensamento entretanto voltou-se para o exterior, destinando-se à comunicação. Quando um homem pensa, torna-se por assim dizer impossível isolar o momento em que ele passa do pessoal para o impessoal e é exactamente por isso que os pensadores causam tantas dores de cabeça aos escritores, que estes preferem evitar tal espécie de personagens.

Robert Musil - O Homem Sem Qualidades (excerto)

COMENTÁRiO





Francis
Francis Graça um bailarino cheio de sensibilidade, que António Ferro apresentou pela primeira vez ao público no Teatro Novo, e que era vaiado quase todas as noites, viu-se forçado a pôr uma máscara e a mudar de nome para fazer a sua carreira em Portugal, onde, após tal percurso se transformou num imensurável sucesso, assumindo a direcção do Verde Gaio com a valiosa colaboração da bailarina alemã Ruth Walden, que diziam, tinha uma boa técnica.
Luís Testa

BREVIÁRiO

Dom Quixote edita Conversas n’A Catedral de Mario Vargas Llosa; prefácio de João de Melo. IMAG.229-245

Numérica edita em CD, Robert Schumann [1810-1856] - Obras Para Clarinete e Piano por Elsa Silva e Nuno Pinto. IMAG.105-194-203-233-268-278

Libri Impressi edita Tarzan dos Macacos segundo a novela de Edgar Rice Burroughs, em desenhos de Harold R. Foster (1929). IMAG.37-149-204-224-267

Sextante edita Outras Vozes, Outros Lugares de Truman Capote (1924-1984); tradução de Maria João Delgado. IMAG.60-64-172-210-230-281

¯Universal edita em CD, sob chancela Decca, Gaetano Donizetti [1797-1848]: Lucia di Lammermoor por Joan Sutherland e Luciano Pavarotti, com Royal Opera House, Convent Garden, sob a direcção de Richard Bonynge. IMAG.156

Guerra Paz edita Livro de Viagem de Fernando Pessoa (1888-1935) e Heterónimos.
IMAG. 26-28-64-82-130-131-157-182-187-196-207-211-236-264-280

Universal edita em CD, sob chancela Decca, Verismo por Renée Fleming, com Coro e Orchestra Sinfonica di Milano Giuseppe Verdi, sob a direcção de Marco Armiliato.

AsaDelta edita Silverfin - As Extraordinárias Aventuras do Jovem James Bond por Charlie Higson (argumento) & Kev Walker (ilustração).
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Relógio d’Água edita O Jogador de Fiodor Dostoievski (1821-1881); tradução de António Pescada. IMAG.220-281

ANUÁRiO

1990 - A Torre do Tombo é sediada na Cidade Universitária de Lisboa. Em 1378-1755, funcionou numa torre do Castelo de São Jorge, que lhe deu nome e, sob ameaça de derrocada da estrutura, o arquivo central do Estado foi transferido para o Mosteiro de São Bento, onde se manteve até à construção do actual edifício. Com uma área de cinquenta e quatro mil e novecentos metros quadrados, e uns cem quilómetros de prateleiras, inclui três áreas principais - arquivo e investigação, actividades culturais e serviços administrativos. Designada Instituto dos Arquivos Nacionais/Torre do Tombo em 1997-2006, foi então autonomizada como Arquivo Nacional da Torre do Tombo. IMAG.84-99-145

EXTRAORDINÁRiO

OS SOBRENATURAIS
Folhetim Aperiódico

SAI DO ARMÁRIO, MEU AMOR,
E DEIXA-ME ENTRAR NA NOITE - 7

 Amadeu Miraldes sucumbiu ao apetite das trevas. Num rompante, arremeteu - rendido à insinuante aparição, que se transfigurava.

Mal refeita. A rir. Beijou-o.

Amadeu olhou com espanto a espiritualizada, e mais tarde asseverou aos seus devaneios que, por instantes, tinha sentido o contacto de uns lábios, vindos de dentro da boca daquela acometida pelo sobrenatural.

 Continua


   

IMAGINÁRiO296

· 24 OUT 2010 · Edição Kafre · imaginario@imaginarios.org
· Ano VII · Semanal · Fundado em 2004


PRONTUÁRiO

IMPRESSÕES



Em 1983, o panorama em quadradinhos por autores portugueses foi revolucionado, com As Aventuras de Filipe Seems, Detective Particular, em revelação virtual de Ana - ambientando-se numa Lisboa estranha, aliás com estigmas contemporâneos e evocações nostálgicas. No ano seguinte, A História do Tesouro Perdido reincidia a cidade capital, sob fantásticas atmosferas, em recriação de um futuro próximo. Eis quando e onde se repercutiu, quase dez anos depois, A Tribo dos Sonhos Cruzados - uma surpreendente exploração, plástica / tecnológica, pelo talento artístico de António Jorge Gonçalves, estigmatizando a mais onírica e crepuscular investigação de Seems, sob o signo fotográfico e visionário de Ana Lógica. Também a intrigante narrativa, densa / lassa, de Nuno Artur Silva se reexpôs sobre os mistérios da vida, ao culminar uma rotura inexorável pelas ironias da realidade, os caprichos do acaso, os enigmas da existência. Algo que está para além do sortilégio gráfico e mágico em quadradinhos - subjugando / mitificando homens e mulheres, como gémeas transfigurações de um universo volúvel, precário, vulnerável, evolutivo...

MEMÓRiA

1826-26OUT1890 - Carlo Lorenzini, aliás Carlo Collodi: «Como eu era ridículo, enquanto marioneta! E como eu sou feliz, agora que me tornei um verdadeiro rapaz!» (Pinóquio - 1883). IMAG.9-31-65-108-261

1931-27OUT1990 - Jacques Demy: «Cinema essencialmente popular, tanto nas ambições como nos temas ou nas formas que adopta, o [seu] cinema é o mais imediatamente acessível, sem que esta simplicidade signifique renúncia ao essencial: a estrita cronologia da narração mascara um jogo vertiginoso com o tempo; as suas convenções do melodrama ou da comédia afloram as mais graves interrogações; a real simplicidade das linhas melódicas faz esquecer a complexidade das estruturas musicais e a sua necessidade profunda» (Jean-Pierre Berthomé).

31OUT1750-1839 - D. Leonor de Almeida Portugal Lorena e Lencastre, Condessa de Oeynhausen-Gravenburg, Condessa de Assumar e Marquesa de Alorna, poetisa de nome literário Alcipe: «Nos discretos caracteres, / Vão teus olhos magoados / Ora lendo o seu conforto, /Ora o decreto dos Fados. // Já te lanças brandamente / No seio da paciência; / Já te recreia admirar / O aspecto da Providência. // Eu te sigo, suspirando, / E teço então sobre a lira / Estas cantigas saudosas / Que o contemplar-te me inspira. // Se os meus versos te consolam, / Sempre a branda simpatia / Conduzirá no silêncio / A Musa que teme o dia.» (A Uma Freira Em Chelas). IMAG.246

CALENDÁRiO

1930-23MAR2010 - José Maria Nunes: Realizador e professor da Escola de Barcelona, nascido em Faro e distinguido como Grande Oficial da Ordem de Sant’Iago da Espada - «Muito contribuiu para o desenvolvimento da arte cinematográfica e para a divulgação da cultura portuguesa a nível internacional» (Aníbal Cavaco Silva).

16AGO1930-24MAR2010 - Robert Culp: Actor norte-americano de cinema e televisão, distinguido como Kelly Robinson na série I Spy / Sou Um Espião (1965-1968) - «Não interessa ter uma boa história para filmar, quando o realizador é alguém sem talento».

24MAR-20ABR2010 - No Salão Nobre do Palácio de S. Bento, em Lisboa, Assembleia da República expõe José Estêvão - Revolução e Liberdade (1809-1862).
IMAG.32-244-252

1937-27MAR2019 - José Antunes: Ilustrador, designer gráfico e autor de banda desenhada, colaborador de Flama, Mundo de Aventuras ou Camarada, criador de Geraldo Sem Pavor (1956), Trinca-Fortes (1957) ou Tony Tormenta (1958), director artístico do Círculo de Leitores.

VISTORiA


Contigo o Céu

¨Se me aparto de ti, Deus de bondade,
que ausência tão cruel! Como é possível
que me leve a um abismo tão terrível
pendor infeliz da humanidade.

Conforta-me, Senhor, que esta saudade
me despedaça o coração sensível;
se a teus olhos na cruz sou desprezível,
não olhes para a minha iniquidade.

À suave esperança me entregaste, 
e o preço do Teu sangue precioso
me afiança que não me abandonaste.

Se justo, castigar-me te é forçoso,
lembra-Te que Te amei e me criaste
para habitar contigo o Céu lustroso!

Alcipe
(D. Leonor de Almeida de Portugal Lorena e Lencastre)

EPISTOLÁRiO



Minha filha dos meus olhos ainda que fazia tenção de te mandar um discurso muito concertado sobre a Poesia, para tu regulares a veia que tem mostrado Leonor, e concordares nessa deligência com o que eu desejo por isso me resolvo agora a dar princípio a esta obra, sem fazer borrão, nem me apurar no estilo, e ordem dele. Está assentado entre as pessoas que se prezam de bom gosto, que a nossa religião é imprópria para versos, ao mesmo tempo que a poesia tem uma extrema necessidade da religião Pagã, que é a fábula, e que sem ela toda a obra Poética é insípida e mostra que lhe falta o nervo principal. As Poesias Cristãs, que se tem composto parecem confirmar esta openião, por serem todas insulsas, principalmente em comparação das que são ornadas com a fábula. Por esta rezão para a poesia da moda é preciso estudar a fábula, a história antiga, ler Poemas, assim antigos como modernos, e entrar deste modo em um estudo absolutamente oposto a tudo o que constitui uma educação Cristã, como a que nós devemos dar a Leonor.

D. João de Almeida,
Marquês de Alorna

PARLATÓRiO


Sou imigrante.
Imigrei por necessidade com o meu pai. Ele decidiu sair de Portugal. Estivemos cinco anos em Sevilha, mas eu sempre quis fazer cinema e convenci-o a vir para Barcelona. 
Barcelona é uma das cidades mais cultas de todas as civilizações. É um sítio de cultura extraordinária, muito interessante cultural e artisticamente.
Cheguei com dezassete anos e hoje, quando me perguntam a nacionalidade, digo que sou um barcelonit.
José Maria Nunes

ANUÁRiO

1470-1536 - Garcia de Resende: Cronista, poeta, médico, arquitecto, autor de Crónica de D. João II (ed. 1545) - «Porque a natural condiçam dos Portugueses é nunca escreverem cousa que façam, endo dinas de grande memória, muitos e mui grandes feitos de guerra; paz e vertudes, de ciência, manhas e gentilezas sam esquecidos» (Prólogo ao Cancioneiro Geral - 1516, excerto). IMAG.92

VISTORiA

Fala D. Inês

Qual será o coraçam
tam cru e sem piadade,
que lhe nam cause paixam
úa tam gram crueldade
e morte tam sem rezam?
Triste de mim, inocente,
que, por ter muito fervente
lealdade, fé, amor
ó príncepe, meu senhor,
me mataram cruamente!

A minha desaventura
nam contente d'acabar-me,
por me dar maior tristura
me foi pôr em tant'altura,
para d'alto derribar-me;
que, se me matara alguém,
antes de ter tanto bem,
em tais chamas nam ardera,
pai, filhos nam conhecera,
nem me chorara ninguém.

Eu era moça, menina,
per nome Dona Inês
de Castro, e de tal doutrina
e vertudes, qu'era dina
de meu mal ser ó revés.
Vivia sem me lembrar
que paixam podia dar
nem dá-la ninguém a mim:
foi-m'o príncepe olhar,
por seu nojo e minha fim.

Garcia de Resende - Trovas (excerto)

BREVIÁRiO

Edições Asa lança As Aventuras de Filipe Seems - Caixa Especial de Nuno Artur Silva (argumento) e António Jorge Gonçalves (ilustração).
IMAG.19-169-183-195-227-252-292

Relógio D’Água edita Um Bando de Corvos de Ruth Rendell; tradução de Fernanda Pinto Rodrigues. IMAG.224-228

Universal edita em CD, sob chancela Archiv, Giovanni Battista Pergolesi [1710-1736]: Stabat Mater pela Orchestra Mozart, sob a direcção de Cláudio Abbado.

¨Edições Asa lança Invisível de Paul Auster; tradução de José Vieira de Lima.
IMAG.119-124-205

Harmonia Mundi edita em CD, Georg Friedrich Händel [1685-1759]: Ode For the Birthday of Queen Anne, Dixit Dominus por Hélène Guilmette, Andreas Scholl e Andreas Wolf com o Vocalconsort Berlin e a Akademie für Alte Musik Berlin, sob a direcção de Marcus Creed. IMAG.196-222

Palimpsesto edita Os Jornalistas e Outras Pasquinadas de Fialho de Almeida (1857-1911). IMAG.129-199

Trem Azul edita em CD, com Fundação Calouste Gulbenkian, Pyotr Ilyich Tchaikovsky (1840-1893) pela Orquestra Gulbenkian, sob a direcção de Joana Carneiro.
IMAG.235-261-273-280

Assírio e Alvim edita Blackpot de Dannis McShade, aliás Dinis Machado (1930-2008). IMAG.218-232-261-267

Megamúsica edita em DVD, sob chancela Alia Vox, Franz Joseph Haydn [1732-1809]: As 7 Últimas Palavras de Cristo Na Cruz por Le Concert des Nations, sob a direcção de Jordi Savall.
IMAG.40-219-228-240-269-271-272-273-275-276-282-285

EXTRAORDINÁRiO

OS SOBRENATURAIS
Folhetim Aperiódico

SAI DO ARMÁRIO, MEU AMOR,
E DEIXA-ME ENTRAR NA NOITE - 6

 Como se não tivesse intenção ou orientação, irradiada e, ao sulcar, fosse espargindo um quebranto caprichoso. Para Amadeu, não era uma desconhecida. E, no entanto, ela ignorava-o. Um impasse germinal. Aos poucos, ia-se - afinal - cumprindo o elã por que tudo ali interagia, numa lógica sem explicação: a terra persistia, qual elemento comum; a morrinha só dava para um escaravelho pôr a pata na poça; uma larva qualquer evoluía para insecto; cobertos de musgo húmido, arfavam os penedos; matagal bravio fazia crescer os seus espinhos com brandura; um cão selvagem exultava no frenesim predador; franzindo o nariz, uma lebre furtiva saía da toca; árvores flectiam o tronco, revigorando os ramos; uma aragem coleava a fixidez etérea; alguns pássaros sacudiam-se, chilreando para ninguém; recortado pelas nuvens, já o sol cedia perante a noite.

– Continua


  

IMAGINÁRiO295

· 16 OUT 2010 · Edição Kafre · imaginario@imaginarios.org
· Ano VII · Semanal · Fundado em 2004


PRONTUÁRiO

EXORCISMOS

Um jovem casal, Mickey e Mallory Knox percorrem a América, incendiando um rastilho de selvática violência, impregnado por fantasmas demoníacos, com os quais exorcizam uma infância de humilhações, abusos e prepotências familiares. Enleados em pacto ritual de sangue, famigerados pelo culto adolescente à histeria, segue-os uma equipa televisiva de Gale, sem escrúpulos quanto à exploração mediática; tendo ainda na peugada Scagnetti, um polícia maníaco, sob a perversa obsessão duma mística expiatória. Após o absurdo assassinato de um venerável índio por Mickey, que Mallory tanto lastima, são caçados e detidos numa penitenciária de alto risco. Uma entrevista de Gale, em directo com Mallory, degenera em motim entre os presos; o grotesco director, McClusky será impotente para deter o caos e o extermínio. Enquanto Mickey e Mallory, reunidos outra vez em clímax devastador, ajustam as derradeiras contas com o passado infernal, para um exílio no anonimato de sublimação… Em Assassinos Natos / Natural Born Killers - sobre história de Quentin Tarentino, cineasta revelado com Cães Danados (1992) - Oliver Stone, o realizador de Quando o Céu e a Terra Mudaram de Lugar (1993), transfigura um complexo e múltiplo painel, visual e melódico, no crepúsculo do imaginário ianque, com Juliet Lewis e Woody Harrelson como anjos da vingança.

 MEMÓRiA

1788-21SET1860 - Arthur Schopenhauer: «A música não exprime nunca o fenómeno, mas unicamente a essência íntima de todo o fenómeno - numa palavra, a própria vontade. Portanto, não exprime uma alegria especial ou definida - certas tristezas, certa dor, o medo, as sensações, o prazer, a serenidade do espírito; exprime-lhes a essência abstracta e a geral, fora de qualquer motivo ou circunstância. E, todavia, nessa quinta essência abstracta, sabemos compreendê-la perfeitamente». IMAG.125-167

21OUT1790-1869 - Alphonse de Lamartine: «Aqueles que definimos como os nossos dias mais belos, não são mais do que um brilhante relâmpago numa noite de tempestade». IMAG.216

22OUT1870-1953 - Ivan Bunin: Prémio Nobel da Literatura em 1933, «pela especificidade artística com que desenvolveu, na escrita em prosa, as tradições clássicas da Rússia».

1918-22OUT1990 - Louis Althusser: «A ideologia é indispensável em qualquer sociedade, se os homens pretendem ser formados, transformados e habilitados a responder às exigências das suas condições de existência». IMAG.199

RELATÓRiO

18NOV1980 - Filósofo Louis Althusser Estrangula a Mulher - ...Era domingo, uma manhã cinzenta de domingo quando o filósofo Louis Althusser, de 62 anos, anuncia aos gritos o que acontecera no interior do seu apartamento na École Normale Supérieure, em Paris: «Estrangulei Hélène!» No dia seguinte, já com o filósofo internado num hospital psiquiátrico, a autópsia confirma: apesar de não existirem quaisquer vertígios na pele do pescoço, nem quaisquer sinais de resistência, Hélène Rytmann, de 70 anos, companheira de Althusser há mais de 30, tinha sido estrangulada. Por ele, que um ano depois é dado como inimputável. Althusser, um dos principais filósofos comunistas, tinha um passado clínico de depressões e crises de melancolia, conhecera já vários internamentos. Continuará a entrar e sair de hospitais psiquiátricos até ao fim da sua vida, em 1990. Entre internamentos, revolta-se contra a privação da palavra que o seu acto acarretara, contra a ausência de testemunho. O resultado é uma autobiografia, L’Avenir Dure Longtemps, que começa assim: «É provável que se considere chocante eu não me resignar ao silêncio após o acto que cometi, e também o não-lugar que o sancionou e do qual eu beneficiei. Mas se eu não tivesse tido este benefício teria de ter comparecido. E se eu tivesse comparecido teria de ter respondido. Este livro é essa resposta...» Saído de «uma noite impenetrável», o que terá levado o filósofo a matar? O que terá levado Hélène a não resistir? «Estrangulei a minha mulher, que era tudo para mim, durante uma crise intensa e imprevisível de confusão mental, ela que me amava a ponto de querer apenas morrer, na falta de poder viver, e talvez eu tenha, na minha confusão, e na minha inconsciência, prestado esse serviço, do qual ela não se defendeu mas do qual morreu».
16NOV2007 - Público

CALENDÁRiO

1924-18MAR2010 - Fess Parker: Artista norte-americano de cinema e televisão, protagonista de Davy Crockett (1954) e Daniel Boone (1964-1970) - «Foi um modelo como actor e um ídolo para mim, desde que eu o vi pela primeira vez na tela grande. Ele era uma verdadeira lenda de Hollywood» (Arnold Schwarzenegger).

INVENTÁRiO



Projecto amadurecido, e de concretização por Manoel de Oliveira pacientemente ambicionada, Non ou a Vã Glória de Mandar (1990) consubstancia e, afinal, subverte algumas das suas obsessões essenciais - entre a tradição e a modernidade, o enraizamento e o universalismo. Envolvido por um momento culminante da nossa história actual, Non é uma evocação trágica, onírica, sobre o demencial épico em que, ao longo dos séculos, se representou A Vã Glória de Mandar.
Trata-se de um culminar na carreira de Oliveira, segundo ambicioso investimento na arte e no espectáculo. E é significativo que, enquanto a indústria anglo-americana, sob o signo de Hollywood, fabrica cada vez mais produtos híbridos, na expectativa de subsequente rendibilização pelo vídeo, em pequeno ecrã, o alcance euro-africano, implícito em Non, expande-se esplendoroso pela amplitude do imaginário - em transe ou êxtase.
«Terrível palavra é o Non», sagra Oliveira - citando o Padre António Vieira, a quem devotou Palavra e Utopia (2000). Em mente, teria a mística do Quinto Império, que lhe estava associada. Através dum envolvimento contemporâneo, protagonizado por alguns soldados já no crepúsculo da guerra colonial, pouco antes do 25 de Abril de 1974, reflecte-se a identidade pátria, quanto a momentos em que se consumou A Vã Glória de Mandar, desde os prenúncios da nacionalidade.
Em evocação solene, ilustrada com Viriato, herói trágico da Lusitânia, contra os Romanos; D. Afonso Henriques e a formação de Portugal, primeiro país do Continente; D. Afonso V e a Batalha de Toro, em tentativa de unificação da Ibéria; retorno a tal expectativa, pelo frustrado casamento do herdeiro de D. João II com a filha dos reis de Castela; os Descobrimentos, como a nossa maior dádiva ao Mundo; o desastre de Alcácer-Quibir, e os desígnios do sabastianismo...
É pela reconstituição desta batalha, enquanto aparatoso cenário de horror e morte, e numa poética transferência sobre a Ilha dos Amores, com a celebração de Vasco da Gama, que Non atinge os lances paroxísmicos - em termos de exaltante martirologia, ou magnificência visionária. A dor e o delírio que empolgaram uma existência histórica, sublimada pela lírica/épica de Camões, resplandecem da efemeridade obscura ou enigmática, pelos artifícios do cinema.
Sugestivamente, Oliveira coloca os mesmos intérpretes a personificar nas distintas incidências, com destaque para um assombroso Luís Miguel Cintra - enquanto Alferes Cabrita, portador dessa memória perturbante, fantomática, que se exorcizará na Revolução dos Cravos, em cuja aurora ele agoniza, compreendendo como «a verdade é algo secreto, inexplicado»... A radical assombração de um espírito primordial - entre as catástrofes, os anseios, as contingências, as vicissitudes.
Académico, fulgurante, pedagógico, libelatório, Manoel de Oliveira traça assim, em Non ou a Vã Glória de Mandar, os estigmas de um imaginário puro e tremendo, inocente ou monstruoso, pervertido ou expiatório, em que o tributo ancestral acaba por transfigurar, para além do testemunho sobre todas as adversidades, as marcas cintilantes quanto ao futuro: é o cinema português entre as luzes e as trevas, eis um artista na plenitude do génio e da perplexidade.

BREVIÁRiO

ZON Lusomundo edita em DVD, Assassinos Natos / Natural Born Killers (1994) de Oliver Stone; com Juliet Lewis e Woody Harrelson. IMAG.6-47-67-157

Estrofes & Versos edita A Aventura da Memória e Outros Contos de Voltaire [1694-1778]. IMAG.28-180-270

Universal edita em CD, sob chancela Decca, The [Giuseppe] Verdi [1813-1901] Tenor por Marcelo Alvarez com Coro e Orchestra Sinfonica di Milano Giuseppe Verdi, sob a direcção de Daniel Oren. IMAG.72-89-156-188-203-222-223

Teorema edita O Leopardo de Giuseppe Tomasi de Lampedusa (1896-1957); tradução de José Colaço Barreiros. IMAG.105-189-278

Objectiva edita O Gato do Simon - Os Gatos São Mesmo Assim! de Simon Tofield (argumento e desenhos).

Ensemble edita em CD, João Baptista André Avondano [fl. 1783-1800]: 4 Sonatas Para Violoncelo e Baixo Contínuo, 2 Duetos Para Violoncelo pelo Avondano Ensemble. IMAG.260

Guimarães Editores lança A Origem das Espécies de Charles Darwin (1809-1882); tradução de Vítor Guerreiro.
IMAG.16-63-74-77-87-90-101-109-119-214-236-238-241-248

Sony edita em CD, sob chancela Legacy, Sketches of Spain - Legacy Edition por Miles Davis (1926-1991). IMAG.64-84-255

COMENTÁRiO

A minha mãe acreditava, e eu penso o mesmo, que matar animais com o objectivo de comer a sua carne é uma das mais deploráveis e vergonhosas fraquezas do estado humano; que é uma daquelas pragas lançadas sobre o homem ou pela sua queda, ou pela teimosia da sua própria perversidade.
Alphonse de Lamartine - Les Confidences (excerto)

VISTORiA

Amemos
Gozemos a hora fugitiva!
O tempo não tem praias;
Corre, e nós passamos.

Alphonse de Lamartine - Elegia (excerto)

É essencial ler e estudar O Capital. Devo acrescentar que é necessário e essencial ler e estudar Lenine e todos os grandes textos, novos ou antigos, aos quais se devem a experiência da luta de classe do movimento operário internacional. É essencial estudar os textos práticos do movimento operário revolucionário em sua realidade, seus problemas e contradições; em seu passado e, acima de tudo, sua história presente.
Louis Althusser - A Filosofia Como Uma Arma Revolucionária

EXTRAORDINÁRiO

OS SOBRENATURAIS
Folhetim Aperiódico

SAI DO ARMÁRIO, MEU AMOR,
E DEIXA-ME ENTRAR NA NOITE - 5

 Franzina, sonambular, luzia deixando um rasto obscuro que se desprendia do seu vulto em transe, fantasmagórico.

– Continua  


IMAGINÁRiO294

· 08 OUT 2010 · Edição Kafre · imaginario@imaginarios.org
· Ano VII · Semanal · Fundado em 2004


PRONTUÁRiO

CELEBRAÇÃO



Tendo celebrado vinte anos na edição de 2009, o Amadora Bd não é apenas o mais antigo e importante certame português, e uma múltipla referência prestigiada além fronteiras, sobre os fenómenos artísticos e culturais sagrados pela banda desenhada. Ponto de encontro, pólo de convívio, espaço de criatividade e divulgação, motivação ritual e pedagógica, as suas memórias virtuais, os seus amplos sucessos, estão contidos e tratados no Almanaque Festival Internacional de Banda Desenhada da Amadora - XX Anos, sob chancela da respectiva Câmara Municipal, com direcção de Nelson Dona e coordenação de Sara Figueiredo Costa. Em destaque, os autores, as exposições, os premiados, os melhores momentos e algumas reflexões sobre o passado e o futuro. Diversas personalidades prestam testemunho e expõem experiências - como outros festivais pelos seus responsáveis, panorama actual dos quadradinhos entre nós - além da opinião de autores e especialistas, ou colecção de originais do CNBDI/Centro Nacional de Banda Desenhada e Imagem, apontando sugestivamente «um património de afectos».
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 MEMÓRiA

09OUT1940-08DEZ1980 - John Lennon: «A mulher é o negro do mundo. A mulher é a escrava dos escravos. Se ela tenta ser livre, tu dizes que ela não te ama. Se ela pensa, tu dizes que ela quer ser homem». IMAG.64-70

10OUT1910-2005 - Ramón Gaya: «Ser criador é isso: obedecer. Ser artista, pelo contrário, é desobedecer, e daí essa quase travessura que tem quase toda a arte moderna, pois trata-se de uma arte especialmente artística, artificial» (El Sentimiento de la Pintura - 1959). IMAG.244

10OUT1930-2008 - Harold Pinter: «Dramaturgo, encenador, actor, poeta e activista político», Prémio Nobel da Literatura em 2005 - «Foi uma figura única no teatro britânico. Dominou a arte de palco desde os anos ‘50» (Alan Yentob). IMAG.63-118-230

12OUT1890-1955 - Luís de Freitas Branco: «Ao significado da sua obra notabilíssima, da sua personalidade fecunda e dominadora, há a juntar a verdadeira paixão que possuía pela Juventude, o entusiasmo com que via os novos triunfar, a sua luta diária, durante cinquenta anos, pelo renovamento, pela europeização da cultura portuguesa, e ainda a generosidade do seu grande coração, sempre disposto a ajudar os que começavam e vivendo com o mesmo entusiasmo as obras dos próprios discípulos, que pretendia sempre colocar à frente das suas» (Joly Braga Santos).
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CALENDÁRiO

01MAR-18MAI2010 - Em Lisboa, Museu Colecção Berardo expõe, no Centro de Arte Moderna/CCB,  Sem Rede de Joana Vasconcelos.

06MAR-13JUN2010 - No Porto, Museu de Serralves expõe À Luz da Sombra de Lourdes Castro e Manuel Zimbro. IMAG.42-63

1927-14MAR2010 - Peter Aurness, aliás Peter Graves: - Actor norte-americano de cinema e televisão, intérprete de Jim Phelps na série Missão: Impossível (1967 e 1988), galardoado com o Emmy por Biography (1997). IMAG.134

18MAR-27ABR2010 - Em Lisboa, Galeria Bernardo Marques expõe The Wedding Dress de João Cristóvão.

01ABR2010 - Centro Cultural de Belém/CCB apresenta Madalena aos Pés de Cristo, cantata de Antonio Caldara (1670-1736) por Divino Sospiro, sob a direcção de Enrico Onofri.

VISTORiA

Mano Vacante

La mano del pintor - su mano viva -
no puede ser ligera o minuciosa,
apresar, perseguir, ni puede, ociosa,
dibujar sin razón, ni ser activa,

ni sabia, ni brutal, ni pensativa,
ni artesana, ni loca, ni ambiciosa,
ni puede ser sutil ni artificiosa;
la mano del pintor - la decisiva -

ha de ser una mano que se abstiene
- no muda, ni neutral, ni acobardada -,
una mano, vacante, de testigo,

intensa, temblorosa, que se aviene
a quedar extendida, entrecerrada:
una mano desnuda, de mendigo.
Ramón Gaya - Del Pintar (1978)

INVENTÁRiO




O que é que faz um bom filme? Eis questão para a qual não existirá consenso, entre os potenciais inquiridos - do público, da crítica ou, mesmo, dos principais sectores responsáveis pela respectiva produção e lançamento. Foi, aliás, levantada por David Golden - ao gerir um orçamento de dois milhões de dólares, investidos em Love Story - Uma História de Amor (1970) de Arthur Hiller, sob chancela Paramount. Por tais inquietações se forja, também, um sugestivo fenómeno de época.
Significativamente, a resposta seria prestada tempos depois, pelo canadense Hiller ao parceiro de Golden, Howard G. Misnky, com quem assumiu outras expectativas cinéfilas: um bom filme é o que dá lucro. Trata-se duma derivação ambígua quanto ao dilema original, mas que remete - para além das virtualidades tecnológicas ou industriais - ao cerne da fascinação, que identifica os espectadores com o imaginário: a capacidade de vibrar, de sofrer, de sonhar, sobre as tensões e os valores em causa.
Nova Iorque. Dois estudantes - Oliver, filho de um banqueiro de Boston; e Jenny, de um vendedor de sorvetes com ascendência italiana - são contrariados pelo pai do rapaz, quanto à paixão que os uniu, na Universidade da Nova Inglaterra. Apesar de tudo, casam-se; e o inflexível progenitor corta relações. Ela trabalha para o sustento da casa, o marido completa o curso. Passam-se dois anos e, em vésperas de ser mãe, a jovem morre leucémica. O infeliz marido regressa ao lar da família Barrett...
Inspirado num best-seller de Erich Segal, então com trinta e quatro anos, Love Story foi um fenomenal sucesso de bilheteira, enquanto clássico moderno do melodrama romântico. A transposição fílmica surgiu em pleno êxito literário (um milhão de exemplares na edição de luxo, nove milhões em pocket-serie), celebrando um casal de actores em ascensão. A Academia de Hollywood atribuiu-lhe um Oscar, pela música de Francis Lai - um dos elementos temáticos mais sugestivos e perenes.
Quarenta anos depois, Uma História de Amor continua a ser um espectáculo intenso e emocionante, logo ao nível artístico, sobressaindo o bem elaborado argumento pelo próprio Segal, o qual consubstanciou também uma candidatura na categoria de Melhor Filme. Inevitavelmente - à transparência de época - Love Story suscitaria mesmo uma sequela: Oliver’s Story (1978) de John Korty, com Candice Bergen substituindo o fantasma de Ali McGraw, no vivo afecto de um obcecado Ryan O’Neal.
Testemunho vibrante, Love Story - Uma História de Amor é, também, o reflexo inequívoco duma sociedade ferida, vulnerável, devorada na fornalha do Vietname. A este nível, mais simbólico ou siderante, cabe destacar a relevância da figura paterna - repartida entre um compassivo John Marley e um renitente Ray Miland - respectivamente quanto a Jenny e Oliver. IMAG.286

PARLATÓRiO

04MAR1966 - O Cristianismo vai desaparecer. Vai diminuir e encolher. Nós, The Beatles, somos mais populares do que Jesus, neste momento. Não sei qual vai desaparecer primeiro - o rock and roll ou o Cristianismo. Cristo não era mau, mas os seus discípulos eram obtusos e vulgares. É a distorção deles que, em minha opinião, estraga o Cristianismo.

11AGO1966 - Se tivesse dito que a televisão era mais popular do que Jesus, ninguém teria ligado… Eu não sou anti-Deus, anti-Cristo ou anti-religião. Não estou a dizer que sejamos melhores ou maiores, ou a comparar-nos a Jesus Cristo como pessoa ou Deus ou seja o que for. Disse o que disse e estava errado - ou fui interpretado erroneamente.
John Lennon

Desisti de escrever peças de teatro, concentro agora as minhas energias em direcções diferentes, noutras formas de literatura, desde logo a poesia. Nos últimos anos, fiz também várias palestras em diversos lugares e cerimónias. Mais especificamente, presto atenção a situações políticas que, em minha opinião, são muito preocupantes, tendo em conta o actual estado de coisas.
Harold Pinter (2005)

BREVIÁRiO

Assírio & Alvim lança O Caminho de Pisões de M.S. Lourenço (1936-2009); edição de João Dionísio. IMAG.264

Harmonia Mundi edita em DVD, [Jean-Féry] Rebel [1666-1747]: Elementos, [Antonio] Vivaldi [1678-1741]: As Quatro Estações pela violinista Midori Seiler com a Akademie für Alte Musik Berlin, em coreografia de Garaio Esnaola. LIMAG.169-205-209-254-255-284

Antígona edita Crónica do Nacionalismo Económico de Karl Marx (1818-1883). IMAG.148-177

Teorema edita O Balão do Menino Nicolau de René Goscinny (1926-1977, argumento) e (Jean-Jacques) Sempé (ilustração).IMAG.71

Biblioteca Nacional edita A Expulsão dos Jesuítas dos Domínios Portugueses - 250º Aniversário; introdução de Jorge Couto.

EMI edita em CD, sob chancela Mute, White Lunar de Nick Cave e Warren Ellis. IMAG.85-202

Dom Quixote reedita Cem Anos de Solidão de Gabriel García Márquez; tradução de Margarida Santiago. IMAG.13-224-229-261

EXTRAORDINÁRiO

OS SOBRENATURAIS
Folhetim Aperiódico

SAI DO ARMÁRIO, MEU AMOR,
E DEIXA-ME ENTRAR NA NOITE - 4

 Em vão. Já se sabe, Amadeu Miraldes era surdo como uma porta - ora, por diferentes parecenças, a do armário fazia ouvir-se, rangendo ao abrir. Menos para ele, pois. Há infortúnios insuspeitáveis.

Mas, não. Não para sempre.

Um dia, Amadeu viu-a. Aquela rapariga que descia pelos socalcos, leve como se tivesse
asas. Em carne e osso, evidente, absorta, o pastor apercebeu-se de que ela era especial.

 – Continua


   

IMAGINÁRiO293
· 01 OUT 2010 · Edição Kafre · imaginario@imaginarios.org
· Ano VII · Semanal · Fundado em 2004


PRONTUÁRiO

RECENSÕES




Transpor a realidade, através dos seus impulsos mais aliciantes, para uma acção recriada… O conceito ficcional é simples: quando tudo corre bem, mesmo para alguém com a vida organizada, às vezes acontece qualquer coisa que perverte a noção que tínhamos da nossa rotina, e pode mesmo afectar as expectativas para o futuro. Na complexidade dos dias actuais, eis o resultado de eventos fortuitos, encontros inesperados, opções complicadas, múltiplas oportunidades. Sobre enredos originais ou transferências literárias, eis o fenómeno exposto / analisado em O Cinema e as Suas Escritas de Carlos J.F. Jorge - sob chancela Apenas Livros. Numa perspectiva tradicional, ou pelo enquadramento contemporâneo, subsiste um sinal premonitório. Assim como em qualquer história - patente, representada, exibida - está em causa o respectivo autor, a partir da sua intenção ou inspiração; quanto a um filme, o imaginário exposto é o produto do poder discricionário do guionista. Aleatório, ambíguo, ou evidente, virtual, cabe-lhe definir as regras - que o espectador aceitará ou não, consumando a alternativa inevitável, inerente ao sucesso ou ao fracasso.

MEMÓRiA

01OUT1910-1934 - Bonnie Parker: «Tal como as flores embelezam ao sol e ao relento, também este mundo brilha mais com gente como tu!» (a Clyde Barrow). IMAG.212

02OUT1890-1977 - Groucho Marx: «Antes de começar a falar, quero que saibam que não tenho nada de importante a dizer» IMAG.24. IMAG. 136

03OUT1900-1938 - Thomas Wolfe: «Nunca demonstrem por palavras ou sinais o que sabem sobre aquilo que estão a ouvir. Deixem os outros falar, e nada digam».

1851-03OUT1910 - Miguel Bombarda: Professor da Escola Médico-Cirúrgica de Lisboa, director do Hospital de Rilhafoles, fundador do Laboratório de Histologia, membro do Comité Revolucionário que implantou a República em Portugal.

04OUT1720-1778 - Giovanni Battista Piranesi: «Foi arquitecto, arqueólogo, teórico, decorador de interiores, designer de mobiliário e, para além de ter inovado a veduta até ultrapassar o próprio género, é um dos maiores expoentes da Gravura europeia» (Maria da Graça Garcia). IMAG.192

CALENDÁRiO

19FEV-23ABR2010 - Em Guimarães, Edifício do Café Milenário, no Largo do Toural, apresenta Campos da Ilustração - LAB/Laboratório das Artes, exposição dos Alunos do Mestrado em Ilustração da ESAP/Escola Superior Artística do Porto/Guimarães.

1926-09MAR2010 - Alda do Espírito Santo, aliás Alda Graça: Escritora natural de São Tomé e Príncipe, militante da luta pela independência, autora do Hino Nacional, ministra e deputada - «Perde a literatura de língua portuguesa uma grande figura e perdemos todos no campo dos afectos» (Pepetela).

11MAR2010 - Atalanta Filmes estreia Cinerama de Inês Oliveira; com Sofia Marques e Diogo Dória.

11MAR2010 - Alambique estreia Tony de Bruno Lourenço; com Tiago Fagulha e Rita Martins.

17OUT1920-12MAR2010 - Miguel Delibes: «Nas minhas obras há quatro elementos essenciais - a natureza, a morte, a sensibilidade em relação ao próximo e a infância».

COMENTÁRiO

Teofilo Braga

Um novo opúsculo de Silva Pinto, Teófilo Braga e os Críticos, agora publicado e dedicado à Federação Académica, busca de demonstrar que a crítica do Sr. Antero de Quental àquele senhor é desautorizada pela paixão, e que a do Sr. Camilo Castelo Branco não tem autoridade moral nem literária. IMAG...214-227-236-237-244-256-263-270-277
31JUL1872 - Diário de Notícias

VISTORiA

.


..A luz irrompeu, desapareceu e irrompeu de novo, as badaladas das três ressoaram no sino do tribunal, ecoando através da cidade, como toadas de uma multidão de bronze, e os ventos leves de Abril sopraram na fonte, causando lençóis de arco-íris até o repuxo amansar, pulsante, à medida que Grover se aproximava da praça. Era uma criança de olhos escuros, rosto sério, com um sinal de nascença no pescoço - como um grão castanho, quente - um rosto gentil, demasiado calmo e atento para a idade.
Thomas Wolfe - O Rapaz Perdido (excerto)

ANTIQUÁRiO








03OUT1910 - Poucas horas antes do início de uma revolução triunfante, o neurocirurgião e militante republicano Miguel Bombarda, com 59 anos, é assassinado pelo tenente Aparício Rebelo, um doente mental, no Hospital de Rilhafoles, onde criou o Laboratório de Histologia em 1887, e do qual foi director.

05OUT1910 - À varanda da Câmara Municipal de Lisboa, José Relvas proclama a implantação da República em Portugal.
IMAG.10-17-52-65-150-161-165-169-174-204-223-224

EPISTOLÁRiO


El-Rei D. Manuel II
ao Primeiro Ministro

Meu caro Teixeira de Sousa

Forçado pelas circunstâncias vejo-me obrigado a embarcar no yatch real Amelia. Sou português e sê-lo-ei sempre. Tenho a convicção de ter sempre cumprido o meu dever de Rei em todas as circunstâncias e de ter posto o meu coração e a minha vida ao serviço do meu Pais. Espero que ele, convicto dos meus direitos e da minha dedicação, o saberá reconhecer! Viva Portugal! Dê a esta carta a publicidade que puder. Sempre mº afectuosamente
Manuel R. - yatch real Amelia
5 de Outubro de 1910

COROLÁRiO

Hoje, 5 de Outubro de 1910, às 11 horas da manhã, foi proclamada a República em Portugal na Sala Nobre do Município de Lisboa, depois de ter terminado o movimento da revolução nacional.
Constituiu-se imediatamente o Governo Provisório sob a Presidência do Dr. Teófilo Braga.
Diário do Governo - 6 de Outubro de 1910

NOTICIÁRiO






Revolução Republicana

Lisboa amanheceu hoje ao som do troar da artilharia. Proclamada por importantes forças do exército, por toda a armada e auxiliada pelo concurso popular, a República tem hoje o seu primeiro dia de História. A marcha dos acontecimentos, até à hora em que escrevemos, permite alimentar toda a esperança de um definido triunfo... Não se faz ideia do entusiasmo que corre na cidade. O povo está verdadeiramente louco de satisfação. Pode dizer-se que toda a população de Lisboa está na rua vitoriando a República.
05OUT1910 - O Mundo

PARLATÓRiO


Implantação da República

O Governo Provisório da República Portuguesa saúda as forças de terra e mar, que com o povo instituiu a Republica para felicidade da Pátria. Confio no patriotismo de todos. E porque a Republica para todos é feita, espero que os oficiais do Exército e da armada que não tomaram parte no movimento se apresentem no Quartel General, a garantir por sua honra a mais absoluta lealdade ao novo regime.
Teófilo Braga - Edital da Proclamação da República - Lisboa, 5 de Outubro de 1910

VISTORiA

Mataram o Dr. Bombarda. Espalha-se na cidade que foram os padres que instigaram um tenente a assassiná-lo. É falso, mas há correrias no Rossio e O Portugal foi apedrejado. Toda a gente acredita num crime planeado, toda a gente se insurge contra o facto brutal – toda a cidade republicana se transforma num vulcão. No Rossio juntam-se grupos de gente taciturna e desesperada: - Mataram-no! mataram-no! - ouve-se. À uma hora da noite o Machado Santos, à frente dum bando de populares, atira-se ao portão de Infantaria 16.
Raul Brandão - Memórias (excerto)

BREVIÁRiO

Tinta da China edita História da Primeira República Portuguesa de Fernando Rosas e Maria Fernanda Rollo.

Sextante Editora lança A Crise da República e a Ditadura Militar de Luís Bigotte Chorão.

iPlay edita em CD, Façam o Favor de Ser Felizes! de Raul Solnado; organização de David Ferreira, incluindo monólogos, canções, diálogos teatrais e televisivos de 1956-1982
IMAG.49-107-264-281

Editorial Caminho lança Camilo Castelo Branco - Memórias Fotobiográficas (1825-1890) de José Viale Moutinho. IMAG...227-236-237-244-256-277

EXTRAORDINÁRiO

OS SOBRENATURAIS
- Folhetim Aperiódico

SAI DO ARMÁRIO, MEU AMOR,
E DEIXA-ME ENTRAR NA NOITE - 3

 Por isso, Amadeu foi crescendo, com a impressão de que o que havia à sua volta ia mirrando. Incoerente, inevitável. Mas absteve-se, na normalidade. Concluiu sem distinção a 4ª Classe. Falhou o serviço militar com dever patriótico. Indiferente, voltou então à pasmaceira da sua aldeia beirã, para ver como os progenitores morriam e nada mais lhe restava em consciência.

Tornou-se guardador de rebanhos, para sobreviver. Apascentava sem convicção, porém, das faldas aos cumes das serranias, enquanto cabras e ovelhas faziam pela vida, ele ia ruminando a saudade duma ausência imaginária.

É que a Menina dos Sonhos nunca mais se havia desvendado. Embora Amadeu, da sua gente, apenas conservasse aquele armário sacralizado. E o mantivesse junto à cama. E embora a tal visão, às vezes, se esgueirasse.

  Continua


  

IMAGINÁRiO292
· 24 SET 2010 · Edição Kafre · imaginario@imaginarios.org
· Ano VII · Semanal · Fundado em 2004


PRONTUÁRiO

CASUALIDADES

O processo criativo por palavras, através do imaginário literário, eis um desafio estimulante e apelativo. O que um escritor observa, anota, inventa. O que partilha, transmite, rejeita. O modo como testemunha, o estilo com que analisa. As memórias que resguarda, as emoções que suscita. As vivências que transfere para outras circunstâncias, modelando-as às suas personagens. A noção do tempo nos subentendidos da ficção. As conotações da experiência na correspondência narrativa... Jornalista, crítico, poeta, dramaturgo, romancista, Júlio Conrado conjuga tais valências complexas / alternativas - em BarberShop, sob chancela da Editorial Presença - de um modo aliciante e corrosivo, linear e recorrente, irónico e reflexivo, ao formular os parâmetros sobre uma realidade restrita, mas exemplar (a partir de Cascais), para uma reincidência virtual, simbólica (como Cascale), em seus contrastes e mutações. Envolvendo e enredando histórias e confidências, desfiando e resolvendo conexões e imbróglios. Interlocutor privilegiado, afinal o leitor (cada leitor) é - também - um íntimo / último destinatário, a surpreender ou a identificar.
IMAG. 24-44-184-222-271

CALENDÁRiO

04DEZ2009-28MAR2010 - Em Lisboa, Museu do Oriente apresenta Selos Portugueses do Oriente - Desenhos Originais da Índia, Macau e Timor, por Almada Negreiros, Alberto de Sousa, Alberto Cutileiro, Constantino Fernandes, Martins Barata, Manuel Lapa, João Abel Manta, Domingos Rebelo, Lima de Freitas e outros artistas.

25FEV2010 - Um exemplar da revista Detective Comics em que, pela primeira vez, apareceu Batman de Bob Kane, é vendido por 1,07 milhões de dólares, recorde para uma publicação de banda desenhada.
IMAG.2-8-10-32-39-45-51-62-71-72-201-208-217-227-265

27FEV-28MAR2010 - Em Vila Franca de Xira, Celeiro da Patriarcal apresenta CartoonXira, com Cartoons do Ano 2009 por António, André Carrilho, Augusto Cid, Cristina Sampaio, António Jorge Gonçalves, Maia, e Caricaturas de Loredano.

02MAR-02ABR - Em Lisboa, Convento dos Cardeais expõe João César Monteiro [1939-2003], Assim e Não Assado, com obras alusivas ao universo do cineasta por Ana Jotta, Francisco Vidal, Pedro Gomes, Ramiro Guerreiro e Rita Magalhães.
IMAG.10-48-129-158-213

05MAR-09MAI2010 - No Centro Cultural de Cascais, Fundação D. Luís I expõe A-Z Entre Imagens e Palavras de Joana Rêgo.

11MAR-18ABR2010 - Teatro Nacional de D. Maria II apresenta Num Dia Igual aos Ostros de John Kolvenbach; encenação de Marco Martins, com Gonçalo Waddington e Nuno Lopes. IMAG.58-125

MEMÓRiA

1907-26SET1990 - Alberto Pincherle, aliás Alberto Moravia: «Quando me sento à secretária para escrever, nunca sei o que me sairá, até que tudo começa a acontecer. Confio na inspiração, que umas vezes me bafeja, e outras não. Mas não fico à espera que ela surja. Trabalho durante todo o dia». IMAG.229

1892-27SET1940 - Walter Benjamin: «Articular historicamente o passado não significa conhecê-lo como ele, de facto, foi. Significa apropriarmo-nos de uma reminiscência, tal como ela cintila no momento de um perigo».

28SET1900-2008 - Boris Yefimov: Caricaturista russo, testemunha da União Soviética - «Ao longo da sua vida viu revolução, guerra civil, duas guerras mundiais, Guerra Fria e um golpe de Estado» (The Daily Telegraph - 2008). IMAG.219

1896-28SET1970 - John Dos Passos: Escritor norte-americano de origem portuguesa, autor de Manhattan Transfer (1925) e da trilogia USA - 42nd Paralell (1930), Nineteen Nineteen (1932), The Big Money (1936) - «Sim. Tenho muitos primos [na Madeira]. A nossa família é muito grande. O meu avô emigrou para os Estados Unidos, um irmão dele foi para o Brasil e outros ficaram cá. Assim, tenho agora parentes aqui, em Lisboa, nos Estados Unidos e no Brasil» (1960).

OBSERVATÓRiO

www.bmab.cm-abrantes.pt - O Essencial de António Botto - Exposição Virtual sobre a vida e a obra do Escritor (1897-1959), no Site da Biblioteca Municipal António Botto de Abrantes, incluindo documentos e fotografias, além de alguns poemas («O mais importante na vida / é ser-se criador - criar beleza».

VISTORiA



O desejo de ser sincero é superficial. Não é por acaso que muitos dos romances entre os últimos aparecidos são escritos na primeira pessoa, de modo a que o eu repetido e disseminado ao longo das páginas produza uma sensação de algo muito próximo a uma lembrança, a uma confissão, a um diário. Não é também por acaso que neles se evita com muito cuidado o enredo ou de certa forma tudo o que possa parecer invenção; e que se narrem os factos com garra jornalística, como coisa que realmente tivesse acontecido. A sinceridade, no seu estrito sentido, não suporta a narração objectiva que é um princípio de artifício nem a invenção que em todas as ocasiões pode parecer falsa.
A sinceridade parece-se muito com o mar em certos dias. Há manhãs de tanta bonança que se andamos de barco e nos inclinamos para contemplar a água debaixo de nós, tem-se a impressão de que estamos suspensos sobre transparentes e tangíveis precipícios. A água, por muito profunda que seja, não se opõe a que se olhe a prumo para baixo e se veja, numa claridade esverdeada, o fundo areoso espargido de seixos e de trigueiras céspedes. Nasce então uma espécie de exaltação, deseja-se tocar aquele fundo que parece estar muito perto de nós. No entanto quando se mergulha, mesmo com todo o peso do nosso corpo e toda a força da nossa impulsão só conseguimos penetrar na água um par de metros. Nem sequer afloramos aquela encantada e longínqua profundidade.
Alberto Moravia - O Homem Como Fim (1963 - excerto)


O materialista histórico não pode renunciar ao conceito de um presente que não é transição, antes se suspende no tempo e imobiliza-se. Porque esse conceito define exactamente aquele presente em que ele próprio escreve a história. O historicista apresenta a imagem eterna do passado, o materialista histórico faz desse passado uma experiência única. Ele deixa a outros a tarefa de esgotar-se no bordel do historicismo, com a prostituta era uma vez. Ele fica senhor das suas forças, suficientemente viril para fazer saltar pelos ares o continuum da história.
O historicismo culmina legitimamente na história universal. Em seu método, a historiografia materialista distancia-se dela talvez mais radicalmente que de qualquer outra. A história universal não tem qualquer armação teórica. O seu procedimento é aditivo. Ela utiliza a massa dos factos, para com eles preencher o tempo homogéneo e vazio. Pelo contrário, a historiografia marxista tem na sua base um princípio construtivo. Pensar não inclui apenas o movimento das ideias, mas também a sua imobilização. Quando o pensamento pára, bruscamente, numa configuração saturada de tensões, ele comunica-lhes um choque, através do qual essa configuração se cristaliza enquanto nómada. O materialista histórico só se aproxima de um objecto histórico quando o confronta enquanto nómada. Nessa estrutura, ele reconhece o sinal de uma imobilização messiânica dos acontecimentos, ou, dito de outro modo, de uma oportunidade revolucionária de lutar por um passado oprimido. Ele aproveita essa oportunidade para extrair uma época determinada do curso homogéneo da história; do mesmo modo, ele extrai da época uma vida determinada e, da obra composta durante essa vida, uma obra determinada. O seu método resulta em que, na obra, o conjunto da obra; no conjunto da obra, a época; e, na época, a totalidade do processo histórico, são preservados e transcendidos. O fruto nutritivo do que é compreendido historicamente contém no seu interior o tempo, como sementes preciosas, mas insípidas.
Walter Benjamin - Magia e Técnica, Arte e Política. Ensaios Sobre Literatura e História da Cultura (1939 - excerto)

NOTICIÁRiO

Tem o sr. Dr. Passos um particular afecto pelo nosso país, pois na visita que em Lisboa fez ao nosso monarca, a quem foi apresentado pelo ministro americano, disse ao sr. D. Carlos que se honrava em ser um «português-americano». Na Madeira também foi sua exª. visitar o venerando prelado funchalense e a Câmara Municipal, manifestando o mais vivo interesse por tudo quanto diz respeito aos negócios da nossa terra. Como é natural, são gratíssimas as impressões que o sr. Dr. Passos leva do nosso país, especialmente da Madeira, onde nacionais e estrangeiros lhe fizeram o mais lisonjeiro acolhimento. O sr. Dr. John R. Dos Passos conta partir hoje no Heidelberg para Lisboa, de onde regressará à América, prometendo contudo voltar à Madeira oportunamente. Felicitando o grande português-americano e a sua distinta família, desejamos-lhe cordialmente uma óptima viagem, fazendo votos para que de novo volte a esta terra, que o estremece como se fosse a sua verdadeira pátria.
10MAI1905 - Diário Popular (Funchal)

PARLATÓRiO

Como Escrevo

Tudo o que eu preciso é de um quarto, sem nenhum pormenor em especial. Algumas coisas, escrevi-as inteiramente à mão, mas agora costumo começar os capítulos à mão e terminá-los à máquina, e tudo acaba em tamanha confusão que ninguém consegue transcrever, excepto a minha mulher. Acho mais fácil levantar-me cedo, e gosto de ficar a trabalhar até à uma, duas horas. Não faço muita coisa durante a tarde. Gosto de sair, se possível... Faço algumas revisões. Certos capítulos são revistos umas seis, sete vezes. De vez em quando, as coisas saem correctas à primeira. Mas, frequentemente, não é possível. George Moore reescreveu romances inteiros. No meu caso, normalmente escrevo até à altura em que o trabalho começa a piorar, em vez de melhorar. Esse é o momento certo de parar e publicar.
John Dos Passos

BREVIÁRiO

Civilização edita Ponto Último e Outros Poemas de John Updike (1932-2009); tradução de Ana Luísa Amaral. IMAG. 124-157-171-234-288-290 

 EMI edita em CD, David Bowie por David Bowie. IMAG.194-223-232

Antígona edita Na Cova dos Leões de Tomás da Fonseca (1877-1968). IMAG.122

Sony edita em CD e DVD, Live at the Isle of Wight de Leonard Cohen.
IMAG.13-64-123-253

Casa das Letras edita O Espectáculo da Vida de Richard Dawkins; tradução de Isabel Mafra.


IMAGINÁRiO291

· 16 SET 2010 · Edição Kafre · imaginario@imaginarios.org
· Ano VII · Semanal · Fundado em 2004


PRONTUÁRiO

DOCUMENTAR



Uma questão se coloca hoje em dia, porventura candente entre as múltiplas que o cinema sugere, na sequência das transformações técnicas e das metamorfoses artísticas: para além dos domínios típicos em género ou em expressão, quais os vectores comuns, as relações de convergência entre o documentário e a ficção em filme? Observamos, desde logo, que tal questão tem pouco significado ao nível da indústria americana - onde são específicos os modelos de produção e os mecanismos de difusão; mas levanta ainda virtual interesse, aliciante expectativa para a conjuntura europeia - onde afinal o cinema nasceu, há mais de um século. E, embora não exista uma manifestação ou incidência comum, poder-se-á talvez configurar aquela natureza original - sobretudo, e sugestivamente, quanto à criatividade de mulheres realizadoras. Primitivamente, não foi preponderante, em relação aos motivos ou flagrantes impressionados em película, distinguir entre testemunho ou simulação do real. Estabelecida, explorada essa alternativa em termos de género ou espectáculo, verifica-se em cineastas - como Agnès Varda - uma fascinante conjugação de referências e sinais narrativos, cuja ênfase matricial acaba por suscitar um novo e surpreendente alcance de leitura ao elã audiovisual…

MEMÓRiA

14SET1580-1645 - Francisco Gómez de Quevedo y Villegas: «Só quem ama com amor é servido com fidelidade… São ténues os limites que separam a resignação da hipocrisia».

1915-16SET2000 - Luiz Forjaz Trigueiros: «…Deu à estampa cerca de 20 obras de ensaio, ficção, crónica, inquérito e reportagem, afirmou-se, sobretudo, como crítico, acompanhando de perto, com grande sagacidade e interesse, toda a produção literária, procurando conciliar os valores da tradição com os surtos da modernidade» (António Valdemar).

17SET1850-1923 - Abílio de Guerra Junqueiro: «Dei a volta ao mundo, dei a volta à vida… / Só achei enganos, decepções, pesar…/ Oh, a ingénua alma tão desiludida!...» (Regresso ao Lar - excerto). IMAG.82-90

1942-18SET1970 - Johnny Allen Hendrix, aliás James Marshall Hendrix, aliás Jimi Hendrix: «Look over yonder here comes the blues... / I can see ’em comin’ / Wearing a blue armoured coat... / You’re sittin’ there with your violins / Hittin’ wrong notes...» (Look Over Yonder - excerto). IMAG.252

1803-23SET1870 - Prosper Mérimée: «Toda a grande mentira necessita de um detalhe bem circunstanciado, graças ao qual passa a ser credível».

CALENDÁRiO

09MAI1920-07FEV2010 - Philip Klass, aliás William Tenn: «Escreveu ficção científica de cariz sarcástico, numa época em que vários autores do género revelavam sentido de humor» (Gerald Jonas - The New York Times).

12FEV-04ABR2010 - Centro Cultural de Cascais expõe Aventuras de Alice No País das Maravilhas de Diogo Muñoz.

18FEV2010 - Teatro de D. Maria II apresenta Rei Édipo a partir de Sófocles, em encenação de Jorge Silva Melo; com Diogo Infante e Lia Gama.

18FEV2010 - Atalanta Filmes estreia Bobby Cassidy, Counterpuncher de Bruno de Almeida; com Bobby Cassidy e Bobby Cassidy Jr. IMAG.0189-245

20FEV2010 - Frente Ribeirinha, em Montijo, expõe Tejo, Fonte de Vida - O Estuário e a Baía do Montijo: Fauna Aquática, em organização da Câmara Municipal.

 26FEV-25ABR2010 - No Centro Cultural de Cascais, Fundação D. Luís I expõe Is Anybody Home? de Joana Gancho.

ANUÁRiO

1830 - Aparecem os primeiros fósforos em Portugal. Eram de pau, e cada caixa continha uns 25 ou 30 palitos, a que se deu o nome de lume pronto. Cada caixa era acompanhada de um frasquinho, contendo um líquido, no qual se mergulhavam e acendiam os palitos. Pouco tempo depois, em vez do frasco, as caixas traziam um bocado de lixa de papel, que servia para n’ela se friccionarem os fósforos. Uns e outros custavam 150 réis. 13MAI1897 - Diário de Notícias

SET2006 - A Fosforeira Portuguesa, única empresa - fundada em 1926, sedeada em Lisboa e com fábrica em Espinho - a produzir fósforos na Península Ibérica, cessa laboração e é substituída pela Chama Vermelha.

OBSERVATÓRiO

www.charliechaplin.com - Charlie Chaplin - Página oficial sobre Charles Chaplin (1889-1977), aliás Charlot, inclui Filmografia, Biografia, Notícias, Loja e Participar (convite a todos, para a criação de blogues pessoais alusivos ao artista).
IMAG.6-55-81-95-99-160-181-204-213-238-283

VISTORiA

Fortunato continuava com um riso zombeteiro.
– O meu pai é Mateo Falcone! – disse ele, enfaticamente.
– Bem sabes, meu malandro, que posso levar-se para a Corte ou para a Bastilha. Farei com que durmas num calabouço, em cima da palha, com ferros nos pés e mandarei guilhotinar-te se não disseres onde está Gianetto Sanpiero.
A essa ridícula ameaça, o menino soltou uma gargalhada, e repetiu:
– O meu pai é Mateo Falcone!
Prosper Mérimée - Mateo Falcone (1829 - excerto)


Não Quero

Um dia, passando na estrada, ouvi dois rapazitos que falavam muito alto: «Não, dizia um com voz enérgica, não quero.»
Parei e perguntei-lhe :
- O que é que tu não queres, meu rapaz?
«Não quero dizer à mamã que venho da escola, porque é mentira. Sei que me há-de ralhar, mas antes quero que me ralhe do que mentir.»
- E tens razão, disse-lhe eu. És um rapaz como se quer. 
Apertei-lhe a mão, enquanto que o outro pequeno, que lhe aconselhava que se desculpasse mentindo, ia-se embora todo envergonhado.
Daí a alguns meses, passando pela mesma aldeia e tendo de falar com o professor, entrei na escola, onde reconheci imediatamente os meus dois pequenos; o que não quis mentir, sorria-me, enquanto que o outro, vendo-me, baixou os olhos.
Ao despedir-me, interroguei o mestre sobre os dois alunos: «Oh! disse-me ele, falando do primeiro, é um magnífico estudante, um pouco teimoso, mas honrado, sincero, sempre pronto a confessar as suas faltas e o que é ainda melhor, a repará-las. O outro pelo contrário, é mentiroso, covarde e incorrigível.»
- Não me espanto, disse eu, já tinha tirado o horóscopo destas duas crianças; e contei-lhe o que tinha ouvido
Guerra Junqueiro

ANUÁRiO




1330-1418 - Nicholas Flamel: Alquimista, autor de O Livro das Figuras Hieroglíficas (1399), O Sumário Filosófico (1409) e Saltério Químico (1414) - «Deus Todo-Poderoso, Eterno, pai da luz, de quem vêm todos os bens e todos os dons de perfeição, imploro a Vossa infinita misericórdia; permiti-me conhecer a Vossa infinita sabedoria; é ela que rodeia o Vosso trono, que criou e realizou, que conduz e conserva tudo. Dignai-Vos enviar-me do céu o Vosso santuário, e do trono a Vossa glória, a fim de que seja e que opere em mim; é ela que é senhora de todas as artes celestes e ocultas, que possui a ciência e a inteligência de todas as coisas. Fazei com que ela me acompanhe em todas as minhas obras, que, pelo seu espírito, eu obtenha a verdadeira inteligência, que eu proceda infalivelmente na arte nobre a que me consagrei, na pesquisa da miraculosa Pedra dos sábios, que escondestes do mundo, mas que constumais revelar pelo menos aos vossos eleitos. Que essa Grande Obra, que devo executar neste mundo, a comece, a prossiga e a termine de modo feliz; que, contente, eu viva satisfeito para sempre. Peço-vos, por Jesus Cristo, a Pedra celeste, angular, miraculosa e firmada em toda a eternidade, que governa e reina convosco» (Oração). IMAG.213

ELUCIDÁRiO

Pois eu, Nicholas Flamel, escrivão, logo que, após a morte dos meus pais, comecei a ganhar a vida com a nossa arte da escrita, fazendo inventários, pondo contas em ordem e suspendendo as despesas dos tutores de menores, veio cair-me nas mãos, pela soma de dois florins, um livro dourado muito velho e bastante grande; não era de papel ou de pergaminho, como são os outros, mas era feito apenas de delgadas cascas (segundo me parecia) de arbustos tenros.
A capa era de cobre muito fino toda gravada com letras ou figuras estranhas e, em minha opinião, creio que podia muito bem tratar-se de caracteres gregos, ou de uma outra língua antiga semelhante. Tanto assim que eu não era capaz de as ler e que sabia muito bem que não eram sinais ou letras latinas ou gaulesas, pois nós, disso percebemos um pouco. Quanto ao interior, as suas folhas de casca estavam gravadas e escritas com grande habilidade, com uma ponta de ferro, em belas e nítidas letras latinas coloridas.
Continha três vezes sete folhas (pois estas encontravam-se assim numeradas no alto da folha), a sétima das quais nunca estava escrita, e, em vez disso, tinha pintadas uma vara e serpentes a devorarem-se; na sétima folha a seguir, uma cruz em que uma serpente estava crucificada; e na última destas sétimas folhas estavam pintados desertos no meio dos quais brotavam fontes belíssimas, de onde saíam muitas serpentes que corriam por aqui e por ali.
Na primeira folha estava escrito, em grandes letras maiúsculas douradas: ABRAÃO O JUDEU, PRÍNCIPE, PADRE, LEVITA, ASTRÓLOGO E FILÓSOFO AO POVO DOS JUDEUS OU DISPERSOS PELA IRA DE DEUS NAS GÁLIAS, SALVE D. I. Depois disto, encontrava-se cheio de grandes blasfémias e maldições (com a palavra MARANATHA, que estava repetida muitas vezes) contra toda a pessoa que pusesse os olhos nesse livro se não fosse sacrificante ou escrivão.
Nicholas Flamel - O Livro das Figuras Hieroglíficas (excerto)

BREVIÁRiO

Midas Filmes edita em DVD, 2 Horas Na Vida de Uma Mulher/Cléo de 5 à 7 (1962) de Agnès Varda; com Corinne Marchand e Antoine Bourseiller.

Midas Filmes edita em DVD, Sem Eira Nem Beira/Sans Toit Ni Loi (1985) de Agnès Varda; com Sandrine Bonnaire e Setti Ramdane.

Universal edita em CD, sob chancela Decca, [Claude] Debussy [1862-1918] & [Maurice] Ravel [1875-1937]: Music For Two Pianos por Vladimir Ashkezani e Vovka Ashkezani. IMAG.104-160-203-252-272

Teorema edita Eu Sou o Maior - O Regresso do Menino Nicolau de René Goscinny (1926-1977, argumento) e [Jean-Jacques] Sempé (ilustração). IMAG.71

Teorema edita Se Numa Noite de Inverno Um Viajante de Italo Calvino (1923-1985). IMAG.51-271-290


IMAGINÁRiO290

· 08 SET 2010 · Edição Kafre · imaginario@imaginarios.org
· Ano VII · Semanal · Fundado em 2004


PRONTUÁRiO

HISTÓRIAS



Uma das mais populares e amadas comédias românticas, dos anos gloriosos de Hollywood, Casamento Escandaloso / The Philadelphia Story (1940) mantém intenso fascínio, para deleite dos fanáticos... e surpresa dos nóveis cinéfilos! Em geral considerado um realizador de mulheres, George Cukor (1899-1983) coloca Katharine Hepburn entre Cary Grant - após dirigir ambos em Sylvia Scarlett (1935) e A Irmã da Minha Noiva (1938) - e James Stewart, assim especulando uma cumplicidade carismática, pelos equívocos que celebraram a peça de Philip Barry. Hepburn conhecia-a bem, após a sua representação na Broadway, tendo adquirido os direitos. Há dois anos ausente das telas, a diva impôs Cukor e os seus comparsas à MGM, para um regresso triunfal. Claro, Hollywood rendeu-se, porém a Academia trocou-lhe as voltas, quanto à consagração dos Oscars: distinguidos foram Stewart e um outro, o argumentista Donald Ogden Stewart. Um pouco como acontece na história, pelo menos até às consequências. Hepburn é uma jovem e bela divorciada da melhor sociedade de Filadélfia, que prepara mais um casamento. Para atrapalhar, o ex-marido Grant, sedutor e ainda apaixonado, aparece como convidado e faz-se acompanhar por Stewart, repórter de uma revista de sensação, pouco amistoso em relação à gente da alta. As peripécias subsequentes levam o noivo a suspeitar, fazendo chantagem sobre os sentimentos e ambições de Hepburn. Resoluta, ela larga-o, mas acaba por desfazer as expectativas do rendido Stewart, optando por um novo enlace com Grant... Entre disfarces e cenários, Cukor celebra a primazia da representação e o privilégio das vedetas, transfiguradas sob o artifício das cintilações. Pelo meio, desfazem-se preconceitos, desvendam-se ousadias - sempre com elegância e ironia, quanto à subversão de um destino convencional.

MEMÓRiA

1904-09SET1990 - Angus McBean: «As estrelas de cinema sabem reconhecer um fotógrafo e confiar nele - e, felizmente, esse fotógrafo muitas vezes sou eu!»

10SET1740-1811 - Nicolau Tolentino de Almeida: «Vejo a Europa em armas; ouço o flagelo da guerra ao redor os confins da minha pátria; e parece-me que não desaprovaria esta sátira aquele ministro hábil que, debaixo da direcção dos seus soberanos; intenta manter uma paz profunda no meio dos fogos das nações armadas» (dedicatória de A Guerra ao Visconde de Vila Nova de Cerveira).

11SET1910-1984 - Manuel Mujica Lainez: «Sempre sonhei com um lugar assim, afastado e próximo, e os mosteiros sucessivos que povoaram os meus monólogos - o principal dos quais ficava em Córdoba, nas proximidades de Nono - foram apenas prenúncios do que, por fim, encontrei n’O Paraíso». IMAG.219

12SET1880-1956 - Henry Mencken: «O pior governo é o mais moral. Um governo composto de cínicos é frequentemente mais tolerante e humano. Mas, quando os fanáticos tomam o poder, não há limite para a opressão».

15SET1890-1976 - Agatha Christie: «Não me parece que a necessidade seja a mãe da invenção - em minha opinião, a necessidade deriva directamente do ócio, e provavelmente da preguiça. Para nos livrar de sarilhos». IMAG.66-125-173-180-228

CALENDÁRiO

23FEV2010 - O escritor e cineasta António de Macedo presta prova de doutoramento em Sociologia da Cultura, com a tese Cristianismo e Heterodoxias, na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa.
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VISTORiA


A Um Cavalo

Vai, mísero Cavalo lazarento,
pastar longas campinas livremente;
não percas tempo, enquanto t’o consente
de magros cães faminto ajuntamento:

Esta sela, teu único ornamento,
para sinal de minha dor veemente,
de torto prego ficará pendente,
despojo inútil do inconstante vento:

Morre em paz; que em havendo algum dinheiro,
hei de mandar, em honra de teu nome,
abrir em negra pedra este letreiro:

«Aqui, piedoso entulho, os ossos come
do mais fiel, mais rápido sendeiro,
que fora eterno a não morrer de fome».

Nicolau Tolentino de Almeida

VISTORiA


Prezado Manucho:

No silêncio de meu quarto
a noite me surpreende,
me prende à vida o dever.
Ser o que de mim exigem
e ser o que de fato sou:
limitar os meus sonhos
à força das injunções;
pressões e azares tamanhos!

Da Nirham Eros (Antonio Miranda),
a Manuel Mujica Lainez
(Rio de Janeiro - 04JUL1965, excerto)

ANTIQUÁRiO

SET1780 - O astrónomo francês Pierre Méchain (1744-1804) descobre a galáxia em espiral Messier 74, situada a trinta e dois milhões de anos-luz do planeta Terra e cuja posição foi determinada por Charles Messier (1730-1817), tendo-a incluído no seu Catálogo em 18OUT1780.

EPISTOLÁRiO



Querido Eros [Antonio Miranda]

Sufocado pelas responsabilidades que em tua carta enumeras, custa-me reconhecer-te. Que te passa, ou melhor dito, que aconteceu contigo? Não se chega a uma mudança de frente como a que apregoas, sem uma rotunda razão. A imputação à idade, à experiência e a outras melancolias, se não porque desde que deixaste Buenos Aires, imaginei que sempre serias jovem, que sempre haveria dentro de ti - e também em tua envoltura - grandes zonas intactas. O curioso é que teu encanto (o encanto do que eras quando te conheci) hasteia na força de tua irresponsabilidade e na graça de tua responsabilidade. Já então, o estudioso que preparou a melhor monografia do concurso argentino, e o esteta preocupado com os mistérios letristas e eufónicos do «trigo-trem», era um homem de óbvias responsabilidades. O irresponsável brotava de teu seguro parentesco com Puck. Assim é que não deves falar-me de responsabilidades como algo novo. Provavelmente, o que aconteceu é que terás sofrido grande desilusão, ignoro de que índole, e que isso rompeu o equilíbrio da balança em que os pratos do responsável e do irresponsável se mantinham, como por milagre, no mesmo exacto nível. E - se assim é, se não estou equivocado - de que ilusão se trata? Diz-mo. Sabes que sou, de verdade, teu amigo.

Manucho (Manuel Mujica Lainez, Buenos Aires - 28DEZ1965)

INVENTÁRiO

Homem de Neandertal Desapareceu Há 37 Mil Anos

Nem há 28 mil, nem há 34 mil anos. Os neandertais desapareceram da face da terra há 37 mil anos. A nova datação foi feita por uma equipa de investigadores liderada pelo arqueólogo e investigador português João Zilhão, da Universidade britânica de Bristol, com base em achados do lugar de Pego do Diabo, em Loures, perto de Lisboa.

Filomena Naves (excerto)
27JAN2010 - Diário de Notícias

ANUÁRiO

1730-1750 - Em Lisboa, é secretário de El-Rei D. João V, o advogado, escritor e diplomata, nascido no Brasil, Alexandre (irmão de Bartolomeu) de Gusmão (1695-1753) - «Esta vaidade com que o mundo engano, / foi da Fortuna errado movimento. / Subi, mas tive humilde nascimento: / assim foi Viriato, assim Trajano». IMAG.61-143

COMENTÁRiO

Lisboa

Parece-nos que o reino está rico, porque nos engana Lisboa cheia de luxo, fazendo monopólio das rendas d’elle, não para as conservar, mas para as destruir, entregando-se às nações estrangeiras a troco do preciso e mais do supérfluo. Também Lisboa faz monopólio dos povos do reino, que todos correm para a sua capital; e por isso nos enganamos, imaginando que está o reino muito povoado. E estes dois enganos de supormos que há muita riqueza e grande povoação, são causas de nosso dano em muita parte.

Alexandre de Gusmão

BREVIÁRiO

Edições Asa lança O Aniversário de Astérix e Obélix - O Livro de Ouro de René Goscinny (texto) e Albert Uderzo (texto, desenhos).
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¨Dom Quixote edita Indignação de Philip Roth; tradução de Francisco Agarez.
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Universal edita em CD, sob chancela Decca, The [Wolfgang Amadeus] Mozart [1756-1791] Album pela soprano Danielle de Niese, com a Orchestra of the Age of Enlightenment sob a direcção de Sir Charles Mackerras.
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Teorema edita Todas as Cosmicómicas de Italo Calvino (1923-1985).
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Sony edita em CD, sob chancela Columbia, Christmas In the Heart de Bob Dylan.
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Civilização edita Ponto Último e Outros Poemas de John Updike (1932-2009); tradução de Ana Luísa Amaral.IMAG. 124-157-171-234-288

Brilliant Classics edita em CD, Les Baricades Mistérieuses pelo alaudista Miguel Serdoura.

EXTRAORDINÁRiO

OS SOBRENATURAIS
Folhetim Aperiódico

SAI DO ARMÁRIO, MEU AMOR,
E DEIXA-ME ENTRAR NA NOITE - 2

 Já estremecia o soalho, com os passos do pai caminhando pelo quarto. A mãe sacudia-lhe ao de leve um ombro, arrebatando-o para este lado. Tudo o que era lindo e doce se desvanecia por encanto. Amadeu emergia entre os lençóis e apenas relanceava, com um discreto pudor, a porta do armário onde a Menina dos Sonhos se havia, como sempre, refugiado e esvaído.

Cada manhã, portanto, Amadeu Miraldes apartava-se do que tanto gostava, conformado a relacionar-se entre os mais seres humanos. Comunicando por gestos e expressões, pois uma deficiência auditiva deixara-o insensível a sons, falas, ruídos, melodias. E também lhe custava tocar. O envolvimento para além do seu corpo era baço e desagradável.

 – Continua   



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